Resumo: A presente resenha trata das inovações no processo licitatório introduzidas pela Lei nº12.462 de 2011, conhecido como Regime Diferenciado de Contratações Públicas, no direito brasileiro. As novas regras aplicam-se às licitações e contratos necessários à realização da Copa das Confederações de 2013 e da Copa do Mundo de 2014; dos Jogos Olímpicos e Paraolímpicos de 2016; das obras de infraestrutura e dos serviços para os aeroportos das capitais dos Estados distantes até 350 kms das cidades sedes desses eventos e, ainda, as ações integrantes do Programa de Aceleração do Crescimento, mais conhecido como PAC, do governo brasileiro. Serão analisadas as regras da Lei nº8.666 de 1993, que trata das normas gerais de licitações na administração pública, e suas diferenças e conflitos com o RDC.
Palavras-chave: Licitações Públicas, Contratos, RDC, Copa, Olimpiadas, PAC.
Abstract: This review deals with innovations in the government procurement process introduced by law no. 12,462 of 2011, known as Differentiated Procurement Regime, in brazilian law. The new rules are applied to procurements and contracts required to carrying out the 2013 Confederations Cup and 2014 World Cup, Olympic and Paralympic Games in 2016, the infrastructure works and services to the airports of the capitals of distant up to 350 kms of the host cities of these events, and also the contracts of the Growth Acceleration Program, better known as PAC, of the Brazilian government. Will be analyzed the rules of law no. 8666 of 1993 which deals with the general rules of government procurement process and their differences and conflicts with the RDC.
Keywords: Governent Procurement, Contracts, RDC, World Cup, Olympics, PAC.
Sumário: Introdução; 1. Novidades quanto ao objeto da licitação; 2. Procedimento licitatório no RDC; 3. Regras aplicáveis aos contratos no âmbito do RDC; 4. Pedidos de esclarecimentos, impugnações e recursos e sanções administrativas; Conclusão
Introdução
O Congresso Nacional, motivado pela urgência em estabelecer novas regras para as licitações e contratos necessários à construção de infraestruturas para os megaeventos a serem sediados no país, criou o Regime Diferenciado de Contratações Públicas (RDC). A Lei 12.462/2011 é uma regulação específica, limitada nos âmbitos objetivo, subjetivo, temporal e espacial, e possibilitou afastar a incidência das normas gerais nas licitações e contratos vinculados aos eventos citados. O âmbito de aplicação do RDC limita-se às novas regras às licitações e contratos necessários à realização da Copa das Confederações de 2013 e da Copa do Mundo de 2014; dos Jogos Olímpicos e Paraolímpicos de 2016; das obras de infraestrutura e dos serviços para os aeroportos das capitais dos Estados distantes até 350 kms das cidades sedes desses eventos e, ainda, as ações integrantes do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). Possui como principal objetivo ampliar a eficiência nas contratações públicas e a competitividade entre os licitantes e sua adoção afasta as normas contidas na Lei 8.666/1993.
Os princípios aplicáveis ao RDC (art. 3º) são os mesmos previstos na Lei Geral, tendo como novidade os princípios da economicidade, eficiência e do desenvolvimento nacional sustentável. As diretrizes que orientam as licitações e contratos do RDC (art. 4º), tais como a padronização de instrumentos convocatórios e minutas de contratos, o parcelamento e a padronização dos objetos das contratações, e a busca da maior vantagem para a Administração, entre outros, não contrariam a Lei Geral e podem constar de qualquer legislação específica de licitações e contratos. Algumas dessas diretrizes constam da própria Lei Geral (art. 3º, art. 11, art. 15, IV, art. 23, § 1º).
1. Novidades quanto ao objeto da licitação
O orçamento com estimativa do valor da contratação pode ser fornecido apenas após o encerramento da licitação (art. 6º), possuindo caráter sigiloso durante o certame, fase em que somente aos órgãos de controle interno e externo seria franqueado acesso a tal documento. O sigilo vigorará até o fim do processo licitatório, quando o orçamento se tornará público. Nesse ponto, a Lei do RDC choca-se com os arts. 3º, § 3º (veda o sigilo, sendo públicos e acessíveis os atos do procedimento licitatório); art. 40, § 2º, II (que dispõe constituir anexo do edital do certame, orçamento estimado em planilhas de quantitativos de preços unitários); art. 44, § 1º (veda qualquer elemento, critério ou fator sigiloso, secreto, subjetivo ou reservado que possa, mesmo indiretamente, afetar a igualdade entre os licitantes), da Lei nº 8.666, de 1993.
A Lei 12.462/2011autoriza a indicação de marca ou modelo nos instrumentos convocatórios (art. 7º), se formalmente justificada para a padronização do objeto; a marca ou modelo forem os únicos capazes de atender às necessidades da entidade contratante, sendo comercializados por mais de um fornecedor; a descrição da marca ou modelo se destinar simplesmente à melhor identificação do objeto, permitida a oferta de produto similar ou de melhor qualidade. Neste caso, o RDC apenas detalha previsões genéricas do art. 7º, § 5º da Lei 8.666. Além disso, permite a Administração exigir dos licitantes amostra do bem, certificação da qualidade do produto ou do processo de fabricação, inclusive sob o aspecto ambiental, e carta de solidariedade do fabricante.
Outra novidade que a lei trouxe é a contratação integrada (art. 9º). Inspirado no regulamento de procedimento licitatório simplificado da Petrobras (Decreto nº 2.745/98), o novo regime de execução de obras e serviços de engenharia aglutina em um só procedimento a elaboração e o desenvolvimento dos projetos básico e executivo, a execução de obras e serviços de engenharia, a montagem, a realização de testes, a pré-operação e todas as demais operações necessárias e suficientes para a entrega final do objeto (art. 9º, § 1º). Ou seja, incube ao contratado a execução das obras e serviços e as etapas prévias de elaboração e desenvolvimento dos projetos básico e executivo correspondentes. Este dispositivo contraria a Lei Geral em seu art. 7º, § 2º, I e II (as obras e os serviços somente poderão ser licitados quando houver projeto básico aprovado pela autoridade competente e disponível para exame dos interessados em participar do processo licitatório, e existir orçamento detalhado em planilhas que expressem a composição de todos os seus custos unitários) e, também, seu art. 40, § 2º, I e II (são anexos do edital, dele fazendo parte integrante, o projeto básico e/ou executivo, com todas as suas partes, desenhos, especificações e outros complementos).
A Lei do RDC prevê, também, a possibilidade de remuneração variável (art. 10), vinculada ao desempenho da contratada, com base em metas, padrões de qualidade, critérios de sustentabilidade ambiental e prazo de entrega definidos no instrumento convocatório e no contrato, observando-se o limite orçamentário fixado pela Administração Pública para a contratação. Também possibilita facultar a contratação de mais de uma empresa para a prestação do mesmo serviço (art.11), nos casos em que o objeto seja passível de execução de forma concorrente e simultânea, havendo conveniência para a Administração.
2. Procedimento licitatório no RDC
Uma inovação no procedimento é a inversão das fases de habilitação e julgamento . A Lei prevê como regra a realização do julgamento das propostas anteriormente à habilitação. E, quando prevê a “inversão de fases”, refere-se ao mesmo procedimento da Lei Geral quando a habilitação precede o julgamento. O julgamento das propostas previamente à habilitação, que até então era aplicado somente à modalidade pregão, tem significado uma economia de tempo e de recursos e possibilita desarticular estratégias protelatórias de licitantes mal intencionados, que se valem de todos os recursos para excluir do certame, ainda na fase de habilitação, concorrentes capazes de apresentar propostas mais vantajosas para a Administração, inclusive pela via judicial.
Sobre os instrumentos convocatórios das licitações (art. 15), a lei fixa prazos para apresentação das propostas, contados a partir da publicação do edital que são inferiores aos previstos na Lei nº 8.666, criando um conflito entre a Lei Geral e a legislação especial. Segundo a doutrina, isso invalidaria esta última, que só poderia ampliar tais prazos. Nas concorrências julgadas pelos critérios de melhor técnica ou técnica e preço, ou quando se adota o regime de empreitada integral, o RDC prevê prazo máximo de 30 dias úteis entre a publicação do edital e a apresentação das propostas, enquanto na Lei Geral é de 45 dias. Quanto a publicação do instrumento convocatório (art. 15 §§ 1º e 2º), a lei faculta a divulgação diretamente aos fornecedores dos bens e serviços e, ainda, a publicação de extrato do edital em jornal diário de grande circulação, validando a divulgação em internet.
Os critérios de julgamento possíveis do RDC (arts. 18 a 23) trazem como novidade o critério de maior desconto, de conteúdo artístico e de maior retorno econômico, além de aumentar o número de hipóteses possíveis na utilização dos critérios de técnica e preço e de melhor técnica. Sobre as causas de desclassificação das propostas (art. 24), prevê que serão desclassificadas as propostas que contenham vícios insanáveis, sem especificar o que são, e determina a desclassificação de propostas que apresentem preços manifestamente inexequíveis. Sobre a determinação do que seja ou não exequível (art. 24 § 3º), segundo o qual no caso de obras e serviços de engenharia, para efeito de avaliação da exequibilidade e de sobrepreço, serão considerados o preço global, os quantitativos e os preços unitários considerados relevantes, conforme dispuser o regulamento.
Os critérios de desempate das propostas (art. 25) diferem dos da Lei 8.666 ao incluir anteriormente na ordem de importância dois novos critérios: uma disputa final entre os licitantes empatados, que poderiam apresentar nova proposta fechada, e, ainda, uma avaliação de desempenho contratual prévio dos licitantes. A nova Lei, em confronto com a lei geral, permite a negociação de melhores condições com o autor da proposta de menor preço (art.26), com o intuito de reduzir o seu valor, de forma a que não exceda o orçamento prévio da Administração. O RDC prevê, ainda, fase recursal única para as licitações (art. 27), nos moldes do que se dá na modalidade de pregão.
Como procedimentos auxiliares das licitações no âmbito do RDC, são previstos a pré-qualificação permanente, o cadastramento, o sistema de registro de preços e o catálogo eletrônico de padronização. A pré-qualificação de que se trata esta lei difere da Lei Geral, que apenas prevê como admissível em concorrências em que se exija uma qualificação técnica especial e superior à necessária a atividades normais, devendo justificar-se a adoção da pré-qualificação perante as peculiaridades do objeto licitado. A pré-qualificação do RDC assemelha-se ao cadastro da modalidade de tomada de preços da Lei 8.666. É possível a Administração promover certames restritos aos licitantes pré-qualificados (art. 30, § 2º), cabendo a regulamento definir em que condições isso se dará para que não atente ao caráter competitivo das licitações.
3. Regras aplicáveis aos contratos no âmbito do RDC
Os contratos no âmbito do RDC são regulados pelas normas da Lei nº 8.666. A incidência desta última só é afastada quando o RDC dispor expressamente em contrário. Por exemplo, caso haja recusa do licitante vencedor em celebrar o contrato e de os licitantes remanescentes não aceitarem celebrá-lo nas condições da proposta vencedora, é facultada à Administração, a convocação dos licitantes remanescentes, na ordem de classificação, obedecidas as condições ofertadas por estes, desde que o respectivo valor seja igual ou inferior ao orçamento estimado para a contratação. Na Lei Geral, quando ocorre a mesma situação (art. 64, § 2), só há autorização para a Administração revogar a licitação ou a convocar os licitantes remanescentes, na ordem de classificação, para fazê-lo em igual prazo e nas mesmas condições propostas pelo primeiro classificado.
O RDC também permite a contratação, para a execução de remanescente de obra, serviço ou fornecimento de bens, em decorrência de rescisão contratual, dos participantes das licitações das quais se originaram os contratos rescindidos, observadas a ordem de classificação e as condições por eles ofertadas (art. 41), desde que não seja ultrapassado o orçamento estimado para a contratação. A Lei 8.666 só admite a dispensa de licitação nas mesmas circunstâncias, submetendo-a à aceitação das mesmas condições oferecidas pelo licitante vencedor.
Ao versar sobre a duração dos contratos, o RDC permite que a vigência daqueles cujo objeto sejam obras previstas no Plano Plurianual se estenda durante por todo o período do plano (art. 42). Permite, ainda, a vigência dos contratos para a prestação de serviços contínuos celebrados pelos entes públicos no âmbito do RDC se estender até a data de extinção da Autoridade Pública Olímpica (art.43). Segundo a Lei nº 12.396, de 21 de março de 2011, a APO será extinta em 31 de dezembro de 2018, podendo ter sua existência extendida por até dois anos mais. Como a Lei Geral (art. 57, II) traz o limite de 60 meses para duração de contratos de serviços contínuos, os contratos celebrados com base no RDC poderão ultrapassar o prazo máximo fixado pela Lei Geral.
4. Pedidos de esclarecimentos, impugnações e recursos e sanções administrativas
Sobre os pedidos de esclarecimentos, impugnações e recursos, o RDC se diferencia da Lei Geral aumentando de 2 para 5 dias úteis antes da abertura das propostas a data limite para impugnação do edital, e reduzindo de 10 para 5 dias úteis o prazo para interposição de recurso contra decisão que declare a inidoneidade do contratado.
O RDC prevê nova sanção administrativa, que assemelha-se a declaração de inidoneidade da Lei Geral, acarretando o impedimento de licitar e contratar com a Administração Pública, nas três esferas da Federação. A nova sanção é limitada a 5 anos, diferenciando-se da declaração de inidoneidade da Lei geral que vigorará enquanto perdurarem os motivos determinantes da punição ou até ocorrer a reabilitação.
Por fim, a Lei 12.462/2011 dispõe que sua aplicação é imediata (art.65) às contratações relativas aos Jogos Olímpicos e Paraolímpicos de 2016, antes mesmo da definição da Carteira de Projetos Olímpicos pela APO, se imprescindível ao cumprimento das obrigações assumidas perante os Comitês Olímpico e Paraolímpico Internacional, e fundamentada pelo órgão ou ente público contratante.
Conclusão
Segundo o art. 22, XXVII, da Constituição Federal, é da União a competência legislativa para instituir normas gerais de licitação e contratação, em todas as modalidades (grifo próprio), para as administrações públicas diretas, autárquicas e fundacionais da União, Estados, Distrito Federal e Municípios. O conceito de norma geral já foi objeto de estudo de diversos doutrinadores, entretanto não há segurança quando se trata de caso concreto estabelecer esta definição às normas constantes de uma legislação editada pelo Congresso Nacional. Moreira Neto resume as normas gerais como regras nacionais, uniformemente aplicáveis a todos os entes públicos; que devem ser uniformes para todas as situações homogêneas; e não podem entrar em pormenores ou detalhes nem, muito menos, esgotar o assunto legislado.
A Lei 12.462/2011 estabelece disciplina diferenciada para os procedimentos e contratos necessários nas perspectivas objetiva e temporal dos “megaeventos”. Esta lei não altera as licitações e contratos dos entes federados em geral, mas apenas dos entes onde serão realizados os eventos e construída a infraestrutura necessária à sua realização, ou seja, numa perspectiva subjetiva e espacial. Para o autor De Rezende (2011), as normas contidas no RDC não são gerais e, portanto, o legislador federal não possui competência para editá-las, salvo se dirigidas exclusivamente à administração pública federal. O RDC, entretanto, autoriza que seja afastada a aplicação da Lei Geral de Licitaçõe e estabelece regras sobre modalidades, tipos de licitação, prazos processuais mínimos aplicáveis a objetos definidos ad hoc que serão válidas apenas para alguns entes federados. Como as normas gerais são vinculantes para todos os entes federados, inclusive a União, isto representaria uma subversão do sistema de distribuição de competências idealizado pelo constituinte de 1988 .
A análise de De Rezende conclui que há violação de princípios da Administração Pública como a isonomia, ao admitir aplicação de regimes jurídicos díspares para contratações similares, a depender da exclusiva e subjetiva decisão da Administração Pública em determinado momento. Além de violar a moralidade administrativa, porque a nova lei chancela, no lugar de limitar, a atividade arbitrária do Administrador. Portanto, o legislador federal não poderia afastar a incidência das normas gerais sobre licitações realizadas por órgãos da União ou de outros entes federados específicos.
Advogado e mestrando do Programa de Pós-graduação em Direito e Políticas Públicas da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro
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