Resumo: O presente trabalho tem por finalidade a realização de uma análise dos efeitos do assédio moral nas relações de trabalho, com o condão de demonstrar na sequência do estudo, a possibilidade da rescisão contratual de forma indireta, proporcionando o ônus das verbas rescisórias ao empregador/assediador. Primeiramente serão analisadas as origens históricas do assédio moral, seus requisitos e fundamentos, e ainda as suas normas legais vigentes em nosso país. Os subsídios fornecidos neste primeiro momento da pesquisa servirão de base para o estudo da possibilidade da rescisão indireta do contrato de trabalho em virtude da violência exercida sobre o empregado no âmbito de suas atividades laborativas, que serão analisadas em um segundo momento do presente estudo. Exposta a possibilidade da rescisão indireta do contrato de trabalho pelo assédio moral exercido pelo empregador, buscar-se-á a conciliação do estudo do tema apresentado inicialmente e os casos típicos exemplificados através das decisões de nossos Tribunais.
Palavras-chave: Assédio Moral. Relações de Trabalho. Rescisão Indireta do Contrato de Trabalho.
Abstract: This article intends to carry out an analysis of the effects of bullying in labor relations, with the power to show the sequence of the study, the possibility of contract termination indirectly, the burden of providing severance pay to the employer / harasser. First we analyze the historical origins of bullying, its requirements and fundamentals, and even their legal norms in our country. Subsidies provided in this first time of the survey will form the basis for studying the possibility of indirect termination of employment due to the violence against the employee in the course of their work activities, which will be analyzed in a second phase of this study. Exposed the possibility of termination of employment indirect bullying exercised by the employer, will seek to reconcile the study of the topic initially presented and the typical cases exemplified by the decisions of our courts.
Keywords: Bullying. Labor Relations. Indirect Termination of Employment Contract.
Sumário: Introdução. 1. Assédio Moral no ordenamento jurídico. 1.1. Origem histórica. 1.2. Conceito. 1.3. Requisitos e Fundamentos. 1.4. Classificação. 1.5. Efeitos e consequências do assédio moral nos trabalhadores e nas empresas. 1.6. Assédio moral na legislação brasileira. 1.6.1. Assédio moral na Constituição Federal. 1.6.2. Leis Infraconstitucionais. 2. Assédio moral ensejando a rescisão indireta do contrato de trabalho. 2.1. Rescisão Indireta do Contrato de Trabalho. 2.1.1. Conceito. 2.1.2. Hipóteses e Requisitos da Rescisão Indireta do Contrato de Trabalho. 2.1.3. Direitos e deveres das partes contratuais na rescisão indireta. 2.2. Assédio moral como motivo de rescisão indireta do contrato de trabalho. 2.3. Nexo Causal e o Conjunto Comprobatório do assédio moral e sua validade na Justiça Brasileira. 3. Decisões jurisprudenciais e suas contradições. 3.1. Decisões do Tribunal Superior do Trabalho. 3.2 Decisões do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região. Considerações finais. Referências.
INTRODUÇÃO
Diante da histórica luta do homem para melhorar as condições de trabalho, obtivemos inúmeros direitos alcançados. Porém a desvalorização da pessoa humana ainda está presente através de violações e abusos reiterados no ambiente de trabalho, caracterizando o assédio moral.
Apesar do assédio moral no ambiente de trabalho ter surgido juntamente com a organização laboral, a temática está sendo considerada como um grande problema da atualidade nas diversas áreas que abrangem as relações de trabalho.
Juridicamente, as violações de fundamentos e princípios constitucionais e trabalhistas, merecem ser analisadas atentamente. Contemporaneamente nossos juristas e legisladores começam a despertar sobre a gravidade do tema e a necessidade de uma legislação própria para oprimir e prevenir essa violência.
Diante disso, neste trabalho objetiva-se avaliar o assédio moral nas relações de trabalho, incluindo suas disposições legais encontradas em nosso ordenamento jurídico, motivando a rescisão indireta do contrato de trabalho por culpa exclusiva do empregador/assediador.
Assim, buscar-se-á a divulgação das implicações desta violência, mediante fundamentos legais, conceituais e práticos, demonstrando a proteção jurídica abrangida pelo trabalhador vítima do assédio moral nas relações de trabalho e a possibilidade de rescisão do contrato de trabalho de forma indireta.
Com vasta pesquisa bibliográfica e jurisprudencial, buscou-se o embasamento necessário a partir dos principais doutrinadores e pesquisadores do assunto. Apesar de escassa a literatura existente, foi possível explicitar os assuntos mais pertinentes sobre o tema.
O presente trabalho divide-se em três capítulos. O primeiro capitulo trata sobre o assédio moral de forma genérica, com sua origem histórica, conceitos, requisitos, culminando na legislação vigente sobre o tema. O segundo capítulo trata primeiramente da rescisão indireta de forma geral, conferindo maior atenção à possibilidade da rescisão indireta em virtude do assédio moral sofrido pelo trabalhador, tema central deste estudo. Já no terceiro capítulo, encontram-se os casos práticos retirados de nossos Tribunais através de jurisprudências, demonstrando as questões até então estudadas e enfatizadas nas decisões elencadas.
Diante disso, o presente trabalho visa demonstrar a defesa ao trabalhador conferido pelo ordenamento jurídico, com o intuito de coibir a violência moral exercida pelas empresas, atingindo entre outros princípios, o principio da dignidade da pessoa humana.
1 ASSÉDIO MORAL NO ORDENAMENTO JURÍDICO
Em nossa atual conjuntura econômica globalizada, onde figuram as grandes corporações e empresas atuantes em diversos países, privilegia-se a alta produtividade dos trabalhadores e o seu baixo custo, resultando em um ambiente de trabalho hostil, perfeito para a propagação do Assédio Moral.
Apesar de invisível, o assédio moral nas relações de trabalho é um assunto atual que está sendo amplamente discutido, tornando-se uma preocupação social, em virtude dos fortes prejuízos aos trabalhadores, abalando muitas vezes a sua existência, prejudicando sua autoestima, propiciando doenças ou agravando as pré existentes, podendo motivar medidas drásticas como o suicídio, por exemplo.
Este assunto não é novo, pois existe desde que o homem sentiu a necessidade de vender a sua mão de obra. Porém, é considerado como um novo fenômeno advindo das relações de trabalho, em virtude de sua visibilidade e comprovação no cotidiano das empresas, causando inúmeros danos aos trabalhadores e às empresas.
1.1 Origem histórica
O assédio moral acompanha a sociedade desde seu surgimento (AGUIAR, 2006, p. 144). Sua caracterização e seus apontamentos sobre as conseqüências para as relações de trabalho são novos, porém a existência da violência moral existe em nossa sociedade desde o começo das relações de trabalho, quando começou a organizar-se em hierarquias.
A origem do assédio moral nos remete ao inicio da venda da mão de obra pelo homem, coincidindo com a hierarquização do trabalho, sendo fortemente evidenciado através das agressões físicas, geralmente em escravos, mas não apenas limitados a estes.
Em nosso país, não merece aprofundamento que o assédio moral deu-se inicialmente com a escravização, porém, após a instituição da Lei Áurea, no final do século XIX[1], e com a substituição da mão de obra escrava por imigrantes, o método de trabalho e suas relações não se alteraram, pois os maus tratos, humilhações, constrangimentos e inclusive assédio sexual, continuaram de forma indiscriminada.
Com o advento da industrialização, o homem começou a ser substituído por máquinas que realizavam o mesmo serviço, porém a um custo muito mais viável para as empresas. Assim, quando o trabalhador tinha emprego, o seu salário era precário, tendo que se submeter a jornadas altíssimas, condições de higiene degradantes e a submissões de superiores hierárquicos (caracterizando o originário mal feitor no período da escravidão), observando com isso a caracterização do assédio moral. Assim, nesta época não houve qualquer progresso nos direitos trabalhistas.
No começo do Século XX foi criado o trabalho formal, onde eram definidas as tarefas e a remuneração devida. Assim, iniciou-se, as primeiras classes trabalhadoras, com a clara definição de cargos, atribuições e salários.
Logo após, apesar da instituição da maior legislação trabalhista do país, a CLT – Consolidação das Leis Trabalhistas, sancionada pelo então presidente Getúlio Vargas, através do Decreto Lei nº 5.452, em 1º de Maio de 1943 (BRASIL, 1943), reconhecendo ao trabalhador brasileiro os seus direitos de receber benefícios como férias, décimo terceiro salário, Fundo de Garantia por Tempo de Serviço, entre outros, a questão do assédio moral não foi abordado, já que era pouco estudada pelos estudiosos da época e era totalmente desconhecida pelos trabalhadores, que se submetiam a tratamentos desumanos sem conhecer seus direitos.
Mais tarde, já no sistema Capitalista e na globalização, os interesses modificaram a atual conjuntura das relações de trabalho. Igualmente à fase de industrialização, o homem continuou sendo substituído por máquinas mais modernas e que substituíam o seu trabalho, porém com a flexibilidade das leis trabalhistas e com a desvalorização do trabalhador, passou-se a exigir cada vez mais a qualificação do trabalhador em relação as suas competências e habilidades.
Deste modo, a caça por alta produtividade e consequentemente maiores lucros, tem norteado a sociedade para canalizar a importância para os valores econômicos, esquecendo da valorização do trabalhador e acima de tudo de sua dignidade como cidadão.
Voltando à temática central, quanto ao estudo do assédio moral nas relações de trabalho e suas conseqüências para o rendimento do trabalhador e os prejuízos causados à empresa, o tema foi somente discutido a partir da década de 1980, com o primeiro apontamento sobre o tema, realizado pelo médico/psicólogo alemão radicado na Suécia, Heinz Leymann, que denominou o fenômeno de “mobbing” (FERREIRA, 2004).
Cabe salientar que o conceito de “mobbing”, já havia sido utilizado anteriormente por Niko Tinbergen e Konrad Lorenz, em seus estudos com animais, onde analisaram ataques de grupos de animais contra alvos perigosos, por exemplo, predadores. Porém, como citado anteriormente, o termo foi popularizado e especificado para os trabalhadores em meados da década de 1980, pelo psicólogo do trabalho, Heinz Leymann (apud FERREIRA, 2004).
De acordo com a autora Márcia Guedes, os estudos do mobbing, também chamado de Psicoterror, começaram com Heins Leymann, na década de 80:
“[…] foi no começo de 1984 Heinz Leymann publica, num pequeno ensaio científico contendo uma longa pesquisa feita pelo National Board of Occupational Safety and Health in Stokolm, no qual demonstra as conseqüências do mobbing, sobretudo na esfera neuropsíquica, sobre a pessoa que é exposta a um comportamento humilhante no trabalho durante certo lapso de tempo, seja por parte dos superiores, seja por parte dos colegas.” (GUEDES, 2003, p. 27)
Logo após, surgiu a primeira tese de doutorado, na Universidade de Viena, de autoria de Klaus Niedl, vindo a ser novamente discutido pela médica Marie-France Hirigoyen e pelo italiano Harald Ege, na forma de artigos publicados aleatoriamente.
Porém, até a década de 90, os estudos embasavam-se apenas na área de saúde da vítima e em estudos sociológicos que analisavam antes de mais nada, as mudanças de estrutura e as relações da vítima com o ambiente de trabalho. Somente na década de 90 que começou a discussão e o próprio conceito de assédio moral na área trabalhista especificamente.
Na década de 90, mais precisamente no ano de 1992, a jornalista inglesa, Andrea Adams, escreveu o livro sobre o tema, intitulado “Bulling at Work”, levando pela primeira vez o conceito de bulling ao ambiente de trabalho[2].
No ano de 1995, Heinz Leymaann, publicou novos artigos sobre o tema (1996 apud GUEDES, 2003, p.32). Neste estudo, o psicólogo e cientista médico alemão baseou-se em crianças que freqüentavam os primeiros anos escolares e que já manifestavam comportamentos hostis, vindo a se transformar em manifestações agressivas no ambiente de trabalho, vinte anos depois. Esse estudo vanguardista é considerado de extrema importância até os presentes dias, pois além de ser uma realidade que poucos doutrinadores analisaram, ele abarca uma maior lastro de tempo, mostrando a transação das crianças até chegar a titularidade de assediador.
Com essa publicação, Leymann difundiu o resultado de suas pesquisas por toda Europa e mudou os conceitos sobre o tema, incluindo em alguns países a disciplina em centros universitários.
Dois anos após a realização destas pesquisas, mais precisamente em 1998, a psiquiatra e psicanalista francesa Marie-France Hirigoyen lançou o seu best-seller “Le harcèlement moral: la violence perverse au quotidien” que criou um debate mundial sobre o tema e inspirou a realização de muitas pesquisas com a temática. Neste mesmo ano a Organização Internacional do Trabalho publicou um relatório analisando diversas formas de violência no trabalho, adotando a "Declaração da OIT sobre os Princípios e Direitos Fundamentais no Trabalho e seu Seguimento", e elegeu a eliminação de toda e qualquer discriminação na realização de atividades laborativas como princípio e direito fundamental no trabalho, impondo ao mesmo patamar da liberdade sindical e da eliminação do trabalho forçado e infantil.
1.2 Conceito
Primeiramente, cabe estudar separadamente as palavras para definir posteriormente o assédio moral nas relações de trabalho. A palavra assédio, de forma genérica, é uma “insistência impertinente, perseguição, sugestão ou pretensão constantes em relação a alguém” (HOUAISS, 2007).
Já a moral, é um conjunto de normas que regulam o comportamento do homem na sociedade. Estas normas são adquiridas através da educação, tradição e pelo cotidiano (VENOSA, 2004, p. 126). Durkheim nos ensina que a Moral é a “ciência dos costumes”, sendo algo anterior a própria sociedade.
Entretanto, para o nosso estudo esta definição deve ser direcionada especificamente para a área do Direito do Trabalho, onde não se limita a simples perseguições ou pretensões constantes em relação a alguém, pelo simples fato do comportamento ou costume ser diferente.
Cabe salientar ainda, que o conceito exato e delimitado de assédio moral ainda é uma utopia, pois até o presente momento os estudiosos não chegaram a uma exata definição, pois a abordagem do tema é visto sob diversos aspectos e pontos de vista. Objetivamente para o nosso estudo, devemos destacar algumas posições.
Destaca-se inicialmente o entendimento da doutrinadora trabalhista Alice Monteiro de Barros, sobre o assédio moral nas relações de trabalho:
“[…] é uma situação em que uma pessoa ou grupo de pessoas exercem uma violência psicológica extrema, de forma sistemática e freqüente (em média uma vez por semana) e durante um tempo prolongado (em torno de uns 6 meses) sobre outra pessoa, com quem mantém uma relação assimétrica de poder no local de trabalho, com o objetivo de destruir as redes de comunicação da vítima, destruir sua reputação, perturbar o exercício de seus trabalhos e conseguir, finalmente, que essa pessoa acabe deixando o emprego.” (BARROS, 2007, p. 902)
Mobbing ou psicoterror, termos utilizados pelo alemão Heinz Leymann (1996 apud GUEDES, 2003, p.34 ), citados anteriormente para definir o assédio moral, são perseguições ou pressões geralmente exercidas pelo superior hierárquico – porém não exclusivamente, podendo ser de colegas de trabalho do mesmo grau, por se acharem em situação privilegiada, como veremos adiante – de forma contínua, que humilhe a integridade física e/ou mental causando danos psicológicos, não escolhendo classe social, país ou etnia, podendo estar presente em todas as empresas.
Adentrando mais especificamente no assunto, para Leymann, citado por Guedes "a base do assédio moral no local de trabalho é uma situação conflitiva mal resolvida" (1996 apud GUEDES, 2003, p. 34). Ou seja, o assédio moral começa com um desentendimento entre as partes, e acaba se transformando gradativamente em um conflito.
Assim, o assédio moral pode ser definido como o conjunto de atos, gestos, atitudes e comportamentos que, por sua repetição, atentam contra a dignidade ou integridade psíquica ou física de uma pessoa, ameaçando seu emprego ou degradando o clima de trabalho (Hirigoyen, 2002, p. 34).
Segundo a médica do trabalho, Margarida Barreto (2000, p. 22), o assédio moral é como a "exposição prolongada e repetitiva a condições de trabalho que, deliberadamente, vão sendo degradadas. Surge e se propaga em relações hierárquicas assimétricas, desumanas e sem ética, marcada pelo abuso de poder e manipulações perversas".
Em nossos Tribunais do Trabalho, o Assédio Moral é visto como “uma patologia social, exteriorizando-se como uma doença comportamental, a qual gera graves danos de ordem física e psicológica nas vítimas, inviabilizando o convívio saudável no ambiente de trabalho” (MATO GROSSO, 2006).
Uma das maiores estudiosas sobre o presente tema, a francesa Marie-France Hirigoyen, define o assédio moral no trabalho da seguinte forma:
“Por assédio moral em um local de trabalho temos que entender toda e qualquer conduta abusiva manifestando-se sobretudo por comportamentos, palavras, atos, gestos, escritos que possam trazer dano à personalidade, à dignidade, ou à integridade física ou psíquica de uma pessoa, pôr em perigo seu emprego ou degradar o ambiente de trabalho” (HIRIGOYEN, 2006, p. 65)
Retornando à temática que nos pertence, o assédio moral, portanto, são atitudes e comportamentos humilhantes, agressivos, com freqüência predeterminada, que objetivam, acima de tudo, a desmoralização e a desqualificação profissional, agredindo o emocional e a moral do assediado, tornando assim, o ambiente de trabalho hostil, obrigando, muitas vezes, em pedido de demissão como forma desesperadora e única da vítima em se desincumbir das agressões, o que corriqueiramente desencadeia problemas de saúde graves.
1.3 Requisitos e Fundamentos
Após análise em jurisprudências e decisões de nossos Tribunais, conclui-se que já há estabelecidos alguns requisitos para a ocorrência do assédio moral, e aos poucos vão sendo consolidados. Primeiramente, é imprescindível que haja uma violência psicológica extrema sobre o trabalhador. Convém lembrar, que o parâmetro para a medição deste grau de violência, é a pessoa média, trabalhando em um ambiente normal de trabalho, sem qualquer pressão demasiada exercida sobre seus laboro. O assédio deve ser uma agressão insuportável produzindo muito conflito psicológico. A ação ou até omissão, deve derivar sofrimento demasiado e danos ao assediado que podem ser morais ou ainda materiais.
Outro requisito necessário é de que o agressor tenha uma conduta constante, habitual. Deste modo, tem decidido os Tribunais, que o assédio exercido em um episódio isolado, não caracteriza o assédio moral, devendo a conduta ofensiva ao trabalhador se repetir constantemente ao longo de certo período de tempo.
Além disso, associado ao requisito anterior, impõe-se que a ofensa perdure durante certo período de tempo. Não há um período mínimo pré determinado, até por que dependerá da gravidade da conduta do agressor.
Os Tribunais Regionais tem elencado outro requisito, que é o da pessoalidade. Assim, a conduta ofensiva deve ser dirigida a uma determinada pessoa. A exposição à ofensa repetida e prolongada do ofensor de maneira pessoal é necessária para a caracterização. Portanto, as condições adversas da prestação do trabalho não se destinando a um trabalhador pessoalmente, afetando a todos no grupo de trabalhadores indistintamente, não pode ser arguida como assédio moral, estando ausente o requisito da pessoalidade.
A conduta do assediador deve ter o claro objetivo de prejudicar o assediado ou que, pelo menos, este seja tratado negligente ou imprudentemente e sofra o assédio por isso. Analisando as decisões de nossos Tribunais, conclui-se que o objetivo geralmente é causar sofrimento sobre determinado trabalhador, forçando a sair da empresa através do pedido de demissão, desonerando as empresas a pagar as verbas rescisórias. Porém, como veremos adiante, aqui está um dos maiores problemas do assunto, que é provar que há culpa ou dolo na ação do agressor.
O doutrinador Francisco das Chagas Lima Filho aduz que cabe à vítima demonstrar três requisitos básicos, a saber: “a) a qualidade de empregador ou preposto do assediante ou causador do dano; b) a conduta culposa (dolo ou culpa stricto sensu) do empregador ou preposto; c) que o ato lesivo tenha sido praticado no exercício da função que lhe incumbia ou em face dela”. (LIMA FILHO, 2009, p. 107)
Assim, ratificam-se os requisitos apresentados acima, com as jurisprudências abaixo:
“EMENTA" ASSÉDIO MORAL" INDENIZAÇÃO – Na caracterização do assédio moral, conduta de natureza mais grave, há quatro elementos a serem considerados: a natureza psicológica, o caráter reiterado e prolongado da conduta ofensiva ou humilhante, a finalidade de exclusão e a presença de grave dano psíquico-emocional, que comprometa a higidez mental da pessoa, sendo passível de constatação pericial. Por outras palavras, o assédio moral, também conhecido como "terror psicológico", mobbing, "hostilização no trabalho", decorre de conduta lesiva do empregador que, abusando do poder diretivo, regulamentar, disciplinar ou fiscalizatório, cria um ambiente de trabalho hostil, expondo o empregado a situações reiteradas de constrangimento e humilhação, que ofendem a sua saúde física e mental. Restando evidenciado nos autos que o empregador, ao instaurar "Rito de Apuração Sumária", para apurar irregularidades imputadas à reclamante, extrapolou os limites regulamentar que lhe são facultados, expondo a reclamante a um período prolongado de pressão psicológica, além do permitido no Regulamento, devido se torna o pagamento da indenização pleiteada.” (MINAS GERAIS, 2006)
“ASSÉDIO MORAL. Ausente prova da alegada exposição reiterada da reclamante a situações humilhantes no curso do contrato de trabalho a evidenciar a prática de assédio moral pelo empregador, impõe-se manter a sentença que indeferiu a pretensão ao pagamento de indenização correspondente. Recurso ordinário da reclamante que não merece provimento. Assim, não resta atendido requisito essencial à caracterização de assédio moral, qual seja, a prática reiterada de conduta abusiva dirigida à reclamante, no curso do contrato de trabalho, pela colega Neusa, que tenha lhe acarretado danos à personalidade, à dignidade, à integridade física ou psíquica. Embora a testemunha Teresinha tenha visto Neusa e a reclamante discutindo algumas vezes, inclusive dirigindo palavrões uma à outra, tal fato não é suficiente para caracterizá-la dano moral por assédio, pela inexistência de prova de efetivo dano aos direitos da personalidade da reclamante.” “(PORTO ALEGRE, 2010)
“INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. Não estando presentes os requisitos ensejadores da indenização pecuniária por dano moral, ação ou omissão da empregadora, o dano sofrido pelo empregado e o nexo causal, não há falar em indenização por dano moral. O assédio moral caracteriza-se, portanto, pela repetição de condutas tendentes a expor a vítima a situações incômodas ou humilhantes – por exemplo, criticar em público, expor ao ridículo, para forçar o trabalhador a se afastar do trabalho.” (PORTO ALEGRE, 2011)
Diante de um tema recente para nossos Tribunais, a tendência é de que se consolidem os requisitos para a averiguação do assédio moral nas relações de trabalho, tornando-se claros e facilmente perceptíveis.
1.4 Classificação
A doutrina majoritária[3] enumera três formas principais de assédio moral: perseguição vertical, horizontal, ou ainda, mista.
A perseguição vertical, de forma descendente, é a mais comum de ocorrer e se dá quando existe a autoridade formal, onde o agressor – chefe – utiliza o cargo na empresa como meio de impor ordens exageradas ocasionando agressões típicas do assédio moral. Já a forma ascendente é mais difícil ocorrer, mas não raro, e se dá quando há uma equipe de funcionários, e não aceita as ordens de um novo chefe. Diferentemente é a forma horizontal, que se caracteriza quando há colegas do mesmo patamar. É observada quando não se consegue conviver com as diferenças, especialmente quando essas diferenças são destaques na profissão ou cargo ocupado. (HIRIGOYEN, 2002, p.112-114)
A última forma pode ser mista, onde as duas formas citadas anteriormente se manifestam conjuntamente.
O doutrinador Sérgio Pinto Martins, ao classificar o assédio moral é muito mais específico em seus conceitos do que seus colegas doutrinadores, como Hirigoyen e Márcia Novaes Guedes:
“Mobbing vertical é o praticado pelo superior hierárquico. Na Inglaterra, é chamado de bossing ( de boss, chefe ) ou bullying; O mobbing horizontal é feito pelos próprios colegas de um mesmo nível; O mobbing ascendente pode ocorrer quando um grupo de subordinados insurgem-se contra o chefe em razão da forma de chefiar e de utilizar mudanças radicais no sistema de trabalho. As ordens de serviço não são cumpridas e há hostilidades ao chefe; No corporate bullying, o empregador ou superior hierárquico pratica ato contra o subordinado; No client bullying, há perseguição dos destinatários da prestação de serviços; No serial bullying, a perseguição é feita reiteradamente contra todos os colegas de trabalho, sejam subordinados ou colegas de igual nível hieráquico. No gang bullying, há perseguição de um grupo de pessoas contra um indivíduo.” (MARTINS, 2009, p. 43)
O assediador pode ser o superior hierárquico (chefe, na forma vertical), que é a situação mais freqüente, ou ainda, um colega de trabalho (forma horizontal). Em alguns casos, pode ser o próprio subordinado o agressor, agredindo o seu superior hierárquico, normalmente, quando muda a chefia e os subordinados reprovam o novo profissional.
Quanto às vítimas do assédio moral, geralmente não é o simples empregado, sem opinião própria, pelo contrário, como afirma Guedes (2003, p.63 apud OLIVEIRA, 2004, p. 57):
“A vítima do terror psicológico no trabalho não é o empregado desidioso, negligente. Ao contrário, os pesquisadores encontraram como vítimas justamente os empregados com um senso de responsabilidade quase patológico, são ingênuas no sentido de que acreditam nos outros e naquilo que fazem, são geralmente pessoas bem -educadas e possuidoras de valiosas qualidades profissionais e morais. De um modo geral, a vítima é escolhida justamente por ter algo mais. E é esse algo mais que o perverso busca roubar. As manobras perversas reduzem a auto-estima, confundem e levam a vítima a desacreditar de si mesma e a se culpar. Fragilizada emocionalmente, acaba por adotar comportamentos induzidos pelo agressor. Seduzido e fascinado pelo perverso o grupo não crê na inocência da vítima e acredita que ela haja consentido e, consciente ou inconscientemente, se já cúmplice da própria agressão.”
Portanto, o agressor não se preocupa com empregados que não objetivam tomar o seu espaço, e por isso, o alvo dos assediadores é exatamente outro, atingindo trabalhadores com níveis de intelectualidade e objetivos superiores a média dos demais.
1.5 Efeitos e consequências do assédio moral nos trabalhadores e nas empresas
Primeiramente, é sabido que um bom ambiente de trabalho traz reflexos positivos em todos os setores de uma empresa e na qualidade de vida de seus empregados e familiares, abrangendo inúmeras áreas, que mesmo de forma indireta, se relacionam com o ambiente de trabalho de uma empresa.
Diante da importância do ambiente de trabalho, o Constituinte de 88 positivou o direito a um meio ambiente saudável[4], com o intuito de equalizar a relação do homem com o meio ambiente, o que não deixa de se relacionar com o ambiente de trabalho. Como sabemos, o homem passa a maior parte de sua vida no ambiente de trabalho, e neste local ele desenvolve seus atributos pessoais e profissionais. (MELO, 2007, p.13). Aduz, o doutrinador Nehemias Domingos de Melo, que a agressão a este ambiente de trabalho, provoca agressão a toda sociedade, que é quem ao final custeia a Previdência Social, responsável pelo Seguro de Acidentes de Trabalho, mantenedora de benefícios relacionados a acidentes de trabalho ou doenças profissionais a eles equiparadas. (MELO, 2007, p.29).
As conseqüências do assédio moral são sentidas primeiramente pelas vítimas, obviamente, e apesar de ser um risco invisível, é muito concreto do ponto de vista das relações de trabalho e na saúde dos trabalhadores.
André Luiz Souza Aguiar cita, em breves linhas, a definição de Barreto, que “ser assediado moralmente constitui uma experiência subjetiva que interfere em sentimentos e emoções, altera o comportamento, que agrava ou desencadeia doenças, podendo, inclusive, culminar com a morte da vítima”. (AGUIAR, 2006, p.47).
Na já citada obra de Hirigoyen (2006. p.159-182), revela-se que os efeitos iniciais sentido pelos assediados, são estresse, ansiedade, depressão e ainda distúrbios psicossomáticos. Além disso,predominam nas vitimas, sentimentos de humilhação, vergonha, podendo acarretar ainda, modificações psíquicas como paranóias e psicoses.
O médico Mauro Azevedo de Moura afirma que:
“Todos os quadros apresentados como efeitos à saúde física e mental podem surgir nos trabalhadores vítimas de assédio moral, devendo, ser, evidentemente, consideradas como doenças d o trabalho. Os primeiros sintomas são problemas clínicos devido ao estresse […]. Depois, começa a ser afetada a parte psicológica […]. A auto estima da pessoa começa a entrar em declínio […]. “(MOURA, 2002)
Nesse sentido, Barreto (BARRETO, 2000, p.153), em suas pesquisas apresenta alguns dados interessantes:
“[…] ao perderem a identidade de trabalhador, as vítimas de humilhações pedem ao mesmo tempo a dignidade ante o olhar do outro. No abandono, 100% dos homens pensam em suicídio, sendo que 18,3% chegam à situação limite de tentativa de suicídio. Alguns relataram o início de consumo de drogas, como álcool, para esquecer a humilhação sofrida, outros revelaram a reprodução no lar, da violência vivida no trabalho”.
Diante disso, a violência exercida sobre os trabalhadores atinge diretamente a sua dignidade, trazendo todos estes danos não apenas para si, mas para todos os que convivem com este drama.
Como conseqüência para a empresa, os prejuízos se dão em virtude dos danos diretos causados aos assediados/funcionários, e são enormes, financeiramente.
Além de possíveis rescisões contratuais de bons funcionários vitimas de assédio moral, e o pagamento de suas rescisões e danos morais, o assédio moral pode causar a queda de produtividade de inúmeros trabalhadores, afetando consequentemente as vendas e a produção. Cabe salientar outra conseqüência negativa, que é o comprometimento da imagem externa da empresa, a sua reputação junto ao público consumidor e ao próprio mercado de trabalho.
Resumindo, para a empresa, o assédio moral realizado em sua área de trabalho, os prejuízos são apenas financeiros, já para os trabalhadores, os danos podem ser mentais, físicos, ou ainda psicossomáticos, podendo atingir facilmente todas as pessoas que o cercam, como amigos, colegas de trabalho e a sua família.
1.6 Assédio moral na legislação brasileira
Em países Europeus, o assédio moral já está positivado em suas normas há algum tempo. Na Noruega, pioneira em questão de assédio moral, foi regulamentado em 1977, onde proibiu o assédio de forma geral. Na França, adotou-se em 2002, uma série de normas onde se regulamentou o assédio moral nas relações de trabalho, proibindo toda e qualquer forma de discriminação no trabalho, ocasionando ao agressor, entre outras penalidades, até um ano de prisão. Outros países, como Suécia, Bélgica e Alemanha, passaram a editar, na ultima década, normas legais para coibir tal violência.
Em nosso país, o assédio moral é muito recente, e o ordenamento jurídico nacional, não aborda de forma clara e específica a ponto de definir os limites do assédio moral nas relações de trabalho. Não temos leis específicas sobre o tema, apenas leis e artigos que podem ser utilizados de forma analógica. Deste modo os trabalhadores brasileiros assediados não estão totalmente desprotegidos.
No ordenamento jurídico brasileiro, encontramos artigos e leis relacionadas ao presente tema na Constituição Federal, no Código Civil, na Consolidações das Leis Trabalhistas e em leis esparsas. Porém, salienta-se que a competência para julgar toda e qualquer ação voltada às relações de trabalho, é única e exclusivamente à Justiça do Trabalho.
“APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO INDENIZATÓRIA. DANOS MORAIS DECORRENTES DA RELAÇÃO DE EMPREGO. ASSÉDIO SEXUAL. COMPETÊNCIA. 1. A incompetência absoluta deve ser declarada de ofício e pode ser alegada, em qualquer tempo e grau de jurisdição, independentemente de exceção (art. 113, CPC). 2. Em se tratando de dano moral decorrente diretamente da relação empregatícia, competente para a sua apreciação é a Justiça do Trabalho, e não a Justiça Comum Estadual. Inteligência do art. 114, inciso VI, CF/88. SENTENÇA DESCONSTITUÍDA E COMPETÊNCIA DECLINADA EX OFFICIO.” (PORTO ALEGRE, 2009)
1.6.1. Assédio moral na Constituição Federal
Ao analisarmos as conseqüências do assédio moral para os trabalhadores, observamos que esta violência atinge a dignidade da pessoa humana. Pois bem, a nossa atual Constituição Federal de 1988, logo em seu primeiro artigo, inciso II, citou a cidadania como elemento que fundamenta as ações do Estado Brasileiro, elencando também neste artigo o inciso III, a dignidade da pessoa humana, como fundamento para todo ordenamento jurídico brasileiro, incluindo a partir disso, as relações de trabalho. Além disso, neste mesmo artigo, em seu inciso IV, estão elencados os valores sociais do trabalho, como fundamento para nortear todas as organizações estatais.[5]
Como já mencionado neste trabalho, o direito ao meio ambiente sadio também está positivado em nossa Constituição Federal, incluindo, o ambiente de trabalho. Diante disso, o empregador é obrigado constitucionalmente a oferecer um ambiente de trabalho com condições físicas e psicológicas para a boa realização do trabalho, fundamentado no art. 225, caput, da Constituição Federal/88.(BRASIL, 1988)[6]
Além disso, a nossa Carta Magna assegura em seu art. 5º, incisos III, V e X[7], que ninguém será submetido à tortura ou a tratamento desumano ou degradante, considerando invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurando o direito de resposta proporcional ao agravo, além de indenização por dano material, moral ou ainda à imagem.
Nos artigos seguintes, a nossa Constituição Federal/88 (BRASIL, 1988), cita o trabalho como direito social[8], elencando os direitos dos trabalhadores, sem distinguir urbanos de rurais, além de outros que objetivem a melhoria das condições sociais:
“Art. 7º, CF/88: […]
I – a relação de emprego protegida contra despedida arbitrária ou sem justa causa, nos termos da Lei complementar, que preverá indenização compensatória, dentre outros direitos;
XXVIII – seguro contra acidentes do trabalho, a cargo do empregador, sem excluir a indenização a que este está obrigado se incorrer com dolo ou culpa;
XXX- proibição de diferenças de salário, de exercícios de funções e de critérios de admissão do trabalhador portador de deficiência;
XXXIV – igualdade de direitos entre o trabalhador com vínculo
empregatício permanente e o trabalhador avulso”.
No capítulo destinado à Ordem Econômica, a busca pelo emprego a toda a sociedade é o dever de todas as instituições, valorizando sempre o trabalho e a livre iniciativa, assegurando a todos a dignidade conforme a justiça social.
Cabe salientar ainda no artigo 7º, o inciso XXVIII (BRASIL, 1988), que institui o seguro desemprego contra acidentes de trabalho, possibilitando a indenização em caso de dolo ou culpa, o que torna o assédio moral, caracterizado como acidente de trabalho, ensejador de indenização não só na Justiça do Trabalho, mas no Instituto Nacional de Seguridade Social – INSS, podendo ainda, requerer auxílio acidentário.[9]
Destarte, observamos que a Constituição Federal/88 dispõe de diversos direitos e deveres voltados aos trabalhadores, buscando a dignidade de todos e lhe protegendo de discriminações.
Deste modo, para invocar o assédio moral a partir da legislação constitucional, deve-se interpretar o caso concreto aos preceitos aludidos, dando a máxima efetividade para conseguir caracterizar o assédio moral.
1.6.2 Leis Infraconstitucionais
A nossa legislação Trabalhista possibilita[10], de forma subsidiária, a utilização de certos dispositivos do Código de Processo Civil, com destaque à responsabilidade e a reparação indenizatória em casos de danos, incluindo neste, o assédio moral nas relações trabalhistas.
“Art. 186 Aquele que por ação ou omissão voluntária, negligência ou imperícia, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.
Art. 187 Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes.
Art. 927 Aquele que por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem fica obrigado a repará-lo.
Art. 932 São Também responsáveis pela reparação Civil:
III – o empregador ou comitente, por seus empregados, serviçais e prepostos, no exercício do trabalho que lhes competir, ou em razão dele.
Art. 949 No caso de lesão ou outra ofensa à saúde, o ofensor indenizará o ofendido das despesas do tratamento e dos lucros cessantes até o fim da convalescência, além de outro prejuízo que o ofendido prove houver sofrido.
Art. 950 Se da ofensa resultar defeito pelo qual o ofendido não possa exercer seu ofício ou profissão, ou se lhe diminua a capacidade de trabalho, a indenização, além das despesas do tratamento e lucros cessantes até o fim da convalescência, incluirá pensão correspondente à importância do trabalho para que se inabilitou, ou da depreciação que ele sofreu.
Parágrafo único. O prejudicado, se preferir, poderá exigir que a indenização seja arbitrada e paga de uma só vez.
Art. 953 A indenização por injúria, difamação ou calúnia consistirá na reparação do dano que delas resulte ao ofendido.
Parágrafo único. Se o ofendido não puder provar prejuízo material, caberá ao juiz fixar, equitativamente, o valor da indenização, na conformidade das circunstâncias do caso.” (BRASIL, 2002)
Deste modo, a legislação nos permite invocar estes artigos oriundos do Código Civil para casos de assédio moral nas relações de trabalho, independentemente de culpa ou dolo do empregador, sendo que este responderá por todas as ações/omissões de seus funcionários. Cabe salientar, que o empregador poderá nestes casos, ingressar com ação de regresso contra o seu funcionário assediador, para ressarcir seus danos em virtude de ato de seu funcionário, porém não o exime do ressarcimento à vítima.
No seara trabalhista, o art. 483 da Consolidação das Leis Trabalhistas, prevê algumas espécies de rescisão contratual possibilitando ao trabalhador receber todos os direitos e indenizações de uma rescisão por culpa do empregador, em virtude deste faltar com alguma obrigação ou descumprir certos requisitos, conforme citado na norma legal.
“Art. 483 da CLT – O empregado poderá considerar rescindido o contrato e pleitear a devida indenização quando:
a) forem exigidos serviços superiores às suas forças, defesos por lei, contrários aos bons costumes, ou alheios ao contrato;
b) for tratado pelo empregador ou por seus superiores hierárquicos com rigor excessivo;
c) correr perigo manifesto de mal considerável;
d) não cumprir o empregador as obrigações do contrato;
e) praticar o empregador ou seus prepostos, contra ele ou pessoas de sua família, ato lesivo da honra e boa fama;
f) o empregador ou seus prepostos ofenderem-no fisicamente, salvo em caso de legítima defesa, própria ou de outrem;
g) o empregador reduzir o seu trabalho, sendo este por peça ou tarefa, de forma a afetar sensivelmente a importância dos salários.” (BRASIL, 1943)
Diante disso, a legislação trabalhista não trata sobre o tema especificamente, apenas abrindo hipótese de rescisão contratual e a busca pela reparação dos danos, de acordo com o artigo supra, 483 da Consolidação das Leis Ttrabalhistas. (BRASIL, 1943)
No âmbito Estadual e Municipal existem diversas leis, porém todas voltadas apenas para a proteção dos servidores públicos.
Por conta do artigo 22, parágrafo I, da CF/88 (BRASIL, 1988), que estabelece a competência para legislar sobre matéria relativa ao trabalho apenas para a União, os estados e municípios não podem legislar fora dos limites da Administração Pública na matéria de assédio moral.
As leis Estaduais e Municipais que tratam sobre assédio moral não são normas trabalhistas, e sim, normas administrativas voltadas para a Administração Pública. Há no Senado e na Câmara Federal, várias propostas e projetos de leis tramitando, mas que por vários motivos, ainda não foram sancionados.
Deste modo, evidencia-se a lacuna que existe no ordenamento jurídico brasileiro quanto à segurança aos trabalhadores celetistas no que concerne ao assédio moral.
Cabe mencionar ainda, a Lei 9.029/95 (BRASIL, 1995), que “proíbe a exigência de atestado de gravidez e esterilização e outras práticas discriminatórias, para efeitos admissionais ou de permanência da relação jurídica de trabalho, e dá outras providências.”
Esta lei não trata do assédio moral especificamente, mas pode ser usada por analogia, de forma subsidiária, com ênfase no seu art. 1º, caput:
“Art. 1º.: Fica proibida a adoção de qualquer prática discriminatória e limitativa para efeito de acesso a relação de emprego, ou sua manutenção, por motivo de sexo, origem, raça, cor, estado civil, situação familiar ou idade, ressalvadas, neste caso, as hipóteses de proteção ao menor previstas no inciso XXXIII do art. 7º da Constituição Federal.” (BRASIL, 1995)
Mais adiante, na referida Lei, houve um acréscimo pelos legisladores em 2010, acrescentando o direito ao dano moral, positivando tal preceito:
“Lei 9.029/95. Art. 4º: O rompimento da relação de trabalho por ato discriminatório, nos moldes desta Lei, além do direito à reparação pelo dano moral, faculta ao empregado optar entre: (Redação dada pela Lei nº 12.288, de 2010)
I – a readmissão com ressarcimento integral de todo o período de afastamento, mediante pagamento das remunerações devidas, corrigidas monetariamente, acrescidas dos juros legais;
II – a percepção, em dobro, da remuneração do período de afastamento, corrigida monetariamente e acrescida dos juros legais.” (BRASIL, 1995)
Anteriormente, já ensinou Menezes (MENEZES, 2005, p.16):
“No Brasil, o assédio, além da nulidade da despedida e da reintegração no emprego(art. 4º, I, da Lei 9.029/95) pode dar nascimento à pretensão da resolução do contrato do empregado por descumprimento de deveres legais e contratuais (art. 483, d, da CLT), rigor excessivo ou exigência de serviços além das forças do trabalhador.” (BRASIL, 1943, art. 483, a e b)
Logo, tal preceito esta sendo usado subsidiariamente em decisões de nossos tribunais de forma análoga, possibilitando mais um caminho aos trabalhadores de requerer os seus direitos. [11]
Destarte, estas são as leis que dispõe os operadores do direito para tratar sobre esta violação aos direitos dos trabalhadores, embora na prática, os tribunais trabalhistas reconhecem o assédio, desde que caracterizado e comprovado por testemunhas, ensejando o pagamento, pelo empregador de reparação pelos danos causados.
2 ASSÉDIO MORAL ENSEJANDO A RESCISÃO INDIRETA DO CONTRATO DE TRABALHO
Após a análise do assédio moral, estudar-se-á a rescisão indireta e a possibilidade de pleitear-la em virtude do assédio moral exercido sob o trabalhador.
Primeiramente, para fins explicativos, convém estudar a rescisão indireta, com seus conceitos, requisitos e deveres e direitos das partes, para posteriormente, avançar para a elucidação da rescisão contratual motivada pelo assédio moral.
2.1 Rescisão Indireta do Contrato de Trabalho
A rescisão do contrato de trabalho é sempre precedida de uma relação, de direitos e deveres entre os pactuantes. A rescisão é o fim desta relação jurídica, onde findam-se os requisitos da relação empregatícia, quais sejam: subordinação, onerosidade, continuidade e pessoalidade. (BRASIL, 1943) [12]
2.1.1 Conceito
A rescisão indireta ou dispensa indireta, como é conhecida também, é uma das formas de término do contrato de trabalho por decisão do trabalhador em virtude da justa causa praticada pelo empregador, com fulcro no art. 483 da CLT. (MARTINS, 2009, p. 373). Deste modo, o trabalhador rescinde o contrato de trabalho em virtude de uma falta grave cometida por seu empregador.
Destarte, esta é uma das hipóteses legais para o empregado rescindir o contrato de trabalho e pleitear judicialmente a rescisão indireta, em virtude de atos praticados pelo empregador, que a lei aponta como ilegais. Deste modo, nada mais é que o rompimento (rescisão) contratual, onde o empregado ou empregador (no nosso caso, o empregado) dá fim à relação de emprego, devendo quitar os direitos legais deste término.
A única forma de o empregado caracterizar a justa causa cometida pelo empregador é, após verificar as ilegalidades, ajuizar, na Justiça do Trabalho, ação de rescisão indireta do contrato de trabalho, devendo notificar o empregador dos motivos que está tomando esta decisão, caso contrário, possibilitará à empresa considerar a sua ação como abandono de emprego.
2.1.2 Hipóteses e Requisitos da Rescisão Indireta do Contrato de Trabalho
Como observado anteriormente, a rescisão indireta do contrato de trabalho caracteriza-se pelo termino do contrato laborativo em virtude de uma violação ou omissão do empregador ao contrato avençado para o desempenho das atividades. O art. 483 da CLT enumera diversas hipóteses capazes de ensejar a rescisão indireta:
“Art. 483, da CLT – O empregado poderá considerar rescindido o contrato e pleitear a devida indenização quando:
a) forem exigidos serviços superiores às suas forças, defesos por lei, contrários aos bons costumes, ou alheios ao contrato;
b) for tratado pelo empregador ou por seus superiores hierárquicos com rigor excessivo[13];
c) correr perigo manifesto de mal considerável;
d) não cumprir o empregador as obrigações do contrato;
e) praticar o empregador ou seus prepostos, contra ele ou pessoas de sua família, ato lesivo da honra e boa fama;
f) o empregador ou seus prepostos ofenderem-no fisicamente, salvo em caso de legítima defesa, própria ou de outrem;
g) o empregador reduzir o seu trabalho, sendo este por peça ou tarefa, de forma a afetar sensivelmente a importância dos salários.
§ 1º – O empregado poderá suspender a prestação dos serviços ou rescindir o contrato, quando tiver de desempenhar obrigações legais, incompatíveis com a continuação do serviço.
§ 2º – No caso de morte do empregador constituído em empresa individual, é facultado ao empregado rescindir o contrato de trabalho.
§ 3º – Nas hipóteses das letras d e g, poderá o empregado pleitear a rescisão de seu contrato de trabalho e o pagamento das respectivas indenizações, permanecendo ou não no serviço até final decisão do processo.” (BRASIL, 1943)
Além do art. 483 da CLT, os artigos 474 e 407, parágrafo único, da CLT, também tratam de rescisão indireta do contrato de trabalho, se não vejamos:
“Art. 474 da CLT: A suspensão do empregado por mais de 30 (trinta) dias consecutivos importa na rescisão injusta do contrato de trabalho.
Art. 407 – Verificado pela autoridade competente que o trabalho executado pelo menor é prejudicial à sua saúde, ao seu desenvolvimento físico ou a sua moralidade, poderá ela obrigá-lo a abandonar o serviço, devendo a respectiva empresa, quando for o caso, proporcionar ao menor todas as facilidades para mudar de funções.
Parágrafo único – Quando a empresa não tomar as medidas possíveis e recomendadas pela autoridade competente para que o menor mude de função, configurar-se-á a rescisão do contrato de trabalho, na forma do art. 483.” (BRASIL, 1943)
Diante das hipóteses elencadas no art. 483 da CLT, o empregado poderá rescindir seu contrato de trabalho ao ajuizar reclamatória trabalhista, visando o reconhecimento judicial por motivo de justa causa do empregador.
Diante disso, existem duas hipóteses para o empregado continuar na empresa reclamada, caso seja de seu interesse, de acordo com o que estabelece o § 3º do artigo 483 da CLT.
Primeiramente, diante da alínea "d", quando o empregador deixa de cumprir as obrigações do contrato de trabalho, ou, na hipótese de alínea "g", quando o empregador reduz unilateralmente o trabalho do empregado, afetando sua remuneração. Nas outras hipóteses do artigo 483 da CLT, o trabalhador terá que afastar-se da empresa, sob a penalidade de ser invalidada sua reclamação.
Diante de diversas possibilidades para rescindir o contrato de trabalho, existem, porém, alguns requisitos ou alguns critérios, para caracterizar o assédio moral, como ensina Godinho (GODINHO, 2006, p.1211).
Primeiramente, o autor cita como essencial o preenchimento dos requisitos objetivos, o qual se deve considerar o enquadramento legal diante da atitude do empregador, e também o lapso temporal, entre o rompimento do contrato e o ato ilegal do empregador, compreendido com a gravidade da conduta do empregador, devendo ser extremamente grave a ponto de impedir a continuidade do contrato.
Já quanto aos requisitos subjetivos, devemos observar a autoria empresarial. O sujeito ativo do ato ensejador da rescisão, deve ser o empregador ou os seus prepostos.
Quanto aos requisitos circunstanciais, Godinho cita que a “ordem jurídica exige que haja efetiva vinculação entre a falta imputada ao empregador e a fundamentação da rescisão indireta pretendida pelo obreiro” (2006, p. 1214).
2.1.3 Direitos e deveres das partes contratuais na rescisão indireta
Como já observado, a CLT traz inúmeras possibilidades de rescisão contratual. Optando pela rescisão indireta, o trabalhador reclamante terá praticamente os mesmos direitos da demissão sem justa causa.
Deste modo, o trabalhador terá direito de receber pela rescisão o saldo de salário[14] até concluir o mês ou a data de pagamento prevista, multa de 40 % do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço[15], férias vencidas e proporcionais acrescidas de 1/3[16], seguro desemprego[17], aviso prévio indenizado[18], décimo terceiro proporcional[19] e ainda um mês de remuneração por ano de efetivo serviço ou fração superior a seis meses.
2.2 Assédio moral como motivo de rescisão indireta do contrato de trabalho
Diante de nosso estudo, cabe destacar cinco[20] hipóteses, do art. 483 da CLT[21], que são as mais citadas em nossas jurisprudências (como veremos adiante), para configurar a rescisão indireta, advindo de um assédio moral.
A Primeira possibilidade é a exigência de serviços superiores às suas forças, defesos por lei, contrários aos bons costumes, ou alheios ao contrato (art. 483, a). A “força”, citado acima, não deve ser analisada como força física especificamente, podendo ser entendida também como capacidade profissional para desempenhar o serviço. Ao citar os serviços alheios ao contrato, significa o exercício de atividades não pactuadas no contrato.
Outra possibilidade de pleitear a rescisão indireta é com fulcro na alínea “B” do art. 483 da CLT (BRASIL, 1943), quando o trabalhador é tratado com rigor excessivo, configurando o assédio moral. Significa que não podem haver repressões ou punições que possam configurar perseguições. Objetiva-se analisar a proporcionalidade entre o motivo da falta (se existe), e a sanção aplicada ao trabalhador.
O perigo de mal considerável, elencado na alínea “C” do art. 483, o qual ocorre quando o trabalhador é obrigado a exercer tarefas impróprias para a sua segurança, também pode ser determinante para a rescisão indireta advindo de um assédio moral.
O legislador elencou ainda, o não cumprimento das obrigações do contrato, descriminado na alínea “D” deste artigo. Neste caso, deve-se analisar os princípios contratuais, dispostos no Código Civil, que nos remete ao princípio da boa fé entre as partes, que neste caso, houve ruptura pelo empregador/assediador. Assim, ressalta-se que os contratos são sempre pactuados levando-se em conta o principio da boa fé e da continuidade, deste modo, o ato sofrido pelo empregado deve ser grave, a ponto de impossibilitar a continuação do trabalho.
Porém a forma mais genérica e comum de pleitear de requerer a rescisão indireta do contrato de trabalho em virtude do assédio moral é a alínea “E” do já citado art. 483 da CLT. Esta alínea é a mais invocada para pleitear a rescisão em virtude do assédio, pois trata do próprio ato lesivo da honra e/ou da boa fama do trabalhador, ou seja, é o próprio desrespeito do assediador para com o trabalhador, violando sua dignidade, e acarretando a infração da alínea “E” do CLT.
Assim, Rufino nos ensina:
“[…] a obrigação contratual do empregador de respeitar os direitos trabalhistas, além da personalidade moral de seu empregado e os direitos relativos à sua dignidade, e vice-versa, cuja violação implicaria na infração dos ditames contratuais e das leis trabalhistas, ensejando o direito do empregado à indenização correspondente, além da legitimação do direito obreiro de resistência, que se consuma com a recusa ao cumprimento de ordens ilícitas.” (RUFINO, 2006, p.35)
Deste modo, com a transgressão de sua honra e ou a boa fama do empregado, este tem direito a recusar as ordens de serviço, apesar da hierarquia (não se confunda com submissão a toda e qualquer ordem) existente, podendo rescindir o contrato e pleitear sua devida indenização.
Importante mencionar que o afastamento imediato realizado pelo empregado, culminado pela rescisão indireta, é a única forma de proteção dos seus direitos, já que não existe nenhuma lei federal capaz de determinar alguma penalidade ou sanção para esta prática, se não vejamos as palavras de Rufino:
“[…] a prática do assédio moral gera conseqüências jurídicas para o ofensor e, também, para a vítima, pois, muito inexista no âmbito trabalhista nacional uma lei específica sobre o fenômeno, o empregador deverá delimitar sua conduta em outras regras de proteção jurídica, que impõem o “dever-se” nesta relação, o qual, se violado, ensejará a respectiva sanção.
De tal modo, apesar de inexistir uma norma específica dispondo e identificando o assédio moral, suas conseqüências e sanções, deverão ser aplicadas outras normas por analogia, impondo ao empregador o cumprimento fiel à proteção jurídica de direitos dos trabalhadores, limitando sua conduta, com ditames trabalhistas, como a implicância da rescisão indireta, previstas na CLT.” (RUFINO, 2006, p.91)
Destarte, diante da inexistência de leis acerca do tema, a rescisão indireta pleiteada judicialmente, com fulcro no art. 483, (alíneas “A”, “B”, “C”, “D”, ou ainda a “E”, por exemplo)[22], pode ser utilizada como forma de interromper o assédio moral exercido sobre o trabalhador, cabendo ainda, como já citado, a reparação pelos danos causados, como a perda do emprego (embora seja por rescisão indireta), despesas com médicos e psicólogos, entre outros.
Um dos pioneiros sobre o assunto, o Juiz Luiz Salvador, disserta brilhantemente sobre os direitos advindos da rescisão contratual em virtude do assédio moral:
“Assim, o lesado por assédio moral pode pleitear em juízo além das verbas decorrentes da resilição contratual indireta, também, ainda, a indenização por dano moral assegurada pelo inciso X do art. 5º da Lex Legun, eis que a relação de trabalho não é de suserania, é de igualdade, é de respeito, de intenso respeito, cabendo frisar que a igualdade prevista no art. 5º da CF não restringe a relação de trabalho à mera relação econômica subordinada: assegura ao trabalhador o necessário respeito à dignidade humana, à cidadania, à imagem, à honradez e à auto-estima.” (SALVADOR, 2003, p.13-17).
Deste modo, apesar da omissão legislativa acerca de uma lei nacional sobre o tema, a CLT fornece mecanismos para evitar a continuação do contrato de trabalho para o trabalhador vítima de assédio moral.
2.3 Nexo Causal e o Conjunto Comprobatório do assédio moral e sua validade na Justiça Brasileira
Antes de adentrar sobre a verificação do nexo causal, entre a conduta do agente e o resultado na vítima, cabe ingressar brevemente na área médica, mais precisamente na Medicina do Trabalho, especialidade da ciência médica, em virtude de sua conceituação no momento do ingresso da rescisão em virtude do assédio. Diante disso, o art. 2º da Resolução nº 1488/98, oriunda do Conselho Federal de Medicina trata sobre o tema:
“Artigo 2º: Para estabelecimento do nexo causal entre os transtornos de saúde e as atividades do trabalhador, além do exame clínico (físico e mental) e os exames complementares, quando necessários, deve o médico considerar:
I – A história clínica e ocupacional, virtualmente decisiva em qualquer diagnóstico e/ou investigação de nexo causal; II – o estudo do posto de trabalho; III – o estudo da organização do trabalho; IV – os dados epidemiológicos; V – a literatura atualizada; VI – a ocorrência de quadro clínico ou sub-clínico em trabalhador exposto a condições agressivas; VII – a identificação de riscos físicos, químicos, biológicos, mecânicos, estressantes e outros; VIII – os depoimentos e a experiência dos trabalhadores; IX – os conhecimentos e as práticas de outras disciplinas e de seus profissionais sejam, ou não, da área da saúde.”
Apesar de toda a tecnologia, sabe-se que é extremamente difícil a caracterização pelo médico, do nexo causal entre as ações dos assediadores e as doenças advindas desta agressão às vítimas. Porém, em casos de dúvida deve o médico adotar o Princípio da Proteção, favorecendo o empregado, pois é a parte hipossuficiente da relação contratual.
Portanto, caso comprovado pelo médico o nexo causal, este poderá considerar um acidente de trabalho, com possibilidade de o trabalhador ingressar com auxílio doença, junto ao Instituto Nacional do Seguro Social, e se afastar da empresa enquanto perdurar o benefício.
Porém, voltando ao nosso tema, a prova é um aspecto delicado para caracterizar e provar o assédio moral.
De acordo com o artigo 818 da CLT[23], a prova das alegações incumbe à parte que as fizer. Deste modo, para ingressar com a rescisão indireta do contrato de trabalho em virtude do assédio moral, o trabalhador deverá estar repleto de provas desta violência.
Porém, o Código de Processo Civil[24], determina que o Reclamado/empregador poderá fazer prova dos fatos impeditivos, modificativos ou ainda, extintivos do direito do autor, ora trabalhador, portanto, poderá alterar ou se defender através de prova de suas ações neste ato.
Deste modo, não cabe apenas o trabalhador alegar fatos que ensejam o assédio moral, terá que comprovar, caso contrário, não haverá direito a rescisão indireta e tampouco a indenização.
As provas dos fatos são consideradas livre, admitindo-se todos os meios de provas legais, como email, mensagens telefônicas e virtuais, gravações telefônicas[25], testemunha(s), entre outras. As provas dos fatos mais utilizadas em nossos Tribunais Regionais são as testemunhas que presenciaram as ilegalidades ao longo das agressões, tendo elas o poder de mudar todo o pedido ou defesa das partes em decisões judiciais, tornando-se uma figura importante para o deslinde processual.
Não é tarde para lembrar que o assédio moral difere dos danos morais, já que aquele não tem a condição de publicidade perante terceiros, podendo ser pessoal, desde que comprovado.
Apesar de ser um requisito essencial, os danos psíquicos e/ou físicos são muito difíceis de comprovar. Assim, a vítima poderá comprovar tal ato, apresentando seu histórico médico, com a possibilidade (embora pequena para comprovar perante o Juiz tal fato) de apresentar ainda, o exame médico admissional, provando que os problemas de saúde começaram, ou se agravaram, após o assédio sofrido. Portanto as lesões sofridas psicologicamente pelos trabalhadores vítimas, poderão se fundar em atestados médicos, receitas ou notas fiscais de medicamentos, radiografias, entre outras.
Apesar destas provas, que poderão ser juntadas ao processo para demonstrar as lesões sofridas pela vítima, poderá o juiz, requerer uma perícia médica para provar as lesões sofridas pelo Reclamante.
Destarte, o Juiz é quem terá que analisar friamente a partir das provas trazidas aos autos, ficando à seu critério a caracterização da violência do assédio moral.
3 DECISÕES JURISPRUDENCIAIS E SUAS CONTRADIÇÕES
A primeira decisão sobre o assédio moral nas relações de trabalho, deu-se em 2002 no Tribunal Regional do Trabalho da 17ª Região, no Espírito Santo, (SALVADOR, 2003, p.10-12), quando condenou-se o empregador, como observamos abaixo:
“ASSÉDIO MORAL – CONTRATO DE INAÇÃO – INDENIZAÇÃO POR DANOMORAL – A tortura psicológica, destinada a golpear a auto-estima do empregado, visando forçar sua demissão ou apressar sua dispensa através de métodos que resultem em sobrecarregar o empregado de tarefas inúteis, sonegar-lhe informações e fingir que não o vê, resultam em assédio moral, cujo efeito é o direito à indenização por dano moral, porque ultrapassa o âmbito profissional, eis que minam a saúde física e mental da vítima e corrói a sua auto-estima. No caso dos autos, o assédio foi além, porque a empresa transformou o contrato de atividade em contrato de inação, quebrando o caráter sinalagmático do contrato de trabalho, e por conseqüência, descumprindo a sua principal obrigação que é a de fornecer trabalho, fonte de dignidade do empregado.”[26]
Depois da decisão inovadora deste Tribunal, sobrevieram centenas de milhares de casos, confirmando através de decisões jurisprudenciais, que o assédio moral nas relações de trabalho pode ensejar a rescisão indireta do contrato de trabalho. Porém há gritantes contradições de nossos julgadores, dependendo muito da sensatez e da observância minuciosa sobre cada caso prático.
A seguir, iremos analisar casos típicos e decisões importantes acerca do presente tema, em cada órgão julgador competente.
3.1 Decisões do Tribunal Superior do Trabalho
Como sabemos, a temática do assédio moral como fator de rescisão indireta do contrato de trabalho é consideravelmente nova, e, portanto, as decisões e entendimentos estão apenas sendo julgadas nos últimos anos. Talvez por isso, que não houve nenhuma súmula ou decisão mais concreta que repercute ligeiramente e integralmente nos processos em andamento nos demais Tribunais Trabalhistas.
Deste modo, podemos avaliar algumas decisões recentes, onde direcionam o nosso estudo nos casos típicos e facilmente encontrado em nossos Tribunais.
“RESCISÃO INDIRETA. CONTRATO DE TRABALHO. FUNÇÃO. MUDANÇA. CAIXA PARA A DE -PROVADOR DE ESTOQUE-. ATIVIDADE INSERIDA NO ROL DE ATRIBUIÇÕES PREVISTAS NO AJUSTE. Não constitui falta grave, configuradora de rescisão indireta do contrato de emprego, conduta do empregador consistente em mudança de função, de caixa para a de atendimento a -provador de estoque-, se ambas as atividades inserem-se no rol de atribuições do cargo para a qual empregada é contratada. Daí por que a conduta do empregador, ao mudar a função do empregado, sem redução de remuneração, encontra-se na esfera do poder diretivo do empregador, configurando o jus variando autorizado por lei. Sobretudo quando se atenta para o fato de que as sanções impostas à reclamante – suspensão e advertência -, por faltas injustificadas ao serviço, guardam estreita proporcionalidade com as faltas. Tal circunstância reforça ainda mais a ausência de qualquer elemento que possa configurar hipótese de rescisão indireta do contrato de emprego. Violação ao artigo 483 do CLT não configurada. Recurso não conhecido. INDENIZAÇÃO. ASSÉDIO MORAL. O direito à indenização por danos advindos de assédio moral, em ambiente de trabalho, supõe, no mínimo, constrangimento ilegal da vítima, vale dizer, qualquer conduta abusiva, hostil, por parte do empregador e/ou de seus prepostos, em relação aos empregados que contrata. O Tribunal a quo, soberano no exame dos fatos e das provas carreadas aos autos, declina que as sanções impostas à demandante, suspensão e advertência, decorreram de faltas injustificadas ao trabalho, que tais medidas guardam estreita proporcionalidade com as faltas cometidas pela empregada. Ressalta que a mudança de função, de caixa para a de atendimento a -provador de estoque-, encontra previsão no rol de atribuições do cargo para o qual empregada fora contratada. Por fim, declina o Tribunal de origem que, mediante a prova testemunhal, produzida por ambas as partes, não resultam evidenciadas quaisquer situações aviltantes que tornem aviltante o ambiente de trabalho, tampouco qualquer conduta abusiva, violadora do patrimônio moral da empregada. Não configurada violação ao patrimônio moral da demandante, não há lugar para acolhimento de pretensão tendente à indenização, fundada em assédio. O TRT de origem, no que exclui a indenização, por assédio moral, não viola os artigos 5º, inciso X, da Constituição Federal. Não conhecido. BENEFÍCIOS DA JUSTIÇA GRATUITA. ISENÇÃO DE CUSTAS. O benefício da justiça gratuita pode ser requerido em qualquer tempo ou grau de jurisdição, desde que, na fase recursal, seja o requerimento formulado no prazo alusivo ao recurso. Mencionado requerimento pode ser efetuado mediante declaração de pobreza firmada pelo reclamante ou, ainda, por seu advogado, mesmo que não detenha poderes especiais para tanto. Hipótese de incidência da Orientação Jurisprudencial n.º 269 da SBDI-I do Tribunal Superior do Trabalho. Conhecido e provido, no particular.” [27]
No exemplo jurisprudencial acima, o Reclamante não obteve êxito quanto à rescisão indireta do contrato de trabalho, pleiteada em virtude da troca de tarefas executas diariamente. Considerou o TST, que a simples mudança de função está prevista no rol de atribuições do cargo na qual fora contratado.
“RECURSOS DE REVISTA DAS RECLAMADAS – DANOS MORAIS – ASSÉDIO MORAL E SEXUAL – ÔNUS DA PROVA.
1. A prova das alegações incumbe à parte que as fizer, sendo certo que o ônus da prova incumbe ao autor, quanto ao fato constitutivo do seu direito. Inteligência dos arts. 818 da CLT e 333, I, do CPC.
2. Na hipótese dos autos, o Regional majorou – de R$ 5.000,000 para R$ 10.000,00 – a condenação por danos morais decorrentes de assédio moral praticado pelo superior hierárquico da Obreira, que, ao cobrar metas, proferia xingamentos e agressões verbais aos empregados. Quanto ao assédio sexual, reformou a sentença para deferir indenização de R$ 30.000,00 por danos morais no particular, entendendo que, em que pese a Trabalhadora não ter comprovado os fatos narrados na inicial, a prova testemunhal indicou a ocorrência de outros fatos que demonstraram o desrespeito à intimidade da Empregada.
3. Verifica-se que, como a decisão guerreada fundamentou-se na prova oral produzida no processo, incólumes os arts. 818 da CLT e 333 do CPC.
4. De outra parte, a generalidade da cobrança de metas não tem o condão de excluir sua ilicitude, mormente diante da inércia da Empregadora em coibir as agressões e os xingamentos praticados pelo superior hierárquico após reclamação dos trabalhadores.
5. Acrescenta-se, ainda, que, à luz do que estabelece o art. 5º, X, da CF, revela-se acertada a conclusão a que chegou a Corte de origem, pois o Empregador, que é responsável direto pela qualidade das relações e do ambiente de trabalho, deveria ter adotado medidas compatíveis com os direitos da personalidade, tendo a Empresa se quedado silente nos aspectos, embora alertada sobre os fatos. Recursos de revista das Reclamadas não conhecidos.”[28]
Nesta recente decisão, não houve apenas o assédio moral, mas também o assédio sexual, o que foi comprovado testemunhalmente, ocasionando indenização a ser pago pela Reclamada.
“AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA. 1. HORA EXTRA. BANCO DE HORAS. O Regional concluiu que foi desvirtuado o acordo de compensação, portanto, não há falar em contrariedade à Súmula nº 85, I, do TST nem em divergência jurisprudencial. 2. INTERVALO INTRAJORNADA. Decisão regional em consonância com a Orientação Jurisprudencial nº 307 da SBDI-1/TST. 3. DANO MORAL. ASSÉDIO MORAL. CONFIGURAÇÃO. INDENIZAÇÃO. De acordo com as provas dos autos, no ambiente de trabalho, a reclamante era submetida a constrangimentos decorrentes de atos dos superiores hierárquicos, na frente de colegas de trabalho. Assim deve ser mantida a condenação em reparação indenizatória, fixada em parâmetros razoáveis e proporcionais. 4. RESCISÃO INDIRETA E CONSECTÁRIOS LEGAIS. Evidenciado que a reclamada incorreu em falta grave, art. 483, b, da CLT, sujeita inclusive a indenização por danos morais, deve ser mantida a rescisão indireta. Agravo de instrumento conhecido e não provido.” [29]
Este caso é o mais comum quanto ao assédio moral nas relações de trabalho, onde o trabalhador é insultado através de palavras de baixo escalão na frente de outros funcionários, o que irá caracterizar a rescisão indireta.
Portanto, apesar de muitas vezes o Tribunal Superior do Trabalho ser o órgão que é mais moroso a atender o anseio dos novos entendimentos, estas decisões irão causar efeitos nos Tribunais Regionais de Trabalho de todo o país, influenciando decisões e sentenças.
3.2 Decisões do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região
Obviamente não diferente do Tribunal Superior do Trabalho, o Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região, pois as decisões deferidas acerca da temática exposta, ou seja, a rescisão indireta do contrato de trabalho em virtude do assédio moral exercido sobre o trabalhador baseia-se fundamentalmente na qualidade das provas juntadas ao processo, importando a sua caracterização através dos requisitos já estudados.
Como observamos nas recentes decisões abaixo, a falta de provas pode trazer enormes prejuízos ao Reclamante:
“DANO MORAL. ASSÉDIO MORAL. RESCISÃO INDIRETA. Prova oral que não convence quanto à veracidade da alegação da inicial, de excessivo controle do horário nas idas ao banheiro, e pressão por produtividade que justifique assédio ou dano moral.”[30]
No caso acima, a testemunha trazida pelo Reclamante, não conseguiu apresentar em juízo provas evidentes dos fatos colacionados na exordial, como controle de horários nas idas ao banheiro. Deste modo, o Juízo de Erechim-RS, não deferiu o assédio moral nos atos da empresa ou de seus responsáveis.
“ASSÉDIO MORAL. OPERADOR DE TELEMARKETING. PRESSÕES PARA CUMPRIMENTO DE METAS. Prova insuficiente. Não demonstrada suficientemente a alegada prática de cobranças exacerbadas e de humilhações, no intuito do cumprimento de metas de vendas, de modo a tipificar o assédio moral, confirma-se a sentença que rejeitou o pedido de indenização por dano moral.”[31]
O Reclamante, no caso acima exposto, não conseguiu comprovar a prática do assédio moral, e por isso teve seu pedido judicial de rescisão indireta pelo assédio moral negado em grau de recurso ordinário.
Em muitos casos, a única prova do fato caracterizador do assédio moral é através de testemunhas, porém elas devem presenciar todos os fatos e saber detalhadamente das agressões, pois é comum ocorrerem casos, como os abaixo citados, onde as testemunhas relatam outras atividades e não caracterizam as violências realmente sofridas.
“DANO MORAL. RECONHECIMENTO DA RESCISÃO INDIRETA. AUSÊNCIA DE PROVA. Assédio moral não provado, ônus que incumbia ao reclamante, por ser fato constitutivo ao direito postulado, conforme disciplina o art. 818 da CLT e art. 333, inciso II do CPC, aplicável de forma subsidiária por força do disposto no art. 769 da CLT. Rescisão indireta do contrato de trabalho não reconhecida. […] No caso em tela, diante do conjunto probatório, constata-se que não estão presentes o ato ilícito, o dano moral e o nexo causal entre ambos. Verifica-se, isto sim, que a reclamada exerceu o regular poder de comando, dentro de limites razoáveis. O fato de o autor ter sido advertido na frente dos demais colegas por conversar demais, decorreu de atitude inadequada do mesmo em seu local de trabalho, conforme a testemunha João Airton, ao afirmar que […] quando o reclamante ia tomar água no galpão, ficava conversando com os empregados;”. A atitude da reclamada é compreensível para zelar pelo bom andamento do trabalho. O fato de mudar o local de trabalho do autor e deixá-lo sozinho empilhando madeiras, não demonstra tratamento diferenciado, uma vez que ficou comprovado pelas testemunhas que era uma atividade de rotina um empregado só realizar a tarefa. […]”[32].”
Neste caso prático, o Reclamante tentou por todos os meios, caracterizar o assédio moral em virtude das adversões sofridas pelo simples fato de conversar bastante. Porém, concluiu o juiz e o magistrado que a atitude da empresa se deu em virtude da pretensão ao bom andamento do trabalho de seus funcionários.
“RESCISÃO INDIRETA DO CONTRATO DE TRABALHO. DANOS MORAIS. Não provados os fatos narrados na inicial, indeferem-se as pretensões ao reconhecimento da rescisão indireta do contrato de trabalho e à indenização por danos morais. Inaplicável ao caso, dessa forma, o art. 932, III, do Código Civil. Recurso não provido. […] Com efeito, no caso, o depoimento da testemunha convidada do autor, Luiz Carlos da Silva Pereira, além de frontalmente contrariado pelo da outra testemunha ouvida, Sandro Santos da Silva, convidada pela ré, mostra-se frágil para comprovar suficientemente a alegação de ter sido o reclamante hostilizado, destratado ou humilhado pelo diretor da empresa, nos termos relatados na petição inicial. “[33]
Na decisão acima, embora o Reclamante tenha conseguido apenas uma testemunha para configurar o assédio moral, esta foi obviamente contrariada pela testemunha levada pela Reclamada, o que fragilizou as suas alegações para o entendimento do juiz. Caso dispusesse de mais testemunhas para esta violência sofrida, poderia se dar uma sentença diferente.
Em outros casos pesquisados, o Reclamante não consegue comprovar a situação de violência em virtude da caracterização do assédio moral[34], conforme estudo anterior.
“RESCISÃO INDIRETA. AMEAÇAS. APELIDO. O tratamento descortês por parte da chefia da reclamante na atribuição de apelido, embora deva ser prática coibida pela empresa, não possui gravidade suficiente para determinar a rescisão indireta do contrato de trabalho.”[35]
No caso exposto, o Reclamante tentou a rescisão indireta do contrato de trabalho em virtude do assédio moral exercido através de ameaças e apelidos impostos pela empresa, o que não caracteriza o assédio moral.
“INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. ASSÉDIO MORAL. Não se configura o assédio moral quando a alegada discriminação do trabalhador não resta demonstrada nos autos, ônus que compete ao reclamante, nos termos do art. 818 da CLT, c/c o art. 333, I, do CPC. Registra-se que o pleito de despedida indireta depende da caracterização do alegado assédio moral, razão por que se impõe, inicialmente, a análise dessa questão. O assédio moral consiste na conduta patronal insidiosa, que tem por finalidade levar o empregado a desistir do emprego. E, para isso, se utiliza das mais diversas práticas aviltantes ou afrontosas, expondo o trabalhador a humilhações de toda a ordem. Com o menoscabo prolongado, o obreiro vai perdendo a autoconfiança e se desgostando com o ambiente de trabalho até chegar ao ponto de preferir se afastar, mesmo precisando do emprego, ou nele se mantém, com elevado custo emocional. No caso dos autos, os fatos narrados pelo autor na petição inicial não restam demonstrados, porquanto a prova produzida é insuficiente para a formação do convencimento sobre a veracidade desses fatos.”[36]
Depois de todo estudo acerca do assédio moral e da rescisão indireta, comprova-se na pesquisa prática jurisprudencial, que a caracterização destes conceitos faz-se necessário, assim como o conjunto probatório.
Destarte, as decisões de nosso Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região, traduzem as decisões e entendimentos dos demais entes federados, onde as provas apresentadas são de suma importância para o deslinde processual.
O assédio moral no ambiente de trabalho é um fenômeno profissional novo, caracterizado pela desumanização das relações laborais. O constrangimento moral ou psíquica, de forma repetitiva, gera vários danos à vida socioeconômica e familiar dos trabalhadores assediados, tornando-os mais fragilizados e suscetíveis a adoecimentos, podendo levá-los desde a incapacidade permanente até a morte. Em virtude da insatisfação com o seu trabalho e a baixa da auto-estima causada pela humilhação de longa duração durante a sua jornada de trabalho, a saúde dos profissionais é fragilizada, propiciando o surgimento de transtornos psicossomáticos. Contudo, essa violência à saúde física e mental dos trabalhadores pode ser prevenida e ainda eliminada com de mudanças comportamentais de estilos de liderança e humanização nas relações de trabalho, propiciada pelas empresas.
O estudo apresentado teve o objetivo de discutir e analisar o assédio moral nas relações de trabalho, demonstrando a possibilidade da rescisão indireta do contrato de trabalho por culpa exclusiva do empregador/assediador. Observou-se que o assédio moral é claramente prejudicial à saúde do trabalhador e a todos que convivem com a vítima, incluindo seus próprios colegas de trabalho.
Para alcançar o objetivo proposto inicialmente, seguimos os seguintes passos: (I) procurou-se basear-se em doutrinadores do assunto, realizando uma ampla pesquisa bibliográfica, para aprofundar a temática do assédio moral; (II) Foi realizada uma ampla pesquisa legislativa acerca das normas vigentes sobre o assunto; (III) Através do enfoque jurídico trabalhista, buscou-se analisar a possibilidade da rescisão indireta do contrato de trabalho em virtude do assédio moral, tema principal do presente trabalho; (IV) Pesquisando através dos sítios de nossos Tribunais, objetivou-se buscar casos práticos do presente tema, a fim de demonstrar todo o assunto estudado nos casos mais comuns existentes nos julgados.
Deste modo, analisamos a escassa legislação específica quanto ao tema, apesar de observarmos contemporaneamente uma discussão que aos poucos está sendo definido e delimitado em nossos Tribunais.
Destaca-se que este reconhecimento oriundo dos Tribunais, sobre a ocorrência de tal conduta lesiva e a busca pela coação de tais práticas, se mostra uma conquista para os trabalhadores, que embora não esteja incluído na Consolidação das Leis Trabalhistas, se tornam muito importantes para o perfeito cumprimento do contrato de trabalho.
Além disso, podemos concluir que o reconhecimento da rescisão indireta do contrato de trabalho, tendo como motivo o assédio moral, tem por finalidade a obediência ao princípio da dignidade da pessoa humana, elencada na nossa atual Constituição Federal. Nas decisões apresentadas, podemos observar que a Justiça do Trabalho, ao reconhecer a violência ao trabalhador, ressalta o que aduz a Carta Magna, trazendo benefícios aos trabalhadores, dignificando este tão importante princípio que, muito embora deva ser norteador das relações jurídicas, carece de efetividade.
Como reflexão final cabe salientar a necessidade da publicização do Assédio Moral, de modo geral, para as empresas e para os trabalhadores. Além disso, as empresas devem estar preparadas para prevenir esta violência, evitando os sérios danos aos trabalhadores e aos seus dependentes.
Advogado. Mestre em Sociologia pela Universidade Federal de Pelotas Especialista em Direito e Processo do trabalho pela Universidade Internacional de Curitiba Graduado em Direito pela Universidade Federal do Rio Grande
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