ECA

A redução da maioridade penal Brasileira seria uma solução?

Would reducing the Brazilian criminal age be a solution?

Victor Werneck Gomes – Advogado, Mestrando em Direito pela Universidade FUMEC, Especialista em Direito Público pela PUC-MINAS e Direito Processual Civil pela Universidade Cândido Mendes. (werneckvictor@hotmail.com)

Resumo: A maioridade penal é um tema bastante debatido nos tempos atuais, isto se sucede muitas vezes pelo fato de um jovem cometer algum crime e ter grandes repercussões nacionais ou locais. A população do Brasil tem tomado posições a esse respeito, sendo alguns favoráveis e outros desfavoráveis ao fato de punir o jovem infrator. A presente monografia tem como objetivo discutir a questão de uma possível punição do delinquente juvenil no Brasil e relacionando principalmente com suas consequências, sendo estas pelo estado precário do sistema carcerário do Brasil ou a necessidade de redução de desigualdades sociais do país. O estudo visa também apresentar o Estatuto da Criança e do Adolescente, como foi tratada a redução da maioridade penal em alguns países e outras considerações acerca da legislação e o menor. Muitos brasileiros defendem a punição do menor infrator, porém fica deixado de lado o fato de que o adolescente, por ser um ser humano em desenvolvimento, deve ser protegido pelo ordenamento jurídico do Brasil.

Palavras-chave: Direito Penal, maioridade penal, medidas socioeducativas, criança. adolescente

 

Abstract: Criminal majority is very debated in modern times, this issue often happens because of a young man committing a crime and have large national or local repercussions. The population of Brazil has taken positions in this regard, some favorable and others unfavorable to the fact punish the young offender. This monograph aims to discuss the question of a possible punishment of juvenile offender in Brazil and relating mainly to their consequences, these being the poor state of the prison system in Brazil and the need to reduce social inequalities in the country. The study also aims to present the Statute of Children and Adolescents, was treated as a reduction of criminal responsibility in some countries and other considerations about the legislation and the lowest. Many Brazilians defend the punishment of minor offenders, but is left out the fact that the teenager, being a developing human being, should be protected by law in Brazil.

Keywords: Criminal Law, penal age, socio-educational measures, child, adolescent.

 

Sumário: Introdução. 1. Estatuto da Criança e do Adolescente. 1.1. Primeiras disposições e os Direitos Fundamentais. 1.2. Conselho Tutelar. 1.3 Medidas Socioeducativas. 1.4 Questões relacionadas ao Estatuto da Criança e do Adolescente. 2. Redução da maioridade penal. 2.1 Menor infrator no Brasil. 2.2 Proposta de Emenda Constitucional para redução da maioridade penal. 2.3 Redução da maioridade penal em outros países. 2.4 Recuperação do menor infrator e o sistema penitenciário brasileiro. 2.5 Argumentos favoráveis e desfavoráveis. Conclusão. Referências.

 

Introdução

Com respeito à polêmica questão da redução na maioridade penal brasileira, por se tratar de um tema relacionado à violência, existem diversos tipos de conclusões acerca do assunto. Muitos defendem maior segurança para a população, questionam a forma de que se busca ressocializar o preso e outros buscam defender a ideia de que a punição é a melhor forma de reprimir futuros crimes, mesmo até que esta punição seja aplicada a menores.

O Brasil é um país onde se existe uma grande desigualdade social, porém, não necessariamente esta desigualdade social é a resposta para o cenário atual da alta taxa de crimes no país. A desigualdade é uma das raízes do problema, mas não é todo aquele que detém menos condições que irá cometer crimes, existem pessoas honestas como existem pessoas desonestas nesta realidade, bem como existem pessoas honestas e desonestas com maior capacidade financeira.

De acordo com estas questões, podemos abordar, primeiramente, o fato de que nos tempos atuais, o Brasil vem tendo como rotina o fato do grave manancial da violência, tanto em grandes cidades e regiões metropolitanas, bem como em cidades menores, de poucos habitantes.

Em segundo, é constatado na atualidade que muitos dos crimes de caráter grave como homicídio, estupro, sequestro, tráfico de drogas, dentre outros, vêm sendo realizado por menores de idade, ou seja, aqueles com a idade de até 18 anos.

Estes jovens, consequentemente acabam entrando na vida criminosa por influência daqueles que já estão em idade adulta. Vida criminosa que, com o resultado, traz grandes problemas à tona da sociedade brasileira.

Em terceiro, o Brasil tem questões pendentes no que se diz respeito à forma como a população encara estas duas anteriores constatações. De certa forma, grande parte da população tem como ilusão que a redução da maioridade penal no Brasil irá transformar instantaneamente a onda de crimes produzida por menores.

O fato de menores cometerem crimes não significa que estes devem ser punidos como adultos, os menores devem ter tratamento diferente daqueles que são adultos justamente pelo fato de estes serem indivíduos mais novos, necessitando de proteção do Estado, mas não é esta a ideia que uma grande parcela da população brasileira defende.

            No Brasil, no caso de ocorrência de crime por um menor, o crime é chamado de ato infracional e a penalidade é chamada de medida sócio-educativa. Tais medidas são encontradas no Estatuto da Criança e do Adolescente, que é o conjunto de normas que se centraliza na proteção do adolescente e da criança no nosso país.

É constatado que crimes graves estão sendo praticados por menores, em algumas vezes até em situações controversas, como é a situação hipotética de um menor de 17 anos, praticar um crime de forma estratégica, faltando poucos dias para se completar 18 anos de idade, e desta forma, se privilegiando com a proteção do Estatuto da Criança e do Adolescente, pois praticou o crime antes de completar a maioridade penal.

Visto isto, seria necessária uma nova política penal, onde os menores tivessem o caráter punitivo devido, bem como crimes praticados nestas situações controversas serem coibidos pelo próprio regime aplicado aos menores?

            Uma parcela da população defende que é uma alternativa para coibir a violência praticada, seria a aplicação de um regime diferente de penalidade para os menores, que consequentemente teria a diminuição da maioridade penal para aqueles infratores.

O senador Aloysio Nunes Ferreira, autor de uma Proposta de Emenda Constitucional defendeu uma possível redução da maioridade penal no Brasil. A Proposta de Emenda Constitucional N° 33 de 2012, propõe a redução da maioridade penal em casos específicos, nos casos de crimes hediondos, sendo assim a maioridade reduzida para 16 anos de idade. Aloysio alegou que este projeto não seria uma redução da maioridade em si, que se trataria apenas de uma exceção à regra vigente.

Ou seja, seguindo os raciocínios acima, o Brasil poderia ter uma forma alternativa de se coibir a violência e ter uma maior eficiência na punição àquele menor de idade que comete crimes controversos, procurando se aproveitar da proteção do Estatuto da Criança e do Adolescente.

De forma a elucidar o tema deste trabalho, o mesmo foi elaborado através de levantamentos bibliográficos, pesquisas em periódicos eletrônicos e impressos.

 

  1. ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE

            O Estatuto da Criança e do Adolescente está disposto na Lei n° 8.069 de 13 de Julho de 1990 e irá dizer a respeito à proteção integral à criança e ao adolescente. A Lei n° 8.069/90 é aplicada e considera como adolescente aquele com idade de doze a dezoito anos e criança, aquele com até doze anos de idade incompletos. Aplicar-se-á também, às pessoas entre vinte e um e dezoito anos de idade em casos excepcionais.

 

1.1 Primeiras disposições e os Direitos Fundamentais

A criança e o adolescente a partir do Estatuto da Criança e do Adolescente passaram a serem visto como aqueles em que o Estado deverá manter com absoluta prioridade e bem como passaram a ser vistos como pessoas em desenvolvimento, sujeitos de direitos e deveres, sem distingui-los em cor, raça ou classe social.

O Estatuto da Criança e do Adolescente irá dispor que todo adolescente e criança irão gozar de todos os direitos fundamentais referentes à pessoa humana, bem como irão ter garantia de prioridade, a condição de pessoas em desenvolvimento em seus Artigos 3°, 4°, 5° e 6°:

 

“Art. 3º A criança e o adolescente gozam de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata esta Lei, assegurando-se-lhes, por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades, a fim de lhes facultar o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade.

Art. 4º É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária.

Parágrafo único. A garantia de prioridade compreende:

  1. a) primazia de receber proteção e socorro em quaisquer circunstâncias;
  2. b) precedência de atendimento nos serviços públicos ou de relevância pública;
  3. c) preferência na formulação e na execução das políticas sociais públicas;
  4. d) destinação privilegiada de recursos públicos nas áreas relacionadas com a proteção à infância e à juventude.

Art. 5º Nenhuma criança ou adolescente será objeto de qualquer forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão, punido na forma da lei qualquer atentado, por ação ou omissão, aos seus direitos fundamentais.

Art. 6º Na interpretação desta Lei levar-se-ão em conta os fins sociais a que ela se dirige, as exigências do bem comum, os direitos e deveres individuais e coletivos, e a condição peculiar da criança e do adolescente como pessoas em desenvolvimento”. (BRASIL, 1990)

 

Estes direitos fundamentais presentes na Lei n° 8.069/90, dirão respeito ao direito ao fato de que a criança e o adolescente terão proteção referente à vida e à saúde deste, que como visto anteriormente, no caso da criança e do adolescente, deverá ser visto como prioridade.

A Lei n° 8.069/90 disporá a respeito ao fato de toda criança e adolescente ter o direito à convivência familiar e comunitária, disporá sobre a família natural, a guarda de criança ou adolescente e sobre a família substituta e sobre a liberdade da criança e do adolescente, onde estes terão, por exemplo, liberdade de opinião e expressão, brincar, praticar esportes, dentre outros. Irá também dispor ao respeito e à dignidade da criança, onde referente a esta dignidade, o adolescente e a criança terão sua proteção como pessoas humanas como sujeitos de direitos civis e pessoas humanas, como disposto nos Artigos 15, 16, 17 e 18:

 

“Art. 15. A criança e o adolescente têm direito à liberdade, ao respeito e à dignidade como pessoas humanas em processo de desenvolvimento e como sujeitos de direitos civis, humanos e sociais garantidos na Constituição e nas leis.

Art. 16. O direito à liberdade compreende os seguintes aspectos:

I – ir, vir e estar nos logradouros públicos e espaços comunitários, ressalvadas as restrições legais;

II – opinião e expressão;

III – crença e culto religioso;

IV – brincar, praticar esportes e divertir-se;

V – participar da vida familiar e comunitária, sem discriminação;

VI – participar da vida política, na forma da lei;

VII – buscar refúgio, auxílio e orientação.

Art. 17. O direito ao respeito consiste na inviolabilidade da integridade física, psíquica e moral da criança e do adolescente, abrangendo a preservação da imagem, da identidade, da autonomia, dos valores, idéias e crenças, dos espaços e objetos pessoais.

Art. 18. É dever de todos velar pela dignidade da criança e do adolescente, pondo-os a salvo de qualquer tratamento desumano, violento, aterrorizante, vexatório ou constrangedor”. (BRASIL, 1990)

 

É importante ressaltar, que com relação ao Capítulo II, do Estatuto da Criança e do Adolescente, ocorreu uma inovação com a Lei 13.010 de 26 de Junho de 2014, que acresceu os Art. 18-A e 18-B, onde estão agora dispostas proteções referentes ao uso de castigo físico e de tratamento cruel ou degradante em crianças e adolescentes.

De certa forma, é de todos da sociedade o dever de se preservar os direitos das crianças e dos adolescentes, ou ao menos ajudar a prevenir qualquer tipo de violação a estes direitos. Um exemplo onde pode ser aplicado este dever de prevenir qualquer tipo de violação ocorre, por exemplo, na proibição que existe com relação à venda de bebidas alcoólicas, drogas, revistas de conteúdo adulto e etc., com relação aos menores de idade.

É importante que se coopere para o desenvolvimento dos menores e esta é uma questão muito importante quando se fala de redução da maioridade penal, afinal, a redução desta maioridade penal iria de certa forma reduzir o espaço de abrangência destes direitos para o desenvolvimento destes menores.

Muito mais importante do que se reduzir a maioridade penal no Brasil, é a ajuda de todos da sociedade no desenvolvimento das crianças e dos adolescentes, para que, a partir de um melhor crescimento intelectual, principalmente, destes menores, a sociedade brasileira passe a colher os frutos deste desenvolvimento, sendo um destes frutos, a inevitável melhora com relação aos crimes cometidos por menores de idade, justamente pela melhor assistência ao desenvolvimento destes menores.

 

1.2 Conselho Tutelar

Como visto no parágrafo único do Artigo 18-B do Estatuto da Criança e do Adolescente, as medidas previstas no artigo serão aplicadas pelo Conselho Tutelar. O Conselho Tutelar é uma entidade pública que deverá existir em cada município, onde serão compostas por cinco pessoas, que são regularmente eleitas pela comunidade local e estas cinco pessoas irão ter a responsabilidade de cuidar dos direitos da criança e do adolescente em uma determinada comunidade.

No Estatuto da Criança e do Adolescente, em seu Artigo 139, estão contidas as disposições com relação ao processo de escolha dos membros do Conselho Tutelar, onde estará exemplificando que o processo para a escolha dos membros será determinado por Lei do Município e que este será realizado sob a responsabilidade do Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente e com a fiscalização do Ministério Público.

É importante ressaltar que o Conselho Tutelar, como detém a função de resguardar os direitos das crianças e dos adolescentes quando houver desrespeito destes direitos, acaba por se tratar de uma entidade pública muito importante, bem como os seus Conselheiros Tutelares e seus deveres.

Desta forma, é dever dos Conselheiros Tutelares, atender crianças e adolescentes e aplicar medidas de proteção, bem como atender e aconselhar seus pais e responsáveis sobre estas e encaminhar à Justiça os casos que sejam dela pertinente, dentre outras atribuições previamente citadas.

Sendo assim, a título de exemplo, havendo no caso algum tipo de suspeita de maus-tratos em qualquer criança em uma determinada comunidade, visto o dever de se preservar a dignidade da criança e do adolescente, é obrigatório que se comunique o conselho tutelar, para assim, se ter as providências cabíveis e principalmente, para se resguardar os direitos consagrados pelo Estatuto da Criança e do Adolescente.

 

1.3 Medidas socioeducativas

            No Brasil, pelo Código Penal Brasileiro, foi estabelecido em seu Artigo 28, que os menores de dezoito anos são penalmente inimputáveis, ficando estes menores sujeitos às normas estabelecidas na legislação especial. Desta forma, os menores, por serem penalmente inimputáveis, estão sujeitos ao Estatuto da Criança e do Adolescente.

Sendo assim, a forma de lidar com os menores infratores, será diferente daquela forma aplicada aos maiores infratores. Para não haver nenhum tipo de erro com relação à idade, no Estatuto da Criança e do Adolescente está determinado que será considerada a idade do adolescente à data do fato, sendo este privado de sua liberdade apenas em flagrante de ato infracional ou por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente.

São previstas, no Estatuto da Criança e do Adolescente, nos seus Artigos 110 e 111, às seguintes garantias processuais:

 

“Art. 110. Nenhum adolescente será privado de sua liberdade sem o devido processo legal.

Art. 111. São asseguradas ao adolescente, entre outras, as seguintes garantias:

I – pleno e formal conhecimento da atribuição de ato infracional, mediante citação ou meio equivalente;

II – igualdade na relação processual, podendo confrontar-se com vítimas e testemunhas e produzir todas as provas necessárias à sua defesa;

III – defesa técnica por advogado;

IV – assistência judiciária gratuita e integral aos necessitados, na forma da lei;

V – direito de ser ouvido pessoalmente pela autoridade competente;

VI – direito de solicitar a presença de seus pais ou responsável em qualquer fase do procedimento”. (BRASIL, 1990)

 

Estas garantias processuais, como citado acima, são determinadas para os adolescentes. Pelo fato da violência praticada por menores infratores ser uma realidade social, presente em várias cidades do Brasil, se tornou necessária a existência de um determinado tratamento para estes menores.

Quando um adolescente, menor de dezoito anos de idade e maior de doze anos de idade, comete um crime, este crime é denominado como ato infracional. Neste caso, então, será aplicada uma medida socioeducativa com relação ao adolescente infrator.

É importante ressaltar que as medidas são de caráter educativo, como dito por Cavagnini (2014, p. 82), “As medidas aplicadas às crianças são específicas de proteção, sempre de caráter educativo, devendo-se voltar, sempre para a escolha daquela que melhor se ajusta à interação da criança e ao meio familiar e social”.

Sendo assim, caso a conduta produzida pelo menor se enquadre em uma hipótese de crime ou uma contravenção penal, o menor, pelo que determina o ordenamento jurídico do Brasil, pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, sofrerá sanção específica prevista como medida socioeducativa, prevista no Estatuto da Criança e do Adolescente.

É disposto no Estatuto da Criança e do Adolescente, que a autoridade competente poderá aplicar ao adolescente diversas medidas socioeducativas, seja ela uma advertência ao menor, uma obrigação do menor reparar o dano, dentre outras, previsto no Artigo 112 da Lei n° 8.069/90:

 

“Art. 112. Verificada a prática de ato infracional, a autoridade competente poderá aplicar ao adolescente as seguintes medidas:

I – advertência;

II – obrigação de reparar o dano;

III – prestação de serviços à comunidade;

IV – liberdade assistida;

V – inserção em regime de semi-liberdade;

VI – internação em estabelecimento educacional;

VII – qualquer uma das previstas no art. 101, I a VI”. (BRASIL, 1990)

 

Como visto acima, as medidas do Artigo 112 do Estatuto da Criança e do Adolescente são previstas para os menores adolescentes com idade menor que dezoito e maior que doze. O inciso VII do Artigo 112, cita o Artigo 101 do Estatuto da Criança e do Adolescente, onde as medidas socioeducativas previstas no Artigo 101 serão aplicadas também aos adolescentes.

No caso do menor de doze anos de idade cometer um ato infracional, não será aplicado o Artigo 112, e sim o Artigo 101 do Estatuto da Criança e do Adolescente, bem como, pelo Inciso VII, do Artigo 112 da Lei 8.069/90, é constatado que algumas destas poderão também ser aplicadas aos maiores de doze anos e menores de dezoito anos:

 

“Art. 101. Verificada qualquer das hipóteses previstas no art. 98, a autoridade competente poderá determinar, dentre outras, as seguintes medidas:

I – encaminhamento aos pais ou responsável, mediante termo de responsabilidade;

II – orientação, apoio e acompanhamento temporários;

III – matrícula e freqüência obrigatórias em estabelecimento oficial de ensino fundamental;

IV – inclusão em programa comunitário ou oficial de auxílio à família, à criança e ao adolescente;

V – requisição de tratamento médico, psicológico ou psiquiátrico, em regime hospitalar ou ambulatorial;

VI – inclusão em programa oficial ou comunitário de auxílio, orientação e tratamento a alcoólatras e toxicômanos;

VII – acolhimento institucional;

VIII – inclusão em programa de acolhimento familiar;

IX – colocação em família substituta”. (BRASIL, 1990)

 

O legislador, no caso das medidas socioeducativas, procurou determiná-las no sentido de que o menor infrator fosse corrigido, se procura melhorar o menor nesta linha, demonstrar ao menor infrator que o as atitudes produzidas por ele não são corretas, e, pelas medidas socioeducativas despertar no menor o caminho correto para no futuro não voltar a cometer atos infracionais, devolvendo o menor à sociedade com outra perspectiva.

Como dito anteriormente, das medidas socioeducativas previstas no Artigo 101 do Estatuto da Criança e do Adolescente, apenas os incisos I, II, III e IV, poderão ser aplicadas ao adolescente. Das medidas previstas no Artigo 112, a medida menos severa que poderá ser aplicada é a advertência, aonde irá se advertir verbalmente o menor infrator, buscando preveni-lo de praticar condutas que necessitem novamente de outras medidas.

A obrigação de reparar o dano e prestação de serviços à comunidade são outras medidas socioeducativas importantes, onde na primeira o se busca o dever de ressarcir o prejuízo causado ao patrimônio alheio ou restituir a coisa alheia, e, no segundo caso, se busca que o menor realize atividades que poderão informar o menor com relação à valores da sociedade e consequentemente trazê-lo de volta a sociedade com outro entendimento, onde não volte a repetir sua conduta.

O adolescente que cometeu algum ato infracional também poderá, como medida socioeducativa, ter sua liberdade assistida ou ser inserido no regime de semiliberdade, como previsto no Estatuto da Criança e do Adolescente. No caso da liberdade assistida, se trata de uma medida de muita importância que poderá ser aplicada pelo fato de que o menor estará acompanhado de um profissional que poderá acompanhar, auxiliar e orientar o adolescente, de forma que o adolescente não retorne com a conduta que resultou na medida socioeducativa. No caso da inserção no regime de semiliberdade, o menor estará submetido à uma medida socioeducativa mais severa, onde implicará na institucionalização, porém, o menor ainda estará em contato com o meio externo, onde buscará, com este contato, a sua ressocialização com a sociedade. O regime de semiliberdade poderá ser determinado como medida inicial ou como uma transição do regime de internação.

De acordo com o Estatuto da Criança e do Adolescente, é possível constatar que de todas as medidas socioeducativas que poderão ser aplicadas em menores de idade, a medida mais rigorosa é a medida de internação em estabelecimento educacional. Esta medida irá ocorre quando o ato infracional praticado pelo menor seja praticada com grave ameaça ou violência à pessoa, ou quando ocorrer por reiteração no cometimento de outras infrações graves ou por descumprimento reiterado e sem justificativa com relação à uma medida que foi imposta ao menor em um momento anterior. A medida socioeducativa de internação prevista pelo Estatuto da Criança e do Adolescente terá a sua aplicação ao menor com a duração máxima de 3 (três) anos.

No caso de haver outra medida que possa aplicada, em nenhuma hipótese será optado pela aplicação da internação. É importante ressaltar também que antes da sentença do menor de idade, a internação só poderá ser determinada por no máximo 45 dias.

Outra hipótese prevista no Estatuto da Criança e do Adolescente é a hipótese da remissão. A remissão não se trata de uma medida socioeducativa ou semelhante à esta. A remissão se trata de uma espécie de perdão ao menor que cometeu um ato infracional.

No caso da remissão, para esta ocorrer, o Ministério Publico deverá concedê-lo pelo seu representante antes do início do procedimento para apuração do ato infracional ou pela autoridade judiciária após o processo de apuração do ato infracional. Irá ocorrer atendendo às circunstâncias e consequências do fato, ao contexto social, bem como à personalidade do adolescente e sua maior ou menor participação no ato infracional, como dispõe o Artigo 126 da Lei n° 8.069/90.

Além das medidas socioeducativas e da remissão, o Estatuto da Criança e do Adolescente prevê medidas aplicáveis aos pais ou responsável do menor de idade. Estas medidas dizem a respeito à inclusão em programa de orientação a alcoólatras e toxicômanos, encaminhamento a tratamento psicológico ou psiquiátrico, perda de guarda, dentre outras medidas.

Ou seja, o Estatuto da Criança e do Adolescente, além de prever medidas que protegem o menor, como a proteção que prevê aos menores de idade, também prevê determinadas medidas socioeducativos para instruí-lo a não repetir condutas que não se enquadram com um bom comportamento em sociedade e da mesma forma procura, como por exemplo, a inclusão em programa de tratamento de alcoólatras e toxicômanos, instruir também, os adultos, de forma a beneficiar a sociedade.

 

1.4 Questões relacionadas ao Estatuto da Criança e do Adolescente

Apesar das intenções positivas do Estatuto da Criança e do Adolescente, no entanto, para a opinião de muitos brasileiros, a Lei n° 8.069/90, não é compatível com o Brasil, sendo considerada ineficiente. O Estatuto da Criança e do Adolescente, que revogou expressamente a Lei n° 6.697/79, que tratava do Código de Menores de 1979, bem como revogou a legislação vigente da época que era conflitante, busca através de medidas socioeducativas inseridas no texto da Lei, uma ressocialização do menor, aplicando medidas sempre de caráter educativo, para se alcançar estes objetivos.

Acontece que o Estatuto da Criança e do Adolescente, em algumas situações está muito distante da realidade brasileira, infelizmente. Uma questão muito levantada que está ocorrendo no Brasil é o fato de menores estarem respondendo como autores no lugar de adultos em caso de determinados crimes, justamente pela proteção ofertada pela Lei n° 8.069/90 a estes e restando para os adultos, injustamente, nenhum tipo de pena ou sanção, favorecendo no crescimento da violência no Brasil pelo fato desta não ter sido coibida e livrando os criminosos de suas responsabilidades criminais.

Outras duas questões, com relação às impropriedades do Estatuto da Criança e do Adolescente. Uma delas diz respeito à previsão do parágrafo único do Artigo 172 da Lei n° 8.069/90 e outra que diz respeito à medida de internação.

No caso da previsão do parágrafo único do Artigo 172 do Estatuto da Criança e do Adolescente, se trata da hipótese de um menor ser apreendido em flagrante em coautoria com um maior de idade. Neste caso, é dito que prevalecerá a atribuição de repartição especializada, onde o adulto será, posteriormente, encaminhada à aquela repartição policial própria. A intenção, obviamente, neste caso, era afastar o menor de idade de delegacias de adultos, onde o ambiente pode ser perigoso e influente para o desenvolvimento do menor, porém, faz-se necessário perceber que encaminhar o criminoso adulto não muda muito a questão, afinal, as delegacias de menores, em muitos casos, não estão preparadas para receber bandidos mais perigosos, como explica José Alberto Cavagnini (2014, p.79), “[…] tal situação não será diferente ao encaminhar maiores criminosos a delegacias de menores, que muitas vezes não possuem segurança apropriada para receber bandidos maiores de alta periculosidade”.

A questão a respeito da medida de internação, Cavagnini (2014, p.80), explica que “[…] o Estatuto determina a medida de internação em casos de violência ou grave ameaça a pessoa, reincidência e desobediência, com o objetivo de ressocializar e educar o menor infrator, está, na verdade, aplicando uma internação prisão”. Ou seja, de certa forma, a medida de internação funciona como uma pena aplicada aos adultos, de forma que os internatos estão se aproximando muito do ambiente dos presídios. Isto torna a questão da internação muito polêmica, afinal, se busca ressocializar o menor de idade, preservando, principalmente o seu desenvolvimento, por ser um indivíduo novo e que está iniciando a sua vida e compreendendo, justamente nesta idade, o que é certo e o que é errado, de acordo com a sociedade em que vive. Se o menor for disposto a medidas socioeducativas que não tragam o devido benefício ao menor, este não conseguirá se ressocializar e consequentemente, no futuro, voltará a cometer atos infracionais ou adentrando em sua idade adulta com uma mentalidade até mais negativa neste sentido, cometendo crimes quando estiver na idade suficiente para a maioridade penal.

Existem outras questões, além das três mencionadas, com relação ao Estatuto da Criança e do Adolescente, que deveriam ser modificadas, como critica Cavagnini (2014, p.88), “Para a maioria, a Lei n° 8.069/90 é romântica e incompatível com a realidade brasileira porque prevê medidas sem sentido jurídico, como a guarda, a tutela e a adoção de menores que praticaram, por exemplo, latrocínio ou estupro”.

É importante compreender que existe uma grande necessidade de mudança em alguns temas abordados pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, principalmente pelo fato de que, o menor é um individuo em pleno desenvolvimento e deve-se preservar, por todos os meios possíveis, o seu desenvolvimento positivo, devendo o menor ser orientado e protegido.

O Estatuto da Criança e do Adolescente sempre deve estar, na medida do possível, o mais próximo da realidade do Brasil. Se no país está havendo mudanças, se há inovações com relação à criminalidade praticada, se o Estatuto está sendo ineficiente com relação à certos temas, se o menor de idade não está sendo protegido da forma que deveria ou se certos temas estão ultrapassados e não deveriam estar no Estatuto, deverá ser feito o devido estudo dos temas em questão e posteriormente deverá reformar a Lei n° 8.069/90, de forma que este se aproxime de forma mais contundente à realidade do Brasil.

 

  1. Redução da maioridade penal

            A ideia de antecipação da maioridade penal no Brasil, onde se procura modificar a idade suficiente de 18 anos para alcançar a maioridade penal, para uma inferior, vem sendo bastante debatida na atualidade. Obviamente, o desejo de se modificar a maioridade penal advém de diversas variáveis, há um grande desejo de preencher o vácuo com relação à resposta do Estado com relação à grande onda de crimes produzido no país, buscando prevenir maiores impunidades.

É importante salientar que mesmo que ocorra a redução da maioridade penal, seja para 16 anos ou para 14 anos, essa redução não trará soluções instantâneas para o país. O desejo insaciável de punir aquele que executou uma conduta criminosa não irá resolver o problema de execuções futuras de outras condutas criminosas, principalmente, quando neste caso estamos falando de menores de idade. A criminalidade juvenil é um problema diferente da criminalidade adulta, não deve ser tratado da mesma forma, muito menos ser observado com uma necessidade de punição a estes menores.

Quando falamos de adolescentes, é importante constatar que a grande maioria dos adolescentes, muitas vezes, não tem a consciência daquilo que é correto ou errado. A época da adolescência para a maioria dos seres humanos, independente do seu país de origem, foi a época de descobertas, de aventuras, de se ter coragem para alcançar diversos objetivos que um adulto não acreditaria, sendo o adolescente sempre imprevisível e principalmente impulsivo.

Um adolescente em uma prisão com adultos, e principalmente, indivíduos de alta periculosidade, pode proporcionar ao jovem uma grande influência negativa, principalmente no seu desenvolvimento, podendo ser irremediável no futuro. É importante constatar que da mesma forma que a influência de uma prisão para um jovem pode ser extremamente negativa, outros tipos de medidas para demonstrar ao jovem aquilo que é correto, podem ser extremamente positivas, de forma que este possa finalmente compreender qual é a melhor posição a se ter na sociedade, prevenindo a ocorrência de condutas classificadas como criminosas no futuro e em sua vida adulta.

A redução da maioridade acaba se mostrando uma alternativa onde se procura resolver o problema da criminalidade juvenil, punindo o jovem, invés de buscar evitar que novos jovens entrem na criminalidade ou auxilie o jovem infrator a sair da criminalidade, afinal, o fato do jovem cometer atos infracionais advém de várias questões e uma delas é a desigualdade social, como explica Amarildo Alcino de Miranda (2005), “Uma vez na rua, depara-se com uma estrutura de desigualdade gigantesca, e tenta a todo custo igualar-se às demais crianças com poder econômico superior ao seu, por meio de práticas de diferentes atos infracionais”.

 

2.1 Menor Infrator no Brasil

As condutas consideradas como criminosas praticadas por menores de idade são uma realidade na sociedade brasileira, e, por informações cedidas pelo UNICEF, em relatório de sua autoria do ano de 2007, é exemplificado que:

 

“De acordo com dados da Subsecretaria de Promoção dos Direitos da Criança e do Adolescente (SPDCA), o numero de adolescentes em conflito com a lei no ano de 2004, em cumprimento de medidas socioeducativas, não atingia 1% do universo da população adolescente.

No Estado de São Paulo, estado que registra o maior número de ocorrências no país, dados de 2003 divulgados pela Secretaria de Segurança Pública do Estado de São Paulo confirmaram que os adolescentes foram responsáveis por menos de 4% dos crimes cometidos naquele ano”. (UNICEF, 2007, p. 25-26)

 

É importante também, ressalvar, que destes crimes produzidos, a maioria destes foram crimes de ordem patrimonial, como é demonstrado pelo UNICEF:

 

“A predominância dos delitos patrimoniais nas estatísticas nacionais foi demonstrada pelo Levantamento Nacional do IPEA de 2003 sobre a situação dos adolescentes privados de liberdade no Brasil, que apontou como mais praticados os delitos de roubo, 42%, seguido de homicídio, 15%, furto, 11% e tráfico de drogas representando 7,5% do total”. (UNICEF, 2007, p. 27-28)

 

Sendo assim, são muitas as variáveis que irão levar ao fato do menor de idade cometer infrações no Brasil. O tema diz respeito a origens subjetivas, podendo ser pelo fato do menor ter uma família não estruturada, dentre outros motivos, como explica Raimundo Luiz Queiroga de Oliveira:

 

“As causas da marginalidade entre os adolescentes são, pois, muito amplas e desconhecidas, não se restringindo somente à vadiagem, mendicância, fome ou descaso social. Tende ainda pelo lado das más companhias, formação de bandos, agrupamentos excêntricos, embriaguez, drogas, prostituição, irreverência religiosa ou moral e vontade dirigida para o crime”. (OLIVEIRA, 2003, p. 7)

 

José Alberto Cavagnini (2014, p. 97), explica ainda que, “O problema da criminalidade deve ser estudado dentro de um quadro geral e engloba vários campos sociais, como saúde, educação, cultura, habitação, transporte, política de empregos, entre outros – só assim serão detectadas razões do seu aumento”.

Seguindo o raciocínio de Cavagnini, onde deve ser estudado, para o problema da criminalidade, o campo da saúde, educação, cultura, habitação, dentre outros, é necessário adentrar nestes campos, analisando a realidade do Brasil com relação a estes temas.

Não é novidade que o Brasil atualmente tem muitos problemas, principalmente com relação à educação, saúde e cultura. O menor que tem incidência em atos infracionais no Brasil tem sua origem, principalmente, nestes problemas. Aquele jovem que não ocupa o seu tempo frequentando a escola e consequentemente amadurecendo e aprendendo com aquilo que é útil para o seu desenvolvimento, acaba se influenciando pelo meio externo, tomando caminhos negativos para ele e para a sociedade.

Também, há de salientar o fato da desigualdade social do país. O menor, bem como um indivíduo em pleno desenvolvimento, que ainda não sabe o que é certou ou errado, na ótica da sociedade, de forma definitiva, ao constatar outros adolescentes, por exemplo, com objetos ou com a oportunidade de executar atividades que ele não tem condição financeira de executar, influência o menor. Neste momento, que o menor se sente desigual ou excluído, principalmente com relação ao resto da sociedade que detém esta capacidade financeira, que influenciaram o fator da educação e da orientação ao menor com relação a isto. A partir do momento em que o menor tem capacidade de com o seu crescimento, entender de forma positiva esta questões tão delicadas da sociedade, ele provavelmente estaria completamente desvinculado de qualquer atividade criminosa e não seria influenciado por meios externos de forma negativa.

José Alberto Cavagnini também diz, justamente a respeito da desigualdade, educação e saúde:

 

“Na verdade, a sociedade está a precisar de uma cirurgia plástica reparadora, mudando as suas reações, os seus comportamentos habituais, as suas soluções e os seus enfoques. É claro que, para tanto, faz-se necessário reformular o pacto social vigente, diminuir as desigualdades, aplicar maciçamente em educação e saúde, usar disciplinadamente os meios de divulgação e aplicar a legislação, com seriedade”. (CAVAGNINI, 2014, p.99)

 

É possível concluir, assim, que o menor que comete, cometeu ou irá cometer algum crime no Brasil, terá esta atitude, muitas vezes por questões ligadas à própria sociedade. Caso a educação no país alcançasse todos, caso a saúde conseguisse preencher a necessidade de todas as famílias brasileiras e a desigualdade social do Brasil não fosse tão espalhafatosa, provavelmente muitos problemas da sociedade seriam reduzidos, bem como a criminalidade juvenil seria reduzida e consequentemente não se teria o interesse de uma grande parcela da sociedade pela redução da maioridade penal.

 

2.2 Proposta de Emenda Constitucional para redução da maioridade penal

            Como dito anteriormente, uma grande parcela da população tem um grande desejo de redução da maioridade penal e este desejo de reduzir a idade de 18 anos para se alcançar a maioridade penal, para uma inferior, também pode ser encontrado no Senado Federal.

De autoria de Aloysio Nunes Ferreira e outros, a proposta de Emenda Constitucional N° 33 de 2012 pretende alterar a redação dos Artigos 129 e 228 da Constituição Federal, aonde iria se acrescer um parágrafo único onde iria passar a prever uma possibilidade de se desconsiderar a inimputabilidade penal com relação aos maiores de dezesseis anos e menores de dezoito anos.

Muito similar à proposta de Aloysio Nunes, é o anteprojeto de autoria de Nélson Hungria que se consolidou no Decreto-Lei N°1.004, de 21 de outubro de 1969, onde nos seus artigos 33 e 34 dizia a respeito da maioridade penal:

 

“Art. 33. O menor de dezoito anos é inimputável salvo se, já tendo completado dezesseis anos, revela suficiente desenvolvimento psíquico para entender o caráter ilícito do fato e determinar-se de acôrdo com êste entendimento. Neste caso, a pena aplicável é diminuída de um terço até a metade.

Art. 34. Os menores de dezesseis anos, bem como os menores de dezoito e maiores de dezesseis inimputáveis, ficam sujeitos às medidas educativas, curativas ou disciplinares determinadas em legislação especial”. (BRASIL, 1969)

 

Aloysio Nunes Ferreira (2012), na proposta de Emenda Constitucional N° 33 de 2012 questiona o fato de em diversas situações, como, por exemplo, situações onde menores cometem delitos, independente de sua periculosidade, e se resguardam na proteção que a Constituição Federal e o Estatuto da Criança e do Adolescente concedem a estes:

 

“Não se pode questionar o fato de que sob a proteção deste mesmo Estatuto (ECA), menores infratores, muitas das vezes patrocinados por maiores criminosos, praticam reiterada e acintosamente delitos que vão desde pequenos furtos, até crimes como tráfico de drogas e mesmo homicídios, confiantes na impunidade que a Constituição e o ECA lhes conferem”. (BRASIL, 2012)

 

O Senador também cita diversos casos, onde menores cometeram diversos crimes e assumiram estes crimes, adentrando na vida adulta livres dos delitos que cometeram.

A proposta feita pelo Senador pretende desconsiderar a inimputabilidade destinada àqueles com idade de 16 anos à idade de 18 anos, no caso de crimes hediondos, como o estupro, latrocínio, tortura ou outros crimes graves. Sendo assim, a proteção do Estatuto da Criança e do Adolescente seria afastada e o menor de idade seria julgado como se tivesse atingido a maioridade.

É esclarecido também, na proposta de Emenda Constitucional N° 33 de 2012, que isto seria apenas uma abertura, possibilitando a aplicação da regra na exceção do menor de idade que cometer crime hediondo e não um desejo de reduzir a idade de 18 anos para todos os tipos de crimes:

Aloysio Nunes Ferreira (2012), também explica a respeito de como o menor poderia perder a proteção legal do Estatuto da Criança e do Adolescente na proposta de Emenda Constitucional N° 33 de 2012:

 

“É importante ressaltar – e o fazemos por meio de um exemplo prático – o alcance dessa nova lei. Imaginemos o caso de um menor de 16 anos e um dia que pratique um homicídio doloso. O Ministério Público, analisando o histórico pessoal do menor, com diversas e reiteradas práticas de crimes violentos, diversas oportunidades e tentativas de recuperação por meio da aplicação das medidas sócio educativas previstas na lei, implementadas pelo juízo competente, julgue que aquele específico menor, pela prática daquele exato crime, não mereça mais a proteção legal do Estatuto da Criança e do Adolescente”. (BRASIL, 2012)

 

É possível constatar pelo raciocínio do Senador, então, que a proposta abrange também, com relação às hipóteses possíveis para que o menor perca a sua proteção do Estatuto da Criança e do Adolescente, outros fatos, como o histórico de delitos do menor de idade e tentativas de recuperação do menor por medidas socioeducativas.

De certa forma, a proposta se sustenta na perspectiva em que o Estatuto da Criança e do Adolescente é ineficaz, deixando aquele que cometeu uma conduta criminosa, impune. Sendo assim, pelo fato de supostamente a Lei N° 8.069/90 não conseguir cumprir aquilo que se propõe, surgiriam as mudanças, de forma que aquele menor de idade que cometa algum crime hediondo, observada a sua reincidência e suas tentativas de recuperação, seja punido como adulto e perca a proteção ofertada pela Lei Brasileira.

Também sobre a Proposta de Emenda Constitucional N° 33 de 2012, esta pode ser vista como uma “terceira via” diante de várias posições contrárias e favoráveis, como elucida o Conselho Federal de Psicologia:

 

“A PEC é apresentada como uma “terceira via” diante das posições contrá

rias e favoráveis à redução da idade penal, por ser considerada uma proposta “ponderada” para o enfrentamento do problema da delinquência juvenil no nosso país”.

Observa-se que, embora apresentada como uma “terceira via”, na análise dos argumentos que sustentam a propositura, constata-se uma repetição daqueles que vêm sustentando a defesa da redução da idade penal, ante os quais a Psicologia vem se manifestando há anos”. (CONSELHO FEDERAL DE PSICOLOGIA, 2013, p.42)

 

Além de se posicionar, argumentando que a Proposta de Emenda Constitucional se trata de uma “terceira via”, o Conselho Federal de Psicologia também argumentou sobre a legitimidade de se punir crianças e adolescentes:

 

“Equivocadamente, os saberes psicológicos e psiquiátricos têm sido convocados a aferir discernimento e periculosidade, entre outros aspectos de sujeitos adolescentes. A Psicologia como ciência e profissão, pautada em referenciais técnicos, científicos, éticos e políticos, não legitima o paradigma tutelar correcional que, em detrimento da Doutrina da Proteção Integral, desconsidera a complexidade do desenvolvimento humano e a situação peculiar em que se encontram crianças e adolescentes”. (CONSELHO FEDERAL DE PSICOLOGIA, 2013, p.42-43)

 

Seguindo, de forma a elucidar o tema relacionado à redução da maioridade penal do menor de 16 anos de idade, Lucy Wallis (2013), explica que “Existem três fases da adolescência — a adolescência inicial, que vai dos 12 ao 14 anos; a adolescência intermediária, dos 15 ao 17 anos; e adolescência final, dos 18 anos para cima”. Sendo assim, o menor de 16 anos ainda estaria na considerada adolescência intermediaria, não teria sequer alcançado a adolescência final.

Lucy Wallis (2013), ainda, completa o raciocínio anterior, “A neurociência tem mostrado que o desenvolvimento cognitivo de um jovem segue adiante neste último estágio, e que sua maturidade emocional, autoimagem e julgamento serão afetados até o córtex pré-frontal do cérebro se desenvolver totalmente”. Ou seja, a capacidade de decisão e julgamento de um jovem de 16 anos ainda não está sequer intermediariamente desenvolvida.

É importante, portanto, ressaltar principalmente com relação à proposta de Emenda Constitucional N° 33 de 2012, que não basta simplesmente direcionar o problema da criminalidade juvenil para a esfera do Direito Penal. O problema é, principalmente, social. E justamente com esta mesma perspectiva, Celso de Melo, demonstra que:

 

“Não é necessário reduzir a maioridade penal para resolver os problemas derivados da criminalidade juvenil. É necessário, sim, reduzir – e, então suprimir, de vez – as condições socialmente degradantes e economicamente opressivas que expõem enormes contingentes de crianças e de adolescentes em nosso País, à situação de injusta marginalidade social”. (MELO, 1998, p. 17)

 

O Estatuto da Criança e do Adolescente apenas não impõe penas muito severas, duras e de maiores durações, como é feito no Direito Penal aplicado aos indivíduos que já são maiores de idade, sendo esta diferença com relação à forma de punir extremamente importante, afinal, o indivíduo adolescente não deve ser tratado da mesma forma que o indivíduo adulto.

Tendo em vista que os menores de idade são inimputáveis, bem como devem ser tratados como indivíduos em pleno desenvolvimento e da mesma forma em que foi, por exemplo, demonstrado pela neurociência que o cérebro humano apenas termina o seu desenvolvimento muitos anos depois da idade de 16 anos, um adolescente de 16 anos de idade não tem sequer plena capacidade mental de tomar suas decisões na mesma capacidade que um adulto, o que claramente demonstra que este não deve ser punido como um adulto.

Punir um jovem de 16 anos como um adulto não irá ser a solução da criminalidade juvenil. Da mesma forma em que irá ocorrer de um determinado jovem ser punido com os seus 16 anos de idade por um determinado crime, posteriormente, outro adolescente de 16 anos de idade também será punido, e assim sucessivamente, pelo fato de que o problema não está na idade penal e sim nos problemas sociais do Brasil.

 

2.3 Redução da maioridade penal em outros países

            Diante da hipótese de redução da idade mínima suficiente para maioridade penal no Brasil, é importante, ao mesmo tempo, procurar compreender quais os possíveis resultados desta redução da maioridade penal, comparando com países que reduziram a maioridade penal de seus países, ou, que contam em seu ordenamento com uma idade mínima suficiente para a maioridade penal inferior a de 18 anos idade, ou também, no caso daqueles que determinaram uma idade superior a de 18 anos de idade.

Segundo o UNICEF, em relatório do ano de 2007 contendo informações de 53 países, é visto que 42 destes adotam a maioridade penal de 18 anos, ou superior:

 

“Da informação de 53 países, sem contar o Brasil, temos que 42 deles (79%) adotam a maioridade penal aos 18 anos ou mais. Esta fixação majoritária decorre das recomendações internacionais que sugerem a existência de um sistema de justiça especializado para julgar, processar e responsabilizar autores de delitos abaixo dos 18 anos. Em outras palavras, no mundo todo a tendência é a implantação de legislações e justiças especializadas para os menores de 18 anos, como é o caso brasileiro”.  (UNICEF, 2007, p. 20)

 

Destes países onde a maioridade penal está abaixo da idade de 18 anos e estes adolescentes poderão ser responsabilizados penalmente como adultos, de acordo com esta análise feita pelo UNICEF no ano de 2007, é possível citar alguns países, a título de exemplo, como os Estados Unidos, onde a maioridade penal irá variar de acordo com cada legislação estadual, tendo a idade mínima em certas regiões aos 12 anos de idade, a Rússia com a idade mínima de 14 anos para a maioridade penal em casos mais graves e 16 para os demais, o Canadá com a idade de 14 anos para delitos de extrema gravidade, apenas, a Dinamarca, Suécia e a Turquia com a possibilidade da maioridade penal atingir os 15 anos de idade, a Bolívia, Bélgica, Portugal e Romênia com a possibilidade da idade mínima de 16 anos de idade.

De todos estes países citados anteriormente, principalmente os Estados Unidos da América, com relação à maioridade penal, demonstra-se um país bastante diferente do Brasil. Afinal, de todos os estados que compõe os Estados Unidos da América, por terem cada um a sua legislação estadual, alguns compreendem em sua legislação, até a pena de morte, algo que não é permitido de nenhuma forma no Brasil.

Nos Estados Unidos, diferentemente do Brasil, pode ocorrer de um menor de idade cometer um determinado delito e então ser penalizado após os seus 18 anos de idade, como noticiou Flavia Barbosa:

 

“No início de 2005, por exemplo, a Justiça da Carolina do Sul condenou Christopher Pittman a três décadas de prisão pelo assassinato de seus avós, quando ele tinha 12 anos, em 2001. Pittman ficou recluso numa detenção juvenil até completar 17 anos (maioridade na Carolina do Sul) e hoje cumpre pena na cadeia”. (BARBOSA, 2013)

 

Atualmente, no Brasil, este tipo de alternativa é inviável pelas medidas socioeducativas do Estatuto da Criança e do Adolescente. O menor infrator não irá ser punido pelos seus crimes como adulto após completar a idade mínima para a maioridade penal.

É importante ressaltar que cada um dos países tem suas necessidades para ter ou a sua maioridade penal menor que a do Brasil, que é de 18 anos. Porém, pelo que foi demonstrado pelo UNICEF, em 2007, os Estados Unidos não tiveram com sua experiência, bons resultados, tendo a maioridade penal reduzida, em diversos casos, observando agravamento da incidência de violência e consequentemente que os jovens que foram punidos, não tiveram uma reação positiva e conseguiram melhorar conforme a sua punição:

 

“Conforme publicado este ano no Jornal New York Times, a experiência de aplicação das penas previstas para adultos para adolescentes nos Estados Unidos foi mal sucedida resultando em agravamento da violência. Foi demonstrado que os adolescentes que cumpriram penas em penitenciárias, voltaram a delinquir e de forma ainda mais violenta, inclusive se comparados com aqueles que foram submetidos à Justiça Especial da Infância e Juventude”. (UNICEF, 2007, p. 11)

 

Ou seja, diante destas informações, é importante ter bastante cuidado quando se propõe ou se deseja a redução da maioridade penal no Brasil. Afinal, os índices de violência no Brasil podem prosseguir da forma que estão ou até piorar e pior, o jovem poderá não ter a reação positiva após estes tipos de pena que poderão ser impostas. É necessário existir a preocupação com relação à pena e a forma que se pune o jovem, principalmente por este não ter a mesma capacidade de discernimento e interpretação da realidade, como tem um adulto. Mais importante do que punir o jovem, é trazê-lo de volta à sociedade, para que em sua vida adulta não tenha outras condutas classificadas como criminosas.

 

2.4 Recuperação do menor infrator e o sistema penitenciário brasileiro

Questões relevantes quando se trata de uma redução da maioridade penal no Brasil que são importantes de se destacar, é a forma em que o jovem infrator está sendo tratado em Instituições em que são integrados e se nestas o menor está conseguindo se recuperar, bem como o tratamento que o jovem irá receber quando este integrar o Sistema Penitenciário Brasileiro, afinal, com uma hipótese redução da maioridade penal, o mesmo não irá ter a proteção do Estatuto da Criança e do Adolescente e estará imposto às penas e a forma em que os adultos são tratados com relação aos crimes.

Com relação aos às Instituições a que os menores serão encaminhados quando cometerem condutas criminosas, Cavagnini comenta que:

 

“As Instituições que se propõem a fazer o tratamento sociopedagógico dos menores infratores não cumprem o seu papel. Não existem centros de recuperação adequados para menores induzidos à marginalidade, uma vez que os órgãos oficiais atualmente denominados Unidades de Internação para Adolescentes Infratores espalhados pelo país encontram-se falidos, não atingindo os objetivos propostos pelo Estado”. (CAVAGNINI, 2014, p. 110)

 

Sendo assim, a ineficiência das Unidades de Internação para Adolescentes Infratores de certa forma se assemelha aos presídios reservados para adultos no país, como é destacado também pelo autor José Alberto Cavagnini (2014, p.110), “Na prática, são iguais aos grandes presídios, com os mesmos problemas que o sistema penitenciário reserva a criminosos perigosos e condenados”.

É notável que o motivo das Unidades de Internação para Adolescentes Infratores terem esta grande semelhança com os presídios destinados a adultos, se dá pelo fato das condições em que as Unidades de Internação se encontram. As Unidades estão em condições precárias e de superlotação, da mesma forma em que as penitenciárias do Brasil estão.

As unidades educacionais, que serviriam de auxílio aos menores infratores, não estão ao alcance de todos os menores, como explica Cavagnini (2014, p. 111), “Apenas parte dos internos tem acesso aos cursos profissionalizantes das unidades educacionais, o que deixa os demais à mercê da obstinação pelo mundo do crime”.

No tocante à falta de acesso de muitos com relação às unidades educacionais e também com relação às condições precárias das Unidades de Internação, é necessário uma mudança imediata nestas unidades. É determinante que, com relação aos menores, ocorra enquanto eles estejam nas Unidades de Internação, a reeducação destes, que estes sejam ressocializados e que se busque a recuperação dos jovens infratores.

A descentralização do sistema poderia ser uma alternativa para se superar a ineficiência das Unidades de Internação do Adolescente Infrator, tal como explica Cavagnini (2014, p. 114), “O ideal seria descentralizar o sistema. Hoje centenas de Fundações e Organizações Não Governamentais estão demonstrando como boas ideias, um pouco de dinheiro e muita disposição podem mudar essa realidade para melhor”.

Sendo assim, é notável que a alternativa de Cavagnini é válida, mas isto apenas se sucede pelo fato de que as Unidades de Internação simplesmente não conseguem recuperar o menor. A realidade atual é que os menores estão sendo encaminhados para estas Unidades, porém, não estão recebendo o retorno que deveriam receber. A solução em teoria que ocorre no caso da realização de uma internação, não está em internar o menor e deixá-lo completamente distante do meio externo e da sociedade, afinal, desta forma, ele não está conseguindo ser ressocializado e a internação se equipara a uma prisão. Se as Unidades de Internação não estão conseguindo encaminhá-los de volta para a sociedade de forma positiva, são necessárias mudanças, mesmo que estas partam de uma descentralização do sistema, como explicou José Alberto Cavagnini.

É possível concluir que da mesma maneira em que as penitenciárias não são os lugares corretos para os menores pelo seu ambiente, as Unidades de Internação também não podem se equiparar a elas. Pelo Estatuto da Criança e do Adolescente é possível constatar que o motivo da hipótese internação do jovem infrator, está no fato de que este necessita de ser auxiliado e reintegrado na sociedade, sendo isto feito pela internação. Porém, isto acaba por se tornar impossível de acontecer, pela premissa de que o ambiente que o jovem terá de se recuperar é equiparado com uma penitenciária e não contém os elementos necessários para ele ser recuperado.

Vistas as condições precárias das Unidades de Internação do Adolescente Infrator, também é necessário observar as péssimas condições das penitenciárias brasileiras.

Apesar de que no Artigo 5°, inciso XLIX, da Constituição Federal de 1988, estar consagrado que, “é assegurado aos presos o respeito à integridade física e moral” (BRASIL, 2014), todos da sociedade brasileira sabem que isto não é uma realidade, afinal, um dos temas de maior precariedade da sociedade brasileira é o Sistema Carcerário Brasileiro.

Muitos dizem que o Sistema Penitenciário do Brasil é um sistema que se encontra completamente falido. Esta linha de raciocínio não está equivocada, afinal, os presos não são tratados com a menor dignidade e respeito. As penitenciárias estão superlotadas, existem todos os tipos de violência no cárcere, inclusive a sexual, os presos ficam doentes com facilidade, bem como se infectam com doenças extremamente graves.

Além de todas as problemáticas com relação ao preso e sua integridade física, os presídios atualmente não contam com a devida segurança, onde temos armas, drogas e celulares que podem, tranquilamente, ser enviados para os presidiários de dentro do presídio, sendo completamente indetectável pela competência policial da penitenciária. É uma situação crítica, afinal, o presidiário com o celular tem a completa capacidade de comandar o crime que ocorre fora do presídio sem nenhum problema, bem como, com a arma que foi enviada a ele, o mesmo consegue ter a capacidade de comandar rebeliões e causar determinadas confusões dentro da penitenciária.

Segundo o Conselho Nacional de Justiça (2014, p.16-17), o Brasil passou a ter no ano de 2014 a terceira maior população carcerária do mundo, com a população de 563.526 presos para a capacidade de um sistema de 357.219 vagas, tendo assim, o déficit de 206.307 vagas, isto sem contar as 147.937 pessoas em prisão domiciliar.

Caso se fizer uma soma buscando o total de pessoas que poderiam ser presas no país, somaríamos os 711.463 presos com os 373.991 mandados de prisão em aberto, chegando à incrível marca de 1.085.454 pessoas presas no Brasil.

É importante ressaltar que a possibilidade de mais de um milhão de presos no país entra em contraste com a capacidade do sistema, que é de aproximadamente 350 mil vagas.

Torna-se evidente que é necessária uma reforma no Sistema Penitenciário Brasileiro, como é defendido por muitos. Porém, o problema está justamente nesta reforma, afinal, no sistema existe tão pouco investimento e está tão precário, que é difícil considerar como possível que em um futuro próximo ocorra uma possível mudança radical no sistema. A soma de fatores negativos do sistema resulta na reflexão feita por Rodrigues (2001, p.32), “O delinquente tende a converte-se num inimigo e o direito penal num direito penal para inimigos”.

É difícil aguardar que em uma cela extremamente lotada, com o uso equivalente ao dobro da sua capacidade, com o uso de drogas entre os presos, liberdade para se carregar armas, celulares, brigas entre detentos, ocorra a ressocialização de algum dos presos. De certa forma, a maioria dos presos se sente abandonado nos presídios, não só da sociedade, como também das autoridades. É um grande sentimento de indignidade e abandono que simplesmente não coopera com a melhora para a reintegração na sociedade de nenhum daqueles que estão nas penitenciárias, seja o condenado por um crime médio ou por um crime gravíssimo. Acaba-se por punir além do aceitável o preso e corrompê-lo a piores atitudes futuras.

Diante desta reflexão, como é possível se cogitar a redução da maioridade penal e aguardar que menores de 16 anos de idade, por exemplo, retornem de forma positiva após uma pena de maior duração de um Sistema Penitenciário, como é este encontrado no Brasil?

É impossível sustentar que é possível ocorrer qualquer tipo de melhora, principalmente no caso do jovem infrator ser inserido neste tipo de realidade. A partir do momento em que um adolescente de 16 anos é condenado, a título de exemplo, a um crime de 10 anos de pena privativa de liberdade, o individuo irá passar o fim da adolescência até a sua vida adulta na prisão, principalmente dos 16 aos 26 anos, que é a época de sua vida em que ele estará entendendo a realidade da sociedade e prosperando novas experiências em sua vida. Excluído em uma penitenciaria apenas irá beneficiar o jovem a se corromper ainda mais com a criminalidade e entender erroneamente que a sua vida se resume ao crime.

 

2.5 Argumentos favoráveis e desfavoráveis

Diante de um tema de caráter polêmico como a possibilidade de uma redução com relação à maioridade penal do Brasil, é necessário, portanto, estabelecer um contraponto entre os argumentos favoráveis e os argumentos desfavoráveis sobre o assunto.

Primeiramente, antes de se dizer a respeito aos argumentos favoráveis e desfavoráveis, é importante se destacar que a forma que a criminalidade infantil é tratada foi se transformando com o tempo, como explica Aníbal Bruno:

 

“Nos fins do século XIX outra ordem de motivos veio a influir na matéria – motivos de natureza criminológica e de política criminal, segundo os novos conhecimento sobre a gênese da criminalidade e a idéia da defesa social, que impunha deter os menores na carreira do crime. Daí nasceu o impulso que iria transformar radicalmente a maneira de considerar a tratar a criminalidade infantil e juvenil, conduzindo-a a um ponto de vista educativo e reformador”. (BRUNO, 1967, p. 543)

 

A respeito dos argumentos favoráveis, a UNICEF em 2007 discorreu sobre o assunto em seu relatório, apontando diversos pontos negativos para uma redução da maioridade penal no Brasil. É argumentado, por exemplo, que a redução da maioridade penal é inconstitucional, se trata de uma violação de cláusula pétrea, que afronta compromissos internacionais assumidos pelo Brasil, está na contra mão do que se discute na comunidade internacional, que tratar adolescentes como adultos somente agravará a violência, defende que o Estatuto da Criança e do Adolescente quando adequadamente aplicado apresenta bons resultados, bem como o fato de que são as políticas sociais que possuem real potencial para diminuir o envolvimento dos adolescentes com a violência:

 

É de conhecimento geral que as causas da violência como as desigualdades sociais, o racismo, a concentração de renda e a insuficiência das políticas públicas não se resolvem com a adoção de leis penais mais severas e sim exigem medidas capazes de romper com a banalização da violência e seu ciclo perverso. Tais medidas de natureza social, como a educação tem demonstrado sua potencialidade para diminuir a vulnerabilidade de centenas de adolescentes ao crime e à violência”. (UNICEF, 2007, p.13)

 

Além da UNICEF, o Conselho Federal de Psicologia também se posicionou de forma desfavorável, citando 05 argumentos contrários a respeito da possibilidade de se reduzir a maioridade penal no Brasil:

 

“1. A maioridade penal constitui cláusula pétrea fixada na Constituição Federal de 1988 e está de acordo com padrão adotado pelos mais importantes documentos internacionais de Direitos Humanos, como a Convenção sobre os Direitos da Criança, ratificada pelo Brasil em 1990.

  1. O rebaixamento da idade penal terá pouco impacto sobre os índices de criminalidade, uma vez que a maioria dos crimes é praticada por adultos, sendo adolescentes e jovens as maiores vítimas da violência;
  2. O rebaixamento da idade penal colocará o adolescente em contato com grupos organizados e criminosos mais velhos e experientes, diminuindo suas chances de não reincidência e de conclusão dos estudos e profissionalização. Contribuirá também para o aumento da população carcerária e o consequente agravamento da carência de vagas no sistema penitenciário brasileiro, considerado um dos piores do mundo.
  3. A legislação nacional – o Estatuto da Criança e do Adolescente – já responsabiliza os adolescentes que cometem atos infracionais a partir dos 12 anos de idade, aplicando medidas socioeducativas de acordo com a gravidade do ato cometido. São elas: advertência, obrigação de reparar o dano, prestação de serviços à comunidade, liberdade assistida, semiliberdade e internação.
  4. Como alternativa para combater o aumento de atos infracionais praticados por adolescentes e sua reincidência, propõem-se a imediata e total implantação do Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (Sinase), que prevê a formação continuada dos agentes socioeducadores, a priorização das medidas em meio aberto, a reforma das unidades de internação mediante parâmetros pedagógicos e arquitetônicos humanizados e, sobretudo, dispõe sobre os Programas e Planos de Atendimento Socioeducativos”. (CONSELHO FEDERAL DE PSICOLOGIA, 2013, p.11)

 

Visto alguns dos argumentos desfavoráveis à redução da maioridade penal, faz-se necessário exemplificar os favoráveis à redução. Sobre estes posicionamentos favoráveis acerca de uma mudança, reduzindo a maioridade penal no Brasil, Guilherme de Souza Nucci diz a respeito, se posicionando com relação à capacidade dos jovens de terem discernimento com relação às condutas que praticam:

 

“Não é admissível acreditar que menores entre 16 anos ou 17 anos, não tenham condições de compreender o caráter ilícito do que praticam, tendo em vista que o desenvolvimento mental acompanha, como é natural, a evolução dos tempos”. (NUCCI, 2007, p. 294).

 

Também se posicionando de forma favorável, o jurista Julio Fabbrini Mirabete também diz a respeito ao discernimento dos jovens de compreender os atos que praticam perante a sociedade:

 

“Ninguém pode negar que o jovem de 16 a 17 anos de qualquer meio social, tem hoje amplo conhecimento do mundo e condições de discernimento sobre a ilicitude de seus atos”. (MIRABETE, 1985, p. 215).

 

Outro com argumento favorável, Miguel Reale se posiciona defendendo uma redução da maioridade penal para os 16 anos de idade:

 

“Tendo o agente ciência de sua impunidade, está dando justo motivo à imperiosa mudança na idade limite da imputabilidade penal, que deve efetivamente começar aos dezesseis anos, inclusive, devido à precocidade da consciência delitual resultante dos acelerados processos de comunicação que caracterizam nosso tempo”. (REALE, 2001, p. 161)

 

Além disto, é possível constatar que os posicionamentos favoráveis à uma redução da maioridade penal no Brasil se sustentam também no maior rigor das normas aplicadas, criticando-se, assim, o Estatuto da Criança e do Adolescente e uma suposta impunidade acerca dos jovens, defendendo-se que com penas mais severas, iria ocorrer a erradicação da criminalidade juvenil.

 

Conclusão

            A redução da maioridade penal no Brasil não é um tema consensual, observando-se grandes divergências entre aqueles que são favoráveis e entre aqueles que são desfavoráveis com relação à ideia de se reduzir o panorama atual de idade mínima de 18 anos.

Diante da perspectiva daqueles que são favoráveis a uma redução da maioridade penal, o presente trabalho buscou adentrar-se nas questões favoráveis e desfavoráveis para a redução da maioridade penal. Foram exemplificadas algumas questões, como o argumento de que as medidas socioeducativas aplicadas pelo Estatuto da Criança e do Adolescente são insuficientes, sendo necessária uma nova forma de se tratar a criminalidade juvenil, prevenindo-se a impunidade destes jovens e consequentemente os delitos praticados. Outro argumento para a redução da maioridade penal que pode ser ressaltado está no fato de que o jovem de 16 anos tem capacidade de votar, ter consciência dos seus atos e capacidade plena de tomar suas decisões, não sendo correta a proteção do Estatuto da Criança e do Adolescente.

Além destes argumentos, vale ressaltar, também, os argumentos que defendem a redução da maioridade penal em casos excepcionais, como é o caso da Proposta de Emenda Constitucional N° 33 de 2012, de Aloysio Nunes. Sendo assim, no caso de crimes hediondos, poderia se reconsiderar a inimputabilidade do indivíduo maior de 16 anos.

Apesar de todos os argumentos favoráveis para a redução da maioridade penal, com relação à posição do presente estudo, defende-se que não deverá se reduzir a maioridade penal brasileira em qualquer hipótese, seja em casos excepcionais ou gerais.

A redução da maioridade penal para qualquer idade se trata de um retrocesso. O argumento de que as medidas socioeducativas aplicada aos jovens são ineficazes não encontra embasamento, as medidas aplicadas são suficientes, sendo necessários maiores esforços para se recuperar o jovem infrator e reinseri-lo na sociedade e não puni-lo.

Reduzindo a idade penal, o adolescente irá perder a proteção do Estatuto da Criança e do Adolescente e será penalizado como um adulto, inserindo o jovem no Sistema Penitenciário Brasileiro, no qual se encontra superlotado e em condições precárias, desamparando o menor infrator, possibilitando com a convivência com adultos de todos os tipos de periculosidade, oportunidades maiores de corrompê-lo e tornando a recuperação do menor muito difícil e complicada.

O argumento aonde o jovem tem plena capacidade aos 16 anos também é equivocado. Existe uma grande diferença em um individuo ter a capacidade de votar e de assumir a responsabilidade e as penas previstas sobre um delito cometido. A juventude é uma fase de desenvolvimento do ser humano, podendo neste processo cometer erros e acertos. É necessário que o adolescente tenha direito à proteção do Estatuto da Criança e do Adolescente e possa ter a oportunidade de se recuperar, sendo obrigação do Estado cumprir a função ressocializadora.

Demonstra-se necessário maior investimento para concretizar que o jovem consiga ser ressocializado. As medidas socioeducativas são suficientes para a recuperação do jovem, mas estas devem ser aplicadas atendendo a todos os jovens, visando os resultados positivos para que no futuro o jovem não volte a delinquir.

Apesar de existir uma grande pressão por parte da população acerca da redução da maioridade penal, deve-se tratar o assunto com cautela, afinal, o sistema prisional do Brasil está absolutamente defasado, não demonstrando resultados positivos dos presidiários adultos.

Constata-se que a redução da maioridade penal no Brasil não trará grande benefício e é necessário maiores esforços para que as medidas do Estatuto da Criança e do Adolescente sejam aplicadas de forma plena, a fim de recuperar o jovem. Porém, mais importante do que a discussão de redução da maioridade e eficiência do Estatuto da Criança e do Adolescente, está no fato de que a diminuição dos níveis da criminalidade juvenil poderá ocorrer com a realização da redução das desigualdades sociais do Brasil, com melhor distribuição de renda, saúde e educação.

Transferir o menor de 18 anos infrator para a cadeia não trará nenhum tipo de beneficio e apenas irá aumentar o número daqueles que estão sentenciados a cumprir pena no Brasil. Não irá ocorrer uma maior intimidação, pelo fato do jovem infrator saber que poderá ser punido como adulto, simplesmente pelo fato de que ele não tem discernimento para isto, sendo o jovem punido como adulto e não tendo a oportunidade de se ressocializar e compreender aquilo que é correto de se desempenhar na sociedade brasileira.

A solução da criminalidade juvenil não está evidenciada em punir os jovens e sim em investir nos jovens, amparar o jovem infrator, prevenir novos infratores educando a juventude, desenvolver a o jovem mentalmente e intelectualmente e diminuindo os problemas sociais do país. Deve-se procurar resolver o problema da criminalidade juvenil se atuando nas causas em que ela se inicia e não em suas consequências finais.

 

Referências

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