Resumo: Esta pesquisa pretende descrever em que conjuntura ética e jurídica está inserida a Lei Arouca bem como a trajetória e contexto de sua criação. Inclusive, analisa-se de que modo a mesma contribui para a manutenção da exploração institucionalizada através do princípio dos 3R’s (replacement, reduction e refinement) e das ideologias do “tratamento humanitário” e do sofrimento “desnecessário”. Além do mais, será verificado o modo em que estes termos normativos atuam para manutenção do status jurídico de propriedade dos animais não-humanos a fim de tornar a indústria da experimentação científica mais produtiva e eficiente, vez que aumenta a adesão popular e silencia discussões acerca da validade de suas premissas. Ainda, examina-se a legitimidade destas normas em face dos dados científicos ora informados, a fim de descontruir as noções de “necessidade” incutidas nas leis de caráter bem-estarista, deste modo, dissolve-se as certezas elucidadas em seu discurso para a identificação de novos problemas. Por fim, serão enumerados os métodos alternativos capazes de manter os experimentos científicos sem a utilização de animais não-humanos.[1]
Palavras-Chave: Abolicionismo; Direito dos Animais; Lei Arouca; Análise Crítica.
Abstract: This research aims to describe which ethical and legal paradigm is Arouca Act inserted, such as the historical context of its creation. Furthermore, it analyzes how this law contributes to the maintenance of institutionalized exploitation through the principle of 3R’s (replacement, reduction and refinement), such as by the ideologies of “humane treatment” and “unnecessary” suffering. Moreover, the research verifies the way in which these normative terms act to maintain the legal propriety status of non-human animals in order to improve the productivity and efficiency of the scientific experimentation industry, since it increases the popular support to it and silences discussions about the truth of their assumptions. Still, it examines the legitimacy of these standards, facing them with the science in order to deconstruct the notions of “necessity” inculcated in welfarists laws, thereby, it dissolves the certainties enunciated in its text for the identification of new problems. Finally, the article will list some alternative methods capable of maintain scientific experiments without the use of non-human animals.
Keywords: Abolitionist Approach; Animal Rights; Arouca Act; Critical Analysis.
Sumário: Introdução; 1. Sobre o histórico-normativo e finalidade de criação; 2. Dos animais não-humanos abarcados; 3.A regulamentação no âmbito da pesquisa e a conjuntura científica atual; 3.1 A regulamentação no âmbito do ensino e suas implicações no aprendizado; 4. Sobre os métodos alternativos; 4.1 Alternativas Absolutas na Pesquisa; 4.2 Alternativas Absolutas na Educação. Conclusão; Referencias.
INTRODUÇÃO
É de se esperar pelo prenúncio de Ruesch (1983, p. 675) quando elucida que mais cedo ou mais tarde a vivissecção será considerada ilegal, visto que é da vontade de todos os não humanos, bem como a de todos que cremos na Civilização, na verdadeira Democracia, no Estado de Direito e na Lei. Embora não seja do desejo de nenhum ser vivo a imposição da morte intempestiva, os seres humanos vêm, desde os seus primórdios, elaborando as mais diversas justificativas para exclusão dos não humanos de nossa comunidade moral. Algumas os entendem como predestinados pelo Criador à exploração do homem; outras os consideram como meros autômatos incapazes de sentir e, ainda, existem as que elaboram critérios para consideração de alguns seres vivos, no entanto, embora estes parâmetros estejam consideravelmente alargados, baseiam-se em perspectivas antropocêntricas.
O fato é que em razão destes modelos ideológicos, por volta de 67 bilhões de animais terrestres, não humanos e sencientes (possuidores de sensibilidade para buscar prazer e evitar a dor) são mortos por animais humanos, ao ano, para fins de consumo. (HUMANE SOCIETY INTERNATIONAL, 2012). Para a experimentação científica, estima-se que o número de 100 milhões, somente nos Estados Unidos da América. (NATIONAL ANTI-VIVISSECTION SOCIETY, 2015a). Apesar dos sucessivos desastres e da comprovação da inutilidade do modelo, nos Estados Unidos da America, a maior parte da pesquisa médica é financiada pelo National Health Institute que possui o orçamento anual de 30 milhões de dólares em média. Cerca de 50% deste orçamento é entregue aos pesquisadores que realizam experimentos com o modelo animal. Quem decide o destino deste dinheiro são comitês formados pelos próprios cientistas que realizam pesquisas através da vivisseção. (GREEK, 2010). Estes investimentos estapafúrdios não ocorrem apenas quanto aos laboratórios de pesquisa, fornecedores de equipamentos e de animais também movimentam uma indústria milionária. O próprio comércio de camundongos no ano de 1999 correspondeu a 200 milhões de dólares, assim como os utensílios de contensão e eleminação de animais não humanos podem varias de 4 a 27 milhões de dólares a unidade. (GREEK; GREEK, 2002, P. 24 apud FELIPE, 2014, p. 144).
Enquanto investimentos bilionários são feitos e para a manutenção de uma indústria infrutífera pelos EUA, incluindo os investimentos em guerra, cerca de 21 mil pessoas morrem de fome por dia no mundo, sem contar a AIDS, Malária, Pneumonia, Diarreia, Febre Amarela e entre outros (POVERTY.COM, 2016). No entanto, este país destina apenas 0,15% de seu PIB, para o fundo Oficial de Assistência ao Desenvolvimento (ODA) que intenta auxiliar os países extremamente pobres à saírem desta situação, quantia esta que passa longe do ideal seria de 0,7%. (SACHS, 2005, p. 6-7).
Em suma, este estudo intenta, primeiramente, identificar de que forma a Lei Arouca, assim como todo o paradigma em que está inserida, é responsável pela manutenção da exploração institucionalizada de não-humanos, confrontando-a com as circunstâncias que a cercam, a partir do método dedutivo, eis que se parte de uma análise sistêmica geral para posterior relação com a lei específica, a partir de revisão bibliográfica.
1. SOBRE O HISTÓRICO-NORMATIVO E FINALIDADE DE CRIAÇÃO
A conjuntura jurídica internacional mais recente e o histórico normativo brasileiro estão de acordo com o paradigma bem-estarista quanto à exploração de animais não-humanos para experimentação científica, baseando-se na ideologia do tratamento “humanitário”, que intenta promover melhorias na alimentação, condições do cativeiro e diminuição do estresse, respeitando padrões “éticos” para evitar o “sofrimento desnecessário”, ressaltando a obrigatoriedade de aplicação de anestésicos e outros métodos indolores, logo, não é um movimento contrário à vivissecção. Para tanto, aplica-se o princípio dos 3R’s (Replacement, Refinament, Reduction), divulgado por Russel e Burch através do seu livro The Principle of Humane Experimentation Tecnhique (1959), responsável por difundir o “critério humanitário” em práticas vivissecionistas (GREIF; TRÉZ, 2000, p. 67). Seguindo esse princípio, toma-se a premissa de que, na medida do possível, faz-se imperativa a substituição por métodos alternativos, a aplicação de métodos de menor invasão e a redução da quantidade de animais em teste. Em sentido contrário, o abolicionismo considera válido somente o princípio do 1R, ou seja, so mente a substituição por meios alternativos que não utilizem animais. (GREIF; TRÉZ, 2000, p. 24).
Cita-se como exemplo a Declaração Universal de Direito dos Animais proclamada em Assembleia da UNESCO (1978) que, embora não tenha força normativa, serve como carta de princípios para os países signatários, dentre eles o Brasil. Esta enuncia que todos os animais nascem iguais perante a vida e tem o mesmo direito de existência (art. 1º); o homem, sendo uma espécie de animal, não poderá exterminar outros, devendo pôr os seus conhecimentos aos seus serviços (art. 2º); nenhum animal deve ser maltratado, se for necessário matá-lo, que seja sem dor (art. 3º); considera a crueldade incompatível, ainda que para fins científicos, com a atribuição de direitos aos animais não-humanos, incentivando também o desenvolvimento e uso de métodos alternativos (art. 8º). (UNESCO, 1978).
Não se pode olvidar que o bem-estarismo é vívido nesta declaração, na medida em que se promove a “necessidade” da morte por meios indolores. Embora se incentive a elaboração de métodos alternativos, reprimem-se apenas os experimentos ditos cruéis, ou seja, aqueles que promovem “sofrimento desnecessário”.
Posteriormente, o International Guiding Principles for Biomedical Research Involving Animals (CIOMS, 1985) consiste em um documento com 10 princípios reforçadores da necessidade de consideração primeira de meios alternativos ao uso de animais no ensino e na pesquisa, conforme o sistema dos 3R’s, entretanto, eleva a importância de manutenção da experimentação, destacando o seu indispensável papel para o avanço da ciência. Em seguida, a European convention for the protection of vertebrate animals used for experimental and other scientific purposes (EUROPEAN UNION, 2001), descreve os animais não-humanos vertebrados como agentes passivos de obrigações morais, visto que possuem memória e capacidade de sofrimento, impondo limites em seu uso quando possível; bem como incentiva a preferência por métodos alternativos. Finalmente, a Diretiva 2010/63/UE do Parlamento Europeu e do Conselho (2010) entende que a exploração de animais para fins científicos e educacionais só deverá ser considerada quando não existir possibilidade alternativa, mencionando expressamente o princípio dos 3R’s em diversos momentos.
Conclusivamente, todas estas normas, em alguma medida, entendem que o uso de animais poderá ser necessário, sem estabelecer objetivamente a motivação.
No Brasil, a primeira regulamentação do uso de animais em testes científicos, condenando as condutas cruéis, foi o Decreto nº 24.645/34, considerando como maus-tratos a mutilação voluntária do animal, a menos que seja realizada em interesse do próprio, do homem ou da ciência (art. 3º) (BRASIL, 1934). Esse decreto foi promulgado por iniciativa da União Internacional de Proteção aos Animais – UIPA, sendo a primeira entidade de proteção brasileira, que importou a legislação vigente da Europa (DIAS, 2006, p. 155).
Em seguimento, o Dec. Lei nº 3.688/41 (Lei das Contravenções Penais) tipificou como contravenção a exposição pública de experimento científico doloroso ou cruel, ainda que para fins didáticos, segundo o art. 64, § 1º. (BRASIL, 1941). Percebe-se, portanto, que os experimentos científicos dolorosos não expostos ao público também não eram objeto de qualquer repressão, haja vista o potencial de gerar bem-estar ao homem sem molestar a integridade mental da coletividade.
Posteriormente, a Lei nº 5.197/67, conhecida como o Código de Caça, em seu art. 14, possibilitou que cientistas de instituições registradas coletassem “materiais” (animais não-humanos) para a ciência, por meio da concessão de licença especializada (BRASIL, 1967).
Finalmente, criada para tratar especificamente da experimentação em animais para fins científicos, a Lei nº 6.638/79 passou a exigir que os biotérios estivessem devidamente registrados e autorizados pelo órgão competente para a realização de experimentos (art. 2º); bem como proibiu a vivissecção sem anestesia e sem a supervisão de técnico especializado; inclusive, vedou-a em locais frequentados por menores de idade (art. 3º). Ademais, a lei estabeleceu a pena do art. 64 caput da Lei de Contravenções Penais no caso de descumprimento de qualquer obrigação prevista na referida Lei, punindo a reincidência com o cancelamento do registro do biotério (art. 5º, inc. I e II). (BRASIL, 1979).
Em continuidade, a Constituição Federativa do Brasil de 1988, no art. 225, § 1º, inc. VII, vedou expressamente práticas que expunham o animal à crueldade, de forma genérica (BRASIL, 1988). Isso ocorreu em razão das mobilizações dos movimentos de proteção aos animais. Coube à Liga de Prevenção da Crueldade contra o Animal – LPCA, em conjunto com a União dos Defensores da Terra – OIKOS, presidida pelo então Deputado Fábio Feldman, e a Associação Protetora dos Animais São Francisco de Assis – APASFA, que deram cabo a um abaixo assinado para obter 30 mil assinaturas. Embora só tivessem conseguido 11 mil, o dispositivo descrito acima fora inserido (DIAS, 2006, p. 160).
No intuito de regulamentar o mandamento Constitucional, cria-se a Lei de nº 9.605/98 (Lei de Crimes Ambientais) que, em seu art. 32, § 1º, criminaliza a realização de experimentos científicos dolorosos e cruéis, ainda que para fins didáticos e científicos, quando existirem métodos alternativos (BRASIL, 1998). Nota-se que há autorização legal para a ocorrência de crueldade, na medida em que se promove limitação tão somente quanto ao “sofrimento desnecessário”, contudo, compreende-se que a “necessidade do sofrimento” se tornou cada vez mais restrita considerando que a finalidade científica já não é automaticamente autorizadora da exploração, devendo-se, primeiramente, verificar a existência de recursos alternativos.
Finalmente, o objeto principal desta análise, a Lei de nº 11.794/08 (Lei Arouca), surge para regulamentar a disposição genérica da Constituição Federal, especificamente no âmbito do ensino de graduação e na pesquisa. O projeto da lei foi elaborado por uma ativista juntamente com o Dr. Silvio Vale (pesquisador da Fiocruz), apresentada pelo Deputado Sergio Arouca ao Congresso Nacional, no entanto, a Academia Brasileira de Ciências não somente recusou o projeto como apresentou o seu próprio na tentativa de desconsiderar o então Projeto de Lei. Nessa mesma ocasião, a Sociedade Educacional “Fala Bicho”, a Liga de Prevenção da Crueldade contra o Animal – LPCA e a Frente Brasileira para a Abolição da Vivissecção – FBAV apresentaram um Projeto de Lei com uma leitura abolicionista para a vivissecção. Este foi encaminhado ao Deputado Fernando Gabeira e foi apensado ao PL do Deputado Sérgio Arouca. Em seguimento, militantes cariocas procuraram a Academia Brasileira de Ciências, no Rio de Janeiro, e passaram a elaborar em conjunto um projeto de lei para a regulamentar a experimentação científica em animais, que substituiria o PL da Lei Arouca. Este trabalho foi encaminhado ao Congresso Nacional e transformado no PL nº 3.964/97, também apensado ao documento anterior. Os projetos continuaram tramitando até aprovação da forma que conhecemos hoje, como a Lei de nº 11.794/08. (DIAS, 2008, p. 139-140).
Esta lei põe em destaque o princípio dos 3R’s e os demais sustentáculos bem-estaristas, incluindo a morte por tratamento “humanitário” (art. 3º, inc. IV); a aplicação de “cuidados especiais” antes e depois do experimento (art. 14, caput); a aplicação de métodos substitutivos quando possível (art. 5º, inc. III); a redução do número de animais explorados, atenuando-se ao máximo a sua dor pela aplicação de sedação e analgésicos (art. 14, § 4º e 5º). Inclusive, o Conselho Nacional de Controle de Experimentação Animal – CONCEA, poderá restringir, ou mesmo proibir, a ocorrência de práticas que sejam extremamente agressivas (art. 15). (BRASIL, 2008).
Após a observação dos textos normativos ora descritos, é possível dizer que, embora a Constituição Federal proíba, genericamente, práticas cruéis, estas continuam a ser permitidas em virtude da existência de uma “necessidade”, ou seja, quando entendemos que há potencial de gerar bem-estar para a nossa espécie. Quando partimos da premissa de que interesses de outras espécies sempre devem ser colocados em segundo plano ao julgarmos, estamos internalizando uma lógica “especiecista”, conceito criado por Rychard Ryder na década de 70 que, em síntese, trata-se da ideologia de que é moralmente justificável dar preferência a certos seres vivos pelo simples fato de serem membros da espécie homo sapiens. (SINGER, 2006, p. 13).
Nas atuais circunstâncias de exploração institucionalizada, não podemos entender que o sentido de “crueldade” presente no art. 225, § 1º, inc. VII, da Constituição Federal de 1988 possa ser compreendido da mesma forma quando associado aos humanos. Exemplifica-se com o conceito do verbete cruelty apresentado pelo The Free Dictionary.com (2012), que designa a crueldade em humanos como qualquer comportamento abusivo e ultrajante para o homem; qualquer imposição deliberada de dor física e mental. Quanto a sua aplicação em animais, a crueldade é considerada somente quando há influição de dor ou morte sem “necessidade”.
Assim sendo, entende-se mandatória a investigação da extensão desta “necessidade”, visto que a regulamentação normativa bem-estarista tem o intuito de estabelecer limites somente no que a tangencia. Nessa lógica, questiona-se quando o uso de animais é “necessário” e o que ela realmente significa.
Quando recorremos ao ordenamento jurídico para tentar compreender estes termos, percebemos que o sentido aplicado nos conflitos entre humano e não-humano é completamente diverso de quando estamos tratando de conflito entre humanos. Em nosso sistema normativo, não há regular admissão de práticas que permitam sacrifícios, mesmo quando benefícios poderiam ser gerados para a maioria. Por exemplo, não há permissão jurídica para realização de pesquisas dolorosas em humanos, sem consentimento, mesmo que tenham como objetivo identificar a cura para o câncer, visto que consideramos todos como possuidores de valor inerente e igual formalmente. A contrário senso, os animais são constantemente abatidos, por meio de autorização legal, em razão da possibilidade de nos gerar “bem-estar”, ou seja, tudo aquilo que é capaz de nos agregar bens de valor. Isto ocorre, pois, humanos e animais são entidades diferentes, sendo uma reconhecida como pessoa e a outra como propriedade. Logo, em um conflito entre pessoas, ambos os direitos serão considerados de forma equivalente; já os animais, sendo compreendidos pela lei como incapazes de possuir direitos, embora sejam alvo de eventuais proteções para atender fins de terceiros, seus interesses não serão considerados de forma direta (FRANCIONE, 1995, p. 10-23).
Desta feita, embora se possa afirmar que as leis anti-crueldade sejam capazes de limitar a exploração, o status de propriedade é determinante no que diz respeito ao alcance desta proteção, pois conduz a forma de tratamento político e jurídico dos animais não-humanos, valorando-os na medida em que são úteis e produtivos, e não a partir dos seus próprios interesses, já que legalmente não possuem. Assim, em um conflito entre humanos e não-humanos o resultado é predeterminado pelo tratamento jurídico de ambas as entidades, tendo em vista que a mera propriedade não possui qualquer interesse jurídico a ser protegido. (FRANCIONE, 1995, p. 14).
O status de mera “coisa” e a resultante inviabilidade de se balancear interesses são acobertados pelos termos normativos já apontados, que servem para legitimar a opressão e torná-la ainda mais eficiente, na medida em que desvia as atenções de reflexões éticas e geram aceitação a partir de uma ideologia de proteção. Isto ocorre porque associamos o sentido destes quando empregados em uma linguagem ordinária, contudo, não é o mesmo denotado neste paradigma legal. Na experimentação animal, observamos a constante menção ao tratamento “humanitário”, quando se está falando em tamanho mínimo de cela, e sofrimento “desnecessário”, quando se está ressaltando a importância da aplicação de anestésicos; entretanto, embora sejam termos revestidos de uma ideologia protetiva, o significado comum destes é deveras distinto do utilizado pelo bem-estarismo. Seres humanos não podem, formalmente, ser explorados a ponto de abrir mão de direitos indisponíveis, sem qualquer consentimento. Destaca-se, portanto, que esses termos normativos são construídos pelo grupo dominante, sendo visível a disparidade econômica entre as entidades. (FRANCIONE, 1995, p. 16).
Desta forma, o revestimento jurídico que se reportar ao tratamento “humanitário” e ao sofrimento “desnecessário” é responsável por legitimar a hegemonia humana. Prontamente, se assumimos que os não-humanos são mera propriedade, cuja existência é limitada à satisfação de nossos interesses, a única dúvida seria determinar em quais circunstancias a lei interferirá no uso, havendo sempre consideração primeira do direito do proprietário. (FRANCIONE, 1996, p. 25-30).
Nesse contexto, nota-se que o nosso sistema jurídico é estruturado para entender qualquer exploração, que não seja totalmente gratuita e que tenha potencial para gerar bem-estar para humanos como “necessária”. Assim sendo, o tratamento dado pela lei aos animais é determinado, não por questões morais, conforme ludibriam os termos normativos, mas na medida em que aumenta a eficiência da exploração, utilizando-se do mínimo para prover o máximo e, assim, valoriza-se a propriedade. Não é à toa que este status jurídico de mera coisa, já foi imposto às pessoas, continue sendo atribuído a animais, pois não há outro que melhor atenda à finalidade de agregar bens de valor ao homem, sendo este o desígnio do bem-estarismo. (FRANCIONE, 1995, p. 23).
2. DOS ANIMAIS NÃO HUMANOS ABARCADOS
O art. 2º da Lei Arouca dispõe que a mesma se aplica aos animais das espécies do filo Chordata e subfilo Vertebrata. Logo em seguida, o art. 3º clarifica que, para as finalidades da Lei, animais do Filo Chordata são aqueles que possuem, como características exclusivas, ao menos na fase embrionária, a presença de notocorda, fendas branquiais na faringe e tubo nervoso dorsal único; o subfilo Vertebrata seria constituído por animais cordados que têm, exclusivamente, um encéfalo grande encerrado em uma caixa craniana e uma coluna vertebral. (BRASIL, 2008).
Para melhor compreensão, o Reino Animália, trata-se de um grupo de seres vivos que se distingue dos demais por serem multicelulares e heterótrofos (não produzem seu próprio alimento), pois são aclorofilados, englobando desde as esponjas marinhas, até os seres humanos. Nesse reino, há o filo dos Chordatas, que possuem as características já descritas, e dentro do mesmo há três subfilos: 1. Urochordata, 2. Cephalochordata e 3. Vertebrata. (SOBIOLOGIA, 2008).
Embora a Lei estabeleça determinações apenas ao subfilo Vertebrata, a Diretiva 2010/63/UE do Parlamento Europeu e do Conselho (2010), no capítulo 1, artigo 1, nº 3, em que trata das provisões gerais, inclui também os Cephalopodes vivos em seu âmbito de regulamentação, estando abarcados por serem capazes de vivenciar dor e sofrimento. Ainda, reafirmando tal constatação, Tanner (2009, p. 7) certifica que os Cephalopodes possuem um sistema nervoso complexo, atividade cerebral, sendo capazes de vivenciar felicidade, tristeza, prazer e dor. Em suma, são considerados seres sencientes.
3. A REGULAMENTAÇÃO NO ÂMBITO DA PESQUISA E A CONJUNTURA CIENTIFICA ATUAL
A vivissecção pode ser entendida como qualquer experimento científico realizado em animais vivos, não havendo necessidade de corte para que se caracterize, embora possa ser questionada a relevância de seus propósitos em razão do grande número de ensaios de desígnios supérfluos como, por exemplo, o sacrifício de um cão para mensurar a agonia de Cristo durante a sua crucificação, ou a extração das vísceras de uma cadela prenha para analisar o seu instinto materno. (RUESCH, 2008, p. 30-33).
Estima-se que quase 100 milhões de animais são utilizados ao ano nos EUA para fins científicos, movimentando uma indústria multibilionária; compreendendo o ramo farmacêutico, universitário, militar armamentista e laboratorial. Em linhas gerais, os animais não-humanos são utilizados como modelos vivos de sistemas biológicos e fontes de tecido, células e outros órgãos. Nessa perspectiva, a experimentação animal é defendida como um meio para entender o comportamento e desenvolvimento de organismos vivos e tratar doenças. Os animais utilizados com maior frequência são ratos, rãs, camundongos e pássaros. Entretanto, The Animal Walfare Act (1966), a lei que regulamenta a experimentação científica em animais nos EUA, não os abrange em sua contagem. Entre os animais considerados pela lei, no ano de 2014, foram postos a testes, tanto para educação quanto para pesquisa, 59.358 cães; 169.528 porcos da índia; 10.315 ovelhas; 57.735 primatas não-humanos; 121.930 hamsters; 21.083 gatos; 27.393 demais animais de fazenda; 45.392 porcos; 150.344 coelhos; 171.735 de outras espécies, perfazendo um total de 834.453 mil. (NATIONAL ANTI-VIVISSECTION SOCIETY, 2015a).
Embora a Lei Arouca não exija o registro do número de animais utilizados, é obrigatório que as instituições estejam devidamente credenciadas pelo CONCEA, inclusive, determina-se que referido conselho mantenha cadastro atualizado dos procedimentos realizados no país (art. 5º, inc. II, III e VII).
Além disso, impõe como condição indispensável para o credenciamento, a constituição prévia de Comissões de Ética no Uso de Animais, chamadas de CEUAs (art. 8º), integradas por médicos, veterinários, biólogos, docentes, pesquisadores e um representante de sociedades protetoras dos animais (art. 9º, inc. I, II e III). É de sua competência examinar previamente os experimentos realizados pela instituição, manter cadastro atualizado dos procedimentos realizados e notificar o CONCEA de qualquer ocorrência (art. 10, inc. I a VI). Ainda, compete ao Ministério da Ciência e da Tecnologia licenciar as atividades destinadas à criação de animais para a ciência (art. 11), sendo a fiscalização de competência dos Ministérios da Agricultura; da Pecuária e Abastecimento; da Saúde; da Educação; da Ciência e Tecnologia; e do Meio Ambiente, em suas respectivas áreas (art. 21). (BRASIL, 2008).
Contudo, Greif e Tréz (2000, p.72) asseveram que, na prática, os comitês têm por função principal fornecer certificados que avalizem os cientistas a publicarem seus trabalhos em periódicos dos quais exijam o cumprimento dos requisitos estabelecidos em lei, seja qual for o “refinamento” utilizado com base no princípio dos 3R’s. Inclusive, observam que a maioria dos membros desses conselhos é composta por vivissectores que não recusariam aprovar projetos do seu interesse.
Sobre os experimentos realizados, verifica-se que há diversos procedimentos para inúmeras finalidades. Na indústria química e cosmética, por exemplo, o papel da vivissecção é tornar os componentes tóxicos aceitáveis e seguros para o público. Toda a garantia é oriunda de práticas vivissecionistas que atestam a toxidade, nível de irritação da pele, carcinogenicidade, mutagenicidade, teratogenicidade (defeitos no nascimento), toxidade reprodutiva e outros. Os métodos mais utilizados são: 1. Draize Skin Test, para verificar a sensibilidade cutânea; 2. Draize Test, que mede o nível de irritação ocular de determinada substância; 3. Lethal Dose 50, que avalia o nível de toxidade suficiente para matar 50% da população em teste. (GREIF; TRÉZ, 2000, p. 9-10).
No Draize Skin Test, depila-se o corpo do animal para aplicação da substância tóxica a ser testada, o que ocasiona muitas vezes o enrijecimento cutâneo, úlceras e edemas. É uma experiência extremamente dolorosa e incoerente visto que as constituições epidérmicas da pele humana são diferentes das postas em testes (peles de porcos, coelhos e roedores). A propósito, as reações imunológicas são características de cada espécie, logo, não há como considerar a credibilidade do resultado. (GREIF; TRÉZ, 2000, p. 9).
Já o teste de irritação ocular (Draize Test) se propõe a verificar as reações oculares e perioculares aos componentes químicos, aplicando uma solução concentrada diretamente no olho de coelhos albinos, que permanecem em caixas de contenção com o pescoço imobilizado (alguns chegam a quebrá-lo tentando escapar) e as pálpebras ficam presas em grampo para que o olho se mantenha constantemente aberto, sem a aplicação de analgésico, pois altera o resultado do experimento. Isso pode durar de 3 a 18 dias, tendo como consequência processos inflamatórios das pálpebras e íris; úlceras e hemorragias. Entretanto, os olhos dos coelhos apresentam estrutura e fisiologia diversa, visto que a sua córnea é mais delgada e suas glândulas lacrimais são menos eficientes, possuindo ainda uma membrana nictitante (uma espécie de 3ª pálpebra) que nós não possuímos, o que já demonstra uma grande diferença no pH do humor aquoso. Desta feita, não há como realizar uma leitura de alta confiabilidade, visto que ocorrem enormes variações de laboratório para laboratório. (GREIF; TRÉZ, 2000, p. 10).
E, por fim, o Lethal Dose 50, consiste em verificar a dose necessária de uma substância para matar 50% da população em teste, forçando o animal a ingerir uma determinada quantidade de substâncias através de uma sonda gástrica que muitas vezes mata o animal por perfuração. Os efeitos geralmente observados são convulsões, dispneia, diarreia, úlceras, emagrecimento, postura anormal, epistaxe (sangramento nasal), hemorragias, lesões pulmonares, hepáticas e renais, coma e morte. As críticas são em relação à falta de um método científico confiável, haja vista que os resultados são afetados pela espécie, idade, sexo, condições de alojamento, temperatura, época do ano, hora do dia e o método de administração da substância. (GREIF; TRÉZ, 2000, p. 10).
Vê-se que tais experiências são extremamente cruéis e, embora o § 5o do art. 14 da Lei Arouca determine que as práticas capazes de causar dor ao animal devem se desenvolver sob sedação, analgesia ou anestesia adequada (BRASIL, 2008). Ruesch (2008, p. 91) assevera que o anestésico serve somente para a opinião pública, pois é incompatível com as observações pós-operatórias em ensaios sobre o sistema nervoso, dor, estresse, conduta, com todos os experimentos de larga duração, com testes em que se causa previamente o dano para depois estudá-lo, com exames que medem toxidade; e com os que verificam a eficácia preventiva de remédios. Logo, na prática, raramente se utiliza a anestesia. Quando aplicada, administra-se apenas no começo do procedimento para manter o animal quieto, ou seja, o efeito é de curta duração e não é capaz de inibir a dor pós-operatória, que pode durar por anos. O seu verdadeiro intento é manter a vivissecção como prática regular na medida em que convence a população de que mera supressão da dor regulamentada por leis aparentemente severas, seria requisito autorizador suficiente para exploração científica do animal.
Quanto à saúde humana, são realizadas pesquisas a respeito da Diabetes, Câncer, HIV/AIDS, doenças cardíacas e etc. Em 2006, The Diabetes Research Institute anunciou que, apesar de terem sido gastos milhões de dólares e 30 anos de pesquisa, descobriu-se que a estrutura interna da produção de insulina humana é dramaticamente diferente da dos roedores, portanto, essas pesquisas não são mais relevantes para o estudo humano. (NATIONAL ANTI-VIVISSECTION SOCIETY, 2015b).
Em relação ao câncer, é uma doença extremamente individual pois os tumores e as reações variam de pessoa para pessoa em razão da variação genética individual, logo, induzir câncer em animais não-humanos que possuem outro modelo genético, imunológico e celular, não é um jeito eficaz de estudar a doença, inclusive Robert Weinberg, pioneiro em pesquisas sobre o câncer, afirma que milhares de dólares são desperdiçados com esses modelos (NATIONAL ANTI-VIVISSECTION SOCIETY, 2015b).
A respeito da AIDS, o modelo animal é utilizado ostensivamente desde a década de 80. Muitos já foram infectados com o vírus HIV e não desenvolveram a síndrome da mesma forma que os humanos, até mesmo os chimpanzés não desenvolvem a AIDS do mesmo jeito como os humanos. Muito progresso já se fez no que tange à compreensão da doença e como ela se espalha, mas, pouco desse avanço foi graças ao modelo animal utilizado, e sim em decorrência de estudos epidemiológicos e clínicos que nos fizeram aprender sobre o curso natural da doença e seus fatores de risco associados. O mesmo insucesso também é visto nas pesquisas referentes às doenças da artéria coronária, visto que já foram utilizadas 20 espécies diferentes de animais, incluindo cangurus e pelicanos, porém, não se obteve nenhum sucesso. Os avanços quanto à prevenção se dão graças aos estudos epidemiológicos, autópsias, pesquisas in vitro, observação clínica e técnicas cirúrgicas testadas em cadáveres humanos. (NATIONAL ANTI-VIVISSECTION SOCIETY, 2015b).
Ademais, uma das maiores críticas à experimentação científica em animais não-humanos são os elementos intervenientes que comprometem o resultado. Entre os fatores ambientais externos estão: a) a temperatura; b) umidade relativa; c) ruído; d) trocas de ar; e) intensidade da luz; f) dieta g) o ambiente social que a cobaia está inserida, considerando o grupo social e o tamanho desta; h) o ambiente biológico, considerando infecções virais, bacterianas e parasitárias; i) o fator emocional da cobaia, incluindo o medo e o stress desde o seu transporte. Quanto aos fatores ambientais internos, verificam-se que padrão genético, sexo, idade e variações circadianas também poderão alterar o resultado do experimento. Logo, estas implicações devem ser consideradas, tendo em vista que os animais de laboratório realizam grande mudança no metabolismo como forma de compensar variações do meio ambiente, portanto, sofrem alterações em sua fisiologia, o que influencia diretamente no resultado do experimento (ANDRADE; PINTO; OLIVEIRA, 2002, p. 289-294). Não é sem razão que cientistas renomados como o PhD Linus Pauling, vencedor por duas vezes do Prêmio Nobel e o doutor G. H. Walker, médico do Royal Hospital e Children’s Hospital em Sunderland, na Inglaterra, classificaram categoricamente como inúteis as pesquisas que utilizam modelo animal como referência para o homem. O primeiro, no que diz respeito às investigações contra o câncer, afirma que todos deveriam saber que se tratam de fraude. Já o segundo considera que o estudo da fisiologia humana através da experimentação animal é o erro mais grotesco cometido pela atividade intelectual da história humana. (GREIF; TRÉZ, 2000, p. 40).
Considerando essas informações, Ramberck (apud FELIPE, 2014, p. 96-97) desmistifica algumas afirmativas associadas ao modelo animal de investigação científica para a medicina, entretanto, descrever-se apenas as mais relevantes:
O primeiro mito é a ideia de que todo o conhecimento médico estaria fundamentado em experiências com animais. Contudo, o autor assevera que este conhecimento é pautado na observação de animais humanos doentes e sadios. Afirma também que muitos medicamentos foram desenvolvidos sem experiências em animais, à base de vegetais, incluindo o ácido acetilsalicílico (contra febre) e o ácido fenobarbital (contra a epilepsia). (RAMBERCK, 1997, p. 11-17 apud FELIPE, 2014, p. 96).
Em segundo lugar, tem-se a ideologia de que a expectativa de vida aumentou devido aos experimentos com modelo animal. O autor esclarece que, na realidade, este crescimento teria ocorrido em razão do declínio das doenças infectocontagiosas e a consequente diminuição da mortalidade infantil devido à melhoria nas condições de higiene, alimentação e saneamento. (RAMBERCK, 1997, p. 11-12 apud FELIPE, 2014, p. 96).
O terceiro mito é a respeito da ideia de que, somente com a experimentação animal, seria possível a pesquisa médica. Na verdade, existem os experimentos in vitro, como a cultura de microrganismos e células cujos resultados superam os experimentos em animais. (RAMBERCK, 1997, p. 12 apud FELIPE, 2014, p. 96).
O último mito é a ideologia de que tais experiências são necessárias para encontrar a cura de doenças agressivas. No entanto, apesar do excesso de experimentos, como já foi dito, as doenças mais graves não se tornaram mais próximas da cura graças a essas práticas, ademais, não há dúvidas de que nós mesmos causamos a maioria delas através de maus hábitos alimentares, dependências tóxicas, estresse e etc. (RAMBERCK, 1997, p. 13 apud FELIPE, 2014, p. 97).
Continuando, a crítica mais severa ao modelo de experimentação com animais não-humanos é a ocorrência constante de desastres iatrogênicos. Muitas drogas já tidas como seguras, após inúmeros testes provocaram a morte ou anomalias irreversíveis em milhares de pessoas. O exemplo mais conhecido é o da Talidomida (1958), um ansiolítico desenvolvido para mulheres grávidas a fim de combater náusea e insônia que não foi testado em fêmeas grávidas antes de ser liberada para o consumo. Em teste, apresentou um nível de toxidade baixíssimo combinado com uma ação sedativa favorável e efeitos colaterais discretos em roedores, primatas e cães, justificando então a execução de experimentos clínicos em humanos. Entretanto, ocasionou cerca de 10 mil efeitos congênitos e 3 mil natimortos, sendo que, nos animais testados, raramente, ocorreram variações teratogênicas. Em caminho contrário, a Aspirina, comprovadamente teratogênica para roedores, primatas, cães e gatos, é amplamente utilizada por mulheres grávidas sem apresentação de qualquer tipo de malformação. (GREIF; TRÉZ, 2000, p. 35-37).
Além do mais, mesmo a utilização de técnicas de transgênese, da qual se trata da modificação genética dos animais em teste para a compatibilização com o gene humano que, inclusive, foi eleita viabilizadora para os transplantes de órgãos de uma espécie para a outra (xenotransplante), não pode ser vista de forma acrítica. Essa tecnologia traz sérios riscos de disseminar doenças, não só epidemias, mas verdadeiras pandemias que afetam rapidamente a coletividade de forma transfronteiriça, como ocorreu recentemente com a gripe suína. (SANTOS, 2015, p. 141-142).
Continuando, Greif e Tréz (2000, p. 68-73) afirmam que, entre os anos de 1968 e 1993, pelo menos 124 drogas foram retiradas do mercado após terem recebido o certificado público de segurança dos laboratórios que realizaram exaustivamente testes em animais. Os autores registraram também os remédios que causaram efeitos adversos para animais, mas foram liberados para humanos. Vejamos alguns exemplos: 1. Aceltilcolina – dilata artérias em cães, mas contrai as de humanos; 2. Antimonia – engorda suínos, mas mata humanos; 3. Arsênico – seguro para ovelha, porém letal para humanos; 4. Bradiquinina – contrai vasos sanguíneos cerebrais em cães, contudo relaxa o de humanos; 5. Depo-provera – seguro em humanos, mas, em cadelas, causa câncer e infecções no útero nas mamas; 6. Encainida – nenhuma alteração no ritmo cardíaco de animais, entretanto causa ataque cardíaco em humanos, provocando a morte de 3 mil pessoas; 7. Penicilina – letal para porcos-da-índia, porém antibiótico para humanos.
Outra falta de Lei em comento é pela ausência de proibição expressa da utilização de animais para a produção de cosméticos, ao contrário do Regulamento (CE) Nº 1223/2009 do Parlamento Europeu e do Conselho que determina proibição gradual, até que se alcance definitivamente o fim da produção e venda dos produtos que contêm uso de animais não-humanos (nº 42). (PARLAMENTO EUROPEU, 2009).
Sabe-se que os cosméticos estão longe fazer parte de nossas necessidades vitais, não passando de adorno estético. Qualquer interpretação propriamente bem-estarista já seria impeditiva da continuidade de tais experimentos. Não foi sem razão que, em 2013, ativistas resgataram 200 cães da raça Beagle do Instituto Royal, no município de São Roque, do Estado de São Paulo. Estes apresentavam notórios sinais de maus-tratos, mutilação, tumores, incluindo um grupo sem olho e muitos fetos imersos em nitrogênio líquido. (ALVES, 2013). Após manifestações de grupos protetores de animais, foi promulgada a Lei Estadual de nº 15.316/14, em São Paulo, que proíbe a experimentação em animais para o desenvolvimento de cosméticos, produtos de higiene pessoal, perfume e seus componentes (art. 1º). (SÃO PAULO, 2014).
3.1 A regulamentação no âmbito do ensino e suas implicações no aprendizado.
A dissecação é a separação, por instrumentos cirúrgicos, de órgãos ou parte do corpo de animais não-humanos para fins didáticos (GREIF, 2003, p. 19). A estatística mais tímida descreve que, nos EUA, 6 milhões de animais são utilizados por ano para essa finalidade. Entretanto, há quem afirme que o verdadeiro montante seja cerca de 10 milhões. (NATIONAL ANTI-VIVISSECTION SOCIETY, 2015c). Os animais mais utilizados pelas instituições universitárias são principalmente os sapos, todavia, são também comumente utilizados ratos, gatos, camundongos, porcos, cães, coelhos, minhocas, fetos de porcos e peixes. Estes podem ser capturados diretamente da natureza, junto a organizações estatais que cuidam de animais em situação de abandono, ou ainda podem ser fornecidos por criadores e em matadouros. (PETA, 1997).
Nas universidades brasileiras, animais são estudados para observação de fenômenos fisiológicos e comportamentais através da administração de substâncias químicas; quando em cativeiro; para compreensão da anatomia; prática de cirurgia ou para obtenção de células e outros tecidos específicos. No geral, os cursos de graduação que aplicam a dissecação são os de Medicina Humana, Veterinária, Biologia, Bioquímica, Farmacologia, Psicologia, Química, Educação Física e Enfermagem. (GREIF, 2003, p. 20).
Greif e Tréz (2000, p. 13) listam alguns dos procedimentos aplicados, quais sejam:
Miografia – que consiste na retirada de um músculo esquelético, geralmente da perna de uma rã viva ocasionalmente anestesiada com éter, para observação em gráfico das respostas fisiológicas aos estímulos elétricos;
Análise da arco-reflexão – a partir da observação do sistema nervoso de uma rã decapitada, a partir da introdução de um instrumento pontiagudo em sua espinha dorsal, para observação dos músculos esqueléticos que respondem sem o comando do cérebro;
Observação do sistema cardiorrespiratório – através da abertura do tórax de um cão para verificação dos movimentos pulmonares e cardíacos, antes e após a injeção de adrenalina e acetilcolina, até que se chegue a parada cardíaca do animal;
Observação da anatomia interna – a partir do uso de cadáveres de animais;
Estudos psicológicos – através da privação de alimentos e água, baseado na estratégia do castigo e recompensa; isolamento social, privação materna, eletrochoques e indução a stress;
Treinamento de habilidades cirúrgicas – em que, geralmente, utiliza-se de animais vivos anestesiados;
Experimentos farmacológicos – que utiliza animais pequenos para injeção de drogas por via intravenosa, oral, intramuscular ou por gavagem (alimentação forçada) para a mera observação e registro dos efeitos.
Estes ensaios trazem consequências irreversíveis, como bem descreve Lima (apud Greif, 2003, p. 21-22), em algumas aulas práticas do curso de ciências biológicas da USP, após a retirada do cerebelo de um pombo para estudo de suas funções, o não-humano perdeu a capacidade de se manter na função vertical, o seu senso de direção, o equilíbrio e a capacidade de se alimentar, pois vomitava constantemente.
Outro dano corriqueiro ocorre da má administração de anestésico, em muitas ocasiões, as cobaias expostas ao éter e clorofórmio chegam a óbito em razão da aplicação imprecisa decorrente das peculiaridades individuais de cada animal. Não obstante, a aplicação insuficiente de anestésico pode fazer com que o animal seja capaz de acordar no meio do experimento. O autor ainda cita casos em que não é permitida a aplicação de substâncias químicas em razão de comprometer a finalidade do experimento, sendo que, nesta situação, o animal pode ser contido através da fixação com alfinetes em bandejas de dissecação ou espinhalamento; já os animais maiores são amarrados firmemente às mesas cirúrgicas ou contidos por outros materiais. Já para o sacrifício sem substâncias químicas, a técnica utilizada pode ser guilhotina ou o giro pela cauda para bater contra um anteparo.
Por conseguinte, o uso de animais no ensino vem sendo questionado por diversos grupos da sociedade civil, inclusive por cientistas, professores e estudantes. Um dos motivos é o impacto ambiental, haja vista que a população de rãs, sapos, salamandras vem declinando vertiginosamente, ocasionando severas extinções na América do Sul, América do Norte, América Central e na Europa, por conta da retirada massiva destes animais por cientistas para fins didáticos (BOOTH, 1989). Além disso, esses anfíbios consomem grande quantidade de insetos, servindo de controle natural contra as pragas que degradam o cultivo. Não é sem motivo que a Índia aboliu o tráfico de sapos, visto que o declínio destes aumentou consideravelmente a população de insetos predadores, prejudicando o que era cultivado para exportação. (K.S., 1987, apud BALCOMBE, 2000, p. 33). Ainda, a importação de animais exóticos para outros países também gera impacto quando estes conseguem se reproduzir no novo ambiente, atacando e competindo com as populações nativas (GREIF, 2003, p. 24).
Outro motivo que gera críticas negativas corresponde ao fato de, por vezes, os experimentos não alcançarem os resultados almejados, dando margem a interpretações errôneas, podendo ser em decorrência de imperícia técnica; do desequilíbrio da saúde física e psíquica do animal pelo estresse anterior ao experimento; das diferenças individuais de cada animal de mesma população; dos fatores externos, entre outros. Não obstante, mesmo quando os objetivos do experimento são atingidos, não houve a concentração desejada do estudante para o aprendizado, haja vista o dispêndio excessivo de atenção para o procedimento em si (GREIF, 2003, p. 25). Por conta disso, não é rara a desistência nos cursos que envolvam a dissecação, tendo em vista que muitos alunos não conseguem lidar com o sofrimento do animal durante as aulas (HOLANDA, 2013). Quanto ao treinamento de técnicas cirúrgicas, sabe-se que a anatomia dos animais não-humanos, embora, de certo modo similar ao dos humanos, ainda é diferente. Logo, não há nada mais perigoso do que tentar adquirir a destreza manual com animais tendo em vista que a falsa sensação de aprendizado torna o cirurgião menos prudente em razão da confiança em sua técnica. (RUESCH, 2008, p. 176-177).
Por fim, outra crítica é a dessensibilização estudantil devido à intimidade com o procedimento, tornando o estudante indiferente ao sofrimento do animal ao ponto de negar a existência do mesmo ou entender que é necessário para os objetivos do teste. (HEIM, 1981, apud BALCOMBE, 2000, p. 16). Neste sentido, Lima (apud GREIF, 2003, p. 26) realizou uma análise psicológica sobre a banalização da vivissecção entre estudantes universitários, abarcando experimentos que atingiam dimensões extremamente cruéis e observou o comportamento acrítico dos estudantes, mesmo os que se consideravam amantes da natureza e dos animais, que nem sequer questionavam a necessidade do procedimento, demostrando passividade e inércia. Esta prática se revelou desagradável para a maioria dos discentes, entretanto, consideravam-na como indispensável, desta forma, o autor da pesquisa identificou um forte comportamento antropocêntrico, tecnicista e limitado racionalmente e decisoriamente. Em outras palavras, a dessensibilização do estudante em razão da exposição constante ao sofrimento o torna indiferente, enfraquecendo o sentimento de alteridade e respeito.
Não é por acaso que o número de alunos cuja posição é contra a vivissecção vem crescendo exponencialmente. Embora alguns optem por desistir de seus cursos de graduação, outros apresentam objeção de consciência. O primeiro caso ocidental registrado foi na Califórnia, onde Jenifer Graham, ainda no colegial, recusou-se a dissecar um sapo em suas aulas de biologia. Ameaçada pela escola a ter a suas notas baixadas, recorreu ao Tribunal californiano e abriu precedentes para que, na escola, os estudantes pudessem optar por dissecar, ou não, animais nas aulas de ciência (BALCOMBE, 2000, p. 72).
No Brasil, um recente caso de escusa de consciência foi apresentado pelo aluno Róber Freitas Bachinski do curso de Ciências Biológicas, pois se recusou a participar das disciplinas que realizavam a dissecação na Universidade Federal do Rio Grande do Sul, cuja dispensa não foi autorizada. No entanto, após propor uma ação ordinária, foi reconhecido o seu direito à liberdade de consciência (art. 5º, inc. VI da CF/88), convicção filosófica (art. 5º, inc. VIII da CF/88) e ao pluralismo político (art. 1º, inc. V da CF/88). (PORTO ALEGRE, 2008). Portanto, visto que inexiste lei no Brasil na qual obrigue o aluno a dissecar, ainda que exista autonomia didático-científica das universidades (art. 207 da CF/88), não se pode afastar a liberdade de convicção, consciência e escolha política. (LEVAI, 2007, p. 12).
4. SOBRE OS MÉTODOS ALTERNATIVOS
O Decreto 6.899/09 foi criado para regulamentar a Lei Arouca no que tange a designar o que sejam os “métodos alternativos”. O conceito divulgado por Russel & Burch define o “Replacement”, ou seja, método alternativo, como aquele capaz de substituir totalmente o uso de animais, reduzir o número utilizado, ou causar menor sofrimento. Destarte, dividem-se em alternativas absolutas (sem qualquer uso de animal) e relativas (continuam utilizando, de maneira refinada ou reduzida). (RIVERA, 2006, p. 173 apud SANTOS, 2015, p. 43). Este fora o mesmo entendimento aplicado no referido Decreto que, em seu art. 2º, inc. II, alíneas “a”, “b”, “c”, “d” e “e”, clarificou a possibilidade de os procedimentos alternativos validados internacionalmente substituir os métodos que utilizam os animais não-humanos; podendo usar espécies de ordem “inferior”; empregar menor número de animais; utilizar sistemas orgânicos ex vivos ou atenuar o sofrimento. (BRASIL, 2009).
É visivelmente ilógico e perverso afirmar primeiramente que se faz necessária a substituição por meios “alternativos” e, logo após, designar estes meios como os que reduzem ou refinam. Essa perspectiva nos leva a crer que não existe boa pesquisa sem o uso de animais não-humanos.
Greif e Tréz (2000, p. 68) afirmam que os 3R’s exaltaram a vivissecção ao ponto de fazer da sua primeira premissa a assertiva de que não existe avanço científico sem experimentação em animais, qualificando-a como um mal necessário. Portanto, se entendermos como “método alternativo” todos aqueles que substituem, reduzem ou infligem menor dor, qual será o incentivo para que os centros de pesquisa, de fato, busquem métodos que não utilizem animais?
Não se pode ignorar que a Constituição Federal já vedou expressamente práticas que submetam o animal à crueldade, assim como a Lei de Crimes Ambientais proíbe, ainda que para fins didáticos e científicos, a experimentação cruel de animais quando existirem recursos alternativos. Portanto, uma interpretação lógica nos leva a crer que a única compreensão aceitável é que “métodos alternativos” são somente aqueles que substituem por completo o uso de animais, ou seja, métodos substitutivos em absoluto, vez que seria uma enorme incoerência flexibilizar a Lei ao ponto de permitir que a mera redução do número de animais ou aplicação de métodos de menor invasão seja moralmente equivalente à completa substituição. Entretanto, o art. 225, caput da Constituição Federal ainda classifica a natureza, incluindo os animais não-humanos, como “bem de uso comum do povo”, ou seja, como propriedade coletiva, o que abre margem para interpretações antropocêntricas, ainda que de maneira alargada. (BRASIL, 1988).
4.1 Alternativas absolutas na Pesquisa
É bem verdade que os métodos substitutivos sempre estiveram disponíveis, dependendo unicamente da capacidade de o cientista em escolhê-los (GREIF; TRÉZ, 2000, p. 76).
Por exemplo, a partir da tecnologia in vitro, desenvolveu-se o Eyetex, substituto do Draize Test, produzido pela National Testing Corporation em Palms Springs/Califórnia, para verificar o nível de irritação ocular. Este utiliza uma proteína retirada da semente do feijão capaz de reproduzir as reações de uma córnea durante o teste (GREIF; TRÉZ, 2000, p. 64).
Há também o Skintex, substituto do Draize Skin Test, que serve para avaliar a irritação cutânea através da semente de abóbora, pois é capaz de simular a reação quando substâncias estranhas são aplicadas na pele. O Edipack também é substituto da pele humana, utilizando tecido humano clonado para testar substâncias potencialmente tóxicas, produzido pela Clonetics em San Diego, na Califórnia. Ainda, o Neutral Red Bioassay, criado pela Universidade de Rockfeller, consiste no uso de células humanas em cultura empregadas para calcular a absorção de um pigmento hidrossolúvel, medindo a toxidade relativa. Por fim, o Test skin, produzido pela Organo genesis, localizada em Cambridge, Massachusetts, também faz uso de pele humana cultivada em plástico, podendo ser aproveitada para medir a irritação cutânea. (GREIF; TRÉZ, 2000, p. 64).
O Harvard’s Wyss Institute criou “organ-on-chip”. Trata-se do cultivo de células humanas para mimetizar a estrutura e função de órgãos e sistema. Esse chip pode ser usado para substituir animais em testes referentes a medicamentos e toxidade de substâncias. Estes se mostraram mais eficientes em replicar fisiologia humana e suas reações, já sendo utilizado pela HµRel Corporation. Outros procedimentos in vitro também são constantemente adotados, como, por exemplo, o Ceetox, que verifica o potencial da substância de causar alergia; o MaTek’s Epi Derm, um modelo tridimensional de célula humana cultivada, que replica traços da pele humana normal, substituindo-se, assim, os porcos-da-índia e coelhos em testes. (PETA, 2015).
Simuladores em computador também foram desenvolvidos com o propósito de reproduzir a biologia humana e a progressão de doenças. Estudos mostram que tais modelos são capazes de prever precisamente o modo como os novos medicamentos irão reagir. O QSARs (relações de atividades estruturais quantitativas) é um software capaz de substituir experimentos em animais fazendo estimativas sofisticadas da probabilidade de a substância apresentar riscos, baseando-se na semelhança estrutural com outras substâncias e no nosso conhecimento sobre a biologia humana. Este método tem sido amplamente utilizado por Governos e Companhias Norte-Americanas. (PETA, 2015).
Inclusive, é possível verificar a mutagenicidade, carcinogenicidade, teratogenicidade e a toxidade através do TOPKAT, produzido pela Health Design Inc em Rochester, Nova York. Do mesmo modo, o Ames Test também se propõe avaliar a carcinogenicidade, através da cultura de Salomenella Typhimuriume enzimas, podendo detectar cerca de 150 carcinógenos. Há ainda o Método de Difusão em Agarose (Agarose Difusion), no qual avalia a toxidade de materiais plásticos e sintéticos que constituem os equipamentos hospitalares, tais como válvulas cardíacas, articulações artificiais e matérias para infusão intravenosa. (GREIF; TRÉZ, 2000, p. 65).
Ao Lethal Dose 50, o professor Heinrich Koch do departamento de Química Farmacêutica da Universidade de Viena, descobriu um método substitutivo a partir do levedo de cerveja, que ao invés de matar metade dos animais testados, mata-se metade das células do levedo. (GREIF; TRÉZ, 2000, p. 66).
Não obstante, estudos epidemiológicos são considerados os maiores responsáveis pelos avanços na saúde humana no que tange à redução de incidência de doenças contagiosas, por melhorias nas condições de higiene e saneamento. Estes são baseados em comparações dos níveis de presença de doenças em grupos com diferentes condições de exposição ao objeto investigado. A maioria das doenças como malária, cólera, leptospirose, febre amarela e dengue, está relacionada a condições de higiene e saneamento. Estes também estabeleceram as relações entre o colesterol e doenças do coração; câncer com o fumo; defeitos do nascimento com exposição a químicos (nicotina, álcool e drogas testadas em animais, como a talidomida); e também os mecanismos de transmissão da AIDS. (GREIF; TRÉZ, 2000, p. 57).
Além do mais, estudos clínicos e anatômicos também são responsáveis por grandes avanços científicos, visto que há observação do quadro sintomático do homem doente através de inúmeros modelos como o CATscan, capaz de reconstruir imagens tridimensionais do corpo humano através de raios-X, ou o PETscan (Positron Emission Tomograph) e o MRI (Magnetic Ressonance Imaging), que elaboram mapas funcionais do cérebro humano, identificando anomalias, podendo monitorar doenças do fluxo sanguíneo. No geral, estes se propõem a detectar anormalidades nos portadores de doenças como Alzheimer, epilepsia ou autismo. (GREIF; TRÉZ, 2000, p. 59).
A prevenção de doenças, sem sombra de dúvidas, também se faz imperativa nos cuidados contra a saúde, entretanto, não é hábito muito estimulado devido à drástica queda lucrativa que sofrerão os laboratórios se as doenças desaparecerem em razão de simples melhorias na qualidade de vida. Cabe destacar que os medicamentos são elaborados para atenuar sintomas, não havendo qualquer previsão para finalizar a terapia. Destarte, há um ciclo ininterrupto de consumo de drogas para se alcançar hipotética cura, chegando-se ao ponto de consumir medicamentos para atenuar efeitos causados por outros medicamentos. As principais causas da mortalidade no Ocidente são derrames, distúrbios cardíacos, pressão sanguínea, doenças respiratórias e câncer. Todas elas são passíveis de prevenção, porém a cura é extremamente difícil ou impossível atualmente. (GREIF; TRÉZ, 2000, p. 60).
4.2 Alternativas absolutas na Educação
A experimentação animal pode ser substituída na educação por alternativas absolutas, em razão desses testes já terem sido conduzidos repetidamente, ano após ano, apresentando os mesmos parâmetros e resultados já conhecidos. Essa medida não compromete o rigor científico da aula, haja vista que o processo de aprendizado é o que conta, e não o resultado do experimento em si. (NAB, 1989, apud BALCOMBE, 2000, p. 55).
A simulação computacional é uma alternativa altamente interativa, podendo incorporar gráficos, filmes e sons. As vantagens dessa técnica são o menor custo, se considerarmos a manutenção do biotério, preparação e manipulação do animal e a quantidade utilizada. O aprendizado se demonstra superior visto que o estudante poderá voltar atrás, a qualquer momento, em um estágio que não tenha compreendido prontamente. Cada aluno poderá aprender no seu próprio ritmo, podendo ser utilizada em casa sem auxílio técnico especializado. Esses métodos não submetem o animal à crueldade, não geram conflitos entre os alunos que não se sintam confortáveis com a dissecação e proporcionam a concentração desejada do estudante no procedimento. (GREIF, 2003, p. 34-35).
Há inúmeros softwares que se propõem a substituir o modelo animal como, por exemplo, o Froguts, que utiliza recursos gráficos para explanar as teses sobre estruturas anatômicas, as funções biológicas, musculatura, funcionamento cardiovascular e o procedimento de dissecação de sapos (FROGUTS, 2012).
Balcombe (2000) lista a constatação de cientistas que realizaram estudos comparativos entre métodos alternativos e tradicionais, demonstrando não haver diferenças significativas na produção daqueles cujos métodos adotados foram os substitutivos absolutos, sendo que alguns estudantes apresentaram melhores resultados com as simulações. Citam-se apenas alguns dos comentários, sendo um deles publicado por Dewhurst e Meeham (apud BALCOMBE, 2000, p. 41), declarando que alguns alunos, ao utilizarem softwares e outros substitutos, apresentaram o mesmo desempenho daqueles que empregaram métodos tradicionais em laboratórios de fisiologia e farmacologia. Inclusive, seis estudantes que realizaram estudos autônomos por simulação apresentaram os mesmos conhecimentos dos alunos ao fazer uso do método tradicional com acompanhamento supervisionado. Ademais, Lilienfield e Broeing (apud BALCOMBE, 2000, p. 41) afirmam que os utilizadores da simulação em computador alcançaram nota significativamente maior em exames sobre o sistema cardiovascular. Phelps (apud BALCOMBE, 2000, p. 41) também confirma que estudos por vídeos interativos produzem melhor performance do que modelos vivos em laboratório.
CONCLUSÃO
Embora esteja claro que a Lei Arouca é instrumento para a manutenção dos termos opressores, travestindo-os de termos “racionais” amplamente aceitos e sem qualquer reflexão mais aprofundada, o que não está claro é de que forma o Direito seria capaz de abarcar um paradigma diverso. Como realmente seja possível abolir a exploração institucionalizada?
A simples modificação do status jurídico dos não-humanos, passando da condição de propriedade para a de pessoa, não é garantia de efetividade, podendo se tornar um mero simbolismo para que, novamente, transforme-se em um artifício funcionalista, dotado de carga antropocêntrica, haja vista que os interesses em manter estrutura econômica existente ainda são extremamente fortes.
Entretanto, o obstáculo não reside na impossibilidade de consideração jurídica equitativa entre humanos e não-humanos, mas da dependência de uma anterior inclusão em nossa comunidade moral, haja vista que é discursivamente mais “dócil”, portanto, mais efetivo em manter a dominação. Para isto, as contradições lógicas, éticas e científicas devem ser expostas.
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