Resumo: A concessão encontra expressa referência no Texto Constitucional, respaldando-se no artigo 175 que dicciona, com clareza ofuscante, que “incumbe ao Poder Público, na forma da lei, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, sempre através de licitação, a prestação de serviços públicos”. Em linhas conceituais, é possível descrever a concessão do serviço público é o contrato administrativo por meio do qual a Administração Pública transfere, sob condições, a execução e exploração de certo serviço público que lhe é privativo a um particular que para isso manifeste interesse e que será remunerado, de maneira adequada, mediante a cobrança, dos usuários, de tarifa previamente por ela aprovada. Neste sentido, o escopo do presente está assentado em promover uma análise acerca dos aspectos caracterizadores do instituto da concessão, bem como das hipóteses estabelecidas para extinção da concessão de serviço público.
Palavras-chave: Administração Pública. Concessão. Serviços Públicos. Hipótese de Extinção.
Sumário: 1 Comentários Introdutórios; 2 Concessão de Serviço Público Simples; 3 Concessão de Serviço Público Precedida da Execução de Obra Pública; 4 Natureza Jurídica; 5 Distinção entre Concessão e Permissão; 6 Prazo da Concessão; 7 Intervenção na Concessão; 8 Comentários às Hipóteses de Extinção da Concessão de Serviço Público
1 Comentários Introdutórios
A concessão encontra expressa referência no Texto Constitucional, respaldando-se no artigo 175 que dicciona, com clareza ofuscante, que “incumbe ao Poder Público, na forma da lei, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, sempre através de licitação, a prestação de serviços públicos”[1]. Com efeito, Carvalho Filho vai afirmar que o texto é claro no que concerne à prestação dos serviços públicos, instituindo uma alternativa para o exercício dessa atividade, a saber: atuação direta pela Administração ou a atuação descentralizada, por meio das concessões e permissões[2]. Em sede infraconstitucional, o instituto da concessão de serviços públicos, cuida mencionar que a Lei nº 8.987, de 13 de Fevereiro de 1995, que dispõe sobre o regime de concessão e permissão de serviços públicos previsto no art. 175 da Constituição Federal e dá outras providências[3].
Em linhas conceituais, é possível descrever, de acordo com Diógenes Gasparini[4], a concessão do serviço público é o contrato administrativo por meio do qual a Administração Pública transfere, sob condições, a execução e exploração de certo serviço público que lhe é privativo a um particular que para isso manifeste interesse e que será remunerado, de maneira adequada, mediante a cobrança, dos usuários, de tarifa previamente por ela aprovada. Em seu escólio, Hely Lopes Meirelles[5] vai discorrer que a concessão consiste na delegação contratual da execução do serviço, na forma autorizada e regulamentada pelo Executivo. Logo, o contrato de concessão é pactuado nos termos do Direito Administrativo, sendo bilateral, oneroso, comutativo e realizado intuitu personae. Convém, diante de tais aspectos caracterizadores, nos termos da Lei nº 8.987, de 13 de Fevereiro de 1995[6], que a concessão só pode ser pactuada com pessoa jurídica ou consórcio de empresas. Assim, por dicção contrária do artigo 2º, incisos II e III, a concessão não será pactuada com pessoa natural.
Meirelles[7], ainda, vai sustentar que é um acordo administrativo – e não um ato unilateral da Administração Pública -, com a presença de vantagens e encargos recíprocos, no qual são estabelecidas as condições de prestação do serviço, considerando-se o interesse coletivo na sua obtenção e as condições pessoais de quem se propõe à execução por delegação do poder concedente. Ora, tratando-se de contrato administrativo, está condicionado a todas as imposições da Administração necessária à formalização do ajuste, dentre as quais a autorização governamental, a regulamentação e a licitação. Com destaque, a concessão não acarreta a transferência da propriedade ao concessionário pelo poder concedente[8] nem se despoja de qualquer direito ou prerrogativa pública.
Meirelles[9], ainda, vai aduzir que a concessão consiste apenas na delegação da execução do serviço público, nos limites e condições legais ou contratuais, estando, a todo tempo, sujeito à regulamentação e à fiscalização do concedente. Nesta trilha, como o serviço, apesar de concedido, continua sendo público, logo, o poder concedente nunca se despoja do direito de promover a exploração, direta ou indiretamente, por seus órgãos, suas autarquias e empresas estatais, desde que o interesse coletivo assim o exija. Em tais condições, o poder concedente permanece com a faculdade de, a qualquer tempo, no curso da vigência do contrato de concessão, retomar o serviço concedido, mediante adimplemento de indenização, ao concessionário, dos lucros cessante e danos emergentes advindos da encampação. É digno de nota que as indenizações, na materialização de tal hipótese, serão as previstas no contrato ou, caso omisso, as que foram apuradas amigável ou judicialmente.
Ao lado disso, a concessão, a rigor, deve ser conferida sem exclusividade, com o escopo de propiciar, sempre que possível, a competição entre os interessados, favorecendo, desta sorte, os usuários com serviços melhores e tarifas mais baratas. Por seu turno, porém, o artigo 16 da Lei nº 8.987, de 13 de Fevereiro de 1995[10], irá afixar a hipótese de concessão com exclusividade, a saber: quando houver inviabilidade técnica ou econômica de concorrência na prestação do serviço, desde que, previamente, haja justificativa. “A atividade do concessionário é atividade privada, e assim será exercida, quer no tocante à prestação do serviço, quer no que entende com o seu pessoal” [11], como explana Meirelles.
Ao lado disso, apenas para os fins expressamente assinalados em lei ou no contrato é que são equiparados os concessionários a autoridades públicas, estando, portanto, os seus atos sujeitos a mandado de segurança e demais ações cabíveis. No que atina às relações com o público, o concessionário fica atrelado à observância do regulamento e do contrato, que podem afixar direitos e deveres também para os usuários, além dos já cominados em legislação, para defesa dos quais dispõe o particular de todos os mecanismos judiciais comuns, em especial a via cominatória, para reclamar a prestação do serviço nas condições em que o concessionário se comprometeu a prestá-lo aos interessados. Findando o prazo do contrato de concessão, o concessionário deve reverter, ao poder concedente, os direitos e bens vinculados à prestação do serviço, nas condições estabelecidas previamente no contrato.
2 Concessão de Serviço Público Simples
Ao se qualificar a concessão de serviço público como simples, distingue-se de modalidade diversa (a ser esmiuçada no item “3” do presente) que o Estado, também, delega a construção da obra pública. Em harmonia com o inciso II do artigo 2º da Lei nº 8.987, de 13 de Fevereiro de 1995[12], entende-se a modalidade em comento como a concessão de serviço público a delegação de sua prestação, feita pelo poder concedente, mediante licitação, na modalidade de concorrência, à pessoa jurídica ou consórcio de empresas que demonstre capacidade para seu desempenho, por sua conta e risco e por prazo determinado. Carvalho Filho[13], ainda, vai destacar que, em decorrência dos contornos do instituto, trata-se de um serviço público que, por beneficiar a coletividade, deveria incumbir ao Estado. Contudo, esse decide transferir a execução para particulares, sob o estabelecimento de fiscalização, nos termos capitulados no caput do artigo 3º da legislação supramencionada[14].
Ademais, como o serviço vai ser prestado para os membros da coletividade, a estes incumbirá o ônus de remunerá-lo em prol do executor. Ao lado do exposto, conquanto haja uma relação principal que vincula concedente ao concessionário, há outros liames existentes nesse negócio típico de direito público, responsável, também, pela caracterização de situações jurídicas aptas para estabelecer um caráter triangular. Ora, se de um lado o negócio principia pelo ajuste entre o Poder Público e o concessionário, dele advêm outras relações jurídicas, como as responsáveis por vincular o concedente ao usuário e este ao concessionário, como aduz Carvalho Filho[15] em suas ponderações.
Prosseguindo no exame da modalidade em comento, é interessante frisar que o objeto da concessão simples pode ser analisado a partir de dois aspectos distintos, quais sejam: mediato e imediato. De maneira mediata, a modalidade significa a vontade administrativa de gerir, em âmbito descentralizado, determinado serviço público, alicerçado na necessidade de agilizar a atividade, conferindo maior celeridade na execução e melhoria no atendimento aos indivíduos que a solicitam. O objeto imediato, por seu turno, é a execução de determinada atividade caracterizada como serviço público, a ser desfrutada pela coletividade. Neste passo, a Lei nº 9.074, de 07 de julho de 1995, que estabelece normas para outorga e prorrogações das concessões e permissões de serviços públicos e dá outras providências, sujeitou ao regime da Lei nº 8.987/1995, os seguintes serviços públicos federais:
“Art. 1o Sujeitam-se ao regime de concessão ou, quando couber, de permissão, nos termos da Lei no 8.987, de 13 de fevereiro de 1995, os seguintes serviços e obras públicas de competência da União:
I – (VETADO)
II – (VETADO)
III – (VETADO)
IV – vias federais, precedidas ou não da execução de obra pública;
V – exploração de obras ou serviços federais de barragens, contenções, eclusas ou outros dispositivos de transposição hidroviária de níveis, diques, irrigações, precedidas ou não da execução de obras públicas;
VI – estações aduaneiras e outros terminais alfandegados de uso público, não instalados em área de porto ou aeroporto, precedidos ou não de obras públicas;
VII – os serviços postais”[16].
Em alinho ao acima, o artigo 2º da Lei nº 9.074, de 07 de julho de 1995[17], vai excluir da necessidade de contratar a concessão em algumas atividades de transporte, como as de transporte de cargas por meio rodoviário; aquaviário de passageiros, desde que não realizado entre portos organizados; rodoviários e aquaviário de pessoas, realizados por empresas de turismo no exercício da respectiva atividade; e transporte de pessoas, realizado de forma privativa, por organizações públicas ou privadas, mesmo de maneira regular. Denota-se, assim, no que concerne ao objeto, que há, primeiramente, uma diretriz administrativa pela qual se constata a conveniência da concessão; posteriormente, ajusta-se o contrato para alcançar os fins almejados.
3 Concessão de Serviço Público Precedida da Execução de Obra Pública
Além da modalidade de concessão de serviço público simples, a legislação de regência, ainda, instituiu outra modalidade, doutrinariamente denominada de concessão de obra pública ou, ainda, legalmente chamada como concessão de serviço público precedida da execução de obra pública, cuja acepção se apresenta mais técnica. Neste passo, o inciso III do artigo 2º da Lei nº 8.987, de 13 de Fevereiro de 1995[18], conceitua a modalidade em exame como a concessão que via a construção, total ou parcial, conservação, reforma, ampliação ou melhoramento de quaisquer obras de interesse público, delegada pelo poder concedente, mediante licitação, na modalidade de concorrência, à pessoa jurídica ou consórcio de empresas que demonstre capacidade para a sua realização, por sua conta e risco, de forma que o investimento da concessionária seja remunerado e amortizado mediante a exploração do serviço ou da obra por prazo determinado.
Na modalidade de concessão em destaque, o Estado pretende livrar-se do dispêndio que obras públicas acarretam, remanescendo todo o investimento ao concessionário. Ora, como esse investe vultuosos recursos na execução da obra, é permitida a exploração, com o escopo de recuperar o montante investido. De outro ângulo, a coletividade se beneficia da obra e o Estado, após o prazo de concessão, assume sua exploração, podendo, ou não, promover a transferência novamente, se for de sua conveniência. Carvalho Filho[19], ao examinar as nominatas estabelecidas na legislação em comento e na doutrina, leciona que a expressão concessão de obra pública denota que o Poder Público transferia ou concedia uma obra pública, o que não ocorre em tal negócio jurídico. Com destaque, a obra não pode ser tecnicamente concedida, porquanto o quê o Estado concede é a atividade, isto é, o serviço, autorizando, para tanto, o concessionário a executar obra previamente. Verifica-se, assim, que há duplicidade de objeto: em relação a este, o que é o objeto de concessão é o serviço público a ser prestado após a execução da obra.
Em complemento, a delegação sob essa modalidade de concessão é compreendida uma duplicidade de objetos. O primeiro abarca um ajuste entre o concedente e o concessionário para o fito de ser executada determinada obra pública. Observa-se que há verdadeiro contrato de construção de obra, semelhante aos contratos administrativos de obra em geral, deles se diferenciando, todavia, pela circunstância de que o concedente não remunera o concessionário pela execução, o que não é verificado naqueles. Já o segundo objeto é responsável pela tradução da real concessão, ou seja, o concedente, ultimada a construção da obra, transfere sua exploração, por lapso temporal determinado, que, conquanto seja denominada de concessão de serviço público precedida da execução de obra pública, foi ela definida, em legislação, como a construção, total ou parcial, conservação, reforma, ampliação ou melhoramento de quaisquer obras de interesse público. “No que diz respeito à construção, reforma, ampliação ou melhoramento de obras, é assimilada o caráter de precedência em relação ao serviço a ser executado”[20].
É oportuno, ainda, frisar que tais argumentos não subsistem em relação à atividade de conservação. Ora, a atividade de conservar obras públicas guarda concomitância com o serviço prestado, e não precedência: à proporção que as obras são executadas, o concessionário explora o respectivo bem público por meio da cobrança de tarifa. A título de exemplificação, é o que ocorre com a concessão para a execução de obras e conservação de estradas de rodagem, remunerada pelo sistema de pedágios. Assim, conquanto subsista a expressão concessão de serviço público precedida da execução de obra, é possível a concessão ter por objeto a execução da obra realizada simultaneamente à prestação do serviço de conservação.
4 Natureza Jurídica
No que atina à natureza jurídica da concessão de serviço público, é importante destacar que não há plena unanimidade, em que pese a doutrina majoritária assentar a perspectiva que se trata de contrato administrativo. José dos Santos Carvalho Filho[21], porém, vai afirmar que o negócio jurídico é de natureza contratual, conquanto seja forçoso reconhecer particularidades específicas que o configuram realmente como inserido no âmbito do direito público. No mais, a Constituição Federal, na redação do artigo 175, parágrafo único, quando faz alusão à lei disciplinadora das concessões, toca, no inciso I, ao caráter especial do contrato, o que explicita a natureza contratual do instituto. A Lei nº 8.987, de 13 de Fevereiro de 1995[22], em seu artigo 4º, colocou fim a eventual controvérsia, mencionando expressamente que a concessão, independente da modalidade, será formalizada mediante contrato.
No mais, a concessão está condicionada a um conjunto de regras de aspecto regulamentar, as quais são responsáveis por estabelecer a organização e o funcionamento do serviço, e que, em decorrência de tal essência, comportam modificação unilateralmente pela Administração. Afora isso, a concessão é constituída, ainda, por regras essencialmente contratuais, a saber: as disposições financeiras que asseguram a remuneração do concessionário, norteadas pelo corolário do equilíbrio econômico-financeiro dos contratos. Ora, é importante destacar que, tendo a natureza jurídica de contratos administrativos, as concessões estão submetidas, basicamente, a regime de direito público, cujos regramentos encontram disposição na Lei nº 8.987, de 13 de Fevereiro de 1995. Supletivamente, todavia, há admissibilidade da incidência das normas de direito privado, pois que neste é que se observa detalhada a disposição que norteia os contratos em geral. Contudo, repise-se, a fonte primeira é a norma especial reguladora.
Carvalho Filho[23], ainda, vai afirmar que todos os elementos mencionados até o momento conduzem ao enquadramento das concessões na órbita da teoria clássica do contrato administrativo, sendo possível destacar três aspectos basilares: a) o objeto contratual é complementado por atos unilaterais posteriores à celebração do ajuste; b) a autoexecutoriedade das pretensões da Administração; c) o respeito ao corolário do equilíbrio econômico-financeiro fixado no início. Outro aspecto que reclama destaque repousa na natureza do objeto a que se destinam os contratos de concessão de serviços públicos. Ora, como se denota na própria denominação, configura objeto desse tipo de ajuste a prestação de um serviço público. A atividade delegada ao concessionário deve caracterizar-se como serviço público e os exemplos conhecidos de concessões comprovam o fato: firmam-se concessões para serviços de energia elétrica, gás canalizado, transportes coletivos, comunicações telefônicas etc.
5 Distinção entre Concessão e Permissão
Ao se ter como substrato as ponderações aduzidas algures, denota-se que o traço diferencial entre a concessão e a permissão de serviço público jazia na natureza jurídica, isto é, enquanto a primeira era considerada como contrato administrativo, a segunda era detentora de natureza de atos administrativos. “A fisionomia contratual era, pois, inadequada para a permissão, como registrava a doutrina em quase unanimidade”[24]. Com a promulgação da Lei Nº. 8. 987, de 13 de Fevereiro de 1995, constata-se que tal distinção restou, de modo determinante, prejudicado, uma vez que, por meio do artigo 40[25], atribuiu ao instituto em comento o caráter de contrato de adesão, tratando, segurando alguns doutrinadores, como um equívoco e uma contradição por parte do legislador.
O Supremo Tribunal Federal, ao decidir Ação Direta de Inconstitucionalidade Nº. 1.491/DF, decidiu que a redação contida no parágrafo único do artigo 175 da Constituição Federal rechaçou qualquer distinção conceitual entre permissão e comissão, notadamente em decorrência de ter assegurado àquela o caráter contratual próprio desta. Deste modo, conquanto haja vozes dissonantes a respeito da natureza jurídica, a Suprema Corte firmou entendimento que, atualmente, a concessão e a permissão de serviços públicos possuem a mesma natureza jurídica, a saber: contrato administrativo.
Constata-se, desta forma, que ambos os institutos são formalizados por meio de contratos administrativos, bem como possuem o mesmo objeto, qual seja: a prestação de serviços público, e representam a mesma forma de descentralização, sendo ambos resultantes da delegação negocial. Outrossim, denota-se que ambos os institutos não dispensam prévia licitação e, de forma idêntica, recebem a incidência de várias particularidades inerentes a este tipo de delegação, como, por exemplo, supremacia do Estado, mutabilidade contratual, remuneração tarifária. Ultrapassando o texto legal, referente às definições dos institutos em tela, verifica-se a presença de dois pequenos pontos distintivos, que traçam a linha demarcatória.
Primeiramente, “enquanto a concessão pode ser contratada com pessoa jurídica ou consórcio de empresas, a permissão só pode ser firmada com pessoa física ou jurídica”[26]. Ora, pelo expendido, denota-se que não há concessão com pessoa natural nem permissão com consórcio de empresas. Em segundo ponto, depreende-se do conceito insculpido no inciso IV do artigo 2º da Lei Nº. 8.897/1995, que o ajuste é proveniente de delegação a título precário, ressalva que não é aplicada na definição da concessão. Assim, considerou o legislador que a permissão é dotada de precariedade, estando o particular que firmou o ajuste com a Administração sujeito ao livre desfazimento por parte desta, sem que subsista direito à indenização por eventuais prejuízos.
6 Prazo de Concessão
É importante assinalar que as concessões serão outorgadas mediante prazo determinado, como aludem as partes finais dos incisos II e III do artigo 2º da Lei nº 8.987, de 13 de Fevereiro de 1995. Em alinho ao exposto, caracterizando-se como contrato administrativo e exigindo sempre o prévio procedimento de licitação, conforme redação ofuscante do artigo 175 da Constituição Federal, a concessão por prazo indeterminado materializaria verdadeira burla, por linhas transversas, ao princípio constitucional, privilegiando por todo o tempo um determinado particular em detrimento de outros que também pretendessem colaborar com o Poder Público. Sobre o prazo determinado, o Superior Tribunal de Justiça já assentou entendimento plasmado no sentido que:
“Ementa: Processual Civil e Administrativo. Concessão de Serviço Público. Transporte. Prorrogação do contrato sem licitação para restabelecer o equilíbrio econômico-financeiro. Impossibilidade. 1. O STJ entende que, fixado estabelecido prazo de duração para o contrato, não pode a Administração alterar essa regra e elastecer o pacto para além do inicialmente fixado, sem prévia abertura de novo procedimento licitatório, porquanto tal prorrogação implicaria quebra da regra da licitação, ainda que, in casu, se verifique a ocorrência de desequilíbrio econômico-financeiro do contrato com o reconhecimento de que as concessionárias dos serviços devam ser indenizadas. 2. O Superior Tribunal de Justiça também possui a orientação de que, nos termos do art. 42, § 2º, da Lei 8.987/95, deve a Administração promover certame licitatório para novas concessões de serviços públicos, não sendo razoável a prorrogação indefinida de contratos de caráter precário. 3. Recurso Especial provido”. (Superior Tribunal de Justiça – Segunda Turma/ REsp 1.549.406/SC/ Relator: Ministro Herman Benjamin/ Julgado em 16 ago. 2016/ Publicado no DJe em 06 set. 2016).
“Ementa: Administrativo e Processual Civil. Concessão de serviço público. Loteria. Prorrogação do contrato sem licitação. Impossibilidade. Alegado cerceamento ao direito de defesa. Verificação impossibilidade. Incidência do enunciado sumular n. 7/STJ. Alegada ofensa ao direito do concessionário ao equilíbrio econômico financeiro. Não demonstração. […] 2. Fixado determinado prazo de duração para o contrato e também disposto, no mesmo edital e contrato, que esse prazo só poderá ser prorrogado por igual período, não pode a Administração alterar essa regra e elastecer o pacto para além do inicialmente fixado, sem prévia abertura de novo procedimento licitatório, sob pena de violação não apenas das disposições contratuais estabelecidas mas, sobretudo, de determinações impostas pela Constituição Federal e por toda a legislação federal que rege a exploração dos serviços de loterias. 3. Não há ofensa ao equilíbrio contratual econômico financeiro em face dos investimentos realizados pela empresa recorrente, porquanto o ajuste de tal equilíbrio se faz em caráter excepcional por meio dos preços pactuados e não pela ampliação do prazo contratual. A prorrogação indefinida do contrato é forma de subversão às determinações legais e constitucionais que versam sobre o regime de concessão e permissão para exploração de serviços públicos, o que não pode ser ratificado por este Superior Tribunal de Justiça. 4. Recurso especial não provido.” (Superior Tribunal de Justiça – Segunda Turma/ REsp 912.402/GO/ Relator: Ministro Mauro Campbell Marques/ Julgado em 06 ago. 2009/ Publicado no DJe em 19 ago. 2009).
No mais, inexiste norma expressa que indique o limite de prazo, com o que a fixação deste ficará a critério da pessoa federativa concedente do serviço público. Com destaque, é oportuno consignar que o prazo, de maneira imprescindível, deverá observar o serviço a ser concedido. Além disso, tratando-se de serviços para cuja prestação seja reclamado o dispêndio de recursos vultuosos, impende que o contrato seja firmado em prazo que assegure ao concessionário o ressarcimento do capital investido, porque, admitir maneira diversa, não haveria interesse da iniciativa privada em colaborar com o Poder Público, consoante expõe Carvalho Filho[27]. Destarte, a concessão deve ser outorgada em prazo compatível com o princípio da igualdade de oportunidades a ser proporcionada a todos quantos apresentem interesse em executar atividades de interesse coletivo, culminando que seja reavaliado o serviço prestado, o prestador, o preço do serviço etc. em novo procedimento licitatório para tal escopo.
7 Intervenção na Concessão
Tal como espancando alhures, a concessão implica a delegação, por parte do Poder Público, de certo serviço de interesse público ao concessionário, que o executa por sua conta e risco. A partir de tal acepção básica decorre a premissa que, em razão da delegação do serviço por parte do Estado, é reservado o poder-dever de fiscalizar a sua prestação, em decorrência de ser a população o alvo da atividade delegada. Assim, em virtude de tais elementos é que o concedente pode adotar várias medidas para assegurar a regular execução do serviço. “Uma dessas medidas consiste exatamente na intervenção do concedente na concessão. Trata-se de uma emergencial substituição do concessionário, que, por este ou aquele motivo, não está conseguindo levar a cabo o objeto do contrato”[28]. Nesta linha, é possível conceituar a intervenção como manifestação da ingerência direta do concedente na prestação do serviço delegado, em aspecto de controle, com o escopo de assegurar a manutenção do serviço adequado à sua finalidade e para garantir o fiel cumprimento das normas legais, regulamentares e contratuais da concessão.
Desta forma, tratando-se de ingerência direta no contrato e na execução do serviço, a intervenção apenas se legitimará diante da presença de certos requisitos. O primeiro requisito a ser observado é o ato administrativo deflagrador, porquanto a legislação reclama que a intervenção seja feita por decreto do Chefe do Executivo da entidade concedente, devendo conter, da forma mais precisa possível, os limites, o prazo e o escopo da intervenção, bem como indique o interventor. O requisito importa modalidade de competência especial, porquanto apenas um agente da Administração – o Chefe do Executivo – possui aptidão jurídica para declarar a intervenção, consoante parágrafo único do artigo 32 da Lei nº 8.987, de 13 de Fevereiro de 1995[29]. O decreto, in casu, traz a característica da autoexecutoriedade, porque verificada a irregularidade da prestação do serviço e constatada a situação emergencial, desde logo, o ato produz seus efeitos.
Após o decreto interventivo é que o concedente deve instaurar o procedimento administrativo e, nos termos do caput do artigo 33 da legislação supramencionada, o prazo será de trinta dias, oportunidade em que, no procedimento, buscarão as causas que geraram a inadequação do serviço, bem como apurarão as devidas responsabilidades. Obviamente, em decorrência dos princípios processuais constitucionais, o procedimento será norteado pelos corolários do contraditório e da ampla defesa. O §2º do artigo 33 vai cominar que o prazo para encerramento da apuração será de cento e oitenta dias. Contudo, ultrapassado o prazo afixado em lei, a Administração ter-se-á mostrado lenta e desidiosa, acarretando, como efeito de tal comportamento, a invalidade da intervenção, retornando o concessionário à gestão do serviço delegado.
O procedimento, uma vez encerrado, alcançará uma de duas conclusões, a saber: concluído pela inadequação do concessionário para prestar o serviço, fato que acarretará a extinção da concessão; ou nenhuma culpa se terá apurado contra ele e, em tal hipótese, a concessão será restaurada sua normal eficácia. No mais, quadra reconhecer que o formalismo do procedimento é inarredável pelo administrador, que a ele está vinculado. Caso seja constatado vício no procedimento, o efeito, nos termos do §1º do artigo 33, será a sua nulidade e, se for o caso, o direito do concessionário à inteira reparação dos prejuízos causados pela intervenção.
8 Comentários às Hipóteses de Extinção da Concessão de Serviço Público
A concessão do serviço público é sempre ajustada por prazo certo ou, quando não, celebrada para vigorar até que atenda aos interesses públicos. No sistema jurídico vigente, contudo, tal como pontuado em momento anterior, vigora apenas as concessões celebradas por prazo determinada, em decorrência das redações contidas nos incisos II e III do artigo 2º da Lei nº 8.987, de 13 de Fevereiro de 1995. Entrementes, é evidente que durante a vigência da concessão de serviço público podem ocorrer certos fatos ou atos jurídicos que acarretam a extinção da concessão de serviço público. Alguns desses acontecimentos têm o condão de extinguir automaticamente a concessão, ao passo que outros não, porém servem de motivo para sua extinção. Tais fatos e atos jurídicos são comumente chamados de causas extintivas de concessão. Segundo o escólio apresentado por Gasparini, “várias são as causas que podem levar a concessão de serviço público à extinção: I – um fato jurídico; II – um ato jurídico; III – um ato administrativo; IV – um ato consensual; V – um ato jurisdicional”[30].
A legislação de regência, sem qualquer sistematização e de modo incompleto, na redação do artigo 35[31], indicou as causas extintivas da concessão de serviço público. Com efeito, tais causas extinguem ou servem de motivo para a extinção da concessão do serviço público, isto é, para o desfazimento do contrato de direito administrativo firmado entre o poder concedente e o concessionário. Ora, as causas não precisam estar indicadas no edital licitatório, contudo o contrato de concessão de serviço público deve, porquanto configuram as denominadas cláusulas essenciais. Entretanto, algumas podem servir de alicerce de extinção desse contrato, ainda que não estejam arroladas, a exemplo da extinção por ilegalidade e pelo decurso do prazo contratual. “A concessionária, empresa privada instituída e dirigida por particulares, não desaparece com a extinção da concessão, embora deixe de ser, na qualidade de concessionária de serviço público”[32].
8.1 Extinção da Concessão de Serviço Público por Fato Jurídico
Considera-se fato como qualquer acontecimento do mundo fenomênico, podendo ser jurídico ou ajurídico. Neste sentido, fato jurídico é aquele que possui relevância para o Direito, como é o decurso do prazo; não sendo dessa forma, considera-se como fato ajurídico, a exemplo da luz do dia. Em complemento, são fatos jurídicos que culminam com a extinção da concessão de serviço público: (i) o decurso do prazo; (ii) o desaparecimento do concessionário. No caso da primeira hipótese, o decurso do prazo, cuida destacar que a concessão de serviço público sempre será pactuada por prazo certo, logo, ultimado o prazo, extingue-se. O advento do termo estabelecido tem o condão de colocar fim ao desfruto do privilégio, culminando em extinção automática, tratando-se, portanto, de hipótese capitaneada no inciso I do artigo 35 da Lei nº 8.987/1995. José dos Santos Carvalho Filho vai assinalar que “essa é a forma natural de extinção da concessão. Advindo o momento final previsto para o fim do contrato, a extinção opera-se pleno iure, sem necessidade de qualquer ato anterior de aviso ou notificação”[33].
Com efeito, inexiste a necessidade de algum ato que declare a extinção da concessão do serviço público, conquanto seja carecido um termo circunstanciado do recebimento do serviço e dos bens público, bem como, quando for o caso, dos bens do concessionário, os quais passam para o domínio público do poder concedente, em decorrência da materialização do instituto da reversão. Os efeitos jurídicos da extinção são computados da data em que houve a consumação do prazo. “São efeitos ex nunc, e não há como pretender sejam de outro modo, pois todas as condições foram cumpridas a contento”[34], como observa Gasparini. Em mesmo sentido, Carvalho Filho vai apontar que os efeitos da extinção são ex nunc, de maneira que apenas a partir do termo final é que o serviço se considera revertido ao concedente. Igualmente, somente a partir do termo final é que o concessionário se desvincula de suas obrigações, perdendo, por consequência, os privilégios administrativos que possuíam em decorrência da vigência do contrato.
A partir do termo final, o prosseguimento da execução e exploração do serviço concedido pelo concessionário torna-se eivada de irregularidade, porque cabe a Administração Pública concedente assumi-las. In casu, a assunção independe de qualquer previsão editalícia ou contratual, porquanto encontra amparo na redação do §2º do artigo 35[35]. “Contudo, se a Administração Pública então concedente nada fizer no sentido de retomada do serviço público concedido, não pode o concessionário, […], paralisar sua execução”[36], em razão do princípio da continuidade do serviço público. Ocorrendo tal hipótese, deverá o concessionário notificar ao poder concedente com o fito de obriga-la, dentro de determinado prazo razoável, a retomar o serviço que lhe fora concedido, sob pena de sua consignação em juízo. Assumindo o serviço público, cuja execução se encontrava a cargo do concessionário, incumbe à Administração Pública, nos termos do sobredito parágrafo, proceder aos levantamentos, avaliações e liquidações necessários. Em harmonia com o §3º do artigo 35[37] da legislação supramencionada, a assunção do serviço então concedido autoriza a Administração Pública ocupar as instalações e utilizar todos os bens reversíveis.
A segunda hipótese é a extinção em razão do desaparecimento do concessionário, ou seja, em razão da falência da empresa concessionária do serviço público cuja execução e exploração lhe foram trespassadas. Com efeito, a hipótese em comento encontra previsão no inciso VI do artigo 35 da Lei nº 8.987/1995 e regulada pela Lei nº 11.101/2005, que disciplina a recuperação judicial, a extrajudicial e a falência do empresário e da sociedade empresária (Lei de Falências). “Com a decretação da falência ocorre o desaparecimento do concessionário, e isso impede lógica e juridicamente a continuidade da concessão de serviço público” [38], porque não há como manter-se em vigor o contrato sem a presença de uma das partes, qual seja: o concessionário. É automática a extinção, sendo despicienda para a caracterização qualquer manifestação estatal, conquanto seja necessário algum comportamento, por parte da Administração Pública concedente, visando a continuidade do serviço público e a defesa do interesse patrimonial.
Os efeitos jurídicos produzidos são ex nunc, contando-se a partir da decretação da falência. Como pontuado, a falência é causa extintiva da concessão do serviço público, ocorrendo durante a vigência do contrato, logo, antes do termo do prazo estabelecido, devendo, in casu, a Administração Pública concedente indenizar os investimentos atrelados a bens reversíveis, ainda não amortizados ou depreciados. Os demais bens sofrerão o processo de arrecadação pela massa falida, salvo aqueles que são pertencentes à Administração Pública concedente. Doutra ponta, a falência, quando fraudulenta, é considerada como descumprimento do contrato de concessão do serviço público, na proporção em que o concessionário deveria manter durante toda a duração do ajuste as condições iniciais de sua habilitação, porém não manteve e desencadeou a quebra, culminando, assim, em prejuízo para Administração Pública concedente. Assim, deve a Administração Pública, na condição de concedente, apurar o prejuízo e aplicar a competente sanção, abatendo tais valores de uma eventual indenização a ser paga à massa falida. Se a falência não for qualificada como fraudulenta, descabe qualquer sanção ou ressarcimento de eventuais prejuízos.
Igualmente, a dissolução da concessionária de serviço público por deliberação de seus sócios ou acionistas também tem o condão de extinguir a concessão de serviço público, supedaneado no inciso VI do artigo 35 da legislação supramencionada. Os efeitos jurídicos da extinção são contados do primeiro ato praticado no sentido da dissolução, a exemplo do termo de dissolução, no caso de sociedade de pessoa, e da aprovação da dissolução pela assembleia geral, em se tratando de sociedade de capital. “São, portanto, de agora em diante ex nunc. É extinção automática da concessão de serviço público, não tendo a Administração Pública concedente que praticar nesse sentido qualquer ato”[39], porém deve adotar algumas medidas, com o escopo de assegurar a continuidade do serviço e a preservação de seus interesses patrimoniais. A dissolução da empresa concessionária é causa extintiva da concessão do serviço público, ocorrendo durante a vigência do contrato, logo, antes do termo do prazo estabelecido, devendo, in casu, a Administração Pública concedente indenizar os investimentos atrelados a bens reversíveis, ainda não amortizados ou depreciados.
É oportuno apontar que os demais bens terão o destino que lhes for determinado pelos sócios ou acionistas, excetuando-se os pertencentes à Administração Pública concedente. Nesta linha, a dissolução é encarada como descumprimento contratual, porquanto o concessionário devia, durante todo o prazo da concessão de serviço público, assegurar as condições iniciais de habilitação, que desapareceram com essa medida de seus sócios ou acionistas. A partir de tal aspecto, com o escopo de evitar repetição enfadonha, são operados os mesmos efeitos da falência fraudulenta. Por fim, a terceira variável abarcada pelo inciso VI do artigo 35 alude ao falecimento ou à incapacidade do titular, quando se tratar de empresa individual. Trata-se de extinção automática, não sendo necessário ato algum da Administração Pública concedente para tanto, embora seja necessária alguma medida para manter a prestação do serviço público e para preservar seus interesses patrimoniais. Se tais atos não foram causados pelo titular da empresa individual, descabe alguma sanção ou apuração e exigência de eventuais prejuízos. Contudo, “a morte de um dos sócios, ainda que participante da diretoria da concessionária de serviço público, não leva à sua extinção, salvo se em razão dela dissolver-se a sociedade”[40], como aponta Gasparini. Igualmente, se esta continuar com os sócios remanescentes e sucessores do de cujus, descabe falar em dissolução.
8.2 Extinção por Ato do Concedente
A concessão de serviço público pode ser extinta por ato da Administração Pública concedente, pelos seguintes motivos: (i) o interesse público; (ii) a desafetação do serviço; (iii) o inadimplemento do concessionário; (iv) a ilegalidade da concessão. A primeira hipótese, interesse público, também nominado de mérito, poderá o poder concedente extinguir, antes do prazo, o contrato de concessão de serviço público. Com destaque, o mérito está relacionado à oportunidade ou à conveniência da extinção dessa espécie de contrato administrativo e à retomada do serviço público em que a execução e a exploração foram atribuídas ao particular. A hipótese em comento encontra amparo no inciso II do artigo 35 da Lei nº 8.987, de 13 de fevereiro de 1995[41], qual seja: a encampação. Teóricos, ainda, nominam a retomada dos serviços públicos concedidos por esse motivo de resgaste.
Com a extinção antecipada da concessão de serviço público é observável que os investimentos vinculados aos bens reversíveis que ainda não foram amortizados ou depreciados, devendo o poder concedente proceder à indenização correspondente, que há de ser prévia, ou seja, antes da retomada do serviço público, conforme preconiza o artigo 37 da Lei nº 8.987, de 13 de fevereiro de 1995[42]. Com destaque, para a legitimidade da extinção da concessão na hipótese em apreço, a legislação de regência reclama autorização legislativa específica, isto é, lei que só prescreva a autorização extintiva e as suas regras. “Os efeitos da extinção da concessão de serviço público por interesse público são ex nunc, isto é, de agora em diante, respeitando-se todos os direitos e situações já consolidadas”[43].
“Sendo o concedente o titular do serviço, é de todo razoável que, em razão da peculiaridade de certas situações, tenha ele interesse em extinguir a delegação e, por conseguinte, a concessão. Os motivos, como bem consigna a lei, são de interesse público, vale dizer, a Administração há de calcar-se em fatores de caráter exclusivamente administrativo. Registre-se, no entanto, por oportuno, que, embora esses fatores sejam próprios da avaliação dos administradores públicos, estão eles vinculados à sua veracidade”[44].
Os direitos e o de receber a correspondente indenização quando os investimentos atrelados a bens reversíveis ainda não forem inteiramente amortizados ou depreciados, são os únicos a que faz jus o concessionário. Desta feita, não assiste o direito de opor-se à extinção do contrato de concessão de serviço público que até aquele momento titularizara, exceto se o motivo for ilegal. Sob alguns aspectos, a hipótese de encampação é descrita como ato administrativo discricionário da Administração Pública, como é o momento de sua prática, sem que acarrete praticar ou não praticar o ato de extinção. É oportuno salientar que o ato de extinção da concessão de serviço público por motivo de mérito é ato administrativo, veiculado por decreto.
A segunda hipótese dispõe que a extinção da concessão de serviço público pode encontrar na desafetação do serviço público, cuja execução e exploração foram transferidas ao concessionário, o motivo de sua legalidade. Desta feita, apenas por lei um determinado serviço torna-se público, ou seja, da responsabilidade da Administração Pública, a fim de serem ofertados aos administrados, sob um regime de direito público, só por lei ele deixa de ser oferecido mediante esse regime. Na hipótese em comento, configura-se, no primeiro caso, a afetação e, no segundo, a desafetação. A afetação torna o serviço um serviço público, logo, só pela Administração Pública ou por seus concessionários e delegatários pode ser prestados aos usuários. A desafetação, por sua vez, retira o serviço público desse regime de execução, sendo que, a partir de então, o serviço passa a ser próprio dos particulares e a ser executado ou explorado como são os demais serviços caracterizados como da iniciativa privada.
Com destaque, os efeitos da desafetação são contados da data da lei que a determinar e para o futuro, sendo, portanto, efeitos ex nunc. Concomitantemente com a desafetação ocorre a extinção antecipada da concessão do serviço público, sendo perceptível que os investimentos vinculados aos bens reversíveis, ainda não totalmente amortizados ou depreciados serão indenizados pela Administração Pública concedente. Distintamente da extinção por interesse público (encampação), como causa da extinção da concessão de serviço público, a indenização não há de ser prévia, tampouco requer a presença de lei autorizadora, conquanto que para a desafetação se vindique lei. Além disso, caso com a desafetação outros prejuízos forem causados ao concessionário, incumbe à Administração Pública o dever de indenizá-lo plenamente.
O inadimplemento de obrigações a cargo do concessionário pode ser causa acarretadora da extinção da concessão do serviço público antes do termo final, estabelecido no contrato. Incumbe ao poder concedente, de forma discricionária, considerar se o inadimplemento é ou não causa suficiente a levar a extinção à concessão de serviço público. Sendo considerada com causa suficiente, é impositiva a extinção. Materializa-se, pois, a hipótese genérica albergada no inciso III do artigo 35 da legislação de regência, qual seja: a caducidade. Não comportando a extinção, aplica-se ao concessionário de serviço público a devida sanção, nos termos preconizados no caput do artigo 38 da mesma legislação[45]. Ainda em consonância com o dispositivo ora mencionado, o inadimplemento pode ser total ou parcial, porém as consequências serão as mesmas.
“Ocorre o inadimplemento quando o concessionário descumpre as condições e termos especificados no edital licitatório, no contrato de concessão de serviço público ou na lei” [46], conforme escólio de Diógenes Gasparini. O descumprimento pode materializar um ato ou fato, comissivo ou omissivo, doloso ou culposo, atribuído ao concessionário e violador de suas obrigações. No mais, o ato de caducidade é ato administrativo punitivo, veiculado por decreto editado pela Administração Pública, em observância ao §4º do artigo 38[47]. Ademais, em consonância com o §1º do artigo 38, a caducidade poderá ser decretada quando restar materializada:
“§ 1o A caducidade da concessão poderá ser declarada pelo poder concedente quando:
I – o serviço estiver sendo prestado de forma inadequada ou deficiente, tendo por base as normas, critérios, indicadores e parâmetros definidores da qualidade do serviço;
II – a concessionária descumprir cláusulas contratuais ou disposições legais ou regulamentares concernentes à concessão;
III – a concessionária paralisar o serviço ou concorrer para tanto, ressalvadas as hipóteses decorrentes de caso fortuito ou força maior;
IV – a concessionária perder as condições econômicas, técnicas ou operacionais para manter a adequada prestação do serviço concedido;
V – a concessionária não cumprir as penalidades impostas por infrações, nos devidos prazos;
VI – a concessionária não atender a intimação do poder concedente no sentido de regularizar a prestação do serviço; e
VII – a concessionária não atender a intimação do poder concedente para, em 180 (cento e oitenta) dias, apresentar a documentação relativa a regularidade fiscal, no curso da concessão, na forma doart. 29 da Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993”[48].
Conquanto não se encontrem acinzelados no §1º do artigo 38, a doutrina[49] entende que a subconcessão, a transferência de concessão e a cessão do controle societário da concessionária sem prévia anuência da Administração Pública concedente é razão suficiente para a decretação da caducidade, de acordo com a redação do artigo 27[50]. A legalidade da decretação da caducidade carece de prévio processo administrativo em que restou devidamente comprovada a inadimplência do concessionário do serviço público e lhe assegurou amplo direito de defesa, conforme prescreve o §2º do artigo 38[51]. O processo em comento só comporta instauração após o concessionário do serviço público ser informado, detalhadamente, acerca do descumprimento de suas obrigações e se lhe dado um prazo para a promoção da correção das falhas e transgressões mencionadas e enquadrar-se novamente nos termos e condições da concessão de serviço público, consoante a dicção do §3º do artigo 38[52].
Denota-se, assim, que a extinção, in casu, não é automática; ao reverso, reclama pronunciamento solene da Administração Pública concedente, como está indicado no §4º do artigo 38, caso a causa esteja indicada na lei, no regulamento ou no ato de outorga. Se a causa não se encontrar disciplinada em qualquer daqueles atos, a cassação é requerida ao Judiciário. “A entidade competente para decretar a cassação é a titular dos serviços públicos […]. Esse procedimento e essas exigências somente são necessários para a decretação da caducidade”[53], ou seja, da extinção da concessão de serviço público. Revela-se, porém, mas simples a aplicação de outras sanções contratuais, que apenas reclamam procedimento administrativo em que seja assegurado ao concessionário do serviço público amplo direito de defesa.
Com efeito, o ato da caducidade não desencadeia qualquer pedido de indenização ou a satisfação do lucro que seria aferido durante o restante do tempo ao concessionário do serviço público. Em mesma trilha, o poder concedente não possui nenhuma culpa pela inadimplência, logo, inexiste o dever de indenização, consoante redação do §4º do artigo 38[54], em especial quando estabelece que a caducidade ocorrerá independente de indenização. De maneira diversa, caso o concessionário do serviço público tenha, com sua atitude, causado qualquer prejuízo para o poder concedente, deverá satisfazê-los, indenizando-o plenamente. Como regra, o pleito indenizatório deve ser deduzido e requerido em Juízo pelo poder concedente em face do concessionário do serviço público. No mais, como se denota que a caducidade só ocorre durante o transcurso da concessão do serviço público, é patente que se os investimentos atrelados aos bens reversíveis ainda não foram totalmente amortizados ou depreciados, devendo, pois, os valores correspondentes serem apurados e indenizados.
Nesta linha, ainda sobre a caducidade, é importante assinalar que sobreditos valores, após devidamente apurados, serão pagos depois da decretação, deduzidos o montante da dívida regularmente aplicados e os prejuízos efetivamente avaliados, consoante a redação do §4º do artigo 38. Entretanto, os demais bens continuam de propriedade das partes anteriormente envolvidas na concessão do serviço público, cabendo a cada uma, em relação a tais bens, proceder em consonância com o respectivo interesse. Afora isso, nenhuma outra responsabilidade decorrente da caducidade é assumida pelo poder concedente. Em complemento, o artigo 38, em seu §6º[55], vai espancar que, declarada a caducidade, não resultará para o poder concedente qualquer espécie de responsabilidade em relação aos encargos, ônus, obrigações ou compromissos com terceiros ou com empregados da concessionária.
Por derradeiro, a quarta hipótese consiste na ilegalidade. É fato que contrato de concessão de serviço público, conquanto emoldurado pela presunção de legitimidade dos atos administrativos, fosse celebrado com vícios que o inquinam, podendo ser declarados a qualquer tempo, desde que não prescrito tal direito. Em tal cenário, há uma ilegalidade que subsidia o motivo ao ato da extinção. Com efeito, o ato do poder concedente apto a extinguir a concessão do serviço público em razão de sua ilegalidade é administrativo, comumente nominado de ato de anulação, encontrando subsídio no inciso V do artigo 35 da Lei nº 8.987/1995, sendo que a decretação pode ocorrer tanto na esfera administrativa como na judicial. No primeiro caso a anulação será chamada de invalidação, ao passo que no segundo é anulação. “A extinção por ilegalidade, é incontroverso, não é automática, exigindo, portanto, um solene pronunciamento da Administração Pública concedente ou do Judiciário”[56].
Os efeitos produzidos pelo ato da extinção, quer seja na esfera administrativa, quer seja na esfera judicial, serão ex tunc, ou seja, retroagirão à data da concessão do serviço público ou mesmo antes, quando for verificada a existência do vício ainda na fase de licitação ou no ato de dispensa desse procedimento e a contratação direta. Destarte, só pode ocorrer, em teoria, durante a vigência da concessão do serviço público, porquanto o que se ambiciona com esse pronunciamento é a sua extinção. Após a extinção, por exemplo, em razão do decurso do prazo, a preocupação não mais subsiste, conquanto ainda seja possível buscar sua extinção com o escopo de apurar a responsabilidade de quem rendeu ensejo à causa de ilegalidade.
Caso a extinção por ilegalidade somente ocorreu durante a vigência da concessão, é fato que os investimentos vinculados a bens reversíveis ainda não foram totalmente amortizados ou depreciados. Em tal situação, cabe ao poder concedente apurar o quanto devido a tal título e adimplir indenização ao concessionário, antes da extinção da concessão de serviço público, caso esse nada tenha feito para que a ilegalidade se instalasse. A indenização, porém, será posterior, caso o concessionário de serviço público contribuiu, de algum modo, para a ocorrência da ilegalidade. Na primeira hipótese, será possível o cabimento de uma indenização com espeque na norma insculpida no §6º do artigo 37 da Constituição Federal. Na segunda, porém, não é devida nenhuma indenização, cabendo, além disso, adimplir os prejuízos eventualmente causados ao poder concedente. Os valores serão deduzidos do montante a ser pago em decorrência dos investimentos vinculados aos bens reversíveis não integralmente amortizados ou depreciados. No que atina aos demais bens, esses continuam na propriedade das partes envolvidas na concessão do serviço público, que darão o destino que seus respectivos interesses afixem.
8.3 Extinção por Ato Conjunto das partes envolvidas na Concessão de Serviço Público
É possível, quando não mais subsistir o interesse de ambas as partes, que o contrato de concessão de serviço público, por ato conjunto, seja extinto. Trata-se, com efeito, de acordo avençado entre a Administração Pública concedente e o concessionário para colocar fim à concessão do serviço público, antes do termo final contido no contrato. Nessa hipótese, “os interesses das partes envolvidas serão resolvidas por consenso. É a extinção da concessão de serviço público, denominada pela Lei federal n. 8.987/95, rescisão”[57]. Para o acordo, acredita-se que há necessidade de lei autorizadora, que, além da autorização, deverá afixar os limites e as condições para a realização do ajuste. Ao lado disso, compreende-se, como extinção por ato conjunto das partes envolvidas, que a lei responsável por tal hipótese é de iniciativa do Poder Executivo.
8.4 Extinção por Sentença
A parte que considerar violado seu direito pode vindicar em Juízo a extinção da concessão de serviço público. Assim, por meio do emprego da adequada medida judicial, a parte inconformada exporá os fatos, bem como indicará o direito ofendido e promoverá o pedido de extinção da relação jurídica existente e a competente indenização que entenda ser cabível. Com ou sem a resposta da parte ex adversa, observados os trâmites processuais pertinentes, chega-se ao fim dessa medida com a prolação da sentença que extingue a relação existente e recompõe os interesses das partes. Com efeito, a recomposição está vinculada à indenização do concessionário de serviço público no que atina aos investimentos concernentes aos bens reversíveis, quando não totalmente amortizados ou depreciados, e à reversão dos bens e equipamentos para a Administração Pública concedente. Diógenes Gasparini vai afirmar que “os demais bens continuarão de propriedade das partes envolvidas na concessão de serviço público, que a eles darão o destino que mais convier aos seus respectivos interesses”[58]. Além disso, o concessionário ainda fará jus a uma indenização, caso não seja o responsável pela causa que culminou na extinção do contrato de concessão.
É oportuno apontar que tal hipótese não encontra assento na redação do artigo 35 da Lei nº 8.987/1995[59], porém é perceptível que tal situação não encontra qualquer obstáculo, em especial se for ajuizada pela Administração Pública, em decorrência do princípio constitucional da inafastabilidade da jurisdição. Já o concessionário do serviço público encontra disposição específica na legislação de regência, eis que o artigo 39 comina que o contrato de concessão poderá ser rescindido por iniciativa da concessionária, no caso de descumprimento das normas contratuais pelo poder concedente, mediante ação judicial especialmente intentada para esse fim. Denota-se, portanto, que tal disposição não conferiu ao concessionário de serviço público qualquer competência para extinguir a concessão de serviço público, autorizando apenas a instauração do processo judicial com essa finalidade. Assim, em decorrência da interpretação do artigo em comento, alcança-se que o concessionário não poderá interromper a execução do contrato de concessão de serviço público até que sobrevenha decisão judicial transitada em julgado.
Doutorando vinculado ao Programa de Pós-Graduação em Sociologia e Direito da Universidade Federal Fluminense (UFF), linha de Pesquisa Conflitos Urbanos, Rurais e Socioambientais. Mestre em Ciências Jurídicas e Sociais pela Universidade Federal Fluminense. Especializando em Práticas Processuais – Processo Civil, Processo Penal e Processo do Trabalho pelo Centro Universitário São Camilo-ES. Bacharel em Direito pelo Centro Universitário São Camilo-ES
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