Bruna Helmer Coutinho e Gabriela de Amorim Ramos**
Alessandra Lignani de Miranda Starling e Albuquerque ***
SUMÁRIO: INTRODUÇÃO; 1 CONCEITO DE PARAÍSOS FISCAIS; 1.1 UTILIZAÇÃO DOS PARAÍSOS FISCAIS PARA ATIVIDADE ILÍCITA; 1.2 EXEMPLOS REAIS DE LOCAIS RECONHECIDOS COMO PARAÍSOS FISCAIS; 2 O INSTITUTO DA BLINDAGEM PATRIMONIAL; 2.1 OPERAÇÃO LAVA JATO E O ESQUEMA DE LAVAGEM DE DINHEIRO PARA O EXTERIOR; CONSIDERAÇÕES FINAIS; REFERÊNCIAS
RESUMO
O presente trabalho tem como objetivo, por meio do método dedutivo, analisar a utilização dos Paraísos Fiscais como meio lícito e ilícito. Busca abordar o emprego de formas ilícitas desses locais para obtenção de benefícios fiscais, com aplicação no direito empresarial, em destaque a constituição de Offshore company. O conceito de Paraísos Fiscais, bem como os exemplos de locais com regime fiscal e societário reconhecidamente mais liberal, serão devidamente elencados. Após essa observação, também será abordado o instituto da blindagem patrimonial, meio ilícito para ocultação de bens passiveis de adimplir com obrigações. Por fim, será destacada a utilização de paraísos fiscais como forma de blindagem patrimonial relacionado as empresas no esquema de corrupção relevadas pela Operação Lava Jato.
Palavras-chave: Paraísos fiscais. Blindagem Patrimonial. Offshore company. Operação Lava Jato.
ABSTRACT
The objective of this study is to analyze the use of Tax Paradise as a licit and illicit means by means of the deductive method. The company addresses the employment of local business forms for the improvement of tax benefits, with the business law application, highlighting the formation of an offshore company. The concept of tax havens, as well as the examples of places with a more liberal tax and corporate regime, will be duly listed. When this observation, will also be approached, the patrimonial patrimony patrimony, illicit means for concealment of goods liable to comply with obligations. Finally, it should be highlighted the use of tax havens as a form of patrimonial shield related as companies in no scheme of corruption by the Lava Jato operation.
Keywords: Tax Paradise. Patrimonial Shielding. Offshore company. Operation Lava Jet.
INTRODUÇÃO
Com a fase em que o Brasil passa atualmente, a utilização de Paraísos Fiscais vem se destacando e tornou-se uma expressão conhecida. Ocorre que, para o público em geral, o termo “paraíso fiscal” é quase sempre relacionado a um método fraudulento de obtenção de vantagens.
O presente trabalho traz uma conceituação abrangente de paraísos fiscais e demonstra a possibilidade de uma atuação lícita desses locais por pessoas físicas e jurídicas. Além disso, demonstra-se aqui a utilização dos paraísos fiscais também como forma de fraudar o sistema tributário e empresarial brasileiro, com uma atuação irregular e desleal para alcançar os benefícios trazidos pelos países e territórios cujo regime fiscal e societário é reconhecidamente mais liberal.
Sobre este tema, será abordado o instituto da blindagem patrimonial, caracterizando os mecanismos ilícitos utilizados para burlar as execuções promovidas por credores e ocultar o patrimônio das sociedades dos “olhos” do fisco. Além disso, o presente estudo aponta meios de utilizar as empresas estrangeiras, conhecidas como offshore, como operações de blindagem patrimonial.
Por fim, relacionando com o cenário atual brasileiro, será associado o objeto do trabalho com as investigações promovidas pela operação Lava Jato. Para melhor elucidação do tema aqui tratado, será identificado como a distribuição de propina era ocasionada através da constituição de empresas estrangerias, conhecidas como offshore, em locais conhecidos como paraísos fiscais.
1 CONCEITO DE PARAÍSOS FISCAIS
A expressão “Paraíso Fiscal” ganhou um olhar preconceituoso da sociedade e também das autoridades com o passar do tempo. Falar sobre esse fenômeno gera, automaticamente, uma associação a algo irregular, que deve ser combatido.
Ocorre que essa visão é equivocada, visto que os paraísos fiscais, quando utilizados da forma correta, não atacam normas legais, afirmando a licitude dessa transação.
Segundo Ricardo Jorge Rocha da Silva, a definição desse instituto é divergente em diversos países. No Brasil, como em outros países, Paraísos Fiscais são:
(…) todos os territórios com tributação inferior relativamente à que se pratica no território nacional. Exemplo disso é o Brasil para o qual, normalmente considera paraísos fiscais todos os países com tributação da renda inferior a 20%. Isso quer dizer que o conceito de paraíso fiscal é relativo e depende do nível de tributação do país de origem.[1]
Observa-se uma atual mudança da Receita Federal quanto ao conceito aqui estudado:
A partir de agora, economias que tributam a renda das empresas a uma alíquota abaixo de 17% serão consideradas regimes fiscais privilegiados. Antes, essa alíquota era de 20%. A mudança foi feita por meio de portaria publicada no Diário Oficial da União.[2]
Além disso, Luís Manoel Leitão conceitua paraíso fiscal da seguinte forma:
Um país ou um território que atribua a pessoas físicas ou coletivas vantagens fiscais suscetíveis de evitar a tributação no seu país de origem ou de beneficiar um regime fiscal mais favorável que o desse país, sobretudo em matéria de imposto sobre o rendimento e sobre as sucessões.[3]
Torna-se nítido que paraísos fiscais não são, por si só, meios fraudulentos, como comumente é acreditado, sendo esse instituto regular e lícito. Na verdade, refere-se a nada mais que a nomenclatura de uma situação em que se encontra um país ou território enquanto espaço de tributação em relação a outro.
Vale afirmar que, para se tornar um paraíso fiscal, existem requisitos que precisam ser atendidos:
Um sistema fiscal globalmente favorável, um elevado grau de segredo bancário e comercial, um mínimo de estabilidade política e económica, falta de controlo de câmbios sobre os depósitos de não residentes, infraestruturas desenvolvidas e existência de tratados fiscais.[4]
Como é possível observar, os requisitos para categorizar um território como paraíso fiscal são frágeis e específicos, sendo necessário muito cuidado para manter seu caráter lícito.
Ocorre que esse fenômeno pode ser usado como meio ilícito por sujeitos de determinado país e, como Estado escolhido para o presente trabalho, pode-se dizer que alguns brasileiros utilizam essa situação como forma de fraudar o sistema tributário e, especificamente, empresarial do Brasil.
1.1 UTILIZAÇÃO DOS PARAÍSOS FISCAIS PARA ATIVIDADE ILÍCITA
Primeiramente, é necessário entender sobre a Elisão fiscal, sendo essa uma realização de uma atividade lícita tributária antes do fato gerador para que seja pago o menor valor tributário possível. É o caso do planejamento tributário.
A Elisão é um meio lícito, onde o contribuinte consegue, através de planejamento tributário, pagar um valor de tributo inferior, tudo de forma lícita e resguardada pela normatização brasileira.
Em contrapartida, tem-se a fraude fiscal, que é um meio ilícito para a obtenção de benefícios de tributação. É combatido pelo Brasil, e pode ser alcançado de formas variáveis.
Vale ressaltar que o estudo de paraísos fiscais engloba a internacionalização de normas, visto que são movimentações entre países, fato que acarreta numa dificuldade em distinguir o que é lícito e o que é ilícito em um país e em outro.
Paraísos fiscais podem ser classificados tanto como elisão fiscal, quanto como fraude fiscal, e o que vai definir sua licitude ou não é a forma como são utilizados.
Em termos empresariais, não é ilícito, por si só, a transferência de uma empresa para um paraíso fiscal, se for comprovada a atividade regularmente praticada, ou seja, se for uma espécie de “empresa fantasma”, claramente o paraíso fiscal foi utilizado como meio fraudulento, mas se a empresa está atuando regularmente, o benefício utilizado se encaixa em elisão fiscal, tornando-se atividade lícita.
Além disso, deve ser observado objetivo da constituição da empresa no estrangeiro. A mera criação não é, por si só, ilícita. Mas se o objetivo é motivado na fraude dessa movimentação, pode ser considerado ato ilícito.
Temos como exemplo a existência de offshore companies que, embora seja um meio caracterizado como lícito, pode ser usado como meio fraudulento para a obtenção de benefício fiscal, reconhecida pela dificuldade de rastreamento das operações, mas que pode ser traduzida em fraude fiscal:
A constituição de offshore companies é uma forma muito apreciada para tais operações; como são pessoas jurídicas estrangeiras, acredita-se qe isso dificultaria o rastreamento da operação, embora implique o risco de se caracterizar o crime de evasão de divisas. A expressão offshore company, ou simplesmente offshore, traduz uma pessoa jurídica estrangeira, ou melhor, constituída no estrangeiro. O termo, contudo, tem uma raiz curiosa: foi cunhado para referir-se especificamente a sociedades constituídas em locais com regime fiscal e/ou societário mais liberal, comumente chamados de paraísos fiscais. Assim, a constituição buscaria aferir vantagens como, no âmbito do direito tributário, um menor recolhimento de impostos; isso faria procurando desaforar a ocorrência dos respectivos fatos geradores: operações que efetivamente ocorreram aqui seriam apresentadas como tendo ocorrido naquelas localidades, sonegando os impostos devidos ao Fisco brasileiro, seja a Fazenda Nacional, sejam as Fazendas estaduais, distrital e municipais.[5]
O referido fenômeno será melhor analisado posteriormente, mas se trata de um claro exemplo em que a licitude e a utilização correta dos paraísos fiscais pode ser empregado como forma de fraudar o sistema tributário e empresarial brasileiro.
Sendo assim, para que um paraíso fiscal seja enxergado como objeto ilícito, deve ser analisado o caso concreto.
1.2 EXEMPLOS REAIS DE LOCAIS RECONHECIDOS COMO PARAÍSOS FISCAIS
A busca dos países e territórios conhecidos como paraísos fiscais é simples, sendo diversos os sites que elencam locais em que o regime fiscal é mais liberal que o Brasil.
O site EXAME enumerou dez países que enfatizam os principais requisitos para o reconhecimento de um paraíso fiscal, sendo o primeiro da lista a Suíça, com pontuação do índice de sigilo fiscal em 73. Em segundo lugar, Hong Kong, com pontuação em 72, seguindo dos Estados Unidos, Singapura, Ilhas Cayman, Luxemburgo, Líbano, Alemanha, Bahrein e Emirados Árabes, com pontuações entre 55 e 77 pontos no índice de sigilo fiscal e bancário.[6]
Alguns locais enxergam no regime liberal fiscal e societário uma forma de atrair investimento, sendo a única forma, para alguns países, de sobrevivência:
A verdade é que muitos países ou territórios devido às suas condições geográficas ou climatéricas só conseguem sobreviver, isto é, atrair investimento, desta forma. Por exemplo, o território das Bahamas sofre de intempéries. Quando o território é assomado por um ciclone, o que acontece amiúde, provoca grandes e graves estragos. Assim, este território precisa ser um paraíso fiscal, visto que é a única forma de atrair algum investimento. Se este território não oferecesse taxas reduzidas e outras vantagens fiscais, provavelmente não teria qualquer tipo de investimento. Como o território das Bahamas, existem muitos outros territórios que se encontram na mesma situação.[7]
Existem hoje diversos paraísos fiscais, muitos além dos aqui listados, fato que demonstra a polarização, cada vez maior, desse fenômeno e, consequentemente, o crescimento da busca de brasileiros que encaram essa possibilidade como oportunidade, motivada por objetivo lícito ou ilícito, a depender do caso concreto.
2 O INSTITUTO DA BLINDAGEM PATRIMONIAL
Inicialmente, cabe abordar que o patrimônio é o conjunto de bens, direito, obrigações e valores pertencentes as pessoas físicas ou jurídicas[8]. Em Blindagem Patrimonial e Planejamento Jurídico, Gladston e Eduarda Mamede classificam patrimônio como um “complexo de relações jurídicas de uma pessoa, dotadas de valor econômico”. Ainda, identificam que a diferente entre o patrimônio ativo (o que se tem) e o patrimônio passivo (aquilo que se deve), é o que compõem o real patrimônio de uma empresa, chamado de patrimônio líquido[9].
Identificado o conceito de patrimônio, cabe definir o que seria o instituto em questão. A blindagem patrimonial é um meio fraudulento para obtenção de vantagens ilícitas por parte de empresas que são devedoras. É caracterizada como uma forma de ocultação do patrimônio que poderia ser executado por empresas credoras. Em outras palavras, seria:
“um ato jurídico complexo, ou seja, envolve a prática de diversos atos que são considerados ilegais por disciplinas jurídicas diversas: ilícitos civis, ilícitos tributários e ilícitos penais, entre outros. Assim, tanto os profissionais, quanto os clientes, podem ser responsabilizados, inclusive por meio de processo criminal”[10].
Cabe ressaltar que o mecanismo de blindagem patrimonial não é sinônimo de proteção patrimonial. A realização de um planejamento do patrimônio empresarial é lícita, desde que não possua a finalidade de burlar possíveis execuções motivada por credores.
A conduta ilícita é denominada blindagem patrimonial. Em conformidade com entendimento do STJ, é um mecanismo fraudulento para ocultação de bens e lavagem de dinheiro. Segundo jurisprudência sobre a Operação Monte Éden, promovida pela Polícia Federal, a blindagem patrimonial é ilícita e pode se concretizar por meio de empresas fictícias no exterior, conforme infracitado:
HABEAS CORPUS. ADVOGADO. OPERAÇÃO “MONTE ÉDEN”. CRIMES CONTRA O SISTEMA FINANCEIRO E CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA, QUADRILHA, LAVAGEM DE DINHEIRO, SONEGAÇÃO DE CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA, FALSIDADE IDEOLÓGICA, TRÁFICO DE INFLUÊNCIA. ARGÜIDA INÉPCIA DA DENÚNCIA. IMPROCEDÊNCIA.
Ademais, este instituto não se confunde como sendo a mera fraude contra credores, uma vez que é composto por mecanismos refinados e complexos que permitem a ocultação dos bens do devedor e, como consequência, ocasionam a fraude contra particulares e contra credores públicos (como a Fazenda Pública, por exemplo).
Nesta mesma linha de raciocínio, em seu livro, Mamede dispõe que as operações de blindagem patrimonial diferenciam-se de fraudes convencionais por apresentarem o objetivo da alocação fraudulenta de bens contra execuções por parte de credores públicos e privados. Sobre isso, aduz que o principal objetivo da blindagem patrimonial é a “alocação fraudulenta (por vezes criminosas) dos bens do devedor em nome de terceiros para que, assim, não pudessem ser alcançados pelos processos executórios”[12].
São diversas as operações e mecanismos para realizar manobras de blindagem patrimonial. Como mencionado no capítulo anterior, a criação de pessoa jurídicas estrangeiras, chamadas de offshore, podem possuir a finalidade de receber bens do ativo financeiro de empresas que estão sendo executadas por credores, sendo utilizadas de forma ilícita.
Como exemplo, é a constituição de offshore para figurarem como empresas-espelhos. Ou seja, é a sociedade constituída em nome de terceiro com o intuito de que seja “capitalizada por desvios de caixa de outra sociedade, por meio de negócios fictícios”[13].
Sobre esse tema, o STJ proferiu acordão negando provimento ao recurso especial interposto pelos sócios fundadores de uma sociedade que “transferiram a totalidade de suas quotas para uma empresa off-shore localizada em paraíso fiscal”[14].
PROCESSO CIVIL E CIVIL. RECURSO ESPECIAL. FRAUDE PRE ORDENADA PARA PREJUDICAR FUTUROS CREDORES. ANTERIORIDADE DO CRÉDITO. ART. 106, PARÁGRAFO ÚNICO, CC/16 (ART. 158, § 2º, CC/02). TEMPERAMENTO.
(…)
Além disso, em decisão deferindo em parte o Habeas Corpus aos indivíduos que criaram uma organização especificamente voltada para a sonegação fiscal, o STF aponta o caráter ilícito desta organização quanto a:
“criação de empresas fantasmas, utilização de “laranjas”, declaração de endereços inexistentes ou indicação de endereços iguais para firmas diversas, alterações freqüentes na constituição social das empresas, inclusive com sucessões em firmas estrangeiras, nos chamados “paraísos fiscais” (supostamente para dificultar a localização de seus responsáveis legais), emissão de notas fiscais e faturas para fornecer aparência de legalidade, entre outras coisas. Fatos que, se comprovados, configuram, entre outras, a conduta descrita no delito de quadrilha, que aí não poderia ser considerada meio necessário para a prática do crime tributário, a ponto de estar absorvida por ele, mesmo porque a consumação daquele delito independe da prática dos crimes que levaram os agentes a se associarem. Impossibilidade de trancamento da ação penal quanto ao crime tipificado no art. 288 do CP, tampouco quanto a outros delitos formais e autônomos que eventualmente se possa extrair dos fatos narrados na denúncia, dos quais foi possível aos acusados se defenderem. Habeas corpus deferido em parte. (HC 84423, Relator(a): Min. CARLOS BRITTO, Primeira Turma, julgado em 24/08/2004, DJ 24-09-2004 PP-00042 EMENT VOL-02165-01 PP-00116 RTJ VOL-00193-01 PP-00395)[15] – grifo nosso.”
Por tudo, são diversos os meios para concretizar as operações de blindagem patrimonial. É possível, através de procedimentos específicos com a omissão de transações no livro Diário e a ocultação de lucro em escrituras contábeis, retirar bens do patrimônio ativo de uma sociedade[16].
No próximo capitulo, serão analisadas as formas de utilização de paraísos fiscais como forma de blindagem patrimonial, por empresa envolvidas no esquema de corrupção reveladas pela Operação Lava Jato.
2.1 OPERAÇÃO LAVA JATO E O ESQUEMA DE LAVAGEM DE DINHEIRO PARA O EXTERIOR
A operação Lava Jato pode ser identificada como uma das maiores investigações de corrupção e lavagem de dinheiro do Brasil[17], sendo responsável por investigar os operadores do esquema de distribuição de propina que imperava na Petrobras por anos.
A investigação começou em 2009, com a suspeita de crimes de lavagem de dinheiro pelo ex-deputado federal José Janene, no Paraná. Em 2013, pelas interceptações telefônicas feita ao doleiro Carlos Habib Chater, foram identificadas quatro organizações criminosas[18].
A primeira fase ostensiva da operação ocorreu em 2014, sobre estas organizações identificadas. Inclusive, o nome da operação foi escolhido por causa de uma das organizações criminosas investigadas utilizar-se “de uma rede de postos de combustíveis e lava a jato de automóveis para movimentar recursos ilícitos”[19]. A segunda fase da operação também ocorreu no ano de 2014, quando o ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa foi preso.
Após várias investigações e denúncias, tem-se o conhecimento de que várias empreitadas, funcionários da Petrobras, operadores financeiros e agentes políticos estavam envolvidos no esquema de corrupção. Conforme informações fornecidas pelo Ministério Público Federal, “nesse esquema, que dura pelo menos dez anos, grandes empreiteiras organizadas em cartel pagavam propina para altos executivos da estatal e outros agentes públicos”[20].
Estendendo-se para o exterior, a operação Lava Jato investiga diferentes governos de países da América Latina, uma vez que a operação está identificando políticos beneficiados em diversos países. Tanto o ex-presidente do Peru, Alejandro Toledo, quanto o atual presidente da Colômbia, Juan Manuel Santos, foram investigados sob a suspeita de receberem benefícios no esquema de propinas de empreiteiras brasileiras[21].
Não obstante, o executivo brasileiro, Marco Pereira Bilinski, um dos delatores da Lava Jato, relatou a abertura de empresas offshore para movimentar recursos ilícitos de empreiteiras. O executivo declarou que efetuou a abertura de contas e empresas offshore, sediadas em paraísos fiscais, para empresários de países como Venezuela, Panamá e República Dominicana, que possuíam relação com empreiteiras brasileiras envolvidas no esquema de propina[22]
“Belinski abriu ainda duas contas para um empresário do país que alegou ter interesse de movimentar dinheiro para negócios imobiliários. O delator disse que, posteriormente, as contas abertas para este empresário chegaram a receber valores de contas da Odebrecht que ele e seus sócios (também delatores) Vinícius Veiga Borin e Luiz França cuidavam, já no Meinl Bank Antigua”[23].
Ainda, o Ministério Público Federal, ofereceu representação frente a 13º Vara Federal criminal de Curitiba, objetivando a adoção de medidas cautelares de busca e apreensão, além da decretação da prisão preventiva, de sujeitos envolvidos com o esquema de propina investigado pela operação Lava Jato, dentre eles:
“a) a decretação de medidas cautelares de busca e apreensão nos endereços de JOÃO CERQUEIRA DE SANTANA FILHO, MÔNICA REGINA CUNHA MOURA, POLIS PROPAGANDA E MARKETING LTDA, SANTANA & ASSOCIADOS MARKETING E PROPAGANDA LTDA, ZWI SKORNICKI, ELOISA SKORNICKI, BRUNO SKORNICKI, ARMANDO RAMOS TRIPODI, OLÍVIO RODRIGUES JUNIOR, MARCELO RODRIGUES, GRACO CORRETORA DE CÂMBIO S.A, LUIZ EDUARDO
DA ROCHA SOARES, FERNANDO MIGLIACCIO DA SILVA e HILBERTO MASCARENHAS DA SILVA FILHO;
No corpo da representação, consta que foram utilizadas empresas offshore em paraísos fiscais para transferências de valores ilícitos, uma vez que há relatos de que “o operador ZWI SKORNICKI depositou valores indevidos em suas contas mantidas no exterior a partir de conta titularizada pela offshore LYNMAR ASSETS CORPORATION”[25].
Ainda, a representação aponta a utilização destas empresas pela própria Odebrecht para ocultar os verdadeiros recebedores do credito transferido de forma ilícita:
“O contrato de consultoria encaminhado, datado de 04/01/2013, fora celebrado entre a empresa offshore SHELLBILL FINANCE S.A, constituída no Panamá, e a KLIENFELD SERVICES LTD., offshore utilizada pela empresa ODEBRECHT para o pagamento de valores espúrios no exterior. (…) Através do posicionamento de MÔNICA REGINA CUNHA MOURA de riscar tão somente o nome da contratante KLIENFELD SERVICES LTD., pode-se concluir que a offshore SHELLBILL FINANCE S.A é controlada pela investigada e seu marido, JOÃO CERQUEIRA DE SANTANA FILHO.[26]”
Além disso, embasando o entendimento de como a constituição de empresas offshore podem ser utilizadas de forma ilícita e, ainda, auxiliar no maior esquema de corrupção do Brasil, um dos delatores da Operação Lava Jato, o empresário Vinicius Borin, afirmou em seu depoimento, que aproximadamente 24 empresas offshore foram beneficiadas com transferências financeiras ligadas a Odebrecht[27].
Por todo exposto, a operação Lava Jato atravessou para sua 47ª fase, e após diversas investigações e denúncias, que contribuíram com o vazamento de dados confidenciais da Mossack Fonseca, empresa do Panamá responsável pela abertura de offshore no exterior, constatou-se a ligação de 57 brasileiros, entre políticos e outras personalidades públicas, alguns associados a empreiteira Odebrecht, relacionados a cem offshore localizadas em paraísos fiscais[28].
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O presente trabalho possui o intuito de demostrar como os “paraísos fiscais” podem ser utilizados de maneira lícita pelos indivíduos que almejam aplicar seus bens e valores com tributação menos elevada. Esses lugares proporcionam vantagens fiscais para as pessoas físicas e jurídicas e, por conta disso, recebem investimentos de todo o mundo. A deturpação desses paraísos fiscais são o real problema apontado pelo estudo.
Pode-se concluir que quando tais locais são manuseados como forma de burlar a lei de determinado país, quando utilizados para prejudicar a execução de obrigações de sujeitos ou sociedades devedoras, os chamados “paraísos fiscais” passam a ser vistos como lugares propícios para o cometimento de ilícitos. Logo, o antes local visualizado como um território em que a legislação é liberal e benéfica, passa a ser visto como um ambiente permissivo e auxiliador para fraudar possíveis credores.
As operações de blindagem patrimonial foram abordadas no presente trabalho, justamente para identificar os meios pelos quais estes paraísos fiscais são utilizados para fraudar execuções motivadas por credores. Através da criação de empresas estrangeiras, conhecidas como offshore, para transferências de bens e valores do patrimônio das sociedades que estão sendo executadas, estes “paraísos fiscais”, por apresentarem uma legislação fiscal liberal, facilitam tais operações.
Por fim, relaciona a utilização desses “paraísos fiscais” com o esquema de corrupção investigado pela Operação Lava Jato. Aponta-se como as empresas envolvidas com a distribuição de propina da Petrobras utilizavam-se de paraísos fiscais para realizar e ocultar a lavagem de dinheiro.
REFERÊNCIAS
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** Discentes do 10º período de Direito da Faculdade de Direito de Vitória – FDV. Email: brunahelmer@hotmail.com; gabriela.amra@gmail.com
*** Mestre em Empresarial pelas Faculdades Milton Campos, FMC. Especialista Direito Civil e Processual Civil pela Universidade Gama Filho, UGF. Graduada em Direito pela Universidade Federal do Espírito Santo – UFES. Professora de Direito Empresarial na Faculdade de Direito de Vitória. E-mail: alessandralmsa@gmail.com
[1] DA SILVA, Ricardo Jorge Rocha. Paraísos Fiscais. Lisboa. ISCAL. 2012. p. 10
[2] Disponível em <https://oglobo.globo.com/economia/receita-federal-muda-conceito-de-paraiso-fiscal-para-atrair-investimento-estrangeiro-14707929#ixzz5CBVteUno
stest>. Acesso em 09 abr 2018.
[3] LEITÃO, Luís Manuel Teles de Menezes, Evasão e fraude internacional, Lisboa: DGCI.CEF, 1993, p. 307
[4] DA SILVA, Ricardo Jorge Rocha. Paraísos Fiscais. Lisboa. ISCAL. 2012. p. 15
[5] MAMEDE, Gladston e MAMEDE, Eduarda Cotta. Blindagem Patrimonial e Planejamento Jurídico. São Paulo. Editora Atlas S.A. 2015. ed.5. p. 45
[6] Os 10 principais “paraísos fiscais” do mundo. Disponível em: <https://exame.abril.com.br/economia/o s-10-principais-paraisos-fiscais-do-mundo/>. Acesso em: 09 abr 2018.
[7] DA SILVA, Ricardo Jorge Rocha. Paraísos Fiscais. Lisboa. ISCAL. 2012. p. 9.
[8] SILVA, Rafael Martins. Patrimônio. Disponível em: <http://www.faculdadedelta.edu.br/downloads _alunos/13 45222159_5.0.Patrimonio.pdf>.
[9] MAMEDE, Gladston e MAMEDE, Eduarda Cotta. Blindagem Patrimonial e Planejamento Jurídico. São Paulo. Editora Atlas S.A. 2015. ed.5. p. 22.
[10] MAMEDE, Gladston e MAMEDE, Eduarda Cotta. Blindagem Patrimonial e Planejamento Jurídico. São Paulo. Editora Atlas S.A. 2015. ed.5. p. 43.
[11] Disponível em: <http://www.stj.jus.br/SCON/jurisprudencia/toc.jsp?livre=fraude+e+blindagem+pat rimonial&&b=ACOR&thesaurus=JURIDICO&p=true>.
[12] MAMEDE, Gladston e MAMEDE, Eduarda Cotta. Blindagem Patrimonial e Planejamento Jurídico. São Paulo. Editora Atlas S.A. 2015. ed.5. p. 45.
[13] MAMEDE, Gladston e MAMEDE, Eduarda Cotta. Blindagem Patrimonial e Planejamento Jurídico. São Paulo. Editora Atlas S.A. 2015. ed.5. p. 47.
[14] Disponível em: <https://stj.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/19133083/recurso-especial-resp-1092134-sp-2008-0220441-3-stj/relatorio-e-voto-19133085>.
[15] Disponível em: <http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=79600>.
[16] MAMEDE, Gladston e MAMEDE, Eduarda Cotta. Blindagem Patrimonial e Planejamento Jurídico. São Paulo. Editora Atlas S.A. 2015. ed.5. p. 48.
[17] Ministério Público Federal. Disponível em: <http://www.mpf.mp.br/para-o-cidadao/caso-lava-jato/entenda-o-caso>.
[18] Ministério Público Federal. Disponível em: < http://www.mpf.mp.br/para-o-cidadao/caso-lava-jato/atuacao-na-1a-instancia/investigacao/historico>.
[19] Ministério Público Federal. Disponível em: <http://www.mpf.mp.br/para-o-cidadao/caso-lava-jato/entenda-o-caso>.
[20] Ministério Público Federal. Disponível em: <http://www.mpf.mp.br/para-o-cidadao/caso-lava-jato/entenda-o-caso>.
[21] Disponível em: <https://g1.globo.com/mundo/noticia/lava-jato-avanca-no-exterior-e-coloca-governos-da-america-latina-sob-suspeita.ghtml>.
[22] Disponível em: <http://politica.estadao.com.br/blogs/fausto-macedo/executivo-diz-que-abriu-contas-em-paraisos-fiscais-para-parceiros-da-odebrecht/>.
[23] Disponível em: <http://politica.estadao.com.br/blogs/fausto-macedo/executivo-diz-que-abriu-contas-em-paraisos-fiscais-para-parceiros-da-odebrecht/>.
[24] Disponível em: <http://d1ao0r2iuz522v.cloudfront.net/64931ab6c74fd93c75e05baa86f99ad2.pdf>. p. 01.
[25] Disponível em: <http://d1ao0r2iuz522v.cloudfront.net/64931ab6c74fd93c75e05baa86f99ad2.pdf>. p. 03.
[26] Disponível em: <http://d1ao0r2iuz522v.cloudfront.net/64931ab6c74fd93c75e05baa86f99ad2.pdf>. p. 08.
[27] Disponível em: < https://noticias.r7.com/brasil/delator-da-lava-jato-diz-que-28-firmas-de-paraisosfisc ais-receberam-r-455-milhoes-da-odebrecht-21062016>.
[28] Disponível em: <https://brasil.elpais.com/brasil/2016/04/03/politica/1459714116_802121.html>.
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