Sumário: 1 – Intróito. 2 – Modalidades. 3 – Legislação
aplicável. 4 – Conceito e natureza
jurídica da locação de coisas. 5 – O sistema adotado pela lei nº 8.245/91. 6 – Locação residencial. 6.1 – Com prazo certo igual ou superior a
trinta meses, contratada por escrito. 6.2 – Com prazo indeterminado ou inferior
a trinta meses. 7. Locação não-residencial. 7.1 – Locação
comercial com direito à renovatória. 7.2 – Outras locações livres. 8 – Locação
para temporada. 9 – Outros aspectos importantes. 9.1 – Alienação do imóvel
durante a locação. 9.2 – morte do locador e do locatário. 9.3 – Separação e
divórcio do locatário. 9.4 – Cessão, sublocação e empréstimo do imóvel em locação.
1. Intróito
O presente estudo tem por escopo fazer uma
exposição, ainda que resumida, dos aspectos principais da locação do imóvel
urbano, de acordo com a Lei nº 8.245/91. Não faremos, todavia, aqui, uma
análise exaustiva do assunto, assim como não trataremos, também, dos aspectos
processuais decorrentes do exame desta espécie contratual, consagrados pela
chamada Lei do Inquilinato. Procuraremos, destarte, tão-somente contribuirmos
para um maior entendimento do instigante tema, elucidando-o mediante linguagem
clara e didática o quanto possível.
2. Modalidades
Podemos identificar três modalidades
de locação:
– A locação de coisas,
que iremos analisar doravante;
– A locação de serviços,
que no Direito moderno, apesar de ainda tratada pelo novo Código, foi absorvida
em parte pelo contrato de trabalho, disciplinado pela legislação trabalhista;
– A locação de obra,
que resultou no moderno contrato de empreitada.
3. Legislação aplicável
O nCC trata quase que seguidamente
destas três aludidas espécies contratuais. A locação imobiliária é disciplinada
pela chamada Lei do Inquilinato – Lei nº 8.245/91, após vários diplomas legais
haverem regulado a matéria, agora revogados pela nova Lei.
As disposições do nCC acerca da
locação de coisas se aplicam aos bens móveis e, somente supletivamente, aos
imóveis, quando não houver disposição específica pela Lei do Inquilinato.
O art. 1º da Lei 8.245/91 aponta
quais são as locações que continuam a ser reguladas pelo CC e pela legislação
especial:
1. de bens dos entes federativos
e das respectivas autarquias e fundações públicas. O fundamento para esta
vedação é o interesse público, que não permite que suas locações sujeitem-se ao
regime privado.[1] É
de se salientar que as sociedades de economia mista e empresa pública, porque
de Direito Privado, submetem-se às regras da Lei do Inquilinato;
2. de vagas autônomas de garagem.
Não se excluem, porém, as vagas ou espaços de estacionamento ligados a uma
locação de imóvel. Destarte, desde que não haja qualquer vinculação com o
imóvel locado, as disposições acerca do contrato de garagem é que serão
aplicadas;[2]
3. dos espaços de publicidade.
É o que ocorre com qualquer espaço publicitário em prédio alheio, que deverá
estar submetido às regras do poder de polícia que a ordem jurídica, nos arts.
29 e 30 da Constituição, mediante lei votada pelo corpo legislativo, concede às
Autoridades Municipais na regulação do interesse local;
4. as locações referentes aos apart-hotéis,
hotéis residência e equiparados. Sílvio Venosa entende que nestas
modalidades de moradia, o que há é contrato de hospedagem e não de locação, sob
o argumento de que o pagamento é feito na forma de diárias e não de aluguel. A
importância desta distinção está em que, uma vez não acolhida pela Lei do
Inquilinato, a relação de hospedagem não sujeita a parte contratante à ação de
despejo, sendo cabível ação possessória para a restituição do imóvel;[3]
5. o arrendamento mercantil (leasing).
O fundamento de sua exclusão do âmbito da Lei 8.245/91 é o de que o
pagamento que se faz nestes casos não é mero aluguel, podendo também servir de
pagamento parcial do bem arrendado. Não bastasse esta significante diferença, o
instituto é regulado por lei própria – Lei nº 6.099/74, regulamentada pela
Resolução nº 351/75 do Banco Central.
Relevante salientar que
encontram-se, ainda, fora do alcance da Lei do Inquilinato a locação de bens
móveis, com já observamos, assim como os imóveis rurais, entendidos
estes últimos conforme sua destinação e não de acordo com a sua localidade. Em
suma, a Lei 8.245/91 se aplica aos imóveis urbanos destinados à residência ou à
atividade comercial.
4. Conceito e natureza jurídica
da locação de coisas
O nCC, em seu art. 565, conceitua
locação de coisas como o contrato através do qual “uma das partes se obriga
a ceder a outra, por tempo determinado, ou não, o uso e gozo de coisa não
fungível, mediante certa retribuição”. A locação de gozo envolve, além do
uso, a apropriação, também, dos frutos. No caso de locação somente do uso da
coisa, o contrato se aproximará do comodato, com a significante diferença da
remuneração. Não podem ser objeto de locação coisas consumíveis pelo uso, tais
como energia elétrica, gás, calor etc. O termo arrendamento pode ser
utilizado como sinônimo de locação, sendo aquele utilizado entre nós com
mais freqüência às locações imobiliárias rurais
A locação possui natureza jurídica
de contrato bilateral, comutativo, oneroso, consensual, de relação duradoura
e não solene.
É bilateral pois cria
obrigações recíprocas para ambas as partes. A importância prática desta
característica é a possibilidade de se invocar o princípio da exceção de contrato
não cumprido, consubstanciado nos arts. 476 e 477 do nCC; é comutativo
porque as obrigações são de plano conhecidas dos contratantes no momento da
conclusão da avença; é oneroso, vez que exige dispêndio de ambas as
partes, sendo aluguel o
termo utilizado para representar o valor da retribuição pela locação. Note-se
que se a cessão da coisa for a título gratuito, o contrato será o de comodato;
é negócio consensual porque independe da entrega da coisa para que se
aperfeiçoe. Assim, o locador obriga-se a ceder a coisa, mas a tradição não é
essencial ao negócio; é contrato de relação duradoura (ou de execução
continuada), sendo-lhe essencial o decurso de prazo, seja determinado ou
não; é, também, não solene uma vez que a lei não lhe exige forma
especial, podendo ser verbal, conquanto na Lei do Inquilinato o contrato
escrito conceda maior proteção ao inquilino.
Há certa digressão doutrinária
acerca da caracterização do contrato de locação como intuitu personae,
haja vista as disposições restritivas a respeito da cessão e sublocação. Sílvio
Venosa ressalta que “sem dúvida há acentuado conteúdo de confiança pessoal
depositada na pessoa do locatário”.[4]
Para Orlando Gomes, porém, a locação é contrato impessoal, sob o
fundamento de que “a morte de qualquer dos contratantes não o extingue.
Admite, ademais, a cessão”.[5]
5. O sistema adotado pela Lei nº
8.245/91
A Lei do Inquilinato pode ser sistematizada em três
grupos distintos de locação, que nortearão o presente estudo:
Locação residencial, subdividida em: a) com prazo certo igual ou
superior a trinta meses, contratada por escrito; b) com prazo indeterminado ou
inferior a trinta meses.
Locação não-residencial, subdividida em: a) locação comercial com direito
à renovatória; b) outras locações livres.
Locação especial, tendo por objeto imóveis destinados à temporada.[6]
6. Locação residencial
6.1 com prazo certo igual ou superior a trinta
meses, contratada por escrito
As principais características desta forma de
locação residencial resumem-se em:
a) direito
de retomada no vencimento, independentemente de motivação (denúncia vazia);
b) inocorrência
de prorrogação legal obrigatória após o vencimento;
c) ocorrendo
a prorrogação tácita, ainda assim ficará assegurada a possibilidade de denúncia
vazia ao locador, desde que este notifique o locatário no prazo de 30 dias.
Assim, estabelece o art. 46 da Lei 8.245/91 que nos
casos de locação com prazo certo igual ou superior a trinta meses, contratada
por escrito, a resolução ocorrerá findo o prazo estipulado, independentemente
de notificação ou aviso. No entanto, findo o contrato e permanecendo o
locatário no imóvel locado por mais de 30 dias sem oposição do locador,
ocorrerá a prorrogação tácita da locação por prazo indeterminado, mantidas as
demais cláusulas e condições do contrato (art. 46, par. 1º da Lei 8.245/91).
Neste último caso, poderá o locador reaver o imóvel a qualquer tempo, porém,
com a exigência de que notifique previamente o locatário, concedendo prazo de
30 dias para a desocupação. Destarte, nesta forma de locação, findo o contrato
por prazo determinado, o locador tem o prazo de 30 dias para ajuizar ação de
despejo, sob pena de ficar obrigado a notificar o locatário.
6.2 com prazo indeterminado ou inferior a trinta
meses
Os efeitos principais desta modalidade de locação
residencial são os seguintes:
a) ocorrência de prorrogação legal compulsória após o
vencimento;
b) o direito de retomada depende de motivação (denúncia
cheia) e só é possível nos casos elencados na Lei;
c) a denúncia vazia somente será admitida após
05 anos de vigência ininterrupta da locação (art. 47, V).
Assim, nas locações avençadas com prazo
indeterminado ou inferior a trinta meses, com a exceção do inciso V do art. 47,
não há a possibilidade de denúncia imotivada do contrato, operando, com isso, a
sua prorrogação automaticamente. Somente poderá ocorrer a retomada justificadamente na forma de um dos
cinco incisos do art. 47, quais sejam:
I – nas hipóteses do art. 9º: (I) por mútuo
acordo; (II) em decorrência da prática de infração legal ou contratual; (III)
em decorrência da falta de pagamento do aluguel e demais encargos; (IV) para a
realização de reparações urgentes determinadas pelo Poder Público, que não
possam ser normalmente executadas com a permanência do locatário no imóvel, ou
podendo, ele se recuse a consenti-las.
O distrato permite o desfazimento de
qualquer relação contratual, autorizando, desta forma, o despejo. Quanto às infrações
legais ou contratuais, os deveres e do locador e do locatário estão
estampados na lei nos arts. 22 e 23. Evidentemente, se a infração for do
locador esta permitirá somente eventual indenização ao inquilino e não o
despejo, que se refere às infrações do locatário. A obrigação de pagar
aluguel é descrita no art. 23, I, sendo essencial ao contrato de locação.
No que toca às reparações urgentes no imóvel determinadas pelo Poder Público,
deve o inquilino não só consentir com a realização dos reparos emergenciais
como também comunicar esta necessidade ao locador.
II – em decorrência de extinção do contrato de
trabalho, se a ocupação do imóvel pelo locatário estiver relacionada com o seu
emprego.
Nesta hipótese a norma procurou envolver zeladores,
vigias, porteiros etc. Desfeito o vínculo trabalhista, abre-se ensejo ao
despejo. No art. 59, par. 1º, II, abre-se a possibilidade de despejo liminar
nestes casos, evitando-se que o empregador tenha que tolerar ex-empregado no
local até a sentença.
III – se for pedido para uso próprio, de seu
cônjuge ou companheiro, ou para uso residencial de ascendente ou descendente
que não disponha, assim como seu cônjuge ou companheiro, de imóvel residencial
próprio.
Importante fazer-se a distinção de uso próprio,
que refere-se à qualquer utilização que se faça do imóvel, residencial ou não,
e de uso residencial, i. e., exclusivamente residencial. A lei permite a
retomada do imóvel justificada no primeiro caso somente ao próprio locador, seu
cônjuge ou companheiro. Para ascendente ou descendente a finalidade deve ser o
uso exclusivamente residencial. A jurisprudência já fixou entendimento de que,
neste último caso, a norma se aplica também aos afins, permitindo que os sogros
do locador sejam beneficiados (JTACSP 106/403, 106/411).
IV – pedido para demolição e edificação
licenciada ou para a realização de obras aprovadas pelo Poder Público, que
aumentem a área construída em, no mínimo, vinte por cento ou, se o imóvel for
destinado a exploração de hotel ou pensão, em cinqüenta por cento.
Esta hipótese de desfazimento da locação não se
confunde com aquela consubstanciada no inciso III do art. 9º. Isto porque,
neste art. 47, IV, a demolição, edificação ou reforma no prédio locado dá-se
por iniciativa do locador e não do Poder Público. Importante notar que a lei
exige não só a demolição como também a ulterior edificação, preenchidos os
requisitos de acréscimos mínimos do imóvel.
V – se a vigência ininterrupta da locação
ultrapassar 05 (cinco) anos.[7]
Este inciso cuida da denúncia imotivada da locação,
na modalidade ora estudada. Destarte, caso tenha o locador preferido locação
verbal ou, se por escrito, por período inferior a 30 meses, deverá aguardar os
cinco anos para poder, imotivadamente, despejar o seu inquilino.
7. Locação não-residencial
7.1 locação comercial com direito à renovatória
O fundamento principal desta modalidade de locação
é proteger o fundo de comércio, o ponto, em uma palavra: o aviamento. Desta
forma, previnem-se os lucros cessantes derivados da interrupção da atividade e
da necessidade de se deslocar o estabelecimento.
Importante salientar que o direito à renovação é
norma cogente, de expressa disposição pelo art. 45, não sendo possível a
dispensa pelas partes de seus efeitos.[8]
O art. 51 da Lei 8.245/91 fixa os requisitos
necessários para a renovação, assegurando-a ao empresário que explora o mesmo
ramo de atividade econômica por, no mínimo, três anos consecutivos, em imóvel
locado por escrito e por prazo determinado mínimo de cinco anos, computadas as
renovações sucessivas.[9]
A lei estende a proteção também às indústrias e
sociedades civis com fins lucrativos, desde que, por óbvio, preencham os
requisitos legais.
A renovação compulsória, se impossível a
consensual, será possível mediante ajuizamento de ação renovatória pelo
empresário-locatário no prazo decadencial que compreende o período de um ano no
máximo a seis meses no mínimo imediatamente anteriores ao término do contrato em vigor. A legitimidade
ativa para a propositura da ação se estende ainda aos cessionários ou
sucessores da locação e, no caso de sublocação total do imóvel, o direito à
renovação somente poderá ser exercido pelo sublocatário (art. 51, par. 1º, Lei
8.245/91).
O art. 52 trata das hipóteses em que o locador não
estará obrigado a renovar o contrato de locação:
I – se por determinação de Poder Público tiver
que realizar no imóvel obras que importarem na sua radical transformação; ou
para fazer modificação de tal natureza que aumente o valor do negócio ou da
propriedade.
O fundamento desta possibilidade de não-renovação
do imóvel reside, na primeira hipótese, na eventual sanção a ser imputada ao
locador em caso de descumprimento de determinação oficial do Poder Público. Na
segunda hipótese, a conveniência do locador em retomar o prédio locado com o
escopo de promover sua valorização, maximizando o seu valor.
II – se o imóvel vier a ser utilizado por ele próprio ou para
transferência de fundo de comércio existente há mais de um ano, sendo detentor
da maioria do capital o locador, seu cônjuge, ascendente ou descendente.
Aqui, o locador pode
retomar o imóvel para uso próprio, ou seja, até mesmo para uso exclusivamente residencial,
se o imóvel assim comportar. Para as demais pessoas arroladas neste inciso, é
necessário que a retomada se destine ao requisito exigido pela lei.
Importante analisarmos as
exceções que se opõem ao inciso transcrito. Assim, na hipótese descrita, o
imóvel não poderá ser destinado ao uso do mesmo ramo do locatário, salvo se a
locação também envolvia o fundo de comércio, com as instalações e pertences,
como se sucede, e.g., com postos de serviços e abastecimento de automóveis.
Outra exceção à norma aludida diz respeito às locações de espaço em shopping
centers, que não são abrangidas pelo dispositivo. Nestes casos, o locador
não poderá se opor à renovação com fundamento no inciso II do art. 52.
Afora esta hipóteses
legais, o locador poderá opor-se à renovação se comprovar melhor proposta de
terceiro. Abre-se, contudo, ao locatário replicar se aceita as condições
propostas para a melhor locação, caso em que obterá direito à renovação
pretendida, eliminando o fato obstativo.
O parágrafo terceiro do
art. 52 da Lei 8.245/91 estabelece, ainda, que o locatário terá direito à
indenização para ressarcimento dos prejuízos e dos lucros cessantes que tiver
que arcar com mudança, perda do lugar e desvalorização do fundo de comércio, se
a renovação não ocorrer em razão de proposta de terceiro, em melhores
condições, ou se o locador, no prazo de três meses da entrega do imóvel, não
der o destino alegado ou não iniciar as obras determinadas pelo Poder Público
ou que declarou pretender realizar.
Em síntese, caso seja julgada
procedente a pretensão renovatória, mantém-se a locação, devidamente
atualizada; julgada improcedente, desfaz-se a locação, com ou sem direito a
indenização, conforme o caso.
7.2 outras locações livres
Distinção importante a se fazer, no que toca às
locações não-residencias, refere-se ao fato de estarem acobertadas ou não pela
ação renovatória. Caso a resposta seja negativa, o contrato submeter-se-á aos
princípios gerais da Lei 8.245/91, sujeitando-se à denúncia imotivada após
findo o prazo determinado.[10]
A lei mantém, portanto, a regra geral da denúncia
vazia para os imóveis não residenciais, não fazendo maiores restrições para
o exercício do direito de retomada do locador.[11]
Por outro lado, no tocante às locações celebradas
com hospitais, estabelecimentos de saúde e de ensino, templo religiosos, a Lei
é ainda mais protetiva no que toca à rescisão do contrato do que naquelas
locações acobertadas pela ação renovatória.
Neste
contexto, o art. 53 da Lei 8.245/91 traça as condições especiais para o
eventual desfazimento do vínculo locatício que envolva estabelecimentos desta
natureza, de evidente significância social e humanitária, exigindo, para a sua
rescisão, que ocorra as situações descritas no já estudado art. 9º (I),
caindo-se na vala comum de todas as locações; ou se o locador pedir o imóvel para demolição,
edificação licenciada ou reforma que venha a resultar em aumento mínimo de
cinqüenta por cento da área útil (II).
Nas precisas palavras de Sílvio Venosa: “a lei
parte para uma grande restrição ao direito de propriedade e suprime destas
locações o sistema ordinário do art. 56, qual seja, a denúncia vazia das
locações não residenciais. Trata-se de proteção maior que a conferida pela ação
renovatória, uma vez que a permanência da locação independe de qualquer
iniciativa do locatário. Também o prazo
de desocupação, quando decretado o despejo nas situações permitidas, é mais
elástico (art. 63, par. 3º)”.[12]
8. Locação para temporada
O artigo 48 da Lei 8.245/91 considera locação para
temporada aquela destinada à residência temporária do locatário, para
prática de lazer, realização de cursos, tratamento de saúde, feitura de obras
em seu imóvel, e outros fatos que decorrem tão-somente de determinado tempo, e
contratada por prazo não superior a noventa dias, esteja ou não mobiliado o
imóvel.
Esta forma de locação do imóvel urbano refere-se a
situações transitórias, salvaguardando os interesses de ambos os contratantes e
fornecendo instrumentais necessários para coibir fraudes.
Importante aspecto da locação para temporada é a
necessariedade de contrato escrito, uma vez que a lei exige, para esta
modalidade, prazo determinado. Caso seja ajustada verbalmente, o contrato
amoldar-se-á às regras do art. 47. O mesmo se sucederá caso o locatário
permaneça no imóvel além do prazo permitido e sem oposição do locador.[13] Aqui, é mantida a relação locatícia, mas com
modificação de sua causa.
Podem haver situações, porém, que façam relativizar
a exigência legal de prazo máximo para a locação para temporada, como nos casos
de locação para tratamento de saúde em que, e. g., contrariamente ao previsto
pelas partes, se estendeu além dos noventa dias fixados pela norma. A matéria,
porém, merece maiores cuidados no caso concreto.
A peculiaridade desta forma de locação diz respeito
à forma de pagamento que permite, excepcionando a regra geral, que o aluguel e
demais encargos sejam pagos e recebidos antecipadamente,[14]
levando-se em conta ser contrato de curta duração.
9. Outros aspectos importantes
9.1 Alienação do imóvel durante a locação
A alienação do imóvel durante a locação permite a
denúncia do contrato, devendo esta ser exercida no prazo de 90 dias, contados
do registro da venda ou do compromisso, presumindo-se, após este prazo, a
concordância com a manutenção da locação. Esta regra aplica-se a todas as
modalidades de locação, com a exceção daquelas contratadas por prazo
determinado, com cláusula de vigência e devidamente registradas no registro
imobiliário competente. [15]
O fundamento desta orientação legal reside no fato de que o novo adquirente é
estranho ao pacto locatício, salvo o registro imobiliário que faz tornar
público o contrato.
9.2 Morte do locador e do locatário
Tanto a morte do locador quanto a do locatário não
faz desaparecer a relação locatícia. No primeiro caso, a locação transmite-se
aos herdeiros (art. 10); no segundo, a lei elenca a ordem de sub-rogação (art.
11): nas locações com finalidade residencial, o cônjuge sobrevivente ou o
companheiro e, sucessivamente, os herdeiros necessários e as pessoas que viviam
na dependência econômica do de cujus , desde que residentes no imóvel (I); nas
locações com finalidade não residencial, o espólio e, se for o caso, seu
sucessor no negócio (II). A razão da distinção se dá tendo-se em vista o
caráter intuitu familiae do contrato de locação residencial.
Importante observar que a fiança, sendo garantia
pessoal, extingue-se com a morte do locatário, devendo ser apresentada nova
garantia se assim exigir o locador. Outra observação refere-se à ocupação
ilegítima do imóvel em caso de morte do locatário, por pessoas estranhas à
ordem legal. Neste caso, a ação cabível não será o despejo e, sim, a
possessória, pois serão considerados intrusos, não participantes da relação
locatícia.[16]
9.3 Separação e divórcio do locatário
Nas hipóteses de separação ou divórcio a locação se
estenderá com o cônjuge ou companheiro que permanecer no imóvel locado
(art.12), devendo esta sub-rogação ser comunicada por escrito ao locador que
poderá exigir, no prazo de 30 dias, a substituição do fiador ou oferecimento de
nova garantia dentre as admitidas pela lei,[17]
sendo esta, na verdade, a finalidade da comunicação ao locador.
9.4 Cessão, sublocação e empréstimo do imóvel em
locação
Trata-se de vedação legal a transferência do
contrato de locação e a cessão sem o prévio consentimento expresso do locador
(art. 13), podendo, em caso de sublocação não consentida, dar margem à rescisão
da do contrato.
A sublocação, como ocorre com qualquer contrato
derivado, haverá de seguir o contrato-base, não podendo, desta forma, permitir
o que este proíbe. Assim, extinto o contrato-base, seja qual for a sua causa,
serão também extintas as eventuais sublocações, ressalvados direitos
indenizatórios em favor do sublocatário contra o sublocador (art.15). Por fim,
o art. 21 estipula expressamente que o aluguel da sublocação não poderá exceder
o da locação, estando autorizado ao sublocatário reduzi-lo até o valor que
seria permitido.
Bibliografia:
FAZZIO
JÚNIOR, Waldo. Manual de Direito Comercial. 3a ed. São Paulo:
Atlas, 2003.
GOMES, Orlando. Contratos. 18a
ed. Rio de Janeiro: Forense, 1999. (edição atualizada por Humberto Theodoro
Júnior).
PICANÇO.
Melchiades. A força eterna do Direito. Rio de Janeiro: Peneluc, 1996.
SLAIBI FILHO, Nagib. As leis que regem as
locações de prédio urbano no novo Código Civil. Jus Navigandi,
Teresina, a. 7, n. 62, fev. 2003.
http://www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=3791.
VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: contratos em espécie. 2a ed. São Paulo: Atlas, 2002.
Notas:
[1] Nagib Slaibi Filho observa
que “quanto à locação de prédios públicos urbanos, observa-se que a
Constituição de 1988 conferiu às entidades federativas (União, Estados-membros,
Municípios e Distrito Federal – embora este não tenha sido mencionado no
referido parágrafo único) o poder de dispor sobre o regime jurídico de seus
bens inclusive imóveis, o que se pode verificar pela ausência de previsão de
legislação privativa ou complementar da União nos arts. 22 e 24 da Carta Magna.
Mas a Constituição brasileira − instituindo o nosso peculiar Pacto Federativo,
que compreende três esferas governamentais, União, Estados e Municípios −
limita a autonomia legislativa das entidades federativas, pois declara, por
exemplo, que os bens públicos não podem ser usucapidos (art. 183, § 3º, art.
191, parágrafo único) e que as contratações realizadas pelo Poder Público devem
obedecer ao procedimento licitatório (art. 37, XXI)”. As leis que regem as locações de prédio urbano no novo
Código Civil. Jus Navigandi,
Teresina, a. 7, n. 62, fev. 2003. www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=3791.
[2] O
contrato de garagem é contrato complexo e atípico, compreendendo as espécies
contratuais da locação de coisas, do depósito e da prestação de serviços. É
diverso, portanto, do contrato regido pela Lei do Inquilinato.
[3] Direito
civil : contratos em espécie. 2a ed. São Paulo : Atlas, 2002, p.
145. O autor observa, porém, que ainda não há legislação própria cuidando da
matéria
[4] Op. cit., p. 135.
[5] Contratos.
18a ed. Rio de Janeiro : Forense, 1999. (edição atualizada por
Humberto Theodoro Júnior), p. 275.
[6]
Esta a sistematização proposta, dentre outros, por Humberto Theodoro Júnior em
nota de atualização à obra de Orlando Gomes. Contratos. 18a
ed. Rio de Janeiro : Forense, 1999, p. 288-289.
[7]
Sílvio Venosa aponta ser este o dispositivo mais importante do art. 47 da Lei
8.245/91, “sendo um dos dispositivos fundamentais da nova lei em relação à
legislação pretérita”. Op.
cit., p. 149.
[8]
Art. 45. São nulas de pleno direito as cláusulas do contrato de locação que
visem a elidir os objetivos da presente lei, notadamente as que proíbam a
prorrogação prevista no art. 47, ou que afastem o direito à renovação, na
hipótese do art. 51, ou que imponham obrigações pecuniárias para tanto. Afirma
Sílvio Venosa: “não pode o contrato impedir ou dificultar o direito à
renovação, porque qualquer cláusula neste sentido é nula de pleno direito”. Op. cit., p. 152.
[9]
Waldo Fazzio Júnior. Manual de Direito Comercial. 3a ed. São
Paulo : Atlas, 2003, p. 100.
[10]
Art. 56. Nos demais casos de locação não residencial, o contrato por prazo
determinado cessa, de pleno direito, findo o prazo estipulado,
independentemente de notificação ou aviso.
Parágrafo único. Findo o
prazo estipulado, se o locatário permanecer no imóvel por mais de trinta dias
sem oposição do locador, presumir–se–á prorrogada a locação nas
condições ajustadas, mas sem prazo determinado.
Art. 57. O contrato de
locação por prazo indeterminado pode ser denunciado por escrito, pelo locador,
concedidos ao locatário trinta dias para a desocupação.
[11]
Sílvio Venosa explica esta opção legislativa: “a finalidade especulativa, na
maioria das vezes, da locação não residencial, é incompatível com restrição ao
exercício do direito de retomada.” Op. cit., p.
151.
[12] Op. cit., p. 158. Dispõe o art. 63: Julgada procedente a ação de
despejo, o juiz fixará prazo de trinta dias para a desocupação voluntária,
ressalvado o disposto nos parágrafos seguintes:
§ 3° Tratando-se de
hospitais, repartições públicas, unidades sanitárias oficiais, asilos e
estabelecimentos de saúde e de ensino autorizados e fiscalizados pelo Poder
Público, e o despejo for decretado com fundamento no inciso IV do art. 9° ou no
inciso II do art. 53, o prazo será de um ano, exceto nos casos em que entre a
citação e a sentença de primeira instância houver decorrido mais de um ano,
hipótese em que o prazo será de seis meses.
[13]
Art. 50. Findo o prazo ajustado, se o locatário permanecer no imóvel sem
oposição do locador por mais de trinta dias, presumir–se–á
prorrogada a locação por tempo indeterminado, não mais sendo exigível o
pagamento antecipado do aluguel e dos encargos.
Parágrafo único. Ocorrendo
a prorrogação, o locador somente poderá denunciar o contrato após trinta meses
de seu início ou nas hipóteses do art. 47.
[14]
Art. 49. O locador poderá receber de uma só vez e antecipadamente os aluguéis e
encargos, bem como exigir qualquer das modalidades de garantia previstas no
art. 37 para atender as demais obrigações do contrato.
[15]
Art. 8º Se o imóvel for alienado durante a locação, o adquirente poderá
denunciar o contrato, com o prazo de noventa dias para a desocupação, salvo se
a locação for por tempo determinado e o contrato contiver cláusula de vigência
em caso de alienação e estiver averbado junto à matrícula do imóvel.
§ 1º Idêntico direito terá
o promissário comprador e o promissário cessionário, em caráter irrevogável,
com imissão na posse do imóvel e título registrado junto à matrícula do
mesmo. § 2º A denúncia deverá ser
exercitada no prazo de noventa dias contados do registro da venda ou do compromisso,
presumindo – se, após esse prazo, a concordância na manutenção da
locação.
[16] Sílvio
Venosa. Op. cit., p. 162.
[17] Art. 37. No contrato de locação, pode o locador exigir
do locatário as seguintes modalidades de garantia: I – caução; II – fiança; III
– seguro de fiança locatícia.
Parágrafo único. É
vedada, sob pena de nulidade, mais de uma das modalidades de garantia num mesmo
contrato de locação.
Advogado do escritório Fontes, Oliveira, Gonçalves & Navega, no Rio de Janeiro. Bacharel em Direito pela Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ.
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