Amanda Figueiredo de Andrade[1]
A Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ), na última quarta-feira (08/06), decidiu por maioria de votos sobre a taxatividade do rol da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS).[2] A decisão tem por consequência que as operadoras de saúde, em regra, não sejam obrigadas a cobrirem tratamentos não previstos na lista da ANS, que pode ser consultada no próprio site da Agência[3].
Nos termos do voto do Sr. Ministro Relator, Luis Felipe Salomão, a Seção definiu as seguintes teses:
1 – o Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde Suplementar é, em regra, taxativo;
2 – a operadora de plano ou seguro de saúde não é obrigada a arcar com tratamento não constante do Rol da ANS se existe, para a cura do paciente, outro procedimento eficaz, efetivo e seguro já incorporado ao Rol;
3 – é possível a contratação de cobertura ampliada ou a negociação de aditivo contratual para a cobertura de procedimento extra Rol;
4 – não havendo substituto terapêutico ou esgotados os procedimentos do Rol da ANS, pode haver, a título excepcional, a cobertura do tratamento indicado pelo médico ou odontólogo assistente, desde que (i) não tenha sido indeferido expressamente, pela ANS, a incorporação do procedimento ao Rol da Saúde Suplementar; (ii) haja comprovação da eficácia do tratamento à luz da medicina baseada em evidências; (iii) haja recomendações de órgãos técnicos de renome nacionais (como CONITEC e NATJUS) e estrangeiros; e (iv) seja realizado, quando possível, o diálogo interinstitucional do magistrado com entes ou pessoas com expertise técnica na área da saúde, incluída a Comissão de Atualização do Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde Suplementar, sem deslocamento da competência do julgamento do feito para a Justiça Federal, ante a ilegitimidade passiva ad causam da ANS.
Em seu voto inicial, o Ministro-Relator pontuou que a taxatividade do rol protege beneficiários contra aumentos excessivos por parte dos planos de saúde, caso estes venham a ter de arcar indiscriminadamente com ordens judiciais para a cobertura de procedimentos fora da lista da ANS. Além disso, foi reforçado que nenhum outro país do mundo possui uma lista aberta de procedimentos e eventos em saúde de cobertura obrigatória, lembrando, ainda, que a lista da ANS é elaborada com base em profundo estudo técnico[4].
A Ministra Nancy Andrighi, de maneira divergente, pontuou que qualquer norma infralegal editada pela ANS com potencial restritivo, salvo as exceções previstas na Lei nº 9.656/1998, coloca o consumidor aderente em uma desvantagem excessiva, pois não é razoável que o consumidor tenha que decidir, na contratação, as possíveis alternativas a eventuais enfermidades que venham a acometê-lo. Nessa hipótese, a incerteza sobre os riscos de responsabilidade dos planos de saúde é transferida ao consumidor, que possui menos condições de antever tais riscos do que os planos de saúde. Ainda, a Ministra pontuou, citando o IPEA, que o lucro das operadoras de saúde mais do que dobrou nos últimos quatro anos, e que os planos transferirão cada vez mais a responsabilidade dos tratamentos que não serão atendidos ao SUS, defendendo assim que o rol tem natureza meramente exemplificativa, e não taxativa[5].
Diante dessa decisão, que se constitui em precedente favorável às operadoras de saúde, e tendo em vista a previsão Constitucional que coloca a saúde como um direito de todos e um dever do Estado, a ausência da cobertura pelo plano de saúde pode ocasionar uma sobrecarga do Sistema Único de Saúde por meio da judicialização, uma vez que o indivíduo se verá obrigado a recorrer ao Estado para garantir a prestação do tratamento, ainda que este não conste do rol da ANS. Neste ponto, a própria autonomia médica também pode sofrer os impactos dessa decisão, diante da possibilidade de que, em vez do tratamento mais adequado, seja buscado o tratamento possível dentro da lista.
Além disso, não há indícios de que haverá redução nos valores cobrados pelos planos de saúde, de modo que a decisão, até o momento, parece apenas trazer limitações ao beneficiário, configurando um retrocesso somente quanto ao direito dos consumidores de planos de saúde no Brasil, aos quais foi transferida a responsabilidade sobre a incerteza quantos aos procedimentos necessários para eventuais enfermidades, como pontuou a Ministra Nancy Andrighi.
A decisão, portanto, vem acompanhada da necessidade de que haja uma maior atenção e fiscalização por parte da população e dos órgãos de controle quanto à constante atualização dos procedimentos constantes rol da ANS, de modo que este venha a acompanhar os avanços da Medicina e permitir o tratamento mais adequado aos pacientes beneficiários dos planos de saúde.
* As opiniões expressas pelos autores pertencem a eles e não refletem necessariamente a opinião da Universidade ou do Portal.
[1] Mestranda no Programa de Pós-Graduação em Direito (PPGDI), da Faculdade de Direito (FADIR), da Universidade Federal de Uberlândia (UFU). Especialista em Direito Público Aplicado (Universidade São Judas Tadeu). E-mail: amandafdeandrade@gmail.com
[2] Este texto se refere aos Processos EREsp 1886929[2] e EREsp 1889704, disponíveis em: https://processo.stj.jus.br/processo/pesquisa/?aplicacao=processos.ea&tipoPesquisa=tipoPesquisaGenerica&termo=EREsp%201886929; e em: https://processo.stj.jus.br/processo/pesquisa/?aplicacao=processos.ea&tipoPesquisa=tipoPesquisaGenerica&termo=EREsp%201889704, respectivamente (acesso em 18 jun. 2022).
[3] Disponível em: http://www.ans.gov.br/planos-de-saude-e-operadoras/espaco-do-consumidor/o-que-o-seu-plano-de-saude-deve-cobrir/o-que-e-o-rol-de-procedimentos-e-evento-em-saude/consultar-se-procedimento-faz-parte-da-cobertura-minima-obrigatoria.
[4] Disponível em: https://www.stj.jus.br/sites/portalp/Paginas/Comunicacao/Noticias/08062022-Rol-da-ANS-e-taxativo–com-possibilidades-de-cobertura-de-procedimentos-nao-previstos-na-lista.aspx (acesso em 18 jun. 2022).
[5] Disponível em: https://www.migalhas.com.br/quentes/367646/stj-define-que-rol-da-ans-e-taxativo-para-planos-de-saude (acesso em 18 jun. 2022).
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