Por Luiza Tavares da Motta[1]
INTRODUÇÃO; 1. DIREITO E LITERATURA; 1.2. Direito como construção narrativa; 1.3. Direito e literatura: a proposição através do discurso; 2. A QUESTÃO FRANCESA; 2.1. Contexto francês no século XIX; 2.2. O romance oitocentista; 2.3. O contrato social e o sujeito de direitos; 2.4. O Code Civil e o romance: duas instâncias da narrativa burguesa; CONSIDERAÇÕES FINAIS.
RESUMO
Ao tratar de Direito e Literatura, este artigo opta pela análise específica do contexto francês do Século XIX, tomando por base o romance oitocentista e dando enfoque às preocupações da cultura jurídica da época, voltada especialmente ao Code Napoléon. Deste modo, o que se pretende é estabelecer a forma como se relacionam duas instâncias culturais – dotadas, portanto, de historicidade – voltadas à narrativa: o movimento Direito e Literatura se coloca neste artigo no sentido de explorar, portanto, as narrativas jurídica e literária e a forma como se colocam quando analisadas a partir da perspectiva histórica imbricada – e não desconectada – da sociedade em que se produzem.
A literatura enquanto também representativa de uma França recém-saída da Revolução Burguesa de 1789 é capaz de apontar, conjuntamente com a análise do Direito Civil, diversos pontos de intersecção do pensamento da época voltado ao enaltecimento de práticas e características tipicamente burguesas, como a criação do novo herói trabalhador, do enfoque nos empreendimentos e no individualismo que se consolidava.
É neste sentido, portanto, que encontramos a coerência entre estas interpretações literárias e um Direito protetor da liberdade individual e da propriedade.
Palavras-chave: História do Direito. Direito e Literatura. Direito Civil. Code Napoléon. Direito Francês.
ABSTRACT
Focused on the Law and Literature perspective, this article opts to analyse specifically the French context in the XIXth century, based on the XIXth century romantic literature and focused on the juridical culture of the time, especially on the propositions sustained in the Code Napoléon. Thus, the intention of this article is to establish the means by which two cultural instances – aligned with their character of historicity – are related through narrative: the movement of Law and Literature is placed in this article with the goal of explore the literary and juridical narratives along with the analysis through a historical perspective interwoven – and not disconnected – with the society that produces those narratives.
Literature as a representation of a France that had recently been through the 1789 Bourgeois Revolution is capable of presenting, side by side with the study of the Civil Law, different points of intermission of the ideals of the time, turned to the glorification of bourgeois praxis and features: the creation of the new working hero, the focus on entrepreneurship and individualism.
Therefore, it is in this sense that coherence is found throughout these two literary interpretations and a Law that protects individual will and property.
Keywords: History of Law. Law and Literature. Civil Law. Code Napoléon. French Civil Law.
INTRODUÇÃO
O presente artigo trata das interseções entre Direito e Literatura enquanto duas narrativas atreladas a um contexto social em que são produzidas.
Neste sentido, ao voltar-se à sociedade burguesa da França oitocentista, debruçou-se sobre a literatura essencialmente burguesa deste período, qual seja, o romance, bem como sobre as proposições e a construção do Code Civil em geral, também a legislação essencialmente burguesa.
Assim, a concepção de que Direito e Literatura são instâncias diversas de uma mesma narrativa – ou narrativas diversas de uma mesma sociedade – regeu a presente pesquisa que, aplicando à época estudada este pressuposto, foi capaz de identificar certos pontos de interseção, essencialmente: a importância do individualismo e da construção da noção de sujeito de direitos; a recorrência do tema da propriedade e do trabalho; o racionalismo no Direito e o racionalismo no romance.
O movimento de Direito e Literatura, cuja consolidação se deu principalmente na década de 70, de reconhecimento, por diversos profissionais, das conexões possíveis de se estabelecer entre as disciplinas, e com noções igualmente distintas, possui, notadamente três correntes maiores (GAAKER, 2011 p. 459-487).
Uma das correntes mais claras na relação direito e literatura é aquela em que se busca o direito na literatura, nesta seara assumem importância especial obras literárias que retratam institutos jurídicos, como O Mercador de Veneza de Shakespeare, ou O Processo de Kafka. Trata-se de linha teórica cuja atenção se concentra na representação do direito pela literatura ficcional, em que encontramos descritos os procedimentos jurídicos da sociedade retratada pela obra em questão (CHUEIRI, 2006, p. 233-235).
O direito como literatura é outra corrente adotada pelos estudiosos das relações entre as duas disciplinas, segundo a qual ambas apresentam caráter de narrativa. Neste sentido, o que teremos é uma defesa do direito como narração e a utilização do arsenal dos homens das letras para a interpretação dos institutos jurídicos e emissão, por exemplo, de opiniões jurídicas, como defende Posner (1986, p. 1351-1392), ou do direito enquanto interpretação das práticas jurídicas, conforme se vê em Dworkin (2000, p. 217-150), ainda que as teorizações dos dois autores acerca do Direito como literatura caminhem em sentidos diametralmente opostos.
A professora Vera Karam de Chueiri (2006), apoiada na teoria de Jacques Derrida (2010)[2] faz aproximação entre direito e literatura em suas origens, ambas inacessíveis, como no conceito de aporia de Derrida: a origem do direito e da literatura é a mesma, suas condições de possibilidade, sempre suspensas e inatingíveis em razão de sua característica inventiva – seja esta com fins de proposição ou de descrição. A aporia do direito se manifesta na singularidade de sua aplicação em relação à universalidade de suas proposições; a aporia da literatura se manifesta na expressão singular de cada autor, que permite, aponta Chueiri, a atribuição da autoria (2006, p. 233-235).
A terceira corrente apontada por Gaakeer é aquela que trata do direito em seu papel de regular a literatura – quando seu objeto, portanto são os direitos autorais, a liberdade de expressão, e demais expedições normativas de conformação e proteção das obras literárias (2011, p. 459-487).
Jeanne Gaakeer se filia à corrente mais contemporânea, de Direito e Literatura, trabalhando, portanto, com uma conjunção das três linhas – trata, no capítulo mencionado, da forma como a lei agiu sobre o autor escolhido, para ela, Joot van den Vondel, bem como da sua obra como espelho social (2011, p. 459-487).
Neste trabalho, importa o romance francês, em especial o de Victor Hugo como fonte para estudo da sociedade francesa do século XIX.
Isto não significa utilizar-se de Os Miseráveis apenas como espelho da sociedade, bem como o estudo aqui realizado não se volta, conforme explicado, ao encontro de Jean-Val Jean com a lei, mas sim à análise das proposições e da forma do romance eleito, para, através da lente do movimento do direito e literatura, lançar um olhar sobre a sociedade francesa e as transformações por e nela operadas durante o século XIX. Também a vida política de Victor Hugo não será ignorada, de modo que considerar-se-á a literatura enquanto representativa de um ideário social mas também representativa das convicções do autor, sem retirar dela o atributo de criatividade que acompanha a linguagem e a simbologia de seus signos.
Assim, o estudo aqui desenvolvido se filia ao movimento de direito e literatura, tomando a obra literária enquanto fonte histórica – sabendo que não é possível toma-la enquanto fonte apenas por seu conteúdo, mas dando atenção também ao estilo literário e à recepção da obra pelo público da época – e considerando, ainda, a vida política do autor.
O Professor Ronald Dworkin, ao debruçar-se sobre o problema da interpretação dos institutos jurídicos propõe uma aproximação entre direito e literatura no sentido de considerar, em conclusão, a interpretação do direito – em especial para fins de resolução dos chamados hard cases, ou casos complexos – como a construção de um romance em cadeia.
A noção do autor, de romance em cadeia, tem base em suas elaborações acerca da interpretação das obras de arte, em especial das obras literárias: a interpretação, para ele, deve buscar não apenas o “significado” da obra, mas entende-la em sua melhor forma.
Por um lado, então, não se exclui a intenção do autor de um texto literário para seus personagens, ou no que concerne a métrica de seu poema e os efeitos que pretende causar no público que a lê, assiste no teatro ou no cinema, declama; por outro, não deixa de considerar que, entre as intenções do autor, consta a intenção de produzir, conforme Fowles, citado por Dworkin, um mundo próprio, tão real quanto, mas outro, daquele em que vivemos.
Neste sentido, é preciso que o intérprete tenha em consideração a unidade da obra e a lógica própria que o autor estabeleceu em seu livro – é neste sentido que, ainda observando Fowler e suas considerações sobre sua novela The French Lieutenant’s Woman, é possível que, no curso da escrita, o autor mude as intenções que exprimiria no texto pela primeira ideia que lhe passou, para algo diverso. Não porque o personagem tenha, de fato, a mind of his own, mas por uma questão de coerência com o desenvolvimento do texto e das personagens.
É importante entender: embora o intérprete tente fazer a melhor leitura possível do texto, isto não significa alterá-lo para que ele tenha o desenvolvimento ou a estética esperada pelo intérprete – este está, portanto, limitado por aquilo que foi escrito, não se pode ignorar ou alterar trechos do texto, mas apenas extrair deles as melhores considerações dentro de critérios estéticos e de unidade e coerência, para que aquela obra de arte seja a melhor obra de arte dentro daquilo que é.
Nesta esteira, diz Dworkin (1982), a interpretação dos institutos legais ou das decisões judiciais em que pretendem se basear os juízes para emitir seus pareceres deve tomar em conta as intenções daqueles que já julgaram casos similares na tentativa de extrair destes os princípios nos quais seriam baseados. O autor de Law as Interpretation não deixa de considerar que, como as interpretações de textos literários serão diferentes de acordo com as concepções de arte e de literatura daquele que leva a cabo o exercício hermenêutico, sendo dependente, portanto, de seus critérios estéticos de daquilo que vê como propósito da arte, também a análise de institutos e decisões judiciais se dará de acordo com as concepções políticas do intérprete, que, vale lembrar, como o leitor, deve se ater, sem retirar nem alterar, àquilo que foi escrito.
Assim, no caso apresentado no texto descrito, em que um juiz se confronta com situação em que, recebendo a notícia de que sua sobrinha havia sido atropelada colocando em risco a saúde da criança, a tia requer reparação pelos danos morais sofridos no sentido de recuperar-se do abalo, este juiz deverá analisar casos anteriormente julgados – como o de ser devida a reparação para a mãe que vê sua filha pequena sofrer dano físico em razão de imprudência de um motorista – procurando neles um princípio abstrato para adequá-lo ao caso concreto que tem em mãos. Deste modo, a orientação política de um juiz que vê no direito essencialmente soluções econômicas levará a um entendimento voltado à redução dos impactos econômicos do descuido no trânsito; um juiz cuja concepção de direito olha para a distribuição de justiça em um senso de moralidade tomará como princípio a noção de que aquele que age de maneira imprudente deve reparar os danos que causou, direta ou indiretamente, com base em critérios de previsibilidade: a questão, aqui, centrar-se-á na probabilidade de a criança possuir parentes que não seu pai ou mãe que sofreriam ao saber da injúria sofrida pela menina, e a extensão deste dano moral sendo maior ou menor a julgar pela presença física no momento do acidente ou ao receber a notícia pelo telefone.
Pois bem, a conclusão de que o direito é como um romance em cadeia parte da noção, muito bem colocada, de que, como um romance em cadeia, cada juiz, sabendo seu papel de criar mais um capítulo da novela, deve ser ao mesmo tempo intérprete dos capítulos anteriores com o fim de criar uma coerência (DWORKIN, 1982, p. 179-200).
Richard Posner (1986, p. 1351-1392), por outro lado, conforme já explicitado anteriormente, trará à tona a questão do intencionalismo versus interpretação crítica. Nesta seara, dirá que, embora uma análise de crítica literária pura – para estabelecer o valor da literatura enquanto arte, seu valor e seu julgamento enquanto boa ou ruim – raramente se beneficiará do estudo das intenções do autor quando este escrevia o texto, mas que, por outro lado, é importante entender o que pretendiam os juízes ao exarar suas decisões ou os legisladores ao editar as leis, para que a interpretação jurídica seja correta.
François Ost (2005), em Raconter la Loi, defende a tese de um direito não mais analisado, mas contado: trabalha com a noção de que enquanto o direito situa-se no campo da segurança de codificar a realidade – por meio de suas proposições, estabelece o “não deves”, preocupa-se com a segurança jurídica, que se pode traduzir na segurança das expectativas sobre o resultado de alguma conduta ou peticionamento ao poder judiciário, seja a fonte desta segurança decisões prévias como na common law ou textos normativos pretensamente suficientes na civil law – a literatura, por sua vez, libera os possíveis, ou permite uma diversidade de resultados e proposições a partir dos mais variados roteiros postos à avaliação do público.
A literatura, então, apresenta, por vezes, uma subversão crítica ao direito, trazendo resultados diversos do que se esperaria em um mundo da segurança jurídica; outras vezes a relação entre literatura e direito é de conversão fundadora, demonstrando uma identidade de mentalidades, cada narrativa construída à sua forma.
“Laboratório do julgamento ético em situação, a literatura submete nossas convicções a diversas experiências de pensamento e de variações imaginativas. Alheia a todo dogma moralista, mas também a todo meio asséptico que estaria de algum modo fora do bem e do mal, a literatura cumpre uma função de descoberta e de experimentação prática: os mais variados tipos de roteiros, e suas avaliações correspondentes, são propostas ao julgamento prático” (OST, 2005, p. 40).
Enquanto o Direito, para Ost (2005), constrói pessoas e engessa realidades, sacrificando a fluidez da vida em nome da segurança jurídica, trabalhando no campo do abstrato, ou do universal, a literatura caminha pelo concreto, particular, voltando os olhos ao individual – aqui, pergunta-se o autor se o individual não seria o caminho mais curto para o universal.
Essa fissão entre direito e literatura não é tão rígida quanto poderia parecer: o teórico belga vê nas duas disciplinas uma relação de interações mútuas, importantíssimas para que se construa uma narrativa do direito, através principalmente da jurisprudência, em que as estruturas fechadas do direito apresentam sua maleabilidade quando confrontadas com as narrativas das partes envolvidas em um caso jurídico.
É neste sentido, portanto, que o autor defende um direito contado, e não um direito analisado: contar a lei é tratar o direito enquanto narrativa, produzida em seus contextos históricos-sociais e voltada não apenas à estruturas formais desligadas da realidade, mas que se relaciona com os casos apresentados.
Os juristas, então, trabalham no campo da narrativa na medida em que suas produções traduzem uma situação histórico-social, pode-se dizer, uma mentalidade da época em que se encontram, baseados nos sensos de justiça ali coerentes (OST, 2005).
Cumpre retomar, aqui, a referência feita anteriormente aos miseráveis de Victor Hugo: mais do que descrever um mundo outro, mas tão real quanto este, como indica Fowles (DWORKIN, 1982, p. 179-200), ou de assumir uma posição subversiva – ainda que esta esteja, até certa medida, presente, em especial no herói Jean-Val Jean –, o autor expressa seu senso de moral, de justiça (e de injustiça), constrói uma sociedade parecida o suficiente com a parisiense da década de 1860 para que esta fosse facilmente identificada em suas páginas.
Também o direito constrói-se com base em critérios de moral, justiça e injustiça do grupo de pessoas ao qual se dirige – mesmo porque, se assim não fosse, conforme indica Jacques Derrida já no início de seu colóquio A Força da Lei, um instituto jurídico destituído de um senso de justiça que falasse ao povo teria não um poder, mas uma força ilegítima, uma violência (DERRIDA, 2010)[3].
A conclusão deste capítulo novamente se pode dispor em duas proposições: a primeira, de que o direito compreendido enquanto não apenas a letra fria da lei, mas também considerando as suas implicações reais que se dão por meio das decisões judiciais, e as opiniões jurídicas emitidas pelos estudiosos do direito, constrói-se sobre, mas também como narrativa – seja a narrativa propositiva do romance em cadeia em busca da solução justa (e, aqui, justa se apresenta enquanto aquela adequada ao senso de justiça mas também enquanto aquela que se encaixa corretamente àquilo que se propõe) (DWORKIN, 1982, p. 179-200), seja a narrativa da fluidez da vida apontada por Ost (2005, p. 40), na interpretação criativa ou intencionalista do direito ou na estilística das opiniões jurídicas (POSNER, 1986, p. 1351-1392); a segunda, já referida e também de grande importância para a continuidade deste trabalho, de que nem a literatura, nem o direito podem se destacar por completo das intenções ou dos processos mentais dos homens por trás das narrativas, carregando consigo suas opiniões jurídicas, seu senso moral, de justiça, para subverter ou coadunar com o direito, para descrevê-lo ou interpretá-lo.
As elaborações dos capítulos anteriores permitiram três níveis de entendimentos a respeito das respectivas áreas trabalhadas, os quais serão sistematizados neste capítulo porque pressupostos essenciais para o estudo específico do contexto jurídico francês do século XIX no que diz respeito às representações, no romance, do ideário social que também se manifesta no campo do Direito.
Em primeiro lugar, a obra literária, por trabalhar com a linguagem, é produto humano desde o princípio: a língua em si é produto cultural, tendo como fim a expressão dos seres de uma dada sociedade – conforme diz Bakhtin (2009)[4], a sociedade se constrói em torno da linguagem, vez que esta é necessária para a aproximação dos indivíduos. Uma vez que o próprio instrumento da literatura é, em si mesmo, social, a obra literária já terá a priori uma carga cultural.
Wittgenstein já traz todas as questões de conceito para a linguagem: para o filósofo, em inovadora proposição, toda a noção de realidade que possuímos se faz por meio de convenções, e a convenção primeira é a da linguagem. Neste sentido, tudo aquilo que se diz só possui um significado porque ele foi acordado, e se a literatura, bem como o direito, parte desse acordo, então estão ambos impregnados desde o seu princípio pela cultura. Nas palavras do filósofo: “o falar de uma língua é parte de uma atividade ou de uma forma de vida.” (2002, p. 446)
Em um segundo nível, o autor da obra é sujeito cuja consciência se forma também na sua relação com o meio, com o contexto em que se encontra, de modo que as manifestações literárias não serão neutras, como não poderiam sê-lo, mas expressam uma visão de mundo ao mesmo tempo particular e impregnada de pré-conceitos sócio-culturais correspondentes a um momento e local.
Vygotsky (2001), ao elaborar sobre a consciência e sua formação nas crianças, estabelece sua historicidade, ou seja, situa a consciência no campo em que são fundamentais as interações sociais, sem, no entanto, partir diretamente a um determinismo puro, em que a individualidade desapareceria. Assim, pode-se dizer que, para o autor, posição com a qual se compactua, a consciência – e, portanto, o sujeito – se constitui em função de, ao mesmo tempo em que constitui, em uma relação dialética, o meio socialmente entendido. Já diria Dubois que o escritor não vive isolado em uma torre de marfim, não podendo sua obra então ser isolada de seu campo social (DUBOIS, 1978).
E isto é verdade mesmo em se tratando de situações, como as apontadas por Posner (POSNER, 1986) em que o autor redige seu texto com pouca ou nenhuma edição, ou seja, sem necessariamente imprimir conscientemente uma opinião ou tendência política, ainda que em muitos casos esta intenção esteja clara para o autor confesso: Victor Hugo, vale lembrar, declarou abertamente as intenções de Os Miseráveis, julgando de volta, nas palavras do autor, a sociedade que julga seu herói Jean-Val Jean; advogando pelo progresso, por uma sociedade justa (BLYTHE, 1985) – segundo o senso de justiça do autor.
Por certo que o senso de justiça de Victor Hugo não é o único senso de justiça possível na sociedade francesa do Século XIX – tanto não se tratava de opinião unívoca que, por suas opiniões políticas foi o poeta exilado ao final de sua vida por 19 anos – mas também não se trata de noção completamente alheia ao que se passava na França de seu tempo.
Partimos, então, para a segunda proposição, segundo a qual o direito, com claro viés político – como não poderia deixar de ser – estabelece, segundo um senso de justiça também dotado de historicidade, proposições e codificações dirigidas a uma sociedade em específico. Como a literatura, então, as disciplinas e instituições jurídicas também não são neutras, dependendo, portanto, de um senso de justiça comum a uma organização sócio-cultural.
Sem a justiça, dirá Jacques Derrida (DERRIDA, 2010)[5], a lei será dotada de poder violento, mas jamais de enforcement, ou da força legítima que deve possuir uma proposição jurídica. Isto é dizer, para que haja força de lei, é preciso que esta fale ao povo ao qual se destina, é preciso que este, portanto, a tome como legítima e aceite sua imposição enquanto justa. Enquanto o direito é instrumento de cálculo, diz o autor, a justiça é o incalculável, é o fundamento místico da autoridade. E, novamente, este senso de justiça só pode ser socialmente constituído.
Se o processo de edição de uma lei, por si, não é e não pode ser politicamente neutro, também não o é a interpretação do instituto jurídico: Dworkin (DWORKIN, 1982) já aponta que a solução dada para cada caso dependerá – como a crítica de uma obra de arte depende da concepção de “arte” daquele que a interpreta – da concepção de “justiça” que carrega o julgador.
Disso se extrai a primeira ligação entre as duas disciplinas: literatura e direito são marcados, ambos, pelas concepções de quem os produz, e, por sua vez, quem os produz é marcado, por um lado, por sua consciência individual, também esta constituída socialmente, conforme indicado anteriormente.
A partir destas concepções, pode-se passar ao segundo ponto de interseção entre direito e literatura, qual seja, a questão da narrativa.
As proposições do capítulo anterior permitiram entender o direito enquanto construção narrativa, por ser também constituído por meio da linguagem – e, aqui, novamente se faz menção a Bakhtin (2009)[6] para dizer que esta própria linguagem já é uma construção social a servir de instrumento para outra –, mas também por fundar-se em histórias. Histórias estas contadas pelas partes em um processo, pelas decisões judiciais proferidas ao longo dos anos, pelas novas interpretações dadas a institutos já anteriormente propostos, pelas próprias proposições legais “codificadoras da realidade” (se…, então…), pela sequência de atos processuais.
Em 1958 o Professor Wolfgang Kaiser já pronunciou-se, para distinguir entre um texto jurídico ou científico e um texto literário, excluindo como critério a ficção de suas proposições: “[…] Para demarcação da linha divisória [entre obras de literatura e obras científicas ou jurídicas] não basta serem umas produto da fantasia do autor e as outras não. Foi neste sentido que alguns românticos ingleses quiseram ver na fantasia um fenômeno constitutivo da poesia. Mas também o cientista precisa de fantasia; e quem ousará decidir se a fantasia de um historiador é na verdade inferior à de um poeta que escreveu um romance histórico ou trabalhou de novo um assunto literário já muitas vezes tratado?” (KAISER, 1958)
É bem verdade que não se compactua, aqui, com a noção de que história e romance histórico se confundem: embora não se possa falar em uma reconstrução real do passado ou em uma análise deste como se fosse um objeto inerte, ou como se tivéssemos em mãos todos os ângulos possíveis de análise para sua representação fiel, conforme apontam alguns historiadores mais dados ao ceticismo; também não parece crível que, entre a imaginação solta do escritor dedicado a um romance histórico e os processos historiográficos não haja qualquer linha divisória – recusa-se esta hipótese ao trazer à tona o elemento da prova, ou, como indica Paul Ricoeur (2000), também citado por Chartier (2011), colocar entre memória e história certas regras de conferência e critérios de estudo a garantir o cientificismo do processo historiográfico em oposição à criação livre do romance histórico.
As histórias da literatura, ficcionais ou não, apresentam um leque de possíveis resultados para cada acontecimento, conforme afirma François Ost (2005), muito maior que as histórias encontradas no direito, conhecido por engessar, em sua narrativa do “dever ser”, a realidade em uma lógica fixa cuja aplicabilidade não mais será necessária quando se adentra o campo literário.
Ainda segundo Ost, o próprio direito, as próprias instituições de base que sustentam uma sociedade em si mesma são produtos da imaginação do homem: há uma narrativa constituinte (2005) – e aqui o termo “constituinte” não se reporta à Constituição escrita de garantias de direitos e liberdades, mas ao ato de constituir, de formar uma sociedade. Neste sentido, como em Hunt (2009) a literatura foi fundamental para a invenção dos direitos humanos, as declarações destes direitos e as Constituções são narrativas da história dos homens, noção que se aproxima, inclusive, da ideia do direito enquanto um romance em cadeia, ao menos no que diz respeito à common law, segundo Dworkin (1982).
Tanto é assim que diversos homens das letras, entre os quais cumpre destacar alguns dos tempos da França dos séculos XVIII e XIX também destacavam-se em suas influências políticas: Rousseau e Voltaire influenciaram a revolução em seus escritos políticos iluministas, mas contribuíram para a cena literária francesa com romances como Júlia e A Princesa da Babilônia, sem deixar de escancarar também nestes últimos suas opiniões políticas; bem como fez mais tarde Victor Hugo, seja em Os Miseráveis, seja em O Corcunda de Notre Dame; seja como fez, como deve ser citada entre as poucas mulheres escritoras de sua época, Madame de Staël, também dada à literatura ficcional ao lado de textos filosóficos e políticos, muitos deles advogando por maior liberdade às mulheres.
Pois bem, sendo direito e literatura construções narrativas pelo uso da linguagem e marcadas por sua historicidade – pela sua relação com os ideais dos produtores do discurso e, na mesma medida, com os ideais da sociedade em que são produzidas – é certo que o estudo de uma e de outra disciplinas, em seu momento histórico, pode servir para revelar as lentes pelas quais juristas e escritores viam a realidade que narravam, e utilizá-la, portanto, para entender o contexto francês no pós-Revolução.
A França no Século XIX, entre monarquias, impérios, monarquias constitucionais, repúblicas, e uma revolução atrás da outra foi objeto de estudos de um sem-número de historiadores. As questões acerca do Estado e do Direito como temos hoje foram em grande parte discutidas e consolidadas precisamente neste momento de ebulição social.
Neste sentido, a filosofia jurídica surgida no século XVIII toma forma no Code Napoléon e na Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão quando da Revolução de 1789.
A separação entre o público e o privado, por exemplo, conforme aponta Hunt em História da Vida Privada (2009) toma grandes proporções com a Revolução, que, tão preocupada com a padronização do que era público acaba por, na verdade, apagar a linha divisória entre público e privado que se pretendia reforçar: : logo, para ser um verdadeiro antirrevolucionário, era preciso usar uma roseta com as três cores da bandeira, ou um barrete vermelho, chegando mesmo ao ponto de se cogitar – e se projetar – uniformes para os cidadãos – como poderia a igualdade se dar em uma sociedade em que as desigualdades ainda se manifestavam no vestuário? Ora, se mesmo o modo de se vestir tornou-se público, conclui a autora pelo desfazimento das fronteiras que tanto se pretendia estabelecer.
Após a tomada da Bastilha, o château de Versailles foi invadido, a Família Real teve sua saída forçada, e se instaurou a Assembleia Constituinte, que decretou, entre outros, o estabelecimento do júri, a divisão da França em departamentos, a supressão dos privilégios feudais, da nobreza e a criação de um novo papel-moeda; em 1790, no aniversário da tomada da Bastilha, o rei promete a manutenção da constituição apresentada pela Assembleia Constituinte; ao tentar sair da França, em 1791, Luís XVI é barrado e enviado a Tuilleries, seus poderes políticos são suspensos; a Assembleia Legislativa foi substituída pela Convenção Nacional (a mesma que editou decreto impedindo o estabelecimento de obrigatoriedade de uso de certas vestimentas pelos grupos civis), e a monarquia é abolida – é proclamada a República em 1792; Luís XVI é morto na Praça da Concórdia, em Paris, em janeiro de 1793 (SAINT-OUEN, 1838).
A classe burguesa, então, toma o poder em Paris e passa a regular o Estado francês. O golpe de 18 Brumário, ainda que coloque no poder francês algo parecido com um rei, na verdade consegue uma consolidação em termos de unificação jurídica voltada quase que exclusivamente aos interesses da classe burguesa: sucesso do famoso Code Napoléon, segundo Safatian, se deu em parte porque colocou-se em uma posição liberal moderada, com traços conservadores que se encontravam nos juristas escolhidos para compor a comissão de redação – juristas que haviam advogado durante a realeza e que, embora compactuassem com os ideais revolucionários, inquietaram-se durante o período do Terror e representavam uma síntese entre o racionalismo jurídico e o individualismo da Revolução Francesa e as tradições do direito francês pré-revolucionário.
Nas palavras do autor: « Sous le rapport de son dispositif, la rédaction du Code civil se caractérise par la rencontre entre une tradition juridique multiséculaire perpétuée par les grands jurisconsultes français et le rationalisme juridique dont la codification française était l’expression en étant la manifestation sur le plan formel de l’esprit de système appliqué au droit. Les principes de liberté, d’égalité et de propriété étaient érigés en fondements principaux du nouvel ordre civil. Le Code Napoléon consacrait, conformément à l’esprit du temps, une conception du droit et de la société davantage centrée sur l’individu tout en s’efforçant de protéger l’institution familiale et de rétablir à tous les niveaux de l’ordre social le principe d’autorité sans bouleverser les mœurs françaises qu’il contribua néanmoins à uniformiser. » (SAFATIAN, 2013)[7]
Desta forma é que se considera possível tomar o Code Civil de Napoléon enquanto instância da narrativa social inserida na lógica jurídica e, neste sentido, quando combinada com a análise literária, capaz de trazer um relato da sociedade francesa do século XIX – mais especificamente, trazer uma narrativa típica da burguesia francesa do século XIX.
Quando se fala em século XIX, se fala, em toda parte, em progresso, em industrialização, em refinamento de técnicas de trabalho, em capitalização, complexificação da sociedade, avanço tecnológico e científico. Fala-se em uma sociedade que não mais teme a mão do destino, ou curva-se à poderosa Natureza, mas que os domina (GOFF, 1990)[8]. Fala-se na centralidade do ser humano e seu poder de entender e manipular a natureza, um homem senhor de seu destino, um homem senhor de si mesmo, um homem racional.
Victor Hugo tem muito forte em sua literatura, o que alguns estudiosos do autor chamam de “mito do progresso”, expresso em grande parte em Os Miseráveis, obra do autor conhecida por seu caráter de denúncia de injustiças sociais que o autor aponta e concentra em alguns personagens. O próprio Victor Hugo, em carta a Lamartine acerca de seu livro, comentada por Debora Mae Blythe: « Parmi les préoccupations, les soucis, et les grands problèmes de son âge qui sont reflétés dans les écrits de Victor Hugo, on trouve surtout les marques du vif intérêt que porte ce penseur à ce que David Owen Evans appelle « la grande idée culturale du XIXe siècle : la doctrine du progrès. Dans une lettre écrite à Lamartine le 24 Juin 1862, Hugo déclare que, dans sa pensée, « Les Misérables ne sont autre chose qu’un livre ayant la fraternité pour base et le progrès pour cime. » L’étude de cette doctrine, ainsi qu’elle est présenté dans ce roman, est donc un intérêt capital. Elle nous éclairera sur la philosophie entière du écrivain, une philosophie qu’il résume assez succinctement dans cette même lettre à Lamartine : « oui, une société qui admet la misère, oui une religion qui admet l’enfer, oui, une humanité qui admet la guerre, me semblent, une société et une humanité inferieures, et c’est vers la société d’en haut, vers l’humanité d’en haut, et vers la religion d’en haut que je tends : société sans roi, humanité sans frontières, religion sans livre. Oui, je combats le prêtre qui vend le mensonge, et juge qui rend l’injustice. Universaliser la propriété (ce qui est le contraire de l’abolir) en supprimant le parasitisme, c’est-à-dire arriver a ce but : tout homme propriétaire et aucun home maître, voilà pour moi la véritable économie sociale et politique. Le but est éloigné. Est-ce une raison pour n’y pas marcher ? » (BLYTHE, 1985)[9]
O mito do progresso em Victor Hugo não é apenas o progresso para Victor Hugo, mas também uma ideia de progresso que permeia todo o Século XIX: não se pode esquecer que é aqui que nasce a História Rankeana, ou Positivista, escola historiográfica baseada numa busca de neutralidade em relação ao seu objeto de estudo, bem como no foco em fontes chamadas oficiais – documentos governamentais, principalmente, e relatos oficializados –, e, mais importante, uma linha historiográfica linear, marcada pela noção de evolução social, de refinamento das sociedades do tempo moderno em relação às anteriores (BURKE, 1992).
Quando se trata de pura crítica literária, Posner dirá que, por mais interessante que seja a análise da história da composição de uma obra literária – o autor traz em seu texto o exemplo do poema Easter, de Yeats, em que estudos dirão tratar-se de texto sobre a revolta irlandesa na Páscoa de 1916, mesmo ano em que foi escrito o poema, brutalmente reprimida pelos ingleses – não significará uma compreensão mais profunda ou uma apreciação maior do poema em si (POSNER, 1986).
Pois bem, se por um lado a literatura, apreendida por prazer, em raras situações se beneficiará do entendimento das posições sociais a ocupar a mente do autor quando escrevia seu texto – mesmo porque, conforme argumenta Posner, grande parte das obras literárias foram escritas com pouca ou nenhuma edição, sendo em boa medida fruto de escolhas feitas pelo subconsciente do autor –, a utilização, como se pretende neste estudo, da obra literária enquanto fonte histórica para a compreensão do universo jurídico de um momento específico não pode, por óbvio, se distanciar da historicidade da novela. Neste sentido: se entender que entre os três homens revolucionários em Easter um deles era o marido de sua inamorata (POSNER, 1986), que nunca se posicionou lutando pela independência irlandesa, pode não ser de grande serventia para o leitor cujas intenções sejam de apreciação de um texto literário, tal entendimento é de grande importância para aquele que pretende, a partir das escolhas – conscientes ou não – do autor, compreender a formatação de um tempo.
Nesta esteira, deve-se lembrar da carga simbólica da linguagem, que traz também uma carga política (BAKHTIN, 2009)[10]. Edward W. Said fala do orientalismo como criação da narrativa do Ocidente sobre o Oriente, e que, portanto, em vez de retratar um Oriente como é, retrata as projeções ocidentais sobre aquela realidade que pretende observar, e isso perpassa, diz o autor, não apenas pelas obras que se pretendem científicas, no campo da antropologia, da história, por exemplo, mas pelas representações literárias desse Oriente criado pelas mentes ocidentais – vale lembrar, neste sentido, Drácula, de Bram Stoker e seu castelo posicionado na “fronteira” entre ocidente e oriente, na Transilvânia, bem como suas três esposas sugestivamente vestidas como odaliscas (STOKER, 2011)[11] – de modo que o orientalismo pode ser visto como “um estilo ocidental para dominar, reestruturar e ter autoridade sobre o oriente” (SAID, 1996).
Adriano Prosperi (2009) busca a definição de “literatura” para a Igreja quando das publicações de index de livros proibidos pela inquisição italiana, lembrando os leitores de que, ainda que a proibição era feita pelos homens da religião, a análise dos textos era relegada aos homens das letras. Em uma palavra, afirma o autor, a literatura se resumia a “histórias”: “A expressão usada sistematicamente durante séculos para indicar o que hoje chamamos de “literatura” foi “obra de ficção”. Ela definia uma relação com a realidade que não podia ser reduzida à simples noção de “falso”. Uma ocasião para precisar o que se entendia a respeito foi oferecida justamente pela criação de índices sistemáticos pela censura eclesiástica.” (PROSPERI, 2009, p. 98)
Assim, os escritos literários podem ser definidos segundo o critério de verdade de suas proposições. Não se pretende aqui entrar em discussão acerca do conceito ou da possibilidade de uma “verdade” real e objetiva, mas apenas utilizar-se do critério mencionado para fazer a distinção entre a construção literária e a realidade observável.
Deste modo, pode-se inferir, da leitura de Prosperi (2009), que a literatura se traduz numa construção narrativa de mundos imaginários e acontecimentos ficcionais, com personagens criadas pela própria linguagem que é instrumento desta arte. A Paris do Quasímodo e o País das Maravilhas, embora a primeira tenha o nome e descreva as construções de um lugar acessível aos seres humanos do plano da realidade, têm uma mesma origem: a manipulação do instrumento linguístico enquanto sua origem, como refere Derrida (2010)[12], inacessível.
O Romance, diz Guinsburg, em suas manifestações nas diversas formas da arte, em seu sem-número de faces – tantos romances quanto romancistas, característica esta importantíssima, diz o autor, para a universalidade do romance, que, com sua característica de individualidade, permite falar a todos – foi um movimento social. Mais do que uma escola literária ou artística, o romance colocou em ebulição toda uma Europa ocidental da segunda metade do século XVIII e adentrou o século XIX sem freios.
Lynn Hunt em A Invenção dos Direitos Humanos trata do romance como uma das principais fontes de alteração na mentalidade europeia a partir do estiramento das fronteiras da empatia: Júlia, moça de classe média eternizada no romance epistolar de Rousseau (1964)[13], em 1761, causou “torrentes de emoções” segundo o Journal des Savants e foi “devorado” por Jean le Rond d’Alembert (HUNT, 2009, p. 38), que pouco tinha de moça ou da classe média. Tais reações, segundo a autora, são novidade para uma sociedade cujos esforços de empatia eram direcionados sempre aos mais próximos (HUNT, 2009, p. 35-69).
O romance, ainda que tardiamente consolidado enquanto escola literária na França – conforme visto, apenas em Cromwell, publicado em 1827 por Victor Hugo, portanto já no início do século XIX, o romance tomou forma e foi defendido em termos de estilo, tendo sempre sido refutado pelos autores, em especial os autores de romances, cujos prefácios não raro indicavam não ser aquele livro um romance (ainda que contivesse todas as características de um) (MORETTI, 2009, p. 98) – significou, então, não apenas novo estilo literário, mas marcou uma época, inclusive nela gerando transformações, e foi por esta também marcado.
Lynn Hunt dirá que não é por acaso que os romances como Pâmela (romance de Samuel Richardson, publicado em 1740), Clarissa (RICHARDSON, 1747) e Júlia (ROUSSEAU, 1761) foram publicados apenas alguns anos antes das primeiras Declarações de Direitos Humanos, de modo que estes e seu poder de potencializar a empatia – ou simpatia – em muito contribuíram para a noção de igualdade que permeia a própria ideia de Direitos Humanos (HUNT, 2009).
O romance, portanto, é estilo literário, sim, mas mais do que isto, é narrativa ficcional capaz de movimentar mentalidades. Para o presente estudo, no entanto, tal conclusão não pode ser suficiente: toda a inventividade do romance e seu poder reformador, de grande importância, devem ser colocados ao lado de sua historicidade, e das tensões que o texto pode trazer em seus significados.
Bakhtin alerta para os perigos de uma análise psicologicista ou idealista, que situam a questão da linguagem – e, portanto, do signo – no âmbito da consciência: se a primeira reduzirá a consciência a nada, de modo que traduz apenas respostas psicofisiológicas anteriores à cultura e que resultarão em uma ideologia mais ou menos organizada ao acaso; a segunda elevará a consciência a algo supra-humano, anterior e condição para a compreensão de qualquer realidade material ou signo que a represente. Pertinente a observação do autor quando afirma serem ambas as teorias incompletas por ignorarem o signo enquanto criação humana que transita pela sociedade, sendo contemporânea e conterrânea à consciência: “No entanto, o ideológico enquanto tal não pode ser explicado em termos de raízes supra ou infra-humanas. Seu verdadeiro lugar é o material social particular de signos criados pelo homem. Sua especificidade reside, precisamente, no fato de que ele se situa entre indivíduos organizados, sendo o meio de sua comunicação.
Os signos só podem aparecer em um terreno interindividual. Ainda assim, trata-se de um terreno que não pode ser chamado de “natural” no sentido usual da palavra: não basta colocar face a face dois homo sapiens quaisquer para que os signos se constituam. É fundamental que esses dois indivíduos estejam socialmente organizados, que formem um grupo (uma unidade social): só assim um sistema de signos pode constituir-se. A consciência individual não só nada pode explicar, mas, ao contrário, deve ela própria ser explicada a partir do meio ideológico e social.
A consciência individual é um fato sócio-ideológico. Enquanto esse fato e todas as suas conseqüências não forem devidamente reconhecidas, não será possível construir nem uma psicologia objetiva nem um estudo objetivo das ideologias.” (Grifo do autor) (BAKHTIN, 2009, p. 6)[14].
Assim, explica o autor, o signo é feito pela sociedade em que surge, e as realidades materiais podem ser transformadas em signos ideológicos: o pão e o vinho, exemplos levantados pelo autor, tornam-se algo além de bebida e alimento nos rituais religiosos pela ideologia imprimida no signo; a foice e o martelo tornam-se símbolos do trabalho no campo e nos centros urbanos como símbolo da União Soviética; Julia de Rousseau, Fantine e Cosette de Hugo, portanto, tornam-se também muito mais do que uma descrição objetiva e genérica de mulher quando inscritas em seus romances inspiradores de paixões e emoções fervilhantes.
O que se pretende, aqui, ao invocar a filosofia da linguagem e a ideologia dos signos, é lembrar que o poder transformador da literatura (HUNT, 2009) e o seu caráter ficcional intimamente relacionado à liberdade criativa (OST, 2004) não podem funcionar como razões para olvidar-se da outra face da produção artística, ou seja, justamente o fato de ser esta uma produção, e, portanto, carregar a marca do ideário da sociedade em que foi produzida, carregar a ideologia do signo.
Com isto não se quer dizer que toda produção literária será escrava da ideologia, ou que servirá sempre à manutenção do status quo, mas que, conforme referencia Bakhtin (2009)[15], sempre tem em si a característica de refletir ou refratar uma outra realidade que não o universo dos signos: a linguagem pode distorcer a realidade o quanto queira, mas sempre referenciará um meio social de homens que a produziram.
E a aproximação, da literatura ao seu contexto se faz presente não apenas em seu conteúdo, mas também em forma: Ian Watt, em A Ascenção do Romance, faz menção às mútuas influências filosóficas e literárias, e à sua relação menos direta do que aparenta, tendo, em verdade, em comum um quadro maior.
Como exemplo, dentre as características listadas pelo autor do romance que aparece – não por acaso – primeiramente na Inglaterra do século XVIII, o realismo é uma das tendências desenvolvidas na arte literária bem como nas elaborações filosóficas: “Até aqui tratamos das principais analogias entre o realismo na filosofia e na literatura. Não as consideramos perfeitas: a filosofia é uma coisa e a literatura é outra. Tampouco as analogias dependem da hipótese de a tradição realista na filosofia ter suscitado o realismo no romance. Provavelmente houve influência, sobretudo através de Locke, cujo pensamento permeia o século XVIII. Entretanto, se existe uma relação causal de alguma importância, provavelmente é bem menos direta: tanto as inovações filosóficas quanto as literárias devem ser encaradas como manifestações paralelas de uma mudança mais ampla – aquela vasta transformação da civilização ocidental desde o Renascimento que substituiu a visão unificada de mundo da Idade Média por outra muito diferente, que nos apresenta essencialmente um conjunto em evolução, mas sem planejamento, de indivíduos particulares vivendo experiências particulares em épocas e lugares particulares.” (WATT, 2010, p. 33).
Assim defende o autor, ao fazer estudo histórico voltado ao fenômeno da estruturação e consolidação do romance pelo século XVIII e XIX, que a aparição e o enraizamento desta forma de literatura se deu porque o meio o permitiu – porque as mudanças pelas quais passava a sociedade europeia na época indicada tornou fértil o terreno para esta nova forma de escrever.
O individualismo aparece dando enfoque nas relações interpessoais pelo direito privado, assim como aparece na literatura ao tratar do foro íntimo das personagens – vide o aparecimento do romance epistolar (WATT, 2010), em que as cartas traduzem mais emoção que razão; ao se voltar à vida de pessoas comuns, os romancistas partem de um pressuposto cuja base só pode ser o individualismo que despontou no século XVII e tomou sua forma no século XIX (o próprio termo “individualismo” foi cunhado na segunda metade do XIX, segundo Watt (2010)).
O patrimonialismo também merece atenção: a proteção dada ao patrimônio pelo Code Civil a coloca na posição de maîtrise souveraine [matriz soberana] (XIFARAS, 2004), o que não se deve a outra coisa senão a força da burguesia enquanto classe dominante e a nova divisão da sociedade em classes por propriedade, com a extinção da nobreza e dos privilégios pautados nas relações do Ancien Régime. Pois bem, o homem trabalhador da literatura burguesa, a aventura empreendedora em contraste com a aventura quixotesca do romance cavalheiresco também representam essa nova sociedade pautada em um sistema capitalista de aquisição (e especial proteção jurídica) da propriedade.
Em terceiro lugar, o racionalismo se apresenta na própria existência do Code Civil: a noção de sistema, de codificação, com a intenção de unificação do Direito – de suma importância para Napoleão enquanto Imperador que, na conquista de mais e mais territórios devia dar à sua nação algo de uno, e eis o Código. Disse Bonaparte: « Ma vraie gloire, ce n’est pas d’avoir gagné quarante batailles: Waterloo effacera le souvenir de tant de victoires. Ce que rien n’effacera, ce qui vivra éternellement, c’est mon Code civil » (MONTHOLON, 1847, p. 401)[16]. E, de fato, até hoje o Code Napoléon é lembrado, e leva seu nome. Também no romance a mentalidade racionalista se apresenta no princípio do realismo, ou da verossimilhança: Mme. De Staël, ao tratar do romance, já glorifica a força de acompanhar a vida de um cidadão comum, de uma pessoa que poderia muito bem ser nós mesmos, não fosse o nome diferente, a importância da identificação com um personagem que, se não vive em nosso mundo, vive em um muito parecido (STAËL, 2012)[17].
Os anos seguintes são plenos de batalhas aliadas ao espírito de dominação de Napoleão que não convém citar neste trabalho.
O discurso de Victor Hugo quando de sua entrada na Academia de Letras da França, em 1841 – cadeira esta que lhe foi dada em razão da repercussão de Notre Dame de Paris, por outro lado, tem muito a dizer sobre a época e a figura de Napoleão. Iniciou com um ode à memória do imperador, enunciando seus feitos e cumprimentando-o pela grandeza; passa o escritor, então, a enunciar aqueles que resistiram à luz ofuscante e sedutora que o Imperador lançou sobre toda a Europa para tornar-se não apenas um grande líder, mas um grande líder largamente aceito – faltava à Europa a autonomia, e faltava à França a liberdade. Estes autores significavam isto para a Europa sob Bonaparte, que, também homem de cultura e amante das belles letres, sabia o poder da literatura, e sabia temer os poetas.
Os seis autores por ele mencionados, contrários ao imperador – Chateaubriand, Mme. De Stäel, Benjamin Constant, Ducis, Delille, Lemercier – eram também contrários aos combates constantes do empreendedorismo napoleônico. Também aqui Hugo cede até certo ponto para dizer que a guerra não é ruim, e é parte necessária da história de qualquer civilização, mas se torna algo que deve ser suprimido quando, de combates ocasionais ou frequentes, torna-se crônica.
Enuncia o dever de respeito desta geração com relação às anteriores para dizer que não cabe a nós julgar os atos políticos de nossos pais, e nem se posiciona contrário ou a favor da política de Napoleão, mas diz que, se foi ofuscante a luz emitida pelo general, a resistência a ela foi também gloriosa.
Passa, então, o autor a falar de Lemercier, o anterior ocupante de sua cadeira na Academia Francesa e cuja morte lhe rendeu o lugar. Com uma vastíssima obra, Lemercier estava, segundo o autor aqui estudado, sempre filiado à moda política do ano anterior: em 1789 era monarquista; em 1793 se autoproclamou libertário de ’89, atraído pela Convenção Nacional, e permaneceu forte em seus ideais durante o período do terror; em 1804, quando Napoleão institui o Império, Lemercier se dizia republicano.
« n’y eut pas que cela, Messieurs ; il y eut aussi service rendu à l’humanité. Il n’y eut pas seulement résistance au despotisme ; il y eut aussi résistance à la guerre. Et qu’on ne se méprenne pas ici sur le sens et sur la portée de mes paroles, je suis de ceux qui pensent que la guerre est souvent bonne. À ce point de vue supérieur d’où l’on voit toute l’histoire comme un seul groupe et toute la philosophie comme une seule idée, les batailles ne sont pas plus des plaies faites au genre humain que les sillons ne sont des plaies faites à la terre. Depuis cinq mille ans, toutes les moissons s’ébauchent par la charrue et toutes les civilisations par la guerre. Mais lorsque la guerre tend à dominer, lorsqu’elle devient l’état normal d’une nation, lorsqu’elle passe à l’état chronique, pour ainsi dire, quand il y a, par exemple, treize grandes guerres en quatorze ans, alors, Messieurs, quelque magnifiques que soient les résultats ultérieurs, il vient un moment où l’humanité souffre. Le côté délicat des mœurs s’use et s’amoindrit au frottement des idées brutales ; le sabre devient le seul outil de la société ; la force se forge un droit à elle ; le rayonnement divin de la bonne foi, qui doit toujours éclairer la face des nations, s’éclipse à chaque instant dans l’ombre où s’élaborent les traités et les partages de royaumes ; le commerce, l’industrie, le développement radieux des intelligences, toute l’activité pacifique disparaît ; la sociabilité humaine est en péril. Dans ces moments-là, Messieurs, il sied qu’une imposante réclamation s’élève, il est moral que l’intelligence dise hardiment son fait à la force ; il est bon qu’en présence même de leur victoire et de leur puissance, les penseurs fassent des remontrances aux héros, et que les poëtes, ces civilisateurs sereins patients et paisibles, protestent contre les conquérants, ces civilisateurs violents. » (HUGO, 1841, p. 85-86)[18]
Desta passagem convêm chamar atenção a três pontos, a seguir trabalhados: burguesia; cultura; o papel da literatura.
No aspecto da burguesia, vale trazer O Burguês de Franco Moretti, figura que, em primeiro lugar, não pode ser una, mas terá necessariamente nuances – e estas nuances existiam, em debates políticos acirrados sobre diversas questões sociais e econômicas, inclusive, pois, como aponta o autor, não necessariamente o burguês era identificado com o capitalista –, mesmo porque era condição necessária da classe burguesa estar sempre aberta a novos integrantes. O ponto sincrético que representaria um núcleo burguês no século XIX, encontrado por Moretti (2014), é a burguesia da cultura, a ser tratada pelo autor por meio da literatura.
Pois bem, a literatura burguesa, para o historiador, pode ser dividida em três momentos: primeiramente identifica-se um senhor que trabalha – como Robinson Crusoé e seus incansáveis esforços pelo empreendedorismo também característico dos romances burgueses, justificava por meio do seu trabalho a sua grande riqueza, ainda que esta não fosse advinda de suas aventuras, mas do trabalho escravo que mantinha em solo americano; depois, temos o século sério – da racionalidade e do “princípio de realidade”, a descrição do mundo como ele é, a atenção aos detalhes e ao realismo, a preocupação com a precisão das palavras tomam a cena neste momento; por fim, a névoa traz o gótico, a adjetivação vitoriana, a figura do gentleman e a erudição. Assim é que, conforme defende Moretti (2014), encontramos o burguês nas formas literárias.
As preocupações de Victor Hugo com relação à guerra demonstram essa burguesia do trabalho e a burguesia da cultura: diz Hugo que as guerras constantes são um perigo à civilidade na medida em que tudo se torna voltado às atividades bélicas e o empreendimento, a indústria, as artes e a instrução pouco se desenvolvem – ameaçando, portanto, o já indicado mito do progresso, característico de Hugo.
Napoleão manteve um sistema de controle da literatura – aponta o próprio Victor Hugo que seu antecessor na Académie Française, Lemercier, enviava romances à censura como soldados à batalha, na recusa de um, logo se seguia outro com o mesmo tom –, mas, conforme aponta Thibaudet (1914), não foi esta a razão para a parca produção literária dos tempos napoleônicos. Para este autor, admirador de Bonaparte, as reclamações de Mme. De Staël e Chateaubriand pouco ou nada contribuíram para sua obra, inclusive, para Thibaudet, o imperador foi inspirador para Chateaubriand e seu Bonaparte e eu. Mais do que isso, o autor aponta para as próximas gerações e suas vinte formas de “imitações de Napoleão” (THIBAUDET, 1914).
Se o clima árido para a literatura se deveu às guerras incessantes pela dominação europeia é conclusão à qual não se pode chegar com certeza, ao menos não sem conduzir um estudo muito mais aprofundado do que se pretende o presente trabalho nesta seara. O que se pode dizer é que Victor Hugo, ainda que defendesse não ser seu papel julgar as ações do período de Napoleão – deve-se lembrar que, nascido em 1802, Victor Hugo contava com apenas treze anos de idade quando da derrota de Napoleão que causou o fim de seu Império e o retorno de Luís XVIII –, considerava as constantes empreitadas imperialistas de Napoleão perigosas para o desenvolvimento das atividades civis, entre as quais se encontrava a instrução: e era neste momento em que deveria insurgir-se bravamente o poeta – como o fizeram Mme. De Staël, Lemercier e Chateaubriand – em defesa da atividade civilizatória pacífica.
Ao lado da instrução – projeto de Hugo consoante sua crença no já mencionado mito do progresso, segundo o qual as sociedades deveriam progredir para serem cada vez mais justas, mais inteligentes, cada vez mais corretas (de acordo com os valores morais do escritor, por certo) – encontramos os ofícios da burguesia típica do século XIX, a indústria, o comércio: o senhor que trabalha (MORETTI, 2014).
A cultura jurídica do fim do século XVIII passou a girar em torno de um ideal de simplicidade, como reação a um direito extremamente complexo que tinha lugar no Ancien Régime com a aplicação do direito das localidades pelos jurisconsultos, as permanências do direito canônico em especial no casamento, a diferenciação jurídica entre cidadãos em razão da classe nobre. Aplicando ao direito o princípio da lei gravitacional – até pela cultura do Direito Natural – os filósofos da Revolução pretendiam um direito civil que gravitasse em torno de uma só máxima: não fazer aos outros aquilo que não toleraria que fizessem a si.
É claro, explica Martin, não se pretendia reduzir de fato o Direito a uma só frase, o que seria impensável, mas era necessário, para o ideal revolucionário, em primeiro lugar uma unidade nacional em torno de um sistema jurídico, e, em segundo lugar, uma simplificação do Direito – da qual dependia, inclusive, a unidade já mencionada. Deste modo é que a codificação do Direito Civil surge como alternativa fundada em princípio egoísta da necessidade atribuída aos homens uns dos outros, sob o mito do pacto social (MARTIN, 2005).
Conforme ensina Martin, diferentemente do que se poderia a princípio pensar, a “humanidade” dos direitos do homem, e o foco trazido pela base filosófica revolucionária ao homem enquanto indivíduo, na verdade, não só não basta como pode assumir ambiguidade curiosa. Explica-se: como se percebe pelos estudos do autor acerca da Guerre de la Vendée – guerra civil contrarrevolucionária que eclodiu na região da Vendéia em 1793 – percebe-se que a noção de homem, na verdade, está mais ligada à bestialidade que ao racionalismo. Para Rousseau, inclusive, o homem bom da natureza (o bom selvagem) era um animal ignorante, estúpido, e o “homem que medita é um animal depravado”, de modo que a dignidade humana não vem primeiro, pela “natureza humana” (ROUSSEAU, 1964)[19] como se poderia crer, mas sim, vem em segundo plano, com a cidadania, “[…]Car c’est le masque civique, martelé par les forgerons de l’anthropologie sociale, qui donnera aux humains leur dignité nouvelle et définitive.” (MARTIN, 2014, p. 50)[20]
Assim, o jusnaturalismo racional, típico da cultura jurídica da modernidade, se faz e justifica, bem como é justificado, pelo pacto social de Hobbes, segundo o qual o homem que, na natureza, é selvagem e perigoso, por precisar da comunidade para sobreviver, assume um pacto de limitação das próprias liberdades, constituindo-se, então, em sujeito de direito a partir do momento em que, para os autores da época, afastando-se de sua natureza, passa a assumir uma posição social, por uma escolha racional. A racionalidade que o afasta da condição natural é a que confere ao homem seus direitos “naturais” (MARTIN, 2014, p. 52).
Assim, é a condição de cidadão – ou de homem “desnaturado” (MARTIN, 2014) – que garante aos homens os direitos professados pelos revolucionários, e não necessariamente sua natureza humana. Deste modo, o Code Civil de Napoleão, código destinado à simplificação e reunião das leis relativas ao direito entre as pessoas privadas, por certo, constitui tratado voltado aos cidadãos.
O movimento humanista que teve início no século XVI já marcava uma tendência à laicização do Direito, que se completou com o Código de Napoleão no século XIX. O foco das culturas, então, inclusive a jurídica, passa a ser o homem, e, mais tarde, com o individualismo, passa a ser não o homem enquanto figura genérica, mas o indivíduo sujeito de direitos (VILLEY, 2008).
Como enuncia Xavier Martin, o Code não se funda em uma tábua rasa, mas é resultado das marcas deixadas pelas correntes filosóficas revolucionárias, bem como pela tradição jurídica francesa, em conjunção apontada por Safatian. Também assume a forma de uma resposta a ambas as correntes, à complexidade multifacetária do Direito do Ancién Régime, bem como ao espírito de mudança e de instituição de nova ordem que veio com a Revolução de 1789.
Também o romance assume uma nova forma de se escrever, conforme aponta Watt (2010), com a inserção, por exemplo, da individualidade e do foco nas características, físicas ou psicológicas, de cada personagem, não mais nomeados de acordo com sua classe, ofício ou característica que reporta a todo um grupo de pessoas.
Conforme já tratado anteriormente, portanto, neste ponto referente à individualidade, o surgimento dos direitos subjetivos do homem e do cidadão também se representa no meio literário representado pelo romance, que substituiu a epopeia aportando estas noções de individualismo e de importância de uma personalidade individual até então ignorada e mesmo superlativa nos romances epistolares, por exemplo, como aponta Hunt (2009).
Também no que tange à ascensão da classe burguesa, já anteriormente mencionada, traz ao romance, bem como ao Direito, algo de novo em termos de conteúdo. Afirma Moretti que a recorrência do herói-homem-trabalhador nada mais é que a representação da nova classe de poder: a burguesia – cujo argumento de poder se centra no fato de que são eles os trabalhadores, enquanto que a nobreza apenas recolhia os frutos do trabalho e do empreendedorismo das demais classes sociais – passa a dar os exemplos heroicos, substituindo a narrativa dos cavaleiros quixotescos para tratar de empreendedores como Jean ValJean (HUGO, 2002)[21] ou Robinson Crusoé – nada importa, aqui, o fato de Crusoé, em verdade, trabalhar o tempo todo mas recolher os frutos de seus empreendimentos além-mar baseados em trabalho escravo, o fato é que sua riqueza se justifica pelo incansável trabalho, embora não dele advenha (MORETTI, 2014).
É neste momento histórico que a propriedade privada passa a ter a importância que tem até os dias de hoje no sistema capitalista: o Code Napoléon eleva à propriedade à condição de, conforme mencionado, maîtrise souveraine (XIFARAS, 2004), a ser especialmente protegida pelo Direito ainda segundo uma lógica individualista nova de atribuição da propriedade a um único titular que se relaciona pessoalmente com esta propriedade.
A racionalidade jurídica que aparece no Code, primeira organização do direito em um sistema uniforme – não apenas no sentido anteriormente mencionado de critério único para o Direito de todo o território francês, mas também enquanto estabelecimento e encerramento, no Código, de uma lógica comum, de um verdadeiro ordenamento jurídico (CAPPELLINI; SORDI, 2002).
A racionalidade no romance aparece, para Franco Moretti, aparece no já comentado “princípio da realidade” que traz ao romance a preocupação com o detalhe, com a imersão do leitor na história, com a verossimilhança e o realismo das descrições (MORETTI, 2014).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O que se percebe, portanto, em um estudo não mais paralelo, mas de entrecruzamento entre Direito e Literatura, são mútuos pontos de encontro capazes de demonstrar aquilo que se tomou como pressuposto anteriormente: o método utilizado neste artigo, aplicado à sociedade burguesa da França no século XIX, parece trazer, de fato, o Direito e a Literatura enquanto duas instâncias narrativas, estas necessariamente ligadas ao contexto em que são produzidas.
Deste modo, o encontro das principais ideologias burguesas em consolidação na França do XIX no Direito e na Literatura são capazes de dar-nos indícios destas narrativas sociais e como se relacionam com esta sociedade que as produziu.
Mesmo quando se fez uso das obras de Victor Hugo, conhecido por sua forte crítica social e pela característica subversiva de sua literatura (HUGO, 2002)[22] – caráter este que a literatura, segundo Ost (2004), não compartilha com o Direito, cujos esforços de conformação da sociedade são não de liberação de possibilidades, mas de engessamento da realidade em uma lógica única de causa-consequência – é notável a presença do realismo – basta ver a reconstrução detalhada diante dos olhos do leitor da Notre Dame de Paris (HUGO, 2015)[23] -, da figura do homem trabalhador, do foco no indivíduo.
Assim, evidenciada a possibilidade e a capacidade de profundidade de uma pesquisa que considere Direito e Literatura não como ambientes paralelos, mas que se encontram e se interpenetram.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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BLYTHE, Deborah Mae. Victor Hugo, Visionnaire: Le mythe du progrès dans Les Miserables. 1985. 141 f. Dissertação (Mestrado) – Curso de Arts, Department Of French, University Of British Columbia, Vancouver, 1985.
BURKE, Peter. A Escrita da História: Novas Perspectivas, pg. 9-17. São Paulo: Unesp, 1992.
CAPPELLINI, Paolo. Il codice eterno. La forma codice e i suoi destinatari: morfologie e metamorfosi di un paradigma della modernità. In CAPPELLINI, Paolo; SORDI, Bernardo (org.). Codici: una riflessione di fine millennio. Milano: Giuffré, 2002.
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[1] Graduada em Direito pela Universidade Federal do Paraná.
[2] Original de 1991
[3] Original de 1991
[4] Original de 1929
[5] Original de 1991
[6] Original de 1929
[7]“No que se refere aos seus dispositivos, a redação do Code Civil se caracteriza pelo encontro entre uma tradição jurídica multissecular perpetuada pelos grandes jurisconsultos franceses e o racionalismo jurídico do qual a codificação francesa era a expressão enquanto a manifestação no plano formal do espírito do sistema aplicado ao Direito.
Os princípios de liberdade, de igualdade e de propriedade eram erigidos sobre fundamentos principais da nova ordem civil. O Code Napoléon consagrava, conforme o espírito do tempo, uma concepção do direito e da sociedade agora centrada no indivíduo, ainda se esforçando para proteger a instituição familiar e reestabelecer a todos os níveis da ordem social o princípio da autoridade sem atropelar os modos franceses que contribuía ainda assim a uniformizar.”
[8] Jacques Le Goff, ao tratar do binômio antigo/moderno na historiografia, afirma: “O par antigo/moderno está ligado à história do Ocidente, embora possamos encontrar equivalentes para ele em outras civilizações e em outras historiografias. Durante o período pré-industrial, do século V ao XIX, marcou o ritmo de uma oposição cultural que, no fim da Idade Média e durante as Luzes, irrompeu na ribalta da cena intelectual. Na metade do século XIX transforma-se, com o aparecimento do conceito de ‘modernidade’, que constitui uma reação ambígua da cultura à agressão do mundo industrial.” Nasce a noção de modernidade no século XIX como auto-referência, demonstrando a confiança do século em sua posição de superioridade em relação a sociedades anteriores, notadamente a Idade Média – mais que a Antiguidade, retomada com saudosismo pela renascença.
[9] Entre as preocupações, as questões, e os grandes problemas de seu tempo que são refletidos na escrita de Victor Hugo, se encontra principalmente as marcas do interesse vivo que leva a esse pensamento aquilo que David Owen Evans chama “a grande ideia cultural do século XIX: a doutrina do progresso”. Em uma carta escrita a Lamartine em 24 de junho de 1862, Hugo declara que, segundo crê, “Os Miseráveis não é outra coisa que não um livro cuja base é a fraternidade e o fim é o progresso”. O estudo desta doutrina, da forma como é apresentado neste romance é, portanto, um interesse capital. Ela nos esclarecerá acerca de toda a filosofia do escritor, uma filosofia que ele resume de modo suficientemente sucinto nesta mesma carta a Lamartine: “sim, uma sociedade que admite a miséria, sim, uma religião que admite o inferno, sim, uma humanidade que admite a guerra, me parecem uma sociedade e uma humanidade inferiores, e é para sociedade alta, para humanidade alta, para a religião alta que tendo: sociedade sem reis, humanidade sem fronteiras, religião sem livro. Sim, eu combato o padre que vende falsidade, e julgo quem traz injustiça. Universalizar a propriedade (que é o contrário de a abolir) suprimindo o parasitismo, quer dizer chegar ao objetivo: todo homem proprietário, nenhum homem mestre, esta é para mim a verdadeira economia social política. O objetivo é longínquo. Mas esta é uma razão para deixar de busca-lo?”
Tradução livre.
[10] Original de 1929
[11] Original de 1897
[12] Original de 1991
[13] Original de 1761
[14] Original de 1929
[15] Original de 1929
[16] “Minha verdadeira glória, não é ter ganho quarenta batalhas: Waterloo ofuscará as memórias de tantas vitórias. O que jamais será apagado, o que viverá eternamente, é meu Código civil”
Tradução livre.
[17] Original de 1795
[18] “Não foi mais do que isso, Senhores; houve também serviço à humanidade. Não apenas resistência ao despotismo; houve também resistência à guerra. E não nos enganemos aqui sobre o sentido de minhas palavras, eu sou daqueles que acreditam que muitas vezes a guerra é boa. Deste ponto de vista superior de onde se vê toda a história como um único grupo e toda a filosofia como uma ideia, as batalhas não são mais feridas feitas na humanidade que os sulcos são feridas feitas na terra. Após cinco mil anos todas as plantações são marcadas pelo arado e todas as civilizações são marcadas pela guerra. Mas quando a guerra tende à dominação e se torna o estado normal da nação, quando passa ao estado crônico, por assim, dizer, quando há, por exemplo, treze guerras em um período de quatorze anos, então, Senhores, por mais magníficos que sejam os resultados posteriores, vem um momento em que a humanidade sofre. A delicadeza dos modos se desgasta e se reduz no embate com as ideias brutais; o sabre se torna o único utensílio da sociedade; a força se torna um direito em si mesma; a razão divina da boa-fé, que deve sempre iluminar as nações, é eclipsada a cada instante na sombra em que se elaboram os tratados e as divisões de reinos; o comércio, a indústria, o desenvolvimento radioso das inteligências, toda atividade pacífica desaparece; a sociabilidade humana está em perigo. Nestes momentos, Senhores, convém que uma reclamação se eleve; é moral que a inteligência se faça corajosamente à força; é bom que na presença de suas vitórias e seu poder, os pensadores façam referências aos heróis, e que os poetas, os civilizadores serenos, pacientes e pacíficos protestem contra os conquistadores, estes civilizadores violentos.” Tradução livre.
[19] Original de 1755
[20]“Pois é a máscara cívica, forjada pela antropologia social, que dará aos humanos sua dignidade nova e definitiva.” Tradução livre.
[21] Original de 1862.
[22] Original de 1862.
[23] Original de 1831.
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