Resumo:A adolescência é um período conturbado e confuso na mente do jovem, onde o adolescente busca a sua autoafirmação pessoal, o seu desenvolvimento psicológico e social enquanto pessoa até atingir a fase adulta, passando por questionamentos e transtornos inerentes a esse momento próprio da sua vida, dentre os quais, encontram-se os conflitos de personalidade, as mudanças na sua química cerebral, bem como em seu sistema hormonal, além de sua sensação de onipotência.A partir daí, a temática a ser abordada neste artigo versa sobre a figura do “adolescente infrator”, em especial, como àquele jovem na fase da adolescência que transgride a Lei, e que é penalizado por isso e ao mesmo tempo deve ser ressocializado com vista ao convívio social e familiar, inserido dentro de políticas públicas determinadas pelo Estado, as quais estão obrigatoriamente normatizadas no Estatuto da criança e adolescente (ECA).
Palavras-chave: adolescente infrator; adolescência; ECA;ressocialização; direito.
Abstract: Abstract: Adolescence is a turbulent and confusing time in the mind of a young teen where he pursues his own self-assertion, their psychological and social development as a person until reaching adulthood, through questioning and confusion inherent in this very moment of its life, among which are personality conflicts, changes in their brain chemistry as well as on your hormonal system, besides his sense of omnipotence. From there, the topic to be discussed in this paper focuses on the figure of the " offending adolescent ", in particular, as that young man in adolescence that breaks the law, and is penalized for it and at the same time should be with resocialized view of the social and family, socializing inserted within public policies determined by the State, which are mandatory in normalized status of children and adolescents (ACE).
Keywords :adolescent offender ; adolescence; ACE ; resocialization ; law.
Sumário: Introdução. 1. Adolescente Infrator. 2. Medidas Sócio-educativas de Meio Aberto.3.Políticas Públicas. Conclusão. Referências.
Introdução:
A Constituição de 1988 proporcionou a criação das condições necessárias para a elaboração do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), afastando-se da doutrina da situação irregular para se vincular à doutrina da proteção integral, pela qual toda criança ou adolescente é considerado sujeito de direitos e por se encontrar em fase especial de desenvolvimento, necessita, portanto, da proteção do Estado, conforme o art. 4º da Lei nº 8.069/90:“ É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária”.
Com a publicação do ECA em 1990, surge uma nova doutrina de entendimento com relação ao adolescente infrator, pois essa legislação considerada uma das mais modernas do mundo, institui uma série de mecanismos legais de constituição e formação desse sujeito interligadas entre os vários campos do saber científico, (direito, psicologia, medicina, biologia, pedagogia, educação) os quais produzem as suas próprias verdades diante desse adolescente, gerando efeitos em toda a sociedade.
Os princípios fundamentais do ECA afirmam que crianças e adolescentes são prioridade absoluta, sujeitos de direitos e pessoas em fase especial de desenvolvimento. A prioridade absoluta engloba a primazia de receber proteção e socorro em todas as circunstâncias, a precedência do atendimento nos serviços públicos ou de relevância pública, a preferência na criação e execução das políticas sociais públicas e a destinação privilegiada de recursos públicos nas áreas relacionadas à proteção da infância e da juventude.
1. Adolescente Infrator:
O adolescente autor da prática de qualquer “infração penal” (pois legalmente o ECA atribui esse termo jurídico para o jovem com menos de 18 anos que comete “crimes” assim tipificados pelo código penal) é visto como um delinqüente, um marginal, ou um “anormal” conforme Michel Foucault, como àquele que se desvia da norma, que precisa ser normalizado, controlado, disciplinado por este Biopoder, o qual sujeita os corpos a um tipo de controle determinado pela norma, pela lei.
E para tanto, segundo Foucault, essa governamentalidade estigmatiza e coloca estereótipos nesse jovem delinqüente, com o discurso do indivíduo marginalizado socialmente, que mora na favela, não alfabetizado, sem estrutura familiar, pobre, já diagnosticado pelas ciências do saber humano, como um potencial problema a ser corrigido.
Veiga Neto apud Damico (2011, p. 182) diz que “a norma no mesmo tempo que individualiza, remete ao conjunto dos indivíduos, por isso, ela permite que esses indivíduos sejam comparados”. Portanto, ao compararmos os adolescentes infratores com o conjunto de adolescentes na sociedade, considera-se anormal àquele cuja diferença (desvio de conduta, comportamento) em relação á maioria passou a ser excessiva, insuportável, fora da lei, e da normalidade.
Para normalizar e resgatar esse adolescente desviante, o ECA instituiu as chamadas medidas sócio – educativas, visando à recuperação social do infrator. As medidas sócio-educativas fazem parte de toda uma estratégia de política pública, onde se mostra ao adolescente a sua responsabilidade comunitária e social por extensão e à comunidade a sua responsabilidade por este adolescente. Entre essas medidas, está a de liberdade assistida considerada de meio aberto (ao contrário da internação, que é de meio fechado), que do objetivo pedagógico, visa inserir o adolescente no sistema educacional e no mercado de trabalho, além de possibilitar uma maior aproximação com sua família e comunidade de modo a produzir uma ruptura com a prática de delitos.
Conforme preceitua o ECA, os adolescentes em conflito com a lei, em razão de sua conduta, podem ser julgados e condenados, de acordo com o devido processo legal, às medidas protetivas e sócio-educativas, variando conforme a gravidade e reincidência do ato infracional, podendo cumprir pena em regime de internação por até três anos, mesmo que completem a idade de 18 anos no decorrer do período de cumprimento dessa pena. De acordo com o art. 121 do ECA, "A internação constitui medida privativa da liberdade, sujeita a princípios de brevidade, excepcionalidade e respeito à condição peculiar da pessoa em desenvolvimento". E ainda, segundo o art. 123, parágrafo único, "Durante o período de internação inclusive provisória, serão obrigatórias atividades pedagógicas".
Nas unidades de internação, existem profissionais das mais diversas áreas do saber, os quais inseridos em uma equipe multidisciplinar trabalham com os adolescentes e tornam-se as pessoas mais próximas desses sujeitos em virtude da convivência diária com os mesmos, sendo importantes peças na mediação dos valores e das normas da sociedade da qual estão apartados. Espíndula e Santos (2004, p. 2) em seus estudos acerca das representações sobre a adolescência a partir da ótica dos educadores sociais de adolescentes em conflito com a lei propõem resultados, os quais fornecem subsídios para uma proposta de intervenção a partir da discussão das práticas educativas cotidianas, de forma que haja um rompimento com a lógica de um determinismo biológico existente no modo de os agentes de desenvolvimento social conceber a adolescência, sobretudo o adolescente infrator. Analisando a Lei de Execução Penal (LEP) e o Código Penal dos Países Ocidentais, assim como o discurso prisional predominante, percebe-se que objetivo maior é o de recuperação do infrator, mesmo que o objetivo da punição não seja abandonado, entretanto, ao se examinar, os procedimentos disciplinares e pedagógicos dos presídios e dos centros de atendimento sócio-educativo, evidencia-se a incompatibilidade entre os dois tipos de atribuições. Para Foucault"as prisões não se destinam a sancionar a infração, mas a controlar o indivíduo, a neutralizar a sua periculosidade, a modificar as suas disposições criminosas" (Julião, 2010, p. 3).
2. Medidas Sócio-educativas de Meio Aberto:
Estudos em onze estados brasileiros tem comprovado a eficácia das medidas de meio aberto como a de liberdade assistida, a de prestação de serviços à comunidade e a de semi – liberdade, as quais apresentam custos inferiores à internação e índices mais baixos de reincidência infracional. Todas essas experiências bem sucedidas foram permeadas pela criatividade, pelo envolvimento da família, da comunidade, das autoridades e pelo reconhecimento de que o jovem em conflito com a lei se encontra em uma fase de seu desenvolvimento e que, sendo-lhe oferecidos os meios propícios, poderá superar a prática de infrações.
Os arts. 118 e 119 do ECA apontam a possibilidade da medida sócio-educativa de liberdade assistida, desde que esta se torne a mais adequada para o adolescente infrator que cometeu atos infracionais de maior gravidade, mas que não comportam a privação total da liberdade. Este jovem será acompanhado e orientado no sentido que o mesmo fortaleça seus vínculos familiares, bem como com seu grupo de convivência e comunidade, de forma a produzir um projeto de vida capaz de romper com a prática de delitos. Nesse caso será designada pessoa capacitada para acompanhar o processo, que poderá ser recomendada por entidade ou programa de atendimento e cumpre a mesma promover o devido acompanhamento do adolescente e sua família, inserindo-os, se necessário, em programas oficiais de auxílio e assistência social, como também matriculá-lo em escola regular e supervisionar o desempenho escolar do assistido, buscar profissionalizá-lo e inseri-lo no mercado de trabalho, retornando essas atividades por meio de relatório à autoridade judiciária competente.
3. Políticas Públicas:
O Estado que governa, é responsável pela implantação de políticas públicas, segundo os princípios legais do ECA, impondo na prática meios governamentais para que essas medidas de recuperação social do adolescente atinjam a finalidade que se espera evitando uma maior reincidência delitiva. A educação e as práticas esportivas direcionadas aos jovens afiguram-se como meios eficientes para sua reinserção ao convívio social, pois ainda que normalizados, são pessoas em construção, sendo vítimas de abusos familiares e desrespeitados em seus direitos básicos como cidadão até chegar à idade adulta.
E ainda, segundo Damico (2011, p. 140), todas as práticas educativas, esportivas, pedagógicas que visam recuperar o jovem, são políticas de segurança pública, pois querem evitar a continuidade e reincidência do cometimento de crimes. Podemos e devemos considerar que a produção de verdades atribuída pelas ciências, e também pelo Biopoder como um todo, gera efeitos imediatos na constituição dos sujeitos, no caso os jovens na condição de infratores, onde a política de segurança pública direcionada para ressocialização obedece a um modelo de governamento estatal, que impõe na prática em prol da população a mudança de comportamentos e algum tipo de controle, ainda que positivo, de modo a estabelecer um discurso quase unânime de uma aparente verdade absoluta, onde poderíamos destacar a criminalização dos adolescentes problemáticos.
As políticas públicas de ressocialização do jovem enfatizam a educação e a profissionalização como ferramentas importantes na construção deste novo indivíduo, ao qual devem ser dadas condições plenas de reestruturação psíquica e familiar e de reinserção social, através de sua compreensão individualizada e particularizada, a fim de resgatá-lo enquanto ser humano e sujeito em sintonia com o momento histórico.
Em todos os casos a educação torna-se o meio mais viável de condicionar o adolescente a novas condutas que o levarão à reinserção social. As famílias desestruturadas figuram como agravante impeditivo de sua reestruturação associado ao sentimento de onipotência inerente a essa fase do desenvolvimento, que se constituem em aspectos negativos da adolescência. Entretanto, cada vez mais se percebe que a justiça e a polícia são responsáveis pela regulação de condutas e comportamentos, mas também a autoridade parental tornou-se objeto de política pública e da economia política, pois as famílias são induzidas a participarem dos programas sociais, tal como, bolsa família e com isso tornarem-se incluídas. É um processo pedagógico, visto que envolve mudança de comportamentos e interfere nas escolhas individuais de forma a afastar o núcleo familiar da ociosidade, da vagabundagem, dos delitos e das infrações (Damico, 2011, p. 140). Também se encaixam nesta conjectura os projetos sociais de esporte e lazer que atingem crianças e jovens pobres, os quais são ações de responsabilidade social da iniciativa privada, dos governos e das ONGs e dos organismos internacionais (UNESCO e UNICEF).
De modo geral, como se afirmou anteriormente, a educação representada pela escola enquanto instituição de captura, figura como a política social mais adequada para recuperação e reinserção social destes jovens em conflito com a norma legal. O seqüestro destes adolescentes seria uma forma de ordená-los e discipliná-los, docilizando – os seus corpos e também suas mentes, cujo objetivo maior do Estado é diminuir a violência e melhorar a segurança pública, além de tornar estas juventudes aptas a atenderem às necessidades do mercado.
Estratégias como “Amigos da Escola” e “Mais Educação” aproximam as famílias da instituição escolar, promovem ocasião de emprego de mão de obra ociosa como trabalhadores voluntários e fazem com que o jovem reconheça este espaço como seu lócus social, onde possa canalizar toda gama de sentimentos contestatórios inerentes à adolescência, expressar-se culturalmente, praticar esportes e, principalmente, desviar-se da criminalidade.
Conclusão:
Torna-se necessário também discutir a escola, a educação como promovedora desta mudança, especialmente no que tange aos jovens infratores sob medida sócio-educativa de liberdade assistida, pois além de já terem cometido o delito ou se desviado da normalidade, ainda permanecem em contato com a sua comunidade, sua família, sua rede social e devem ser reintegrados à sociedade, considerando suas particularidades, desenvolvendo suas potencialidades e competências individuais, a fim de que se transformem em cidadãos plenos.
O que se observa neste contexto, é que são aplicadas práticas governamentais racionais de intervenção dos órgãos oficiais na vida dos jovens infratores, os quais já estão agrupados como potencialmente perigosa assim, esta estratégia de criminalização tem o escopo de garantir a segurança pública, evitando as desordens causadas pela exclusão social (Damico apud Wacquant, 2011, p. 217).
De acordo com Foucault (2008, p. 145): “O Estado de polícia implica em encarregar-se da atividade dos indivíduos até seu mais tênue grão.” Assim, para os adolescentes pobres em geral, a presença da polícia é hostil e representa o abuso de autoridade na forma de agir daquelas pessoas excluídas socialmente, generalizando todos como possíveis suspeitos e criminosos. Essa força de repressão do Estado, a polícia, é muito utilizada pelo poder público, como prática governamental para controle desse grupo da população mais vulnerável, os quais são as juventudes da periferia, estereotipados e rotulados, como “prováveis bandidos”.
Segundo a constatação de Priuli e Moraes (2007, p. 2), o adolescente é autor e vítima da violência, o que corrobora a metáfora do “governo do navio” de Foucault, na qual o mau comportamento deve ser corrigido e inibido em seu próprio contexto, onde esta ação é uma prática de governamento exercida pelo Estado.
A medida sócio-educativa de liberdade assistida poderá ser a melhor escolha para ressocialização desse adolescente, o que significa dizer que o mesmo deve estar integrado em uma política pública global direcionada para a população jovem do município, que coordene e determine vias de comunicação e recursos entre as diversas áreas de atuação como educação, saúde, cultura, esporte, profissionalização, assistência social e o sistema de justiça, interferindo na sua realidade familiar e comunitária, tencionando resgatar, mediante apoio técnico oferecido, as suas potencialidades.
No momento em que se objetiva identificar as potencialidades desse jovem infrator, enquanto sujeito em construção, busca-se individualizá-lo, retirá-lo do estereótipo de anormal, de irrecuperável, e “re-olhá-lo”, voltando a enxergar o ser humano que está à frente com outros olhos, respeitá-lo enquanto pessoa humana e sujeito de direitos, conforme preceitua o ECA e verificar quais as práticas sócio-educativas e culturais adequadas ao seu potencial latente que estão disponíveis para sua reinserção social, como forma de preservação da segurança pública.
Para que as mudanças propostas pelo ECA se efetivem, é preciso que seja modificada a cultura das próprias instituições e sociedade em relação à concepção do adolescente e de seu novo papel institucional e social. O Estatuto da Criança e do Adolescente proporciona a mudança, porém ainda há resistências cotidianas a serem vencidas, no sentido de alcançar o êxito pretendido nos objetivos propostos pelas políticas públicas de ressocialização desse jovem.
Advogado, Pós – Graduado em Direito Público pela Universidade do Sul de Santa Catarina
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