ECA

Efetividade dos direitos fundamentais inerentes as crianças e adolescentes em conflito com a lei

Michele Ribeiro Haddad[1]

Resumo: O presente estudo trata da efetividade dos direitos fundamentais que são inerentes as crianças e aos adolescentes em conflito com a lei, apontando a real importância de esses seres receberem os direitos que a eles são destinados. O objetivo da pesquisa é ratificar a importância do cumprimento efetivo desses direitos, por ser tratar de pessoa em desenvolvimento e que se encontra em conflito com a lei, assegurando-lhes condições dignas de correta aplicação de medida socioeducativa protetiva. Lembrando que dessa forma as leis internas e o direito de cada sistema devem garantir a satisfação de todas as necessidades das pessoas até 18 anos de idade, incluindo não só o aspecto penal, mas a todos direitos basilares garantidos como o direito à vida, saúde, educação, convivência, lazer, profissionalização e liberdade.

Palavras Chave: Medida Socioeducativa. Direitos Fundamentais. Criança e adolescente. Efetividade normativa.

 

Abstract: The present study deals with the effectiveness of the fundamental rights that are inherent to children and adolescents in conflict with the law, pointing out the real importance of these beings receiving the rights that are destined for them. The objective of the research is to ratify the importance of the effective fulfillment of these rights, as it deals with a person in development and who is in conflict with the law, assuring them conditions worthy of correct application of a protective socio-educational measure. Recalling that in this way the internal laws and the right of each system must guarantee the satisfaction of all the needs of people up to 18 years of age, including not only the criminal aspect, but all basic rights guaranteed such as the right to life, health, education, coexistence, leisure, professionalization and freedom.

Keywords: Socio-educational measure. Fundamental rights. Child and teenager. Normative effectiveness.

 

Sumário: Introdução. 1. Do Estatuto da Criança e do Adolescente. 2. O Adolescente em conflito com a lei. 3. Lei do Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (SINASE). Considerações Finais. Referências Bibliográficas.

 

Introdução

Se averígua no corpo textual do art. 227 da Constituição Federal que as crianças e os adolescentes possuem garantias e prioridade de direitos frente ao Estado em relação as demais ações. Porém, é necessário saber que nem sempre foi dessa forma, uma vez que as crianças e os adolescentes não eram reconhecidos como cidadãos.

O Estatuto da Criança e do Adolescente é de certa forma um sistema novo, uma vez que possui menos de 20 anos de vigência. Porem ações de auxílio a essas crianças e adolescentes começaram no Brasil desde a época colonial com a criação da “Roda dos Enjeitados”.

As primeiras legislações penais relacionadas à criança e ao adolescente iniciam-se pelas Ordenações Filipinas e chega a atual legislação que é o Estatuto da Criança e do adolescente.

Em 1808 a corte imperial portuguesa veio ao Brasil e trouxe em suas raízes as Ordenações Filipinas, que seria a legislação que passaria a vigorar em todo país, e nessa escrita a imputabilidade penal começaria aos 07 anos de idade, idade essa em que não era cabível a pena de morte.

Contudo a partir de 17 anos até 21 anos, era critério de quem julgava o delito dizer se caberia ou não a pena de morte e com 21 anos atingia-se a imputabilidade penal total, onde era possível a aplicação da pena de morte, dependendo do delito cometido.

As crianças e adolescentes que cometiam os crimes eram tratadas como se adultas fossem e a única coisa que diferenciava a criança e o adolescente do adulto, era a forma que a pena seria atenuada.

Em 1830 surgiu o Código Penal do Império, onde a criança e o adolescente poderiam ser julgados como criminoso mesmo tendo menos de 14 anos, se restasse comprovado que o indivíduo praticou o ato em pleno discernimento do que estava fazendo e dessa forma essas crianças e adolescentes eram recolhidos às casas de correção e permaneciam lá até completarem a idade de 17 anos, conforme os seguintes artigos:

 

Art.10. Também não se julgarão criminosos:

  • Os menores de quatorze anos;

 

Art.13. Se provar que os menores de quatorze anos, que tiverem cometido crimes obraram com discernimento, deverão ser recolhidos as casas de correção, pelo tempo que ao juiz parecer, com tanto que o recolhimento não exceda a idade de dezessete anos.

 

Com o passar do tempo, as crianças vieram deixando de ser apenas mão de obra barata e passaram a adquirir direitos e deveres perante a sociedade e perante o Estado e com isso o Estado começa a entender e perceber a necessidade de intervir nas premissas básicas de qualquer ser humano, quais sejam a saúde física e mental, a dignidade e o respeito.

Já em 1890 passa a vigorar o Código Penal dos Estados Unidos do Brasil, e com isso os artigos 27 e 30 do referido código, nos mostra que não serão considerados criminosos os menores de 09 anos completos e os maiores de 09 anos e menores de 14 anos que não possuírem discernimento no ato realizado.

Em 1927 surgiu à primeira codificação brasileira especifica em menores e o Código de Menores do Brasil que ficou conhecido como Código de Menores Mello Mattos, trazia proteção e confiabilidade aos menores.

Nesse mesmo ano, viu-se a necessidade de proteger e cuidar dos menores, para posteriormente puni-los caso necessário. O art. 24, §2º do decreto lei nº 17.943-A de 1927 do Código de Menores Mello Mattos, dizia que se o menor for abandonado ou estiver em perigo de ser abandonado, a autoridade competente promoverá a colocação dessa jovem casa de educação, escola de preservação ou irá confiar a uma pessoa idônea, apara que fique responsável pela sua educação e integridade física e psicológica, contanto que não se ultrapasse a idade de 21 anos.

É notável que se aumentasse a idade de ressocialização, onde nas legislações anteriores era de 17 anos e passou a ser de 21 anos. Essa justiça foi baseada no critério humanitário, que se dava proteção à criança e ao adolescente e a possibilidade de um futuro melhor.

Com o surgimento do Código Penal de 1940, a imputabilidade penal do menor passou a ser de 18 anos de idade.

Indo em conflito a tais concepções a Constituição Federal de 1988 e a Declaração Universal de Direitos Humanos, estabelece como prioridade a cidadania e dignidade da pessoa humana como fundamentos da República Federativa do Brasil, por constituir-se Estado Democrático de Direito. Respaldada neste entendimento, a Constituição de 1988 direcionou um novo olhar para crianças e adolescentes, desde então reconhecidos como sujeitos de direitos, cidadãos, titulares de direitos especiais, dadas as suas especificidades.

E desde 1990, ano da publicação do Estatuto da Criança e do Adolescente, os atos praticados, sejam eles lícitos ou ilícitos estão elencados e regulados, uma vez que o enfoque do estudo se dirige a efetivação dos direitos fundamentais de crianças e adolescentes em conflito com a lei.

 

  1. Do Estatuto da Criança e do Adolescente

O estatuto da Criança e do adolescente (ECA) é de certa forma um sistema novo, uma vez que possui menos de 20 anos de vigência. Porem ações de auxílio a essas crianças e adolescentes começaram no Brasil desde a época colonial com a criação da “Roda dos Enjeitados”.

As primeiras legislações penais relacionadas à criança e ao adolescente iniciam-se pelas Ordenações Filipinas e chega a atual legislação que é o Estatuto da Criança e do adolescente.

O ECA foi à última atualização relacionada às crianças e aos adolescentes no Brasil. Essa atualização surge já no bojo da Constituição Federal de 1988, em seu artigo 227 que se versa o seguinte:

 

Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.

  • O Estado promoverá programas de assistência integral à saúde da criança, do adolescente e do jovem, admitida a participação de entidades não governamentais, mediante políticas específicas e obedecendo aos seguintes preceitos:

I – aplicação de percentual dos recursos públicos destinados à saúde na assistência materno-infantil;

II – criação de programas de prevenção e atendimento especializado para as pessoas portadoras de deficiência física, sensorial ou mental, bem como de integração social do adolescente e do jovem portador de deficiência, mediante o treinamento para o trabalho e a convivência, e a facilitação do acesso aos bens e serviços coletivos, com a eliminação de obstáculos arquitetônicos e de todas as formas de discriminação.

  • A lei disporá sobre normas de construção dos logradouros e dos edifícios de uso público e de fabricação de veículos de transporte coletivo, a fim de garantir acesso adequado às pessoas portadoras de deficiência.
  • O direito a proteção especial abrangerá os seguintes aspectos:

I – idade mínima de quatorze anos para admissão ao trabalho, observado o disposto no art. 7º, XXXIII;

II – garantia de direitos previdenciários e trabalhistas;

III – garantia de acesso do trabalhador adolescente e jovem à escola;

IV – garantia de pleno e formal conhecimento da atribuição de ato infracional, igualdade na relação processual e defesa técnica por profissional habilitado, segundo dispuser a legislação tutelar específica;

V – obediência aos princípios de brevidade, excepcionalidade e respeito à condição peculiar de pessoa em desenvolvimento, quando da aplicação de qualquer medida privativa da liberdade;

VI – estímulo do Poder Público, através de assistência jurídica, incentivos fiscais e subsídios, nos termos da lei, ao acolhimento, sob a forma de guarda, de criança ou adolescente órfão ou abandonado;

VII – programas de prevenção e atendimento especializado à criança, ao adolescente e ao jovem dependente de entorpecentes e drogas afins.

  • A lei punirá severamente o abuso, a violência e a exploração sexual da criança e do adolescente.
  • A adoção será assistida pelo Poder Público, na forma da lei, que estabelecerá casos e condições de sua efetivação por parte de estrangeiros.
  • Os filhos, havidos ou não da relação do casamento, ou por adoção, terão os mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação.
  • No atendimento dos direitos da criança e do adolescente levar-se- á em consideração o disposto no art. 204.
  • A lei estabelecerá:

– o estatuto da juventude, destinado a regular os direitos dos jovens;

II – o plano nacional de juventude, de duração decenal, visando à articulação das várias esferas do poder público para a execução de políticas públicas.

 

E como norma especial o ECA em seu artigo 4º e artigo 100, preveem:

Art. 4º É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária.

Parágrafo único. A garantia de prioridade compreende:

  1. a) primazia de receber proteção e socorro em quaisquer circunstâncias;
  2. b) precedência de atendimento nos serviços públicos ou de relevância pública;
  3. c) preferência na formulação e na execução das políticas sociais públicas;
  4. d) destinação privilegiada de recursos públicos nas áreas relacionadas com a proteção à infância e à juventude.”

 

Art. 100. Na aplicação das medidas levar-se-ão em conta as necessidades pedagógicas, preferindo-se aquelas que visem ao fortalecimento dos vínculos familiares e comunitários.

Parágrafo único. São também princípios que regem a aplicação das medidas:

II – proteção integral e prioritária: a interpretação e aplicação de toda e qualquer norma contida nesta Lei deve ser voltada à proteção integral e prioritária dos direitos de que crianças e adolescentes são titulares

 

Sendo visível e claro, que conforme os dispositivos mencionados, os interesses da criança e do adolescente devem sempre prevalecer.

Após a promulgação do ECA, foi realizado grandes manobras para a efetiva implementação do novo sistema no governo, porém a efetiva implementação do ECA na sociedade ainda passa por alguns desafios, e conforme elenca Costa (2000), as Mudanças no panorama legal entre municípios e estados precisam se adaptar à nova realidade legal, pois muitos deles ainda não contam em suas leis internas sobre a proteção da criança e do adolescente.

Ainda segundo Costa, o ordenamento institucional deve colocar em prática as novas institucionalidades trazidas pelo ECA e deve haver a melhoria nas formas de entender e agir como isso deverá funcionar na realidade, para que profissionais sejam capacitados corretamente no intuito de aplicar corretamente o que está disposto na lei a essas crianças e adolescentes que estão em negligencia.

No rol da Constituição Federal o ECA concretizou um novo perfil de proteção integral à criança e ao adolescente, uma vez que retirou o termo “menor” passou a trata-los como criança e adolescente.

O ECA exemplifica melhor os direitos da criança e do adolescente e no próprio estatuto inicia-se com o direito à vida e a saúde, uma vez que direito à vida é o principal entre todos e os demais são direitos acessórios e irrevogáveis.

Conforme o artigo 7º do ECA, a criança e o adolescente têm direitos a proteção à vida e à saúde, mediante a efetivação de políticas sociais públicas que permitam o nascimento e o desenvolvimento sadio e harmonioso desses indivíduos, em condições dignas de existências e para que isso se efetive, a lei prevê mecanismos de proteção para que sejam efetivamente postas em práticas.

Quanto à prática de um ato realizado por uma criança ou um adolescente, o ECA também regulariza essa situação, revelando que nenhuma criança ou adolescente será privado de sua liberdade senão em flagrante de ato infracional ou por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente, conforme elenca o art. 106, ECA:

Art. 106. Nenhum adolescente será privado de sua liberdade senão em flagrante de ato infracional ou por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente.

Parágrafo único. O adolescente tem direito à identificação dos responsáveis pela sua apreensão, devendo ser informado acerca de seus direitos.

 

E mediante essa situação o adolescente tem direito a identificação dos responsáveis pela sua apreensão, devendo ser informado de seus direitos e lhe ser garantido o contraditório e legitima defesa, conforme art.107, ECA:

Art. 107. A apreensão de qualquer adolescente e o local onde se encontra recolhido serão incontinenti comunicados à autoridade judiciária competente e à família do apreendido ou à pessoa por ele indicada.

Parágrafo único. Examinar-se-á, desde logo e sob pena de responsabilidade, a possibilidade de liberação imediata.

 

Como prevê o art. 15, o segundo grande direito, depois da vida e da saúde, é à liberdade. A criança e ao adolescente têm direito à liberdade, ao respeito e à dignidade como pessoas humanas em processo de desenvolvimento e como sujeitos de direitos civis, humanos e sociais garantidos na Constituição Federal e nas leis.

Segundo Gonçalves (2005, p.37):

O Estatuto da Criança e do Adolescente é considerado uma legislação de vanguarda, pois rompe com a doutrina da situação irregular e reafirma a noção da proteção da infância e juventude brasileiras, implicando a discriminação positiva da criança e do adolescente.

 

Porém conforme Silva (2013, p.10), isso não funciona de forma tão simples, uma vez que:

Um conjunto de dificuldades é encontrado para a real implantação do Estatuto, como: o despreparo dos recursos humanos nos Conselhos de Direitos e Conselhos Tutelares; o caráter desumanizador das instituições de privação de liberdade; a falta de políticas, programas e ações efetivas.

 

Ao contrário do Código de Menores, o ECA trata da proteção integral que se refere a garantia de ver executados todos os direitos das crianças e dos adolescentes.

 

  1. O adolescente em conflito com a lei

Diante da importância e zelo com a criança e ao adolescente e perante o surgimento do estatuto da criança e do adolescente, fez-se necessário a criação de princípios, tais como o princípio da proteção integral, princípio da prioridade absoluta, principio do menor interesse e o princípio da convivência familiar, com o intuito de assegurar normas de proteção diferenciadas a aquelas aplicadas ao adulto infrator, em decorrência da menoridade e por se tratar de um indivíduo e situação peculiar de risco.

Segundo Curry (2006) os direitos de toda criança e adolescente devem ser universalmente reconhecidos, pois são direitos especiais e específicos pela condição de desenvolvimento que esses seres apresentam, dessa forma as leis internas e o direito de cada sistema devem garantir a satisfação de todas as necessidades das pessoas até 18 anos de idade, incluindo não só o aspecto penal, mas a todos direitos basilares garantidos como o direito à vida, saúde, educação, convivência, lazer, profissionalização e liberdade.

O art. 112, do ECA, nos traz um rol exaustivo de medidas que devem ser aplicadas ao jovem em caso de descumprimento da lei e a autoridade competente para a aplicação de tais medidas é o juiz da Infância e Juventude, por se tratar de atividade tipicamente jurisdicional.

Medidas essas que são divididas em 05 aplicações, quais sejam advertência, obrigação de reparar o dano, prestação de serviços à comunidade, liberdade assistida, inserção em regime de semiliberdade e a internação em estabelecimento educacional. Contudo, o Juiz da Infância e Juventude ao aplicar a medida, deve analisar a condição do jovem de cumpri-la, bem como as circunstancias do ato infracional.

O art. 100 do ECA, aponta que no momento da aplicação das medidas devem ser levados em consideração as necessidades pedagógicas, com o intuito do fortalecimento familiar e comunitário. Lembrando que a decisão do juiz, sempre visará a proporcionalidade entre o ato praticado e a medida socioeducativa aplicada.

Assim, para a aplicação da medida de advertência, que é a medida mais branda, o estatuto se contenta com indícios de autoria, exigindo apenas a materialidade do ato infracional praticado, ou seja, a medida de advertência não deve ser aplicada sem comprovação de autoria.

Quanto a aplicação da medida de reparação do dano, este possui ramificações patrimoniais, quando o juiz determina que o jovem restitua a coisa, ressarça o dano ou compense a vítima de alguma outra forma e essa medida, necessita da concordância do adolescente infrator.

Já a prestação de serviços à comunidade, consiste na realização de tarefas sem fins lucrativos, de interesse geral para toda comunidade. A liberdade assistida, é um meio de acompanhar o jovem, sendo a medida mais rigorosa em meio aberto, e deverá ter um período mínimo de seis meses.

Por fim, a medida de internação, que é a medida mais rigorosa que o jovem pode receber, pois cessa por tempo determinado (pois tem duração máxima de 03 anos, ou completos 21 anos), um dos direitos mais valiosos que é a liberdade. É a medida que possui em seu seio os princípios da brevidade, excepcionalidade e respeito a condição peculiar da pessoa em desenvolvimento. Ela é aplicada por tempo indeterminado, devendo ocorrer uma reavaliação a cada 06 meses de reclusão. A determinada medida, só é aplicada quando todas as outras medidas não mais se encaixam, dessa forma é aplicada quando ocorre violência ou grave ameaça a outrem e por descumprimento de medida imposta anteriormente.

Além disso, é importante saber que as medidas socioeducativas, podem ser aplicadas em conjunto com medidas de proteção, sem que o adolescente se encontre em situação de risco.

Shacaira (2008, p.149) defende ainda que:

O art.112 do ECA (…) modifica a regra de inderrogabilidade, vigente na legislação processual penal, afirmando que, verificada a prática do ato infracional, a autoridade competente poderá (não necessariamente deverá) aplicar aos adolescentes medidas socioeducativas. Na prática, o representante do Ministério Público não se obriga a representar (oferecer denúncia) á autoridade judiciária e esta a aplicar a medida socioeducativa.

 

Em sede de execução das medidas socioeducativas, o art. 35 da lei 12.594/2012 (SINASE) consagra os princípios da excepcionalidade da intervenção judicial e da imposição de medidas, favorecendo-se meios de autocomposição de conflitos e da mínima intervenção, restrita sendo necessário para a realização dos objetivos da medida.

 

  1. Lei do Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (SINASE)

A lei 12.594/2012, a lei do SINASE, regulamenta a execução das medidas socioeducativas. A lei trata-se de um adento que complementa o ECA, disciplinando as especificidades da execução das medidas socioeducativas. E conforme elenca o art.1º, é coordenado pela União, compreendendo um conjunto de princípios, regras e critérios que envolvem a execução de medidas socioeducativas, incluindo-se nele, por adesão, os sistemas estaduais, distritais e municipais.

O ECA estruturou um modelo de responsabilidade especial por ato infracional praticado por adolescente, em respeito à sua condição peculiar de desenvolvimento.

A lei do Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (SINASE), consistente em princípios e regras que regulam os atos infracionais e as medidas a serem aplicadas ao jovem infrator, conforme elenca o art. 1º, §1º, do Sinase:

Art. 1º Esta Lei institui o Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (Sinase) e regulamenta a execução das medidas destinadas a adolescente que pratique ato infracional.

  • Entende-se por Sinase o conjunto ordenado de princípios, regras e critérios que envolvem a execução de medidas socioeducativas, incluindo-se nele, por adesão, os sistemas estaduais, distrital e municipal, bem como todos os planos, políticas e programas específicos de atendimento a adolescente em conflito com a lei.

 

Salienta-se que o Sinase regulamenta o exercício do rol de medidas socioeducativas que elenca o estatuto da criança e do adolescente e é coordenado pela Secretaria Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente do Ministério dos Direitos Humanos (SNDCA/MDH).

A lei do Sinase deixa explicita que a aplicação das medidas socioeducativas, é norteada antes de tudo pelo princípio da proteção integral da criança e do adolescente e que a real verdade sobre o problema de violência enfrentada pelos jovens infratores, tanto individualmente quanto coletivamente demanda uma união dos diversos membros da administração pública que não mais podem sonegar as responsabilidades para com o adolescente.

O ECA e o SINASE se complementam, uma vez que o ECA deixa de lado a situação irregular e passa a considera-los verdadeiros sujeitos de direito e já o SINASE é considerado um documento teórico operacional para a execução das medidas, conforme elenca Digiácomo (2016, p.19):

O Estatuto da Criança e do Adolescente abandona a velha doutrina da “situação irregular”, de modo que a criança e ao adolescente não mais ostenta a condição de meros objetos de proteção, conforme era previsto no revogado Código de Menores. O Estatuto vem, assim, a considera-los como verdadeiro sujeito de direitos, os quais, além de possuírem a titularidade de garantias expressas a todos, indistintamente, também ostentam direitos específicos à sua condição, tais como o direito de brincar, divertir-se, além de garantias prioritárias. O SINASE constitui-se, pois, na lei de execução de medidas socioeducativas, sendo considerado um documento teórico-operacional para execução dessas medidas. A implementação do SINASE objetiva primordialmente o desenvolvimento de uma ação socioeducativa sustentada nos princípios dos direitos humanos.

 

O controle do SINASE compete aos Conselhos de Direitos de Direitos da Criança e do Adolescente, nos mais diversos níveis.

É necessário salientar que o SINASE impõe que seja implementado o Plano de Atendimento Socioeducativo, que busca unir todos os lados do país, quais sejam os governos estaduais e municipais, em prol da correta aplicação das medidas socioeducativas, além da certa aplicação do dever do poder judiciário tais como saúde, educação e cultura. Todo esse sistema elaborado é para que efetivamente as medidas socioeducativas surtem seus efeitos que é a ressocialização do jovem.

 

Considerações Finais

É notório saber que a medida de internação é a forma mais rigorosa de sansão a ser aplicada ao jovem, uma vez que o estado alcança o bem mais preciso do ser humano, além da vida, que é a liberdade. Manifestamente que essa intervenção deve ser fundamentada, uma vez que a decisão que decreta a internação antes da sentença deve demonstrar não só os indícios suficientes de autoria e materialidade, mas também a necessidade imperiosa da medida. Todos aqueles privados de sua liberdade, apenas estarão sujeitos a essa medida socioeducativa como uma forma restrição para que o objetivo fim, que é a reeducação, seja cumprido.

O Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo explicita que a aplicação das medidas socioeducativas, é norteada antes de tudo pelo princípio da proteção integral da criança e do adolescente e que a real verdade sobre o problema de violência enfrentada pelos jovens infratores, tanto individualmente quanto coletivamente demanda uma união dos diversos membros da administração pública que não mais podem sonegar as responsabilidades para com o adolescente.

Diariamente, milhares de crianças e adolescentes tem seus direitos negados pela omissão do Estado, este que é garantidor dos direitos fundamentais do jovem, conforme elenca no art.6º, da CF:

 

Art. 6º. São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição.

 

Quanto ao dever do Estado para com esses jovens os arts. 24 e 125 do ECA alencam:

Art. 54. É dever do Estado assegurar à criança e ao adolescente:

I- ensino fundamental, obrigatório e gratuito, inclusive para os que a ele não tiveram acesso na idade própria;

II- progressiva extensão da obrigatoriedade e gratuidade ao ensino médio;

III- atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência, preferencialmente na rede regular de ensino;

IV- atendimento em creche e pré-escola às crianças de zero a seis anos de idade;

V- acesso aos níveis mais elevados do ensino, da pesquisa e da criação artística, segundo a capacidade de cada um;

VI- oferta de ensino noturno regular, adequado às condições do adolescente trabalhador;

VII- atendimento no ensino fundamental, através de programas suplementares de material didático- escolar, transporte, alimentação e assistência à saúde.

  • 1º O acesso ao ensino obrigatório e gratuito é direito público subjetivo.
  • 2° O não oferecimento do ensino obrigatório pelo poder público ou sua oferta irregular importa responsabilidade da autoridade competente.
  • 3° Compete ao poder público recensear os educandos no ensino fundamental, fazer-lhes a chamada e zelar, junto aos pais ou responsável, pela frequência à escola.

 

Art. 125. É dever do Estado zelar pela integridade física e mental dos internos, cabendo-lhe adotar as medidas adequadas de contenção e segurança.

 

Desta forma, é nítido a importância da efetividade e aplicação dos direitos fundamentais a criança e ao adolescente. Primeiramente pela condição de vulnerabilidade decorrente da própria idade e segundamente pois são direitos especiais e específicos pela condição de desenvolvimento que esses seres apresentam, dessa forma as leis internas e o direito de cada sistema devem garantir a satisfação de todas as necessidades das pessoas até 18 anos de idade, incluindo não só o aspecto penal, mas a todos direitos basilares garantidos como o direito à vida, saúde, educação, convivência, lazer, profissionalização e liberdade.

 

Referências Bibliográficas

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil – Col. Saraiva De Legislação – 55ª Ed. 2018.

 

BRASIL. Lei nº 8.069 de 13 de julho de 1990. Estatuto da Criança e do Adolescente. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8069.htm. Acesso em 19 de maio de 2020.

 

CURRY, Munir. Estatuto da Criança e do Adolescente Comentado. Comentários Jurídicos e Sociais. Ed – São Paulo: Malheiros Editores, 2006.

 

DIGIÁCOMO, Eduardo O SINASE (Lei nº 12.594/12) em perguntas e respostas – São Paulo – Ed. Ixtlan – 2016.

 

FULLER, Paulo Henrique Aranda. Estatuto da Criança e do Adolescente Comentado. 1ª. Ed – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2017.

 

GONÇALVES, H. S. Medidas socioeducativas: avanços e retrocessos no trato do adolescente autor de ato infracional. IN: ZAMORA, M. H. (Org.). Para além das grades. Elementos para a transformação do sistema socioeducativo. Rio de janeiro: Editora PUC-RIO, 2005.

 

SHECAIRA, Sérgio Salomão. Sistema de garantias e o direito penal juvenil. São Paulo: Ed. RT, 2008.

 

SILVA, Mayara do Nascimento. A efetividade dos direitos fundamentais de crianças e adolescentes em conflito com a lei e a atuação do ministério público. Artigo Cientifico disponível em : http://www.publicadireito.com.br/artigos/?cod=1c95ee9c76a4fb92. Acesso em: 15 de maio de 2020.

 

 

[1] Bacharela em Direito pela Universidade Candido Mendes, Campos dos Goytacazes/RJ. Pós Graduanda em Direitos da Criança e do Adolescente pela Fundação Escola Superior do Ministério Público/RS. Endereço eletrônico: michelehaddadr@gmail.com

Âmbito Jurídico

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