André Severo Chaves
Resumo: O novo Código de Processo Civil trouxe várias mudanças na ordem jurídica brasileira, destaca-se a unificação do regime das tutelas de cognição sumária, por meio da tutela provisória, que compreende as tutelas de urgência e de evidência. Analisa-se os antecedentes históricos e a evolução das técnicas de sumarização, especifica-se as espécies de tutela provisória, com enfoque na de evidência, e aborda-se a aplicação desta no plano do processo tributário. O enfoque metodológico da pesquisa é caracterizado como qualitativo e o objeto de estudo como de natureza bibliográfica e documental. Como resultado admite-se perfeita sintonia da tutela de evidência, instituto processual cível, com o direito tributário, para suspender a exigibilidade do credito tributário e para admitir-se mandado de segurança com pedido liminar com base na tutela de evidência, desde que instituída por meio de prova pré-constituída exclusivamente documental, cuja tese seja acostada em julgamento de recursos repetitivos ou em súmula vinculante.
PALAVRAS-CHAVE: Novo Código de Processo Civil. Tutela Provisória. Tutela de Evidência. Processo Tributário. Suspensão da Exigibilidade do Crédito Tributário.
ABSTRACT: The new Civil Procedure Code brought several changes in Brazilian legal system, with emphasis to unification of the tutelage system of judicial cognizance through provisional guarantee, which includes urgent and evident provisions. Historical background and the evolution of the summarization techniques are analyzed, the provisional guarantee is stipulated focusing on the one of evidence, and its applications on tax procedure is discussed. The methodological approach of the research is characterized as qualitative and the object of study, as a bibliographical and documentary nature. As a result, is recognized the concordance between evident provision, as a civil procedure institute, and tax law to suspend the requirement of tax credit and to allow a writ of security with a preliminary injunction based on evident provision, since established by means of preconstituted documentary evidence only, which thesis is set to judgement of repetitive appeals or in binding decision.
KEYWORDS: New Civil Procedure Code. Provisional guarantee. Evident provision. Tax procedure. Suspension of mandatory tax credit. Writ of security.
SUMÁRIO: Introdução; 1 Da tutela provisória; 2 Da tutela provisória de evidência; 3 Da aplicabilidade da tutela de evidência no processo tributário; Considerações finais; Referências
O presente artigo objetiva demonstrar as consequências trazidas ao direito tributário com o advento da tutela de evidência, fruto de uma das mais relevantes e extensas inovações do Código de Processo Civil de 2015, o qual unificou em um regime geral as tutelas que buscam regular provisoriamente o direito material que se encontra sob urgência de satisfação ou evidência de que o direito é cristalino ao ponto de necessitar concessão transitiva.
Não se pretende esgotar o assunto abordado, mas contribuir para divulgação do conhecimento, destacando os pontos positivos ao direito tributário e incentivar a elaboração de novos estudos que venham a aprofundar e ampliar o seu entendimento. Desta feita, o trabalho possui dois estágios, no qual em primeiro momento analisa-se a teoria das tutelas provisórias, com enfoque na tutela provisória de evidência para caracterizá-la e expor suas hipóteses de cabimento e suas particularidades; e em segundo, discorrer acerca da possibilidade de concessão dessa tutela como hipótese de suspensão da exigibilidade do crédito tributário, assim como sua admissão em sede de liminar em mandado de segurança.
O enfoque metodológico da pesquisa é caracterizado como qualitativo, preponderando o exame rigoroso da natureza, do alcance e das interpretações possíveis para o fenômeno pesquisado. O objeto de estudo será de natureza bibliográfica, documental e jurisprudencial.
Como resultado admite-se perfeita sintonia da tutela de evidência com o direito tributário para suspender a exigibilidade do credito tributário e para admitir mandado de segurança com pedido liminar com base na tutela de evidência, desde que instituída por meio de prova pré-constituída exclusivamente documental, cuja tese seja acostada em julgamento de recursos repetitivos ou em súmula vinculante.
A Tutela Provisória nada mais é que um mecanismo processual pelo qual o magistrado julgará antecipadamente o mérito da causa ou o provimento judicial acautelatório, seja para atender a parte que se encontra com direito ameaçado pelo perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo, seja para conceder a tutela pretendida a parte que demonstra direito evidente, sem que, nesse caso, seja preciso comprovar perigo da demora. No primeiro caso tem-se a tutela de urgência; conquanto que no segundo, a tutela de evidência. Ambas constituem técnicas que tem por objetivo sumarizar, acelerar o rito processual. A seguir, será introduzido sobre tais técnicas de sumarização e distinguido as hipóteses de tutela provisórias presentes no Código de Processo Civil.
A jurisdição é uma função estatal que visa a resolução da lide com a realização prática do direito tutelado que, no Estado Constitucional, não tem como escopo o simples cumprimento da vontade da lei, mas a proteção integral do direito objeto da prestação jurisdicional. É nesse sentido que o processo se constitui como instrumento pelo qual utiliza-se a jurisdição para tutelar a situação jurídica controvertida.
Não obstante, com a evolução da sociedade e com a crescente complexidade das relações sociais e jurídicas, o Estado fora tornando-se falho na prestação jurisdicional, de modo que o dever de dirimir os conflitos a tempo hábil passou a ser uma utopia, visto a morosidade judicial.
É nesse contexto que todos os anseios se voltaram a criação de um Novo Código de Processo Civil, que buscou a concretude de um processo dotado de maior efetividade e celeridade. A Exposição de Motivos do Novo Código de Processo Civil[1], elaborada pelo Senado Federal, esclarece as mudanças realizadas para se alcançar tais objetivos:
O novo Código de Processo Civil tem o potencial de gerar um processo mais célere, mais justo, porque mais rente às necessidades sociais e muito menos complexo. […]
O Novo CPC agora deixa clara a possibilidade de concessão de tutela de urgência e de tutela à evidência. Considerou-se conveniente esclarecer de forma expressa que a resposta do Poder Judiciário deve ser rápida não só em situações em que a urgência decorre do risco de eficácia do processo e do eventual perecimento do próprio direito. Também em hipóteses em que as alegações da parte se revelam de juridicidade ostensiva deve a tutela ser antecipadamente (total ou parcialmente) concedida, independentemente de periculum in mora, por não haver razão relevante para a espera, até porque, via de regra, a demora do processo gera agravamento do dano.
Como se observa, um dos meios para garantir a celeridade processual fora a adequação do texto processual cível ao constitucional, com observância ao princípio da duração razoável do processo, por meio da alteração no regime das tutelas provisórias, que será oportunamente explicado.
Com base nos ensinamentos de Humberto Theodoro Junior[2] há de se perquirir que não se pode confundir a tutela com a técnica utilizada pelo Poder Judiciário para a resolução adequada demandas: a tutela principal se refere à tutela de conhecimento ou a de execução, porém, a depender da análise do caso concreto, pode-se evidenciar que a duração prolongada do processo ou o risco de prejuízo ao direito de uma das partes pode comprometer a efetividade da tutela jurisdicional, casos em que é possível o manejo de técnicas de sumarização, que no ordenamento jurídico vigente é denominado como tutelas provisórias, para prematurar o efeito da sentença de mérito.
Com atenção a tais premissas, importante se faz descrever como nasceu o instituto que originou a tutela provisória para depois discorrer sobre a referida tutela no ordenamento jurídico pátrio, em especial a de evidência.
Remonta ao Direito Romano a origem do que hoje se conhece como tutela provisória. Conforme os ensinamentos de Rogério Tadeu Romano[3] existiam dois institutos de grande importância na época: o actio e o interdictum. O primeiro dava-se com participação das partes e com objetivo de uma sentença meritória por parte do juiz, enquanto que o segundo o juiz decidia apenas sobre a matéria de fato, de modo célere e com base no juízo do probabilidade e verossimilhança das alegações, a pedido de um particular, a outra pessoa, impondo-lhe uma determinada conduta.
O mesmo autor completa:
O interdito era utilizado em toda situação que exigisse uma “tutela de urgência”, seja de interesse privado ou público, possibilitando que o pretor adentrasse no mérito da controvérsia, mas não com o intuito de organizá-la, como ocorria na actio, e sim, de decidi-la […] [4]
Nesse bojo surgiu a tutela possessória, na qual medidas liminares eram utilizadas para a rápida satisfação do direito de quem encontra-se com ameaça ao direito de posse. Posteriormente, institutos assemelhados surgiram em outros ordenamentos e evoluíram ao longo dos anos. Exemplifica José Roberto dos Santos Bedaque apud Lívio Goellner Goron[5] que a partir do século XIII, em países como Alemanha, Itália, Espanha e França, o interdito foi largamente utilizado nos casos em que o magistrado necessitava proferir medidas liminares.
Com a evolução da sociedade e, consequentemente, dos institutos jurídicos, fora comprometida a efetividade do direito. Nesse viés, a cognição plena e exauriente para a prestação jurisdicional tornou-se cada vez mais postergada. Tal situação permitiu avanço nos estudos de novos meios para agilizar o processo.
Como resultado, destaca-se a forma alternativa encontrada pelos legisladores italianos ao adotar em seu Código de Processo Civil o “Dei Provvedimenti D’Urgenza”[6]. Influenciada pela inovação italiana, a Lei nº 8.952, de 13 de dezembro de 1994, alterou o artigo 273 do antigo Código de Processo Civil (Lei nº 5.869, de 11/01/1973) para inserir a tutela antecipada.
O novo Código de Processo Civil trouxe profundas mudanças na prestação jurisdicional, com vistas principalmente na busca pela celeridade processual e pela simplificação dos processos e dos procedimentos. É nesse sentido que as alterações provocadas nas técnicas de sumarização foram de grande valia pela busca da concretude dos princípios processuais e constitucionais da duração razoável do processo e do acesso à jurisdição, com destaque o advento da tutela provisória de evidência, que será caracterizada oportunamente.
O Código de Processo Civil de 1973, após alteração da Lei nº 8.952, de 13 de dezembro de 1994, passou a permitir uma tutela distinta, que prescinde dos princípios da segurança jurídica, da ampla defesa e da necessidade de um processo de cognição exauriente. Trata-se da tutela antecipada, que tem como objetivo antecipar total ou parcialmente os efeitos da tutela jurisdicional, tornar o processo mais ágil e célere e tutelar pretensões que não podem esperar a longa tramitação do processo.
Computando-se a redação do artigo 273 do Código de Processo Civil de 1973, extrai-se que os requisitos para concessão da tutela antecipada são: existência de prova inequívoca, verossimilhança das alegações, existência de fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação e abuso de direito de defesa ou o manifesto propósito protelatório do réu (MOZZATTO, 2017)[7].
Nota-se que a inserção de um dispositivo que permita pleitear antecipadamente o mérito do processo, levando em consideração que, em certos casos, torna-se impossível ou sem razão, a espera do autor pelo destrinchar do processo até que seu direito seja reconhecido em juízo, constitui um grande marco para o Direito brasileiro.
No mesmo subsistema da tutela antecipada, sobrevivia a tutela cautelar, por meio de uma ação autônoma. Disciplinada em um livro próprio no antigo diploma, a ação cautelar tinha como objetivo garantir a certificação ou uma futura execução do direito, através de procedimentos específicos, tais como o sequestro de bens, o arresto e a busca e apreensão.
Segundo Pontes de Miranda[8] “a tutela cautelar garante para satisfazer, já a tutela antecipada satisfaz para garantir”. Deste modo, tem-se que a ação cautelar tinha como objetivo garantir a certificação ou uma futura execução do direito, enquanto a tutela antecipada visava satisfazer objetivamente um direito. Daí que se infere que a ação cautelar é dita conservativa; e a antecipada, satisfativa.
Neste ínterim, a fim de uniformizar o processo e deixa-lo sincrético, o novo código processual civil extinguiu o processo cautelar autônomo e sistematizou o regime das tutelas sumárias com a destinação de um livro, intitulado “Da Tutela Provisória”, que por sua vez é dividida em tutela provisória de urgência, que compreende a cautelar e a antecipada; e tutela provisória de evidência.
Segundo Humberto Theodoro Júnior[9], a tutela provisória é uma técnica de sumarização, para que o custo da duração do processo seja melhor distribuído, e não mais continue a recair sobre quem aparenta, no momento, ser o merecedor da tutela.
Acrescenta Alexandre Freitas Câmara[10] que tutelas provisórias são fundadas em cognição sumária, isto é, fundadas em um exame menos profundo da causa, capaz de levar à prolação de decisões baseadas em juízo de probabilidade e não de certeza.
Em outros termos, diz-se que provisória é toda tutela jurisdicional concedida com base em cognição sumária, não definitiva, ou seja, sem o magistrado ter exaurido a investigação, sendo exigido apenas juízo de probabilidade.
Tanto a tutela provisória de urgência quanto a de evidência possuem particularidades. A principal consiste na possibilidade de apenas a de urgência poder ser pleiteada em tanto em caráter antecedente, ou seja, na petição inicial, quanto em caráter incidental, no curso do processo. A tutela de evidência não admite a primeira hipótese, vez que na propositura da ação, os pedidos não foram elaborados com intuito de obtenção de uma sentença resolutória de mérito de caráter urgente. O que ocorre nesse tipo de tutela é que no curso do trâmite processual verifica-se algumas das situações admitidas em lei que se faz necessário a antecipação da tutela face a probabilidade de o direito ser deveras claro e evidente.
Todavia cumpre destacar alguns aspectos em comum ao regime das tutelas provisórias: os dois tipos adquirem eficácia à tutela provisória quando deferida, que é conservada enquanto durar o processo, inclusive durante o período de suspensão; podem ser modificadas ou revogada; há isenção de custas processuais quando formuladas em caráter incidental; a decisão judicial que deferir a tutela deverá ser motivada e cabe interposição de agravo de instrumento da decisão conceder a tutela.
Por fim, Raatz e Anchieta[11] sintetiza como se deu a sistematização das tutelas provisórias no âmbito no novo Código de Processo Civil:
Desse modo, a única maneira possível de compreender a sistematização oferecida pelo Novo CPC no tocante à tutela provisória é ler, quando o Código fala em tutela antecipada, a expressão “tutela satisfativa fundada na urgência”, a qual se apresenta, no que diz respeito à sua finalidade, como um contraponto à tutela cautelar, a qual também é fundada na urgência. A chamada “tutela da evidência” também é uma tutela satisfativa que, no entanto, não se fundamenta na urgência. Então, pode-se concluir que (i) o Novo CPC optou por dar ênfase ao termo “tutela provisória” o qual não guarda relação alguma com a finalidade do provimento jurisdicional, mas tão-somente com a possível revogação, modificação ou confirmação do provimento dentro do mesmo processo; (ii) a divisão da tutela provisória em tutela de urgência e de evidência tem unicamente como critério de distinção os pressupostos – urgência ou evidência – que fundamentam essas duas espécies de tutela provisória; (iii) a tutela provisória de urgência poderá, no que diz respeito ao seu conteúdo material, ser cautelar ou satisfativa – sendo que esta última o Código denomina de “tutela antecipada” –, ao passo que a tutela provisória de evidência será sempre satisfativa.
O legislador, ao criar o novo Código de Processo Civil, organizou e sistematizou as medidas de sumarização para que a solução do Poder Judiciário fosse célere não somente nas situações urgentes, como também naquelas em que a alegação da parte se revela tão evidente que é injustificável esperar o fim do processo para que seja analisada a tutela final pretendida[12]. Trata-se de uma das mais expressivas inserções do Código de Processo Civil atual: a tutela à evidência, tema central de estudo do presente artigo.
Essa tutela possui como principal peculiaridade a desnecessidade da demonstração do perigo da demora ou de risco ao resultado útil do processo. É preciso, portanto, apenas a demonstração da probabilidade do direito.
Esclarece Alexandre Freitas Câmara[13] que a tutela de evidência tem como objetivo antecipar o resultado prático final do processo, satisfazendo-se na prática o direito do demandante independentemente da presença de pericullum in mora.
Fred Didier Junior[14] afirma que há necessidade de os direitos evidentes, senão os contidos nos incisos do artigo 311 do Código de Processo Civil, merecerem tratamento especial, sob a justificativa de estarem sob a égide de um substrato fático cuja prova pode ser feita facilmente.
Em consonância com este ensinamento, Eduardo José da Fonseca Costa apud por Natalia Rosa Mozzatto[15] leciona que:
Nos casos de tutela de evidência, por exemplo, embora premido por uma cognição ainda não plena, o juiz defronta-se com uma pretensão de direito material cuja existência é quase certa. Isso é muito comum, por exemplo, nas demandas em que a petição inicial já conta com provas robustas, ou pré-constituídas, dos fatos constitutivos do direito alegado pelo autor.
Tecida as considerações iniciais, passa-se a análise das hipóteses em que cabe a tutela à evidência.
A primeira, conhecida como sancionatória ou punitiva[16], busca acelerar o trâmite processual, com vistas a pô-lo fim, quando é incontestável o abuso do direito de defesa ou manifesto uso de manobras protelatórias. Salienta-se, nesse caso, que o pedido de tutela à evidência não pode ser inaudita altera partes, vez que deve ser dada a oportunidade de defesa à parte que supostamente agira no sentido de obter fim não desejado pela ordem jurídica.
A segunda hipótese é admitida quando as alegações de fato puderem ser comprovadas apenas documentalmente e quando houver tese firmada em julgamento de casos repetitivos ou em súmula vinculante. Essa hipótese carece de prova pré-constituída, ou seja, os documentos acostados na petição inicial devem ser suficientes para fazer prova aos fatos alegados. Concomitantemente, o pedido deve ter fulcro em tese firmada em súmula vinculante ou em julgamento de casos repetitivos, que são os recursos repetitivos ou o Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas – IRDR.
Já a terceira diz respeito ao pedido reipersecutório fundado em prova documental adequada do contrato de depósito, quem tem como pedido a devolução imediata do bem custodiado. Trata-se, assim como a anterior, de uma hipótese de prova documental.
A última hipótese refere-se à ausência de contraprova documentada suficiente da parte adversa para rebater os fatos constituídos pelo autor.
Cumpre ressaltar que a tutela de evidência sempre é incidental ao processo que fora feito o pedido principal e que no caso da primeira e da última hipótese aqui explanadas, senão as que prescindem de provas documentais, não podem ser formuladas sem audição das partes contrárias, pois caso fosse assim admitido, seria ferido o necessário prévio contraditório.
Ainda não pode, nesses casos, ser formulado pedido de tutela de evidência antes do oferecimento da contestação. Alexandre Freitas Câmara[17] explica que só se pode cogitar de abuso do direito de defesa depois que esta tenha sido oferecida, assim como só se pode afirmar que o réu não trouxe provas capazes de gerar dúvida razoável sobre o material probatório produzido pelo autor depois que o demandado tenha tido oportunidade para apresentar as suas alegações e provas.
O novo Código de Processo Civil prevê a possibilidade da concessão antecipada do direito sem a necessidade de se comprovar qualquer perigo de dano, em casos enumerados nos quais reste comprovado o chamado “direito de evidência” (MOZZATTO, 2017)[18].
Essa modalidade de tutela provisória foi responsável por inúmeras contribuições a diversas áreas do direito, sobretudo ao processo tributário.
A hipótese do inciso II do artigo 311 do Código de Processo Civil trata da concessão de tutela de evidência em função das alegações de fato que possuam incontroversibilidade fática documental corroboradas com tese firmada em julgamento de casos repetitivos ou em súmula vinculante. Como explanar-se-á adiante, essa hipótese se encaixa perfeitamente ao direito tributário.
O Código Tributário Nacional não traz conceito elaborado de crédito tributário. Para conceituá-lo tomaremos emprestado a definição dada por Hugo Brito Machado[19]:
Crédito tributário é o vínculo jurídico, oriundo do lançamento tributário, de natureza obrigacional, por força do qual o Estado (sujeito ativo) pode exigir do particular, contribuinte ou responsável (sujeito passivo), o pagamento do tributo ou da penalidade pecuniária (objeto da relação jurídica), tornando o tributo exigível por sua liquidez e certeza.
A relação jurídico-tributária nasce quando o contribuinte realiza o fato gerador tributário. É nesse momento que o ente púbico pode exigir o pagamento dessa relação obrigacional, por meio do lançamento.
Neste ponto, o contribuinte possui dois caminhos a seguir: pagar o tributo, caso em que a relação jurídico-tributária se extingue; ou não pagar, motivo pelo qual o Estado pode se valer de medidas de exigência para obrigar o contribuinte a adimplir o crédito tributário, tais como inclusão em Dívida Ativa ou execução fiscal, denominados processos exacionais.
No processo tributário, pode ainda o contribuinte figurar como polo ativo, por meio de ações antiexacionais, seja de caráter preventivo, seja repressivo. Como exemplifica Camila Vergueiro Catunda[20] a ação antiexacional preventiva pretende evitar aplicação da regra-matriz de incidência tributária fazendo-o, ou por meio da Ação Declaratória de Inexistência de Relação Jurídica ou do Mandado de Segurança Preventivo. De outro lado, por meio da ação antiexacional repressiva, o contribuinte pode se valer de Ação Anulatória, ou do Mandado de Segurança Repressivo ou dos Embargos à Execução Fiscal com vistas a desconstituir atos praticados pelo Fisco.
O ato de ingressar em juízo não possui o condão de suspender a exigência do crédito tributário que se está levando à discussão, razão pela qual o contribuinte necessita adotar alguma medida que vise suspender sua exigibilidade.
O legislador trouxe, no artigo 151 do Código Tributário Nacional, ferramentas que possuem força de suspender a exigibilidade do crédito tributário, bem como de evitar o confisco.
Destacam-se as medidas suspensivas da exigibilidade do crédito tributário dos incisos IV e V do supramencionado artigo, quais sejam: a concessão de medida liminar em mandado de segurança e a concessão de medida liminar ou de tutela antecipada, em outras espécies de ação judicial.
A lei tributária se mostra bastante rígida ao dispor, no artigo 141 do Código Tributário Nacional, que as hipóteses de suspensão da exigibilidade são taxativas. Ademais, afirma o inciso I do artigo 111 do mesmo diploma que todos os dispositivos da legislação tributária que se refiram a suspensão ou exclusão do credito tributário devem ser interpretados literalmente.
Em contraposição, Íris Vânia Santos Rosa apud Felipe Reis Caldas[21] entende pela admissão de novas possibilidades de suspensão da exigibilidade do crédito tributário lastreada em princípios constitucionais, podendo ser aplicadas por analogia às existentes.
O Supremo Tribunal de Justiça[22] já decidiu pela flexibilização das hipóteses de suspensão ao afirmar que o pedido administrativo de compensação de tributo suspende a exigibilidade e impede o ajuizamento da execução fiscal.
Certamente, o Código Tributário Nacional, datado de 1966, fora concebido em momento jurídico-social distinto do atual, inclusive a alteração legislativa do ano de 2001 que inseriu duas causas de suspensão de exigibilidade do crédito tributário, em destaque a concessão de medida liminar ou de tutela antecipada em outras espécies de ação judicial, também o foi.
Nesse jaez, a causa de suspensão retromencionada necessita uma releitura, com a devida adequação ao dispositivo processual civil vigente, porque o direito tributário utiliza-se da lei processual civil, que sofreu, como já anteriormente afirmado, importantes alterações, sobretudo com a unificação do regime das tutelas provisórias. De acordo com Felipe Reis Caldas[23], deixou de existir a separação de liminares (cautelares) e tutelas antecipadas, sendo ambas conceituadas como parte do gênero tutelas provisórias, não mais havendo o que se falar de tutela antecipada e suas implicações na suspensão da exigibilidade, tal como escreve o inciso V do artigo 151 do Código Tributário Nacional.
Defende-se, portanto, que o dispositivo que trata das hipóteses de suspensão da exigibilidade deve ser interpretado com outra roupagem para admitir a aplicação no direito tributário tanto da tutela de urgência quanto da de evidência.
Com essa leitura, o julgador pode conceder a tutela de evidência para suspender a exigibilidade do credito tributário para que o Fisco se abstenha de cobrar o crédito até que haja uma cognição processual exauriente.
Um evidente direito não satisfeito indica lesão a quem o pleiteia em juízo. Esse fato viola os princípios constitucionais da efetividade do processo, do acesso a jurisdição e da duração razoável do processo.
De início, aponta-se que a lei nº 12.016/2009 disciplina a ação constitucional do mandado de segurança. É possível impetrar essa ação nos casos em que haja lesão ou ameaça de lesão a direito líquido e certo por ato coator de autoridade.
Esse conceito é semelhante a hipótese de concessão de tutela de evidência lastreada em provas documentais robustas com tese firmada em julgamento de casos repetitivos ou em súmula vinculante, senão a contida no inciso II do artigo 311 do Código de Processo Civil, pois trata-se este caso de um pedido tutelar incontestável, resultante de clara violação à lei, no qual a parte adversa possuirá dificuldade em rebater ao fatos em sua defesa.
Transferindo para a seara tributária, tem-se um caso em que o contribuinte, vítima de uma evidente transgressão à lei, tem uma espécie de direito líquido e certo violado. Pode ele, então, buscar a tutela jurisdicional através de mandado de segurança com pedido liminar com base na tutela de evidência.
Dada a semelhança, admite-se que no âmbito tributário, ao impetrar essa ação, o contribuinte tem como objetivo específico impedir que o Fisco promova cobranças decorrentes do não pagamento de tributos, ou seja, suspender a exigibilidade do crédito tributário.
A título exemplificativo, Ricardo Alexandre[24] assevera que, ao ajuizar mandado de segurança, o impetrante alega, no tocante ao perigo da demora que a não concessão da medida em caráter liminar traria prejuízos de grande monta e de impossível reparação, como a negativa de certidões, a impossibilidade de participar de procedimentos licitatórios, a inscrição em cadastros de inadimplentes, a negativa de acesso a crédito oficial, entre outros; quanto à relevância dos argumentos (fumu boni iuris), o impetrante pode alegar a inconstitucionalidade, ilegalidade ou irregularidade na cobrança que tenta evitar.
Pela inteligência do inciso III do artigo 7º da Lei do Mandado de Segurança, o juiz, ao despachar a inicial, ordenará que se suspenda o ato que deu motivo ao pedido, quando houver fundamento relevante e do ato impugnado puder resultar a ineficácia da medida, caso seja finalmente deferida, sendo facultado exigir do impetrante caução, fiança ou depósito, com objetivo de assegurar o ressarcimento à pessoa jurídica.
Ricardo Alexandre[25] ressalta que esse dispositivo, claramente, traz uma medida cautelar a fim de assegurar o resultado prático do processo, que somente é deferido quando se fizerem presentes o periculum in mora e o fumus boni iuris. Admite-se, portanto, que o mandado de segurança possui natureza cautelar por assegurar o direito e não o satisfazer previamente.
Nesse diapasão, cumpre ressaltar que o parágrafo 2º do mesmo artigo restringe a concessão de medida liminar em mandado de segurança que tenha por objeto a compensação de créditos tributários. Tal contenção é justificável pelo entendimento de que o mandado de segurança se amolda perfeitamente à natureza cautelar.
Ocorre que o Código de Processo Civil, como visto, ao instituir as tutelas provisórias, inovou com um tipo de tutela em que não se exige a demonstração de perigo de dano ou de risco ao resultado útil do processo. Trata-se da tutela evidência, que pode ser invocada, inclusive, em caráter liminar, em conformidade com o parágrafo 1º do artigo 311 do mencionado Código.
Dentre os tipos de tutelas de evidência, especialmente a do inciso II, senão a concedida quando as alegações de fato puderem ser comprovadas apenas documentalmente e houver tese firmada em julgamento de casos repetitivos ou em súmula vinculante, reflete com maior peso no direito e processo tributário, com força de ser admitida em mandados de segurança que versem sobre matéria tributária.
Paulo Cesar Conrado[26] esclarece que o código processualista não explicita os efeitos da tutela de evidência, logo, por não restringir, entende-se admissível tanto as providências cautelares quanto as satisfativas. O mesmo autor continua:
Se assim for, partindo-se da premissa (já assentada) de que liminar em mandado de segurança é submodelo de cautelar, o que se poderia concluir é, para além das condições gerais fixadas nos incisos do artigo 7º da Lei 12.016/2009, seria possível a concessão da aludida medida sob o regime do artigo 311 (especificamente em seu inciso II).
Nesse sentido, é inovador a possibilidade do contribuinte conseguir que seja admitida medida liminar em mandado de segurança, independentemente de urgência ou perigo da demora, por meio da tutela de evidência.
A correspondência entre esse imperativo mandamental e o pedido de tutela de evidência é perfeitamente ilustrada por Natália Rosa Mozzatto[27]
A questão se mostra de grande importância ao analisar uma situação hipotética em que a exação de determinado tributo tenha sido reconhecida como ilegal em sede de recurso repetitivo. Bastaria, portanto, neste caso, ao impetrante demonstrar sua qualidade de sujeito passivo deste tributo, pleiteando a tutela de evidência para que não o recolhesse mais, independentemente da demonstração do periculum in mora.
Nessa esteira, conclui-se pela admissibilidade de mandado de segurança com pedido liminar com base na tutela de evidência, desde que instituída por meio de prova pré-constituída exclusivamente documental, cuja tese seja acostada em julgamento de recursos repetitivos ou em súmula vinculante, para que seja suspensa a exigibilidade do crédito tributário.
Com as modificações do novo Código de Processo Civil no tocante a unificação do regime das tutelas provisórias, o direito tributário foi alvo de uma grande benesse. Agora as questões julgadas com base em casos repetitivos ou em súmulas vinculantes e que tenham bruta prova documental juntada aos autos tem poder de suspender a exigibilidade do crédito tributário. Os Tribunais já estão admitindo a referida tutela, como é perceptível pelo julgado infra [28].
AGRAVO DE INSTRUMENTO – SUSPENSÃO DA EXIGIBILIDADE DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO – ICMS. INCIDENTE SOBRE AS TARIFAS DE USO DO SISTEMA DE DISTRIBUIÇÃO (TUSD) E DE USO DO SISTEMA DE TRANSMISSÃO (TUST) – DEFERIMENTO DA TUTELA PROVISÓRIA. Alegações comprovadas documentalmente e em consonância com jurisprudência consolidada do C. STJ. Possibilidade de concessão da tutela de evidência. Inteligência do art. 311, inciso II, do NCPC. Decisão mantida, por fundamento diverso. Recurso desprovido.
(TJ-SP – AI: 20927231420178260000 SP 2092723- 14.2017.8.26.0000, Relator: Spoladore Dominguez, Data de Julgamento: 07/06/2017, 13ª Câmara de Direito Público, Data de Publicação: 12/06/2017).
Um caso emblemático acerca aplicação da tutela de evidência como hipótese de suspensão de crédito tributário diz respeito à cobrança indevida de ICMS sobre Tarifas de Uso do Sistema de Transmissão (TUST) e Tarifas de Uso do Sistema de Transmissão de Distribuição (TUSD) de energia elétrica.
O entendimento consolidado pelo Superior Tribunal de Justiça é no sentido de que o ICMS incide sobre o valor da tarifa de energia elétrica correspondente à demanda de potência efetivamente utilizada pelo contribuinte.
O julgado abaixo[29] contou com deferimento de tutela de evidência, vez que se encontram presentes os requisitos ensejadores, senão tese comprovada documentalmente e corroborada por súmula:
Agravo de Instrumento. Direito Tributário. ICMS. serviço de energia elétrica. legitimidade ativa do consumidor e passiva do estado do Rio de Janeiro. Matéria sob exame que foi objeto da arguição de inconstitucionalidade nº. 2005.017.00027, tendo o E. Órgão Especial deste Tribunal de Justiça declarado a inconstitucionalidade do art. 14, VI, item “2” e VIII, item “7” do Decreto nº. 27.427/2000, por ofensa aos princípios da seletividade e essencialidade. Questão da alíquota incidente que se resolve pela simples aplicação do regulamento do ICMS, que prevê a alíquota genérica de 18% (art. 14, I, Decreto nº. 27.427/2000). fundo de combate e erradicação à pobreza. manutenção da alíquota de 5%. incidência de ICMS na prestação do serviço de energia elétrica. Pretensão de suspensão da exigibilidade do tributo sobre a fase de transmissão (TUST) e de distribuição (TUSD) da energia elétrica, assim como dos valores cobrados a título de “encargos setoriais” e “tributos”. Decisão recorrida que deferiu a tutela de evidência. ICMS que deve incidir sobre o valor da tarifa de energia efetivamente consumida pelo contribuinte. Inteligência da súmula nº. 391 do superior tribunal de justiça, editada após o julgamento do Resp. 960476/SC (tema 63), sob a sistemática dos recursos repetitivos. Fases de transmissão (TUST) e distribuição (TUSD) que compreendem o deslocamento da energia e não constituem fato gerador do ICMS. Precedentes do Superior Tribunal de Justiça e desta E. Corte. Cobrança de “encargos setoriais” e “tributos” que deve ser suspensa por não se referirem à demanda de energia efetivamente utilizada. Orientação em sentido contrário, recentemente adotada pela 1ª turma daquela corte (Resp. 1.163.020/RS), que não deve prevalecer. Apertada maioria. Prevalência da posição consolidada do superior tribunal de justiça. Ausência de significativa mudança no contexto fático que deu origem aos precedentes. Preservação do princípio da segurança jurídica. Reforma da decisão recorrida. Provimento do recurso.
(TJ-RJ – AI: 00299133220178190000 RIO DE JANEIRO NOVA IGUACU 5 VARA CIVEL, Relator: MARÍLIA DE CASTRO NEVES VIEIRA, Data de Julgamento: 21/06/2017, VIGÉSIMA CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 23/06/2017).
Outrossim, há o entendimento de que a tutela de evidência deve ser aplicável, por analogia, nos casos de violação a direito líquido e certo motivado por abuso de poder de uma autoridade pública. No precedente abaixo [30] fora afastado a necessidade de periculum in mora para concessão de liminar em mandado de segurança em função da aplicabilidade de tutela de evidência por jurisprudência consolidada.
DECISÃO. Trata-se de mandado de segurança, com pedido de liminar, objetivando provimento jurisdicional que determine à Autoridade impetrada que aprecie e julgue a Manifestação de Inconformidade, no prazo de 20 (vinte) dias. O Autor alega, em síntese, que Manifestação de Inconformidade nos autos do processo administrativo fiscal em 26 de julho de 2014, encontrando-se o pedido em andamento, conforme extrato de movimentação processual de fl. 111. Dessa forma, sustenta haver violação a direito líquido e certo, vez que já se esgotou o prazo assinalado no artigo 24 da Lei federal n. 11.457, de 2007, que é de 360 (trezentos e sessenta) dias, em razão do que ajuíza a presente ação de mandado de segurança. Juntou documentos (fls. 15/118). É O RELATÓRIO. DECIDO para a concessão da medida liminar, nos termos do artigo 7º, inciso III, da Lei federal n. 12.016, de 2009, faz-se necessária a presença de dois requisitos, quais sejam: (i) a relevância do fundamento; e (ii) a possibilidade de ineficácia da medida, se ao final concedida. Embora este juízo tenha sempre entendido pela inexistência de periculum in mora que justifique liminar para apreciação célere de pedidos administrativos de restituição ou ressarcimento, o novo Código de Processo Civil passou a admitir tutela de evidência pautada em jurisprudência consolidada, art. 311, II, o que entendo aplicável ao mandado de segurança, por analogia. A questão discutida nestes autos foi objeto de julgamento em incidente de recursos repetitivos […]
[…] Consoante se verifica dos fatos narrados na inicial, pretende a Impetrante a análise de Manifestação de Inconformidade desde 26 de julho de 2015, sob o fundamento de que a demora da administração é ilegal. O ordenamento jurídico garante ao contribuinte o direito ao serviço público eficiente e contínuo, não podendo ver seu direito de petição aos Poderes Públicos prejudicado diante da inércia da autoridade administrativa, sob pena de violação a direito individual protegido pela Constituição Federal em seu artigo 5º, XXXIV, “a”. Nesta perspectiva, o princípio da eficiência, introduzido na Carta Magna por meio da Emenda Constitucional nº 19, de 04 de junho de 1998, impõe ao ente público a busca constante pelo bem comum, através do pleno exercício de suas prerrogativas com imparcialidade, transparência, eficácia, buscando a otimização no desempenho de suas funções, visando critérios que maximizem a utilização de recursos públicos, evitando, assim, o desperdício, garantindo uma rentabilidade social. De outra sorte, a Lei n.º 11.457/2007, que dispõe sobre a Administração Pública Federal, prevê no art. 24 que a Administração fica obrigada a emitir decisão em todos os processos administrativos de sua competência, no prazo de 360 (trezentos e sessenta) dias a contar do protocolo de petições, defesas ou recursos administrativos do contribuinte. Por conseguinte, na medida em que a Manifestação de Inconformidade foi apresentada em de julho de 2015, tenho que restou configurada a ilegalidade do ato, em razão do que a medida de urgência deve ser deferida. Posto isto, DEFIRO A LIMINAR, a título de tutela de evidência, para determinar à Autoridade impetrada que analise e decida acerca da Manifestação de Inconformidade apresentada em 26 de julho de 2015 nos autos do processo administrativo fiscal n. 11610.010.442/2008-68, em 30 dias, contados da intimação desta decisão, passíveis de interrupção em caso de intimação do Impetrante para apresentação de documentos que sejam necessários, reiniciando o curso a partir de seu atendimento […].
Ante as teses expostas, percebe-se que o instituto da tutela à evidência no âmbito do direito tributário já vem conquistando adeptos e que os tribunais pátrios já admitem a aplicação nos casos mencionados no presente artigo, inclusive com entendimentos consolidados e teses firmadas em sede de incidente de recursos repetitivos.
O novo Código de Processo Civil buscou adequar o sistema processual cível aos princípios constitucionais, facilitando o acesso à jurisdição, tornando o processo mais justo e mais célere. Dentre as inovações a adesão da tutela provisória, sem dúvida, é a de maior magnitude. Por meio desta foi possível favorecer uma parte da lide que se encontra em situação de urgência na satisfação de seu direito ou de ameaça que o direito evidente seja exaurido. Desse modo, o contraditório é diferido para que o juiz possa decidir de maneira mais adequada à realidade fática da situação jurídica controvertida. Assim, evita-se que a demora do processo afete ou agrave o dano já experimentado pela parte que pleiteia a tutela provisória.
Dentre as duas espécies, destacou-se a importância da tutela de evidência no ordenamento jurídico brasileiro e uma de suas hipóteses de aplicação, qual seja: concessão de tutela de evidência em função das alegações de fato que possuam incontroversibilidade fática documental corroboradas com tese firmada em julgamento de casos repetitivos ou em súmula vinculante.
Esta hipótese de tutela de evidência é aplicável ao processo tributário e tem o condão de suspender a exigibilidade do crédito, haja vista que é necessário que seja feita uma interpretação analógica, com fulcro em princípios constitucionais, do artigo referente a este tema do Código Tributário Nacional, de modo a permitir, além da tutela de urgência, a de evidência. Outrossim, entende-se cabível liminar em mandado de segurança, sob o regime da tutela de evidência na hipótese supra, para que seja suspensa a exigibilidade do crédito tributário.
Por conseguinte, conclui-se que, no Brasil, o instituto da tutela de evidência, embora recente, já apresenta adesões em ações tributárias com intuito de fazer com que o Fisco se abstenha de cobrar o crédito tributário. Em contraposição, nota-se que, diante dos argumentos e dos precedentes judiciais colacionados, a aplicação da tutela de evidência ao direito tributário ainda é tímida e pode ser plenamente usada pelos operadores do direito.
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[1] SENADO FEDERAL. Código de processo civil e normas correlatas. 11 ed. Brasília: Senado Federal, Coordenação de Edições Técnicas, 2015.
[2] THEODORO JUNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil. 58 ed, v. 1. Rio de Janeiro: Forense, 2017.
[3] ROMANO, Rogério Tadeu. Os interditos e as tutelas cautelar e antecipatória no âmbito do processo civil brasileiro. Disponível em: <https://jus.com.br/artigos/52185/os-interditos-e-as-tutelas-cautelar-e-antecipatoria-no-ambito-do-processo-civil-brasileiro>. Acesso em: 22 mar. 2018.
[4] ROMANO, Rogério Tadeu. Op cit. p. 2.
[5] GORON, Lívio Goellner. Tutela Específica de Urgência: antecipação da tutela relativa aos deveres de fazer e de não fazer. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2013.
[6] BONATO, Giovanni. Tutela anticipatoria di urgenza e sua stabilizzazione nel nuovo c.p.c brasiliano: comparazione con il sistema francese e con quello italiano. Revista da AGU, Brasília, v. 15, n. 04, p. 11-64, nov./dez., 2016. Disponível em: <https://seer.agu.gov.br/index.php/AGU/article/viewFile/888/752>. Acesso em: 21. mar. 2018.
[7] MOZZATTO, Natália Rosa. Novo Código de Processo Civil: reflexos da tutela de evidência no processo tributário. In: III CONGRESSO CATARINENSE DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL, 2017. Anais… Florianópolis: UNIVALI, 2017. p. 133-153.
[8] PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Comentários ao Código de Processo Civil, 5 ed. Rio de Janeiro: Forense, 1999.
[9] THEODORO JUNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil. 58 ed, v. 1. Rio de Janeiro: Forense, 2017.
[10] CÂMARA, Alexandre Freitas. O novo processo civil brasileiro. 2 ed. São Paulo: Atlas, 2016.
[11] RAATZ, Igor; ANCHIETA, Natascha. Tutela antecipada, tutela cautelar e tutela da evidência como espécies de tutela provisória no novo código de processo civil. Revista Eletrônica de Direito Processual – REDP, v. 15, n. 15, 2015. Disponível em: <http://dx.doi.org/10.12957/redp.2015.16873>. Acesso em: 06 abr. 2018.
[12] CATUNDA, Camila Vergueiro. Tutelas provisórias no CPC/2015 e as lides tributárias. Disponível em: <http://www.ibet.com.br/download/Camila-Vergueiro.pdf>. Acesso em: 23 mar. 2018.
[13] CÂMARA, Alexandre Freitas. O novo processo civil brasileiro. 2 ed. São Paulo: Atlas, 2016.
[14] DIDIER JUNIOR, Fredie; BRAGA, Paula Sarno; OLIVEIRA, Rafael Alexandria de. Curso de direito processual civil. 12 ed, v. 2. Salvador: JusPodivm, 2018.
[15] MOZZATTO, Natália Rosa. Novo Código de Processo Civil: reflexos da tutela de evidência no processo tributário. In: III CONGRESSO CATARINENSE DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL, 2017. Anais… Florianópolis: UNIVALI, 2017. p. 133-153.
[16] THEODORO JUNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil. 58 ed, v. 1. Rio de Janeiro: Forense, 2017.
[17] CÂMARA, Alexandre Freitas. O novo processo civil brasileiro. 2 ed. São Paulo: Atlas, 2016.
[18] MOZZATTO, Natália Rosa. Novo Código de Processo Civil: reflexos da tutela de evidência no processo tributário. In: III CONGRESSO CATARINENSE DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL, 2017. Anais… Florianópolis: UNIVALI, 2017. p. 133-153.
[19] MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. 22 ed. Fortaleza: Malheiros, 2003.
[20] CATUNDA, Camila Vergueiro. Tutelas provisórias no CPC/2015 e as lides tributárias. Disponível em: <http://www.ibet.com.br/download/Camila-Vergueiro.pdf>. Acesso em: 23 mar. 2018.
[21] CALDAS, Filipe Reis. A tutela de evidência e seus reflexos no âmbito do direito tributário. In: Âmbito Jurídico, Rio Grande, XIX, n. 153, out 2016. Disponível em: <https://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=17932&revista_caderno=26>. Acesso em 23 mar. 2018.
[22] BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Agravo regimental no recurso especial – AgRg no REsp 1192182/PR. Relator: ministro Hamilton Carvalhido, primeira turma. DJ: 24/08/2010. JusBrasil, 2010. Disponível em: <https://stj.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/17016033/peticao-de-recurso-especial-resp-1210085>. Acesso em: 04 abr. 2018.
[23] CALDAS, Filipe Reis. A tutela de evidência e seus reflexos no âmbito do direito tributário. In: Âmbito Jurídico, Rio Grande, XIX, n. 153, out 2016. Disponível em: <https://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=17932&revista_caderno=26>. Acesso em 23 mar. 2018.
[24] ALEXANDRE, Ricardo. Direito Tributário. 11 ed. Salvador: JusPodium, 2007.
[25] ALEXANDRE, Ricardo. Op. Cit. p.474
[26] CONRADO, Paulo Cesar. Tutela de evidência de Mandado de Segurança afeta direito tributário. Disponível em: <http://www.conjur.com.br/2016-mai-25/paulo-conrado-tutela-evidencia-ms-afeta-direito-tributario>. acesso em: 23 mar. 2018.
[27] MOZZATTO, Natália Rosa. Novo Código de Processo Civil: reflexos da tutela de evidência no processo tributário. In: III CONGRESSO CATARINENSE DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL, 2017. Anais… Florianópolis: UNIVALI, 2017. p. 133-153.
[28] BRASIL. Tribunal de Justiça de São Paulo. Agravo de instrumento nº 20927231420178260000-SP, proc. nº 2092723-14.2017.8.26.0000. Relator: Spoladore Dominguez. DJ: 07/06/2017. JusBrasil, 2017. Disponível em: <https://tj-sp.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/469064260/agravo-de-instrumento-ai-20927231420178260000-sp-2092723-1420178260000?ref=juris-tabs>. Acesso em: 04 abr. 2018.
[29] BRASIL. Tribunal de Justiça do estado do Rio de Janeiro. Agravo de instrumento nº 00299133220178190000-RJ. Relator: Marília de Castro Neves Vieira, DJ: 21/06/2017. JusBrasil, 2017. Disponível em: <https://tj-rj.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/471377459/agravo-de-instrumento-ai-99133220178190000-rio-de-janeiro-nova-iguacu-5-vara-civel>. Acesso em: 04 abr. 2018.
[30] BRASIL. Tribunal Regional Federal da Segunda Região. Despacho. Processo nº 0022290-61.2016.4.03.6100. DJ 24/10/2016 p. 76/84. Justiça Federal Seção Judiciária de São Paulo, 2016. Disponível em: <http://www.jfsp.jus.br/foruns-federais/>. Acesso em: 04 abr. 2018.
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