Com vistas à apuração de falta praticada pelo servidor ou empregado público à Administração Direta ou Indireta, independente de sua gravidade[i], faz-se necessária a utilização do procedimento administrativo com essa finalidade. Não se trata de analisar tão somente a falta grave, ao contrário de alguns entendimentos doutrinários.[ii]
Assim, o “objeto do processo administrativo disciplinar é a averiguação da existência de alguma infração funcional por parte dos servidores públicos, qualquer que seja o nível de gravidade”.[iii]
Este procedimento vem regulamentado na Lei 8.112/90, em seu artigo 143 e seguintes, e deverá seguir alguns princípios, dentre os quais: legalidade objetiva (só há permissivo para a instauração do processo com base na lei), a oficialidade (cabe tão somente à Administração Pública a movimentação do processo administrativo), o informalismo (há dispensa de ritos rigorosos e formas solenes) e a publicidade (acesso aos interessados, devendo demonstrar interesse na causa, ou atuar em defesa de interesse coletivo, ou exercitar direitos à informação, salvo em caso de sigilosidade).[iv]
Deverá a Administração se valer do presente procedimento com a utilização de sindicância e processo administrativo disciplinar principal, concluindo, ao final, pela escolha da execução de uma das medidas: o arquivamento do feito, em se demonstrando a ausência de infração, ou a aplicação da penalidade cabida, no caso de cometimento de falta funcional.
– Sindicância: segundo definição doutrinária, seria “o meio sumário de que se utiliza a Administração Pública, no Brasil, para, sigilosa ou publicamente, com indiciados ou não, proceder à apuração de ocorrências anômalas no serviço público, as quais, confirmadas, fornecerão elementos concretos para a imediata abertura de processo administrativo contra o funcionário público responsável”.[v]
Trata-se, assim, de uma apuração preliminar de falta do servidor, visando à apuração da existência da própria infração, a razão de sua ocorrência e de seu autor.
Por ser um procedimento preliminar (artigo 154, caput, da Lei 8.112/90), faz-se um paralelo com o inquérito policial, meio processual penal prévio à ação penal. Assim, está revestida a sindicância de caráter inquisitivo, não litigioso, sem incidência dos princípios do contraditório e ampla defesa e com o princípio da publicidade atenuado, objetivando – e por isso a razão de ser um procedimento preliminar – a instauração de um processo administrativo principal.[vi]
Pelo caráter preliminar e por todas características acima enunciadas, demonstra-se a impossibilidade de a sindicância proceder à aplicação de penalidade. Daí que a sindicância a que a Lei 8.112/91 faz referência não se subsumir à sua clássica modalidade, visto que permite a aplicação de penalidade (artigo 145, II) e da ampla defesa (artigo 143, caput). Trata-se, em verdade, de processo administrativo disciplinar principal.[vii]
Conforme a jurisprudência pátria:
Dessa maneira, reitera-se, o procedimento de sindicância é preliminar, preparativo do processo administrativo principal, contendo caráter inquisitivo, não litigioso, sem a incidência dos princípios do contraditório e ampla defesa, com o princípio da publicidade atenuado, sendo impedida a aplicação de penalidades.
– Processo administrativo disciplinar principal: também chamado simplesmente de processo disciplinar (conforme artigos 148 e seguintes, da Lei 8.112/90), é “o processo administrativo litigioso, acusatório e definitivo que exige a incidência do princípio da ampla defesa e do contraditório, e do devido processo legal. Este, e somente este, é que, ao seu final, permite ao administrador aplicar a penalidade adequada quando tiver sido efetivamente verificada a ocorrência de infração funcional”.[viii]
É instaurado após finda a sindicância, procedimento este que, por ser tido por encerrado, não se permitirá alegação mácula ou vício. Assim:
O presente procedimento detém fases, que, cronologicamente, se dispõem em: instauração, instrução, defesa, relatório e decisão.[ix]
No tocante à instrução e defesa, chamados de inquérito administrativo pela Lei 8.112/90 (artigos 153 e seguintes), deve-se obedecer aos princípios constitucionais do contraditório e ampla defesa, com a utilização de meios e recursos admitidos em direito (artigos 153 e 156, da Lei 8.112/90 e artigos 27, parágrafo único, 30, 38 e 40, da Lei 9.784/99).
Além disso, é assegurada a publicidade dos atos, mesmo que para aquele interessado que está sendo processado disciplinarmente, ao contrário do que se dá na sindicância. Poderá, assim, ter vista dos autos do processo na repartição onde está sendo autuado (de acordo com o §1°, do artigo 161, da Lei n8.112/90).
Demonstra-se, com isso, que o procedimento de punição requer, necessariamente, o respeito aos princípios do contraditório e ampla defesa, observando-se o devido processo legal, sob pena de nulidade[x], ao contrário do procedimento de sindicância, por ser prévio, inquisitivo e sigiloso.
Mesmo que o ordenamento jurídico pátrio, através de disposições constitucionais e legais preveja o acesso às informações – através do que se depreende, por exemplo, nos incisos XIV e XXXIII, da Constituição da República do Brasil de 1988 – elencando-o como princípio constitucional, por outro lado é permitido, através destes mesmos dispositivos, o sigilo de informações, por ser imprescindível à segurança da sociedade e do Estado.
Dessa forma, como meio de solução ao caso concreto, aplicar-se-á a técnica da ponderação, na qual se identifica os casos em que há “confronto de razões, de interesses, de valores ou de bens albergados por normas constitucionais” [xi], conforme o caso. Sopesam-se os princípios em jogo e será aplicado aquele que possuir maior peso, sem que haja exclusão total de um por outro.
Assim sendo, quanto à possibilidade de acesso ou a utilização do sigilo ao procedimento administrativo de sindicância, prevalece o entendimento de que o caráter sigiloso dever ser o soberano, em vistas à segurança da sociedade e do Estado. Isso porque, caso se atribuísse o acesso dos documentos formalizados pela comissão de sindicância, mesmo que para os ex-empregados e/ou empregados envolvidos, estar-se-ia concedendo permissão à sociedade para que viole o direito de sigilo do Estado em questões que lhe interessem sobremaneira, como, no caso, a punição a seus funcionários faltosos.
As informações, caso interessem ao requerente, podem ser consultadas através da via judicial. Não é concedida, conforme fundamentações trazidas à baila, a livre consulta a relatórios conclusivos emitidos pelas comissões de sindicância.
Referências Bibliográficas
Notas:
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