Resumo: Verifica-se a preocupação do legislador constituinte de proporcionar ao homem, da presente e futuras gerações, um ambiente com condições para o seu desenvolvimento. No entanto, é imposto à coletividade a responsabilidade da preservação e conservação. Nesse plano é reservado ao indivíduo o direito de usufruir dos benefício fornecidos pelo ambiente e ao mesmo tempo, lhe é imposto o dever de resguardar esse ambiente de qualquer dano. Essa obrigação de preservar o Meio Ambiente, parte do pressuposto de que o próprio homem é o responsável direto pelas transformações que ocorrem no ambiente e que, consequentemente, podem levar a um desequilíbrio que influenciará todas as formas de vida. Essas mudanças no ambiente podem ocorrer quando: se aplica, em tudo, novas tecnologias, são realizadas novas experiências sem ter comprovação de consequências futuras e na prática de atividades sem qualquer tipo de cautela. Observa-se que o conceito técnico insere o homem dentro de ambiente diferente da lei 6938/81, que traz o conceito de Meio Ambiente. Esta não inclui o homem como parte integrante do Meio Ambiente Natural, nesse caso, a sociedade humana torna-se algo não pertencente ao ambiente em seus componentes bióticos e abióticos. Assim, necessário se revela a análise do meio-ambiente e o desenvolvimento de indicadores que conjuguem o desenvolvimento com a sustentabilidade.
Palavras Chaves: Meio Ambiente. Sustentabilidade. Indicadores de Desenvolvimento.
Sumário: 1 Meio Ambiente: Conceito e Classificação: 1.1 Meio Ambiente Natural ou Físico; 1.2 Meio Ambiente Artificial ou Humano; 1.3 Meio Ambiente Cultural; 1.4 Meio Ambiente do Trabalho; 2 Sustentabilidade: Indicadores Econômicos, Sociais e Ambientais; 3 A proeminência da defesa do meio ambiente em todos os seus aspectos como forma para se alcançar os indicadores próprios da sustentabilidade: 3.1 Breve Análise Histórica do Cenário da Sustentabilidade: Da Conferência de Estocolmo ao Protocolo de Quioto; 3.2 – O Direito ao Meio-Ambiente Ecologicamente Equilibrado como fomento ao Desenvolvimento Sustentável; 3.3 – A Acepção de Desenvolvimento Sustentável e os Indicadores de Sustentabilidade: O Princípio Irradiador da Carta Magna.
1 Meio Ambiente: Conceito e Classificação
Historicamente, a expressão Meio Ambiente foi utilizada, pela primeira vez, em 1835, pelo naturalista francês Geoffroy de Saint-Hilarie[1]. Desde então, busca-se um conceito para a expressão entre os especialistas. Em sentido jurídico, tem-se o conceito de Meio Ambiente estabelecido pela Lei 6938/1981, que trata da Política Nacional do Meio Ambiente, que assim estabelece: “Artigo 3º Para os fins previstos nesta Lei, entende-se por: I – meio ambiente, o conjunto de condições, leis, influências e interações de ordem física, química e biológica, que permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas”[2].
Para Silva, considera-se meio-ambiente como “a interação do conjunto de elementos naturais, artificiais e culturais que propiciem o desenvolvimento equilibrado da vida em todas as suas formas”[3]. Por seu turno, Édis Milaré distingue duas perspectivas principais, dentro do conceito jurídico da expressão Meio Ambiente, uma estrita e outra ampla[4]. Segundo o autor supra, numa visão estrita, “considera-se meio ambiente uma expressão do patrimônio natural e as relações com e entre os seres vivos”. Noutro giro, numa visão mais ampla “o meio ambiente abrange toda a natureza original artificial, assim como os bens culturais correlatos”.
Nesse contexto mais amplo, há uma divisão do meio ambiente em natural – que abrange o solo, a água, o ar, a energia, a fauna e a flora – e artificial – que abrange as edificações, equipamentos e alterações produzidas pelo homem. A Constituição Federal as República Federativa do Brasil, promulgada em 1988, não conceitua expressamente Meio Ambiente, mas, insere indiretamente, o homem no contexto, transmitindo uma visão antropocêntrica quando expressa:
“Artigo 225: Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações”[5].
Verifica-se a preocupação do legislador constituinte de proporcionar ao homem, da presente e futuras gerações, um ambiente com condições para o seu desenvolvimento. No entanto, é imposto à coletividade a responsabilidade da preservação e conservação. Nesse plano é reservado ao indivíduo o direito de usufruir dos benefícios fornecidos pelo ambiente e ao mesmo tempo, lhe é imposto o dever de resguardar esse ambiente de qualquer dano.
Essa obrigação de preservar o Meio Ambiente, parte do pressuposto de que o próprio homem é o responsável direto pelas transformações que ocorrem no ambiente e que, consequentemente, podem levar a um desequilíbrio que influenciará todas as formas de vida. Essas mudanças no ambiente podem ocorrer quando: se aplica, em tudo, novas tecnologias, são realizadas novas experiências sem ter comprovação de consequências futuras e na prática de atividades sem qualquer tipo de cautela. Nesse contexto legal, assim expressou-se Marcello Abelha:
“Bem se vê que o legislador teve preocupação específica com o homem quando disse, ao definir a atividade poluente numa visão antropocêntrica, como sendo aquele que afete o bem-estar, a segurança, as atividades sociais e econômicas da população. Enfim, essa definição de poluição levou em consideração o aspecto finalístico do meio ambiente (proteção da vida) e, mais especificamente ainda, reservou-o para a proteção da vida humana (meio ambiente artificial), numa visão inegavelmente antropocêntrica. Não sendo assim entendido, não seria mais vago do que o referido enunciado”[6].
Observa-se que o conceito técnico insere o homem dentro de ambiente diferente da Lei N°. 6.938, de 31 de Agosto de 1981, que traz o conceito de Meio Ambiente. Esta não inclui o homem como parte integrante do Meio Ambiente Natural, nesse caso, a sociedade humana torna-se algo não pertencente ao ambiente em seus componentes bióticos e abióticos. Milaré[7] pontua, em sua obra, uma definição, que ele considera descritiva, de Ávila Coimbra em que se considera meio ambiente a reunião de elementos bióticos e abióticos, organizados em ecossistemas diversos, sendo o homem inserido, de modo individual ou social, num processo de interação que atenda o desenvolvimento das atividades humanas e a preservação dos recursos naturais respeitando-se as leis da natureza e os padrões de qualidade definidos. Nesta esteira, ainda, com o objetivo de compreender as nuances e complexidades que integram o tema em testilha, carecido se faz trazer a lume a classificação dos aspectos do meio-ambiente, ainda que esta seja considerada para fins meramente didáticos, como bem anota Trennepohl[8], sendo agrupado em quatro órbitas, a saber: natural, cultural, artificial e do trabalho.
1.1 Meio Ambiente Natural ou Físico:
O primeiro grupo, doutrinariamente, apresentado compreende o meio ambiente natural, também denominado de físico, o qual alberga os fatores abióticos e bióticos, considerados como recursos ambientais. Nesta esteira de raciocínio, cumpre registrar, a partir de um viés jurídico, a acepção do tema em destaque, o qual vem disciplinado pela Lei Nº. 9.985, de 18 de Julho de 2000, que regulamenta o art. 225, §1º, incisos I, II, III e VII da Constituição Federal, institui o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza e dá outras providências, em seu artigo 2º, inciso IV, frisa que “recurso ambiental: a atmosfera, as águas interiores, superficiais e subterrâneas, os estuários, o mar territorial, o solo, o subsolo, os elementos da biosfera, a fauna e a flora”[9]. Nesta esteira, o termo fatores abióticos agasalha a atmosfera, os elementos afetos à biosfera, as águas (inclusive aquelas que se encontram no mar territorial), pelo solo, pelo subsolo e pelos recursos minerais; já os fatores bióticos faz menção à fauna e à flora, como bem assinala Fiorillo[10]. Em razão da complexa interação entre os fatores abióticos e bióticos que ocorre o fenômeno da homeostase, consistente no equilíbrio dinâmico entre os seres vivos e o meio em que se encontram inseridos.
Segundo Rebello Filho e Bernardo[11], o meio-ambiente natural “é constituído por todos os elementos responsáveis pelo equilíbrio entre os seres vivos e o meio em que vivem: solo, água, ar atmosférico, fauna e flora”. Nesta senda, com o escopo de fortalecer os argumentos apresentados, necessário se faz colocar em campo que os paradigmas que orientam a concepção recursos naturais como componentes que integram a paisagem, desde que não tenham sofrido maciças alterações pela ação antrópica a ponto de desnaturar o seu aspecto característico. Ao lado do esposado, faz-se carecido pontuar que os recursos naturais são considerados como tal em razão do destaque concedido pelo ser humano, com o passar dos séculos, conferindo-lhes valores de ordem econômica, social e cultural. Desta feita, tão somente é possível à compreensão do tema a partir da análise da relação homem-natureza, eis que a interação entre aqueles é preponderante para o desenvolvimento do ser humano em todas as suas potencialidades.
Patente se faz ainda, em breves palavras, mencionar a classificação dos recursos naturais, notadamente em razão da importância daqueles no tema em testilha. O primeiro grupo compreende os recursos naturais renováveis, que são os elementos naturais, cuja correta utilização, propicia a renovação, a exemplo do que se observa na fauna, na flora e nos recursos hídricos. Os recursos naturais não-renováveis fazem menção àqueles que não logram êxito na renovação ou, ainda, quando conseguem, esta se dá de maneira lenta em razão dos aspectos estruturais e característicos daqueles, como se observa no petróleo e nos metais em geral. Por derradeiro, os denominados recursos inesgotáveis agasalham aqueles que são “infindáveis”, como a luz solar e o vento. Salta aos olhos, a partir das ponderações estruturadas, que os recursos naturais, independente da seara em que se encontrem agrupados, apresentam como elemento comum de caracterização o fato de serem criados originariamente pela natureza. O meio-ambiente natural encontra respaldo na Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, em seu art. 225, caput e §1º, incisos I, III e IV.
“Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.
§1º – Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder Público:
I – preservar e restaurar os processos ecológicos essenciais e prover o manejo ecológico das espécies e ecossistemas; […]
III – definir, em todas as unidades da Federação, espaços territoriais e seus componentes a serem especialmente protegidos, sendo a alteração e a supressão permitidas somente através de lei, vedada qualquer utilização que comprometa a integridade dos atributos que justifiquem sua proteção;
IV – exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente, estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará publicidade”[12]
1.2 Meio Ambiente Artificial ou Humano:
O meio-ambiente artificial, também denominado humano, se encontra delimitado no espaço urbano construído, consistente no conjunto de edificações e congêneres, denominado, dentro desta sistemática, de espaço urbano fechado, bem como pelos equipamentos públicos, nomeados de espaço urbano aberto, como tão bem salienta Fiorillo[13]. Cuida salientar, ainda, que o meio-ambiente artificial alberga, ainda, ruas, praças e áreas verdes. Trata-se, em um primeiro contato, da construção pelo ser humano nos espaços naturais, isto é, uma transformação do meio-ambiente natural em razão da ação antrópica, dando ensejo à formação do meio-ambiente artificial. Além disso, pode-se ainda considerar alcançado por essa espécie de meio-ambiente, o plano diretor municipal e o zoneamento urbano.
O domínio em apreço é caracterizado por ser fruto da interferência humana, logo, “aquele meio-ambiente trabalhado, alterado e modificado, em sua substância, pelo homem, é um meio-ambiente artificial”[14]. Como robusto instrumento legislativo de tutela do meio-ambiente artificial, pode-se citar a Lei Nº. 10.257, de 10 de Julho de 2001, que regulamenta os arts. 182 e 183 da Constituição Federal, estabelece diretrizes gerais da política urbana e dá outras providências, conhecido como “Estatuto da Cidade”, estabelece os regramentos e princípios influenciadores da implementação da política urbana. Nesta esteira, cuida trazer à colação o entendimento firmado por Fiorillo, em especial quando destaca que o diploma legislativo em apreço “deu relevância particular, no âmbito do planejamento municipal, tanto ao plano diretor (art. 4º, III, a, bem como arts. 39 a 42 do Estatuto) como à disciplina do parcelamento, uso e ocupação do solo” [15].
Assim, é plenamente possível traçar um íntimo liame entre o conceito de cidade e os próprios paradigmas integrantes do meio-ambiente artificial. Ora, não se pode olvidar que o meio-ambiente artificial é o local, via de regra, em que o ser humano se desenvolve, enquanto indivíduo sociável, objetivando-se a sadia qualidade de vida nos espaços habitados. Deste modo, temas como a poluição sonora ou mesmo visual se revelam dotados de grande relevância, eis que afetam ao complexo equilíbrio existentes no meio-ambiente urbano, prejudicando, direta ou indiretamente, a saúde, a segurança e o bem-estar da população, tal como a criar condições adversas às atividades dotadas de cunho social e econômico ou mesmo afetando as condições estéticas ou sanitárias em que são estabelecidas.
1.3 Meio-Ambiente Cultural
A terceira espécie de meio-ambiente apresentado pela doutrina é o denominado cultural e que compreende duas subespécies distintas, uma concreta e outra abstrata. Nesta toada, o meio-ambiente cultural concreto, também denominado material, se revela materializado quando está transfigurado em um objeto classificado como elemento integrante do meio-ambiente humano. Assim, é possível citar os prédios, as construções, os monumentos arquitetônicos, as estações, os museus e os parques, que albergam em si a qualidade de ponto turístico, artístico, paisagístico, arquitetônico ou histórico. Os exemplos citados alhures, em razão de todos os predicados que ostentam, são denominados de meio-ambiente cultural concreto. A importância do meio-ambiente cultural é dotada de grande relevância que o Superior Tribunal de Justiça já decidiu:
“Ementa: Meio Ambiente. Patrimônio cultural. Destruição de dunas em sítios arqueológicos. Responsabilidade civil. Indenização. O autor da destruição de dunas que encobriam sítios arqueológicos deve indenizar pelos prejuízos causados ao meio ambiente, especificamente ao meio ambiente natural (dunas) e ao meio ambiente cultural (jazidas arqueológicas com cerâmica indígena da Fase Vieira). Recurso conhecido em parte e provido.” (Superior Tribunal de Justiça – Quarta Turma/ REsp 115.599/RS/ Relator: Ministro Ruy Rosado de Aguiar/ Julgado em 27.06.2002/ Publicado no Diário da Justiça em 02.09.2002, p. 192) (sublinhou-se).
Diz-se, de outro modo, o meio-ambiente cultural abstrato, chamado, ainda, de imaterial, quando este não se apresenta materializado no meio-ambiente humano, sendo, deste modo, considerado como a cultura de um povo ou mesmo de uma determinada comunidade. Da mesma maneira, são alcançados por tal acepção a língua e suas variações regionais, os costumes, os modos e como as pessoas relacionam-se, as produções acadêmicas, literárias e científicas, as manifestações decorrentes de cada identidade nacional e/ou regional. Esses aspectos constituem, sem distinção, abstratamente o meio-ambiente cultural. “O patrimônio cultural imaterial transmite-se de geração a geração e é constantemente recriado pelas comunidades e grupos em função de seu ambiente”[16], decorrendo da interação com a natureza e dos acontecimentos históricos que permeiam a população.
O Decreto Nº. 3.551, de 04 de Agosto de 2000, que institui o registro de bens culturais de natureza imaterial que constituem patrimônio cultural brasileiro, cria o Programa Nacional do Patrimônio Imaterial e dá outras providências, consiste em instrumento efetivo para a preservação dos bens imateriais que integram o meio-ambiente cultural. Como bem aponta Brollo[17], em seu magistério, o aludido decreto não instituiu apenas o registro de bens culturais de natureza imaterial que integram o patrimônio cultural brasileiro, mas também estruturou uma política de inventariança, referenciamento e valorização desse patrimônio.
Ejeta-se, segundo o entendimento firmado por Fiorillo[18], que os bens que constituem o denominado patrimônio cultural consistem na materialização da história de um povo, de todo o caminho de sua formação e reafirmação de seus valores culturais, os quais têm o condão de substancializar a identidade e a cidadania dos indivíduos insertos em uma determinada comunidade. Necessário se faz salientar que o meio-ambiente cultural, conquanto seja artificial, difere-se do meio-ambiente humano em razão do aspecto cultural que o caracteriza, sendo dotado de valor especial, notadamente em decorrência de produzir um sentimento de identidade no grupo em que se encontra inserido, bem como é propiciada a constante evolução fomentada pela atenção à diversidade e à criatividade humana.
1.4 Meio-Ambiente do Trabalho
O quarto aspecto do meio-ambiente, doutrinariamente reconhecido, é o local em que os indivíduos desempenham suas atividades laborais, independente dessas serem remuneradas ou não, cujo equilíbrio se encontra estruturado na salubridade do ambiente e na ausência de agentes que possam comprometer a incolumidade físico-psíquica dos trabalhadores, independente da condição que apresentem. Ao lado disso, cuida salientar, com bastante ênfase, que, consoante as ponderações de Brollo[19], “o meio ambiente do trabalho configura o conjunto das condições de produção nas quais a força de trabalho e o capital se transformam em mercadorias e benefícios”.
Ora, salta aos olhos que o cerne da questão do aspecto em comento encontra arrimo na premissa que o ambiente laboral é o lugar em que o trabalhador passa considerável parte de sua existência e, portanto, a higidez daquele influencia, de maneia determinante a sadia qualidade da vida humana. Denota-se, desta sorte, que o meio-ambiente laboral ambiciona garantir a sadia qualidade de vida, o qual se desdobra em saúde e segurança do trabalhador, sendo que o enfoque constitucional dispensado ao tema em testilha ostenta aspecto essencialmente preventivo, já que objetiva reduzir riscos à saúde e à segurança. “Nesse caso, o ambiente do trabalho a ser preservado é aquele que não represente risco nem à saúde, nem à segurança do trabalhador e que, acima de tudo, assegure a sua dignidade”[20]
Infere-se que a Carta da República de 1988, ao dispor acerca do meio-ambiente e seus distintos aspectos, adotou dois objetos diversos, a saber: um imediato consistente na manutenção da qualidade do meio-ambiente e de todos os plurais elementos que o constituem, e outro mediato que se manifesta na saúde, segurança e bem-estar do cidadão, expressado, de maneira robusta, nas locuções vida em todas as suas formas e em qualidade de vida, consagrados nas redações do artigo 3º, inciso I, da Lei Nº. 6.938/1981[21] e artigo 225, caput, da Constituição Federal[22]. No mais, a acepção que deve envolver o meio-ambiente laboral deve ser ampla e irrestrita, vez que alcança todo trabalhador, remunerada ou não, o qual detém proteção constitucional de um ambiente de trabalho adequado e seguro, sendo elemento indispensável à digna e sadia qualidade de vida.
2 Sustentabilidade: Indicadores Econômicos, Sociais e Ambientais
Inicialmente, cuida salientar que, de maneira tardia, a partir da década de 1970, a humanidade passou a assistir a acentuada destruição e esgotamento das mais variadas formas de vida e por perceber que sem os recursos naturais a vida humana encontra-se em risco, passou-se a fomentar o desenvolvimento econômico em compatibilidade com a preservação de aludidos recursos. O objetivo global em comento passou a ser denominado de desenvolvimento sustentável, eis que permitia o diálogo entre o crescimento econômico e a preservação ambiental. Em liame com o conceito de ora aludido, tiveram suas gêneses os indicadores de sustentabilidade com o escopo de impingir relativa evolução em relação à própria sustentabilidade.
Ao lado disso, insta assinalar que os indicadores são ambientais, econômicos e sociais e, uma vez conciliados, tornam-se um instrumento que permite a quantificação e análise das informações técnicas que são transmitidas de maneira simples, a fim de otimizar a compreensão. Neste diapasão, pode-se destacar que os indicadores de sustentabilidade, segundo a visão apresentada por Amaral[23], na qual são descritos como parâmetros ou mesmo valores de parâmetros que fornecem informação acerca de um determinado fenômeno, podendo ser descritivos, quando descrevem uma situação concreta, ou normativos, quando indicam as distâncias entre as condições reais e as condições de referência.
Desta feita, como pontua Polaz, os denominados indicadores se afiguram como “instrumentos essenciais para guiar a ação e subsidiar o acompanhamento e a avaliação do progresso alcançado rumo à sustentabilidade” [24]. Além disso, os denominados indicadores de sustentabilidade ambiental, em decorrência da acessibilidade de informações que possui, podem ser descritos como propostas que possibilitam a cada país a escolha de instrumentos e políticas que busquem sanar os problemas ambientais existentes. Para tanto, são observados tanto os impactos locais quantos os globais a serem produzidos em razão do crescimento econômico almejado. É observável, dessa maneira, que um dos aspectos constituintes dos indicadores de sustentabilidade consiste na avaliação da assimilação, por parte do meio-ambiente em que a atividade econômica é desenvolvida, dos poluentes.
De outro giro, os indicadores sociais são descritos como instrumentos de operacionalização do monitoramento da realidade que a formulação e, quando necessário, a reformulação de políticas públicas. Consiste, deste modo, em uma medida, geralmente quantitativa, dotada de significado social substantivo, empregado para substituir, quantificar ou mesmo operacionalizar um conceito abstrato, que goza de interesse teórico para formulação de pesquisa acadêmica ou mesmo desenvolvimento de políticas, como bem observa Azevedo[25].
Os indicadores econômicos, por sua vez, examinam os desdobramentos das ações, tendo como filtro um sistema macro e um micro, que demonstrem que os recursos financeiros empregados alcançam a máxima eficiência, bem como que o projeto estruturado tem a capacidade de produzir renda suficiente para manter o ser humano na atividade econômica desenvolvida. Ao lado disso, insta salientar que aludidos indicadores, quando implementados, devem incidir também sobre valores atinentes ao desenvolvimento sustentável, assim como se estes são considerados na implementação da atividade, com o escopo de compensar, em outra vertente, os danos causados ao meio-ambiente em razão da atividade econômica.
A exploração do meio-ambiente de maneira sustentável se afigura como tema dotado de maciça relevância, em especial em razão da interdependência mantida com a qualidade de vida das presentes e futuras gerações, materializando-se no princípio da dignidade da pessoa humana. Assim, ao se adotar os ideários emanados por uma visão holística do meio-ambiente, o ser humano deixou de estar alheio ao ambiente em que se encontra, passando a estar inserto, como parte integrante e não podendo se dissociar. A ramificação ambiental contemporânea do Direito não possui uma ótica estritamente jurídica, mas essencialmente arrimada em valores ecológicos, conferindo-lhe uma abordagem interdisciplinas, valorando-se a interpretação das normas a partir de uma conjugação de fontes.
3 A proeminência da defesa do meio ambiente em todos os seus aspectos como forma para se alcançar os indicadores próprios da sustentabilidade.
3.1 Breve Análise Histórica do Cenário da Sustentabilidade: Da Conferência de Estocolmo ao Protocolo de Quioto.
Tendo por sedimento, robusto e maciço, as ponderações trazidas até o presente momento, pode-se, ainda, salientar que a preocupação com o meio-ambiente, em suas múltiplas acepções, aliado ao desenvolvimento sustentável, ganhou substancioso destaque nas últimas décadas do século XX, fruto da evolução da sociedade global, diante das sensíveis modificações verificáveis, tanto no que tange às alterações climáticas como comprometimento dos recursos naturais. Como sustentáculo de tal afirmação, necessário se faz citar as considerações tecidas por Machado quando salienta que “o marco para a construção do conceito de desenvolvimento sustentável teve início na década de 70, mais propriamente, a partir da Conferência de Estocolmo (United Nations Conference on the Human Environment), realizada em 1972”[26].
Na referida conferência, a discussão orbitava em torno de dois assuntos proeminentes, a saber: a poluição e a preservação, tendo como balizas o contínuo e incontido crescimento das nações, aumento populacional e o uso predatório dos recursos energéticos, hídricos e das fontes de matérias primas naturais[27] que se contrapunham à necessidade de preservação e desenvolvimento sustentável. A adoção do paradigma de defesa e preservação do meio-ambiente, neste período, se revelava um empecilho para o desenvolvimento dos países, sobretudo aqueles tidos como integrantes do Terceiro Mundo. Como bem destaca Machado:
“[…] na medida em que esse paradigma [preservação do meio-ambiente] se opunha a estratégias de desenvolvimento com uso intensivo de recursos, os países do Terceiro Mundo temiam que preocupações de cunho ambiental se tornassem obstáculos ao desenvolvimento”[28].
Todavia, com o passar dos anos, a questão ambiental se revelou eivada de grande complexidade, sendo, comumente, atrelada à necessidade de um desenvolvimento pautado na sustentabilidade, trazendo à tona, em contrapartida, um sucedâneo de dificuldades no estabelecimento de um diálogo entre os diversos sujeitos envolvidos. Entrementes, a construção de um conceito de desenvolvimento sustentável passou a afigurar como um sólido axioma sobre o qual se poderia edificar um diálogo entre os mais diversos segmentos, como comunidades científicas, empresários, governos de países desenvolvidos e em desenvolvimento.
Atualmente, o paradigma que se encontra em destaque enfatiza o impacto negativo das atividades humanas no meio-ambiente, em uma escala global. “Pode-se perceber, com clareza, essa mudança de paradigmas ao comparar a Declaração de Princípios de Estocolmo com a do Rio de Janeiro, vinte anos mais tarde”[29]. Tais exposições cingem-se ao fato de que quase todos os princípios que se encontravam insertos no texto 1972 fazem referência ao consumo excessivo de recursos, ao passo que em 1992 sobressai o problema de gerenciamento coletivo de sistemas naturais em escala global. Diante do cenário pintado, a elaboração de uma nova realidade conceitual que articule o tratamento da questão ambiental, o desenvolvimento econômico e o progresso social, arrimando-se em um desenvolvimento sustentável é medida carecida.
Como fruto de tais trabalhos, no ano de 1997 é elaborado um acordo internacional, o qual consagrava em suas linhas os pilares alicerçantes do desenvolvimento sustentável, qual seja: o Protocolo de Quioto. O fito primário do documento mencionado era estabelecer metas pra fomentar a redução de gases que causam e aumentam o efeito estufa, para prevenir as consequências que o aumento da temperatura da Terra podem trazer, como degelo das calotas polares e a consequente elevação dos níveis das massas de águas oceânicas.
Denota-se, a partir do exame da linha tracejada pelo documento internacional, a importância sem precedentes no que atina à matéria de cooperação internacional que se traduzem em esforços globais para a defesa ambiental. “Sua adoção é resultado dos esforços dos governos ao assumir, perante a comunidade internacional, o compromisso de agir dentro de suas fronteiras em prol da questão climática, a partir das determinações tomadas multilateralmente”[30].
3.2 O Direito ao Meio-Ambiente Ecologicamente Equilibrado como fomento ao Desenvolvimento Sustentável.
Em profundos sulcos, o direito ao meio-ambiente ecologicamente equilibrado foi entalhado nas disposições da Declaração de Estocolmo de 1972 e reavivado, com fortes cores e grossos traços, na Declaração do Rio de Janeiro de 1992, assim como elevado a patamar de flâmula norteadora no art. 225 da Carta de Outubro. O dogma em exame traz como maciço desdobramento de suas disposições que o meio-ambiente ecologicamente equilibrado é pilar constituinte do manancial de direitos difusos, já que é pertencente a todos os indivíduos. Aliás, é de bom alvitre mencionar o caput do referido dispositivo da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, que assim aduz: “Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações”[31].
Por essas linhas, é possível observar consagrado a solidariedade intergeracional sincrônica, quando a redação do art. 225 alude à presente geração, e solidariedade transgeracional anacrônica, no momento, em que é assegurado o meio-ambiente ecologicamente equilibrado a futuras gerações. A preocupação hodierna da Lex Fundamentallis do Estado Brasileiro foi preservar o meio-ambiente para as gerações futuras, preservando os nichos existentes e recuperando as áreas ambientais que já estão degradadas. Destarte, verifica-se que a Constituição da República impôs a todos, coletividade como uma unidade e cada indivíduo que a constitui, uma obrigação de zelo e respeito com o meio-ambiente.
Como bem aponta Facin, “o direito ao ambiente como um dos direitos fundamentais da pessoa humana é um importante marco na construção de uma sociedade democrática, participativa e socialmente solidária”[32]. Desta sorte, a Constituição de 1988, visando efetivar o exercício do direito ao meio-ambiente sadio, fixou o tema em comento como direitos públicos subjetivos, os quais podem ser exercidos a qualquer momento, e que se possa exigir do Estado e dos particulares a proteção devida ao ambiente. “A proteção ao meio ambiente é relevante, na medida que é importante preservar a natureza, como meio da própria subsistência e existência da vida humana”[33].
Ainda nesta linha de raciocínio, bem como fortalecendo todo o sucedâneo de informações apresentados, pode-se destacar que os denominados direitos difusos (direitos da fraternidade ou solidariedade), do qual o meio-ambiente ecologicamente equilibrado se encontra abrangido, têm íntima relação com o humanismo e, por extensão, ao ideário de uma sociedade caracterizada por ser mais justa e solidária, consubstanciando, dessa monta, a continua busca na autodeterminação dos povos e na consolidação da paz universal. Nesta senda, inclusive, é possível citar as ponderações trazidas a lume pelo festejado Bonavides:
“A consciência de um mundo partido entre nações desenvolvidas e subdesenvolvidas ou em fase de precário desenvolvimento deu lugar em seguida a que se buscasse uma outra dimensão dos direitos fundamentais, até então desconhecida. Trata-se daquela que se assenta sobre a fraternidade, […], e provida de uma latitude de sentido que não parece compreender unicamente a proteção específica de direito individuais ou coletivos. Com efeito, um novo polo jurídico de alforria do homem se acrescenta historicamente aos da liberdade e da igualdade. Dotados de altíssimo teor de humanismo e universalidade, os direitos de terceira geração tendem a cristalizar-se no fim do século XX enquanto direitos que não se destinam especificamente à proteção dos interesses de um indivíduo, de um grupo ou de um determinado Estado. Têm primeiro por destinatário o gênero humano mesmo, num momento expressivo de sua afirmação como valor supremo em termos de existencialidade concreta”[34]
Ora, em razão da abordagem apresentada até o momento, é viável observar que a manifestação dos doutrinadores a este respeito é uníssona, dotada de grande relevância e precisão, porquanto a proteção ambiental abrange "a preservação da natureza em todos os seus elementos essenciais à vida humana e a manutenção do equilíbrio ecológico, visa tutelar a qualidade do meio ambiente em função da qualidade de vida, como uma forma fundamental da pessoa humana”[35].
3.3 A Acepção de Desenvolvimento Sustentável e os Indicadores de Sustentabilidade: O Princípio Irradiador da Carta Magna.
Em atinência ao tema em comento, bem como tendo em vista as ponderações arrazoadas até aqui, pode-se pontuar que o ideário de desenvolvimento sustentável é detentor de grande complexidade, tendo substanciais variações de acordo com a abordagem empregada. Segundo vertentes vigentes, o desenvolvimento sustentável é tido como aquele que “atende às necessidade do presente sem comprometer a possibilidade de as gerações futuras atenderem às suas próprias necessidades”, como consagra Acselrad e Leroy[36].
De outra banda, assentando o tema em destaque em pilares consagrados pela ordem econômica albergada pela Constituição de 1988, pode-se lançar mão dos ensinamentos apresentados por Fiorilo, quando expõe que “busca-se com isso a coexistência harmônica entre economia e meio ambiente. Permite-se o desenvolvimento, mas de forma sustentável, planejada, para que os recursos hoje existentes não se esgotem ou tornem-se inócuos”[37]. Isto é, a exploração dos recursos naturais deva estar atrelada, de maneira robusta e imprescindível, à proteção do meio-ambiente, a fim de que os impactos tenham consequências menos danosas, sendo necessário, para tanto, uma conscientização da sociedade, tanto no que tange a produção como no consumo.
Desta feita, imperioso se revela a necessidade do crescimento econômico acompanhado, de forma íntima, com a preservação ambiental, sob o risco de perda da parcela de um bem jurídico de cunho transindividual, pertencendo a todos indistintamente[38]. Sendo assim, visa-se o crescimento econômico e o desenvolvimento social, ao tempo que, paralelamente, promove-se a defesa e a proteção do meio-ambiente ecologicamente equilibrado. Ao lado do expendido, cuida anotar, com grossos traços que:
“Esses três fatores genéricos são especificamente formados pela dignidade da pessoa humana; livre iniciativa; direito de propriedade; direito ao trabalho; à saúde; ao lazer, a educação, enfim aos Direitos Individuais, Coletivos e aos Sociais elencados nos arts. 5º e 6º da Carta Magna”[39].
Ainda nesta esteira, em relação aos pressupostos que edificam as bases de desenvolvimento sustentável, denota-se que intimamente relacionados a esse estão os indicadores, que têm o condão de delinear o habitat humano, como: “saneamento urbano, qualidade do ar, conforto ambiental, condições habitacionais, de trabalho, transporte, disponibilidade de energia, qualidade da água e do solo, recursos econômicos, infra-estrutura institucional, recreação, educação”[40]. Contudo, dependendo da abordagem dispensada, pode-se perfazer o total de 50 e, avaliando os desdobramentos destes advindos, ultrapassar 400.
Nessa linha de exposição, pode-se reafirmar o conceito de indicadores de sustentabilidade como sendo uma unidade de medida, um elemento de essência informativa e de “natureza física, química, biológica, econômica, social e institucional -– representado por um termo ou expressão que possa ser medido, ao longo de determinado tempo”[41], cujo objetivo é a caracterização dos efeitos e tendências, bem como promover a avaliação as relações existentes entre os recursos naturais, a qualidade ambiental e os recursos naturais.
Insta asseverar, também, que para o alcance do desenvolvimento sustentável é imprescindível o planejamento e, sobretudo, o monitoramento. Neste diapasão, os indicadores de sustentabilidade minimizam as chances de se obterem resultado não almejados. Desta feita, para que a efetividade possa ser alcançada, os indicadores podem figurar como maciços elementos de auxílio no processo decisório, como gizam Moldam e Bilharz (1997)[42]. Pode-se conceder expressivo destaque ao fato de que uma boa estrutura de indicadores de sustentabilidade viabiliza a integração, ainda que seja de forma comedida, moderada, informações que oscilam desde o cunho social, até o diálogo por âmbitos de feição ecológica e econômica, cada qual com seu grau de importância específico.
Ademais, os mencionados indicadores se prestam a identificar as variações, comportamentos, tendências e processos, assim como fixar comparações entre países diversos e regiões. Igualmente, tem o condão de indicar as necessidade e prioridades para a formulação, monitoramento e avaliação de políticas, como também possibilitar o entendimento ao crescente público envolvido com o assunto, em razão de seu poder de sintetizar as informações
Doutorando vinculado ao Programa de Pós-Graduação em Sociologia e Direito da Universidade Federal Fluminense (UFF), linha de Pesquisa Conflitos Urbanos, Rurais e Socioambientais. Mestre em Ciências Jurídicas e Sociais pela Universidade Federal Fluminense. Especializando em Práticas Processuais – Processo Civil, Processo Penal e Processo do Trabalho pelo Centro Universitário São Camilo-ES. Bacharel em Direito pelo Centro Universitário São Camilo-ES
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