Resumo: O presente trabalho tem por escopo analisar o atual cenário dos direitos trabalhistas dos empregados domésticos que constituem uma categoria com direitos bastante restritos formando uma comparação com um cenário hipotético tendo como parâmetro proposições legislativas que visam equiparar os direitos destes trabalhadores aos demais, ampliando a gama de benefícios auferidos pelos domésticos. Em nosso ordenamento os trabalhadores domésticos encontram-se regidos por lei específica, tombada sob o nº 5.859/72, a qual poderá vir a ser revogada, tacitamente, em virtude da PEC nº 478/2010 ou pela ratificação da Convenção nº 189 OIT; tanto a PEC, quanto a Convenção nº 189 OIT, tem por objetivo ampliar o rol de direitos do empregados domésticos, garantindo-lhes todos os direitos inerentes aos trabalhadores em geral. Neste trabalho far-se-á uma construção histórica desde os primórdios do Direito do Trabalho, passando pelas primeiras jurisprudências que reconheceram em relações de trabalho doméstico direitos legalmente não atribuídos a esta classe, e culminando na análise de propostas legislativas nacionais e internacionais almejando esta equiparação de direitos além de analisar os possíveis reflexos decorrentes desta presumível modificação em nosso cenário jurídico.
Palavras–chave: Empregados domésticos; Equiparação; Propostas legislativas; PEC nº 478/2010; Convenção nº 189 OIT.
Abstract: The scope of this paper is to analyze the current state of labor rights of domestic workers that constitute a category with very restricted rights forming a comparison with a hypothetical scenario having legislative proposals as a parameter, intended to equate the rights of workers, expanding the range of benefits earned by the household. In our planning, domestic workers are governed by specific legislation, listed under nº 5.859/72, which could be revoked, tacitly, by virtue of PEC nº 478/2010 or the ratification of ILO Convention nº 189, both PEC, as the ILO Convention nº 189, aims to enlarge the list of rights of domestic workers, guaranteeing them all the rights inherent to workers in general. This work will make a historical analysis from the early days of the Labor Law, passing by the first case law that recognized domestic relations work legally not assigned to this class, and culminating in the analysis of national and international legislative proposals aiming at its similarity rights in addition to examining the possible consequences resulting from this alleged change in our legal scenario.
Keywords: Household Workers, Equalization; Legislative proposals; PEC nº 478/2010, ILO Convention nº 189.
Sumário: Introdução; 1. Referencial histórico e conceitual do direito do trabalho; 1.1 Aspectos históricos do direito do trabalho; 1.2 Conceito de direito do trabalho; 1.3 Fontes do direito do trabalho; 2 Referencial histórico do direito do trabalho no Brasil; 2.1 Aspectos históricos do direito do trabalho no Brasil; 2.2 O empregado doméstico no direito brasileiro; 3 Direito internacional do trabalho; 3.1 A aplicabilidade de normas internacionais; 3.2, Hierarquia da norma internacional do ordenamento jurídico brasileiro; 3.3 A organização internacional do trabalho; 4 Propostas de equiparação dos direitos dos empregados domésticos aos demais trabalhadores; 4.1 Precedentes jurisprudenciais; 4.2 Propostas legislativas nacionais; 4.2.1 O projeto de Lei nº 1.626/1989; 4.2.2 A proposta de emenda constitucional (PEC) nº 478/2010; 4.3 A convenção nº 189 da OIT; Considerações finais; Referências.Introdução
As relações humanas em muitos aspectos encontram-se intimamente ligados ao trabalho, a necessidade de realizá-lo e a forma como deveria ser executado. Inicialmente, os trabalhos eram realizados apenas como meio necessário de sobrevivência, a manutenção de nossos lares, ao suprimento de nossas necessidades alimentícias, a necessidade de nos protegermos da ação da natureza e de animais selvagens.
Após algumas gerações as relações humanas tomaram contornos mais complexos, o que culminou na transformação das relações humanas e, a partir de então, a sociedade passou a ser dividida entre os que deveriam servir e os que eram servidos, a partir deste momento os serviços são realizados não em benefício próprio, mas, sim, para a satisfação de necessidades alheias.
A escravidão foi, por assim dizer, o início da história do denominado trabalho doméstico, tendo-se em vista que nas sociedades antigas somente os escravos desempenham os serviços domésticos enquanto os trabalhadores livres desempenhavam outros tipos de atividades.
Não há dúvidas de que história do Direito do Trabalho propriamente dita teve início com a revolução industrial, sendo de pouca relevância os eventos trabalhistas acontecidos anteriormente. A dinâmica de lutas em busca de melhores condições de trabalho mostrou-se com ênfase na fase industrial e pós-industrial, sempre em prol do proletariado, raramente em favor daqueles que trabalhavam nos domicílios alheios.
Após vários séculos pouca coisa mudou com relação ao direito dos empregados domésticos, contudo, recentemente ganha vulto um movimento social no sentido de equiparação dos demais trabalhadores aos empregados domésticos sendo exemplos disso algumas propostas legislativas em âmbito nacional e internacional, fato este que merece maior atenção e estudo dos operadores do direito, motivo que enseja a confecção do presente trabalho.
O presente trabalho será desenvolvido através de uma pesquisa bibliográfica e documental a ser realizada em livros e documentos de caráter eminentemente jurídico e/ou sociológico ou, ainda, outros documentos que estejam interligados ao tema proposto, que sejam encontrados em acervos e bibliotecas públicos ou particulares, livrarias e mesmo na internet.
Tem-se por escopo conceituar e definir o Direito do Trabalho e o empregado doméstico, bem como analisar, a evolução destes institutos e também das propostas legislativas que visam equiparar aos empregados domésticos os direitos conferidos aos demais trabalhadores, traçando-se, assim, um paralelo entre a o cenário atual e o provável futuro desta categoria profissional.
2 Referencial histórico e conceitual do Direito do Trabalho
2.1 Aspectos Históricos do Direito do Trabalho
Nas sociedades antigas existiam duas espécies de trabalhadores, de um lado encontravam-se os homens livres os quais podiam se dedicar a qualquer trabalho que lhes aprouvesse, e, de outro lado, encontrava-se os escravos os quais eram utilizados pelos nobres nos afazeres domésticos, zelando não somente pela residência, mas, também, pelo bem estar de seus senhores.
Posteriormente, a mão de obra escrava passou a ser utilizada em maior escala passando a trabalhar não só nas casas dos nobres, mas também em suas plantações, cultivando a terra e colhendo os frutos destinados a alimentar o seu senhor e a família deste. Em alguns momentos os escravos foram utilizados até mesmo na construção de obras públicas.
O escravo não possuía qualquer tipo de direito, era tratado apenas como objeto e não como um indivíduo merecedor de tratamento digno, inobstante a imensa carga de serviço suportado pelo escravo este não tinha descanso, remuneração ou qualquer forma de compensação pelo trabalho realizado, recebia apenas a alimentação estritamente necessária a sua subsistência.
Acerca deste período Amauri Mascaro Nascimento (2009, pág. 43) assevera que “predominou a escravidão, que fez do trabalhador simplesmente uma coisa, sem possibilidade sequer de se equiparar a sujeito de direito. O escravo não tinha, pela sua condição, direitos trabalhistas”.[1]
A servidão veio a suceder o regime escravagista, muito embora não o tenha abolido completamente. O servilismo possuía como característica marcante o fato de que os servos, embora não fossem escravos, não possuíam uma liberdade plena para desempenhar suas atividades. Os servos eram protegidos pelo senhor feudal, contudo, eram obrigados a trabalhar nas terras deste e em contraprestação ao direito de cultivar a terra e de proteção deviam entregar ao senhor grande parte da colheita, além de pagar os impostos por ele instituídos.
Durante a Idade Média surgem as corporações de ofício, as quais eram compostas pelo mestre, companheiros ou oficiais e aprendizes; os mestres eram os proprietários das oficinas e da matéria prima, portanto, detinham os meios de produção; os companheiros, por sua vez, eram artesãos liderados pelo mestre, percebendo deste uma remuneração pelos trabalhos realizados; já os aprendizes eram menores de idade que buscavam aprender o ofício ou profissão.
Cada corporação de ofício era regida por estatuto próprio que determinava as normas a serem seguidas pelos membros da oficina, disciplinando inclusive o modo como um membro poderia chegar à condição de mestre, surgia, portanto, o primeiro exemplo de ordenamento jurídico trabalhista, ainda que muito diferente do sistema atual, mas, ainda assim, bastante relevante para a história do Direito do trabalho.
Nascimento (2009, pág. 43) faz-nos uma preleção bastante pertinente:
“Com as corporações de ofício da Idade Média as características das relações de trabalho ainda não permitiram a existência de uma ordem jurídica nos moldes com que mais tarde surgiria o direito do trabalho. Houve, no entanto, uma transformação: a maior liberdade do trabalhador. Nas corporações de artesãos agrupavam-se todos os artesãos do mesmo ramo em uma localidade. Cada corporação tinha um estatuto com algumas normas disciplinando as relações de trabalho. Havia três categorias de membros das corporações: os mestres, os companheiros e os aprendizes.”[2]
No que tange ao Direito do Trabalho a Revolução Industrial foi um verdadeiro divisor de águas, houve profunda modificação na produção de bens, o trabalho artesanal foi substituído pela manufatura fato que repercutiu enormemente nas condições de trabalho, sendo necessária a utilização de um número menor de trabalhadores sendo mantida ou superada a capacidade produtiva anterior.
Esta mudança ocasionou uma alteração no contexto social visto que houve um aumento no número de desempregados, aliando-se a isso o forte êxodo rural culminando na acentuação dos contrastes sociais. Aproveitando-se do enorme contingente de trabalhadores disponíveis os donos das indústrias passaram a contratar as pessoas em condições cada vez mais aviltantes, submetendo os empregados a salários ínfimos e condições de trabalhos extenuantes, com jornadas de trabalho exaustivas.
Visando coibir os excessos praticados pelos patrões os operários passam a organizarem-se, surgindo, assim, os primeiros movimentos em prol dos trabalhadores, os quais, posteriormente, deram ensejo à criação dos sindicatos. Os movimentos trabalhistas, principalmente no século XIX, tinham como principais exigências a diminuição da jornada de trabalho e a regulamentação do trabalho feminino e infantil.
Com o fim da 1ª Guerra Mundial, surge a 1ª Organização Internacional dos Trabalhadores a qual tinha como objetivo unificar a luta operária e o movimento proletariado internacional, resguardando aos trabalhadores condições mínimas adequadas ao desenvolvimento de suas atividades profissionais.
No século XX tem início o movimento denominado Constitucionalismo Social, o qual objetivava a inserção de normas de cunho trabalhista nas Constituições, estabelecendo algumas mínimas garantias aos trabalhadores buscando dessa forma defender os interesses sociais.
No que se refere ao Constitucionalismo Social é pertinente trazer a baila a preleção de Maurício Godinho Delgado (2011, pág. 98):
“O dado fundamental é que o Direito do Trabalho se institucionaliza, oficializa-se, incorporando-se à matriz das ordens jurídicas dos países desenvolvidos democráticos, após longo período de estruturação, sistematização e consolidação (…).” [3]
Na atualidade o Direito do Trabalho passa por novas reformulações visando tutelar não somente as relações empregatícias (cerne desta ciência), mas também procura açambarcar as relações de trabalho, em que há a prestação de serviço, mas inexiste o caráter de dependência de uma parte para com a outra.
2.2 Conceito de Direito do Trabalho
Nascimento (2009, pág. 59) apresenta a seguinte definição de Direito do Trabalho:
“(…) é possível definir direito do trabalho como o ramo da ciência do direito que tem por objeto as normas, as instituições jurídicas e os princípios que disciplinam as relações de trabalho determinam os seus sujeitos e as organizações destinadas à proteção desse trabalho em sua estrutura e atividade.” [4]
Garcia (2011, pág. 8) nos ensina que “o Direito do Trabalho pode ser definido como o ramo do direito que regula as relações de emprego e outras situações semelhantes.” [5]
Delgado (2011, pág. 51) conceitua Direito Individual do Trabalho como o “complexo de princípios, regras e institutos jurídicos que regulam, no tocante às pessoas e matérias envolvidas, a relação empregatícia de trabalho, além de outras relações laborais normativamente especificadas.” [6]
Diante dos conceitos apresentados, podemos entender o Direito do Trabalho como o ramo da ciência que visa o estudo dos institutos e pessoas que constituem uma relação empregatícia ou similar, assim entendidas as relações jurídicas que pressupõe a prestação de serviços mediante contraprestação.
2.3 Fontes do Direito do Trabalho
As fontes do Direito do Trabalho podem ser classificadas em dois grandes grupos, de acordo com o fenômeno que lhe originou, deste modo podemos dizer que uma fonte é material ou formal. As fontes materiais são aquelas que decorrem de acontecimentos sociais, econômicos, políticos, filosóficos e históricos que ensejam a criação de normas jurídicas.
De maneira brilhante o ilustre professor Renato Saraiva (2006, pág. 23) afirma que “a história do Direito relaciona as fontes materiais com o momento pré-jurídico inspirador da norma, em função dos fatores sociais, psicológicos, econômicos, históricos etc., que intervém no nascimento da norma jurídica.”[7]
As fontes formais são aquelas que guardam pertinência com o ordenamento jurídico propriamente dito, diz respeito a como o Direito se materializa, é a exteriorização da norma jurídica, neste sentido nos ensina Delgado (2011, pág. 139):
“Na pesquisa e conceituação das fontes formais, procura-se o fenômeno de exteriorização final das normas jurídicas, os mecanismos e modalidade mediante os quais o Direito transparece e se manifesta. Portanto, são fontes formais os meios de revelação e transparência da norma jurídica – os mecanismos exteriores e estilizados pelos quais as normas ingressam, instauram-se e cristalizam-se na ordem jurídica.”[8]
De maneira pacífica a doutrina mais abalizada tem admitido como fontes formais de Direito do Trabalho: A constituição; as leis; a sentença normativa; a jurisprudência; a sentença arbitral; as convenções e acordos coletivos; os usos e costumes; o regulamento de empresa; o contrato de trabalho e os princípios jurídicos.
Há autores que também consideram como fontes formais os tratados e convenções internacionais ratificados pela autoridade nacional competente, Delgado (2011, pág. 153) é um dos defensores desta vertente, senão vejamos:
“os tratados e convenções internacionais podem ser fonte formal do Direito interno aos Estados envolvidos. Assim, irão se englobar no conceito de fonte normativa heterônoma (lei, em sentido material ou sentido amplo), desde que o respectivo Estado soberano lhes confira ratificação ou adesão – requisitos institucionais derivados da noção de soberania. No Direito do Trabalho, as convenções da OIT, quando ratificadas pelo Estado brasileiro, têm se tornado importantes fontes formais justrabalhistas no país.”[9]
Os tratados são pacto firmado entre dois ou mais países ou entes internacionais e que tem por finalidade criar normas e obrigações entre os envolvidos e as convenções, por sua vez, são uma espécie de tratado editado por entidade internacional e a que os membros desta aderem de maneira voluntária.
Por guardarem estrita relação com o objeto deste trabalho é pertinente esclarecer acerca da definição de lei e de jurisprudência, duas fontes formais de bastante relevância em nosso ordenamento jurídico.
Delgado (2011, pág. 150) afirma que a lei, em sentido lato, “(…) constitui-se em toda regra de Direito geral, abstrata, impessoal, obrigatória, oriunda de autoridade competente e expressa em fórmula escrita (…)” [10]. Contudo, a nós interessa a definição de lei em sentido estrito, sendo de extrema precisão o conceito apresentado por Delgado (2011, pág. 150):
“Em acepção estrita (lei em sentido formal), é regra jurídica geral, abstrata, impessoal, obrigatória (ou conjunto de regras jurídicas: diploma legal) emanada Poder Legislativo, sancionada e promulgada pelo Chefe do Poder Executivo. É a lei em sentido material aprovada segundo o rito institucional específico fixado na Carta Magna.”[11]
O ilustríssimo professor Delgado (2011, pág. 166) define jurisprudência como “(…) a reiterada interpretação conferida pelos tribunais às normas jurídicas, a partir dos casos concretos colocados a seu exame jurisdicional. Trata-se da conduta normativa uniforme adotada pelos tribunais (…)”[12]
Os princípios também são considerados como fontes de Direito do Trabalho, e, no que tange a equiparação dos direitos trabalhistas dos domésticos são de especial relevância os Princípios da Proteção; da Isonomia; e, da Dignidade da Pessoa Humana.
O Princípio da Proteção, do qual se depreende que em função de sua condição o trabalhador deve receber maior amparo do Estado, devendo a lei (em sentido lato) ser aplicada sempre de forma que ofereça a melhor proteção ao trabalhador.
O Princípio da Isonomia, por sua vez, visando equalizar a desigualdade existente no plano socioeconômico, estabelece que em sede trabalhista, o direito deverá pender, preferencialmente, em favor do menos favorecido, entenda-se em prol do trabalhador, que constitui o elemento mais fraco na relação trabalhista, tratando as partes igualmente na proporção de suas necessidades. Decorre, também deste Princípio, que nenhum trabalhador pode ser discriminado em razão da sua raça, cor, religião, sexo, ou da atividade que exerça.
Por fim, o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana (do qual emanam os demais princípios), nos ensina que no exercício de sua atividade profissional o indivíduo não pode ter tolhida a sua honra, nem ser sujeitado a condições insalubres, constrangedoras ou que de qualquer outra forma constitua em prejuízo de sua saúde física, mental ou moral.
3 Referencial histórico do Direito do Trabalho no Brasil
3.1 Aspectos Históricos do Direito do Trabalho no Brasil
Durante um longo período da história de nosso País a nossa economia girou em torno do emprego de mão-de-obra escrava, poucos eram os trabalhadores livres que recebiam alguma contraprestação pelos serviços prestados. Competia aos escravos realizarem os trabalhos nos campos e também na residência de seus senhores.
Os escravos escolhidos para a lida doméstica eram tidos como privilegiados, pois, em tese, tinham o trabalho menos árduo, e gozavam da confiança dos patrões. Contudo, independentemente, do local em que o escravo trabalhasse sua sorte não mudava, pois ainda encontrava-se sujeito aos castigos físicos desumanos, a condições de habitação inferiores, e recebia como alimentação apenas os restos deixados pelos senhores.
Em 1824, com o advento da Constituição Imperial, a qual sofreu influência das idéias liberais, há uma modificação no cenário trabalhista brasileiro sendo abolidas as corporações de ofício, passando a existir o livre exercício de profissões, conforme lição de Garcia (2011, pág. 4).
Com a promulgação da Lei Áurea chega ao fim o período escravagista brasileiro. Neste momento ganha vulto o trabalho assalariado impulsionado pela chegada dos imigrantes europeus ao País. O advento da Lei Áurea é de tamanha relevância que Delgado (2011, pág. 105) chega a considerá-lo “(…) o marco inicial de referência da História do Direito do Trabalho brasileiro (…)”.[13]
No ano de 1981, através da edição de uma nova Constituição, há o reconhecimento a liberdade de associação[14]. Neste mesmo ano foram promulgadas algumas leis esparsas que regulamentavam o trabalho de menores de idade.[15]
Durante a Era Getúlio Vargas foram grandes os avanços na legislação trabalhista, primeiramente a Constituição de 1934 influenciada pelo Constitucionalismo Social, passou a ter em seu bojo regras eminentemente de cunho trabalhista.
Acerca de Constituição de 1934, Nascimento (2009, pág. 50) assevera que:
“Dentre os diferentes aspectos que caracterizam as Constituições do Brasil, destaquem-se, na de 1934, o pluralismo sindical, autorização para criação, na mesma base territorial, de mais de um sindicato da mesma categoria profissional ou econômica (…).”[16]
No que tange a Constituição de 1937, Garcia (2011, pág. 4) nos ensina que:
“A Constituição de 1937 expressa a intervenção do Estado, com características do sistema corporativista, tendo instituído o sindicato único, vinculado ao Estado, além de proibir a greve (vista como recurso antissocial e nocivo à economia).”[17]
Em 01 de Maio de 1939, foi erigido o Decreto-lei nº 1.237, o qual tinha como tema a Justiça do Trabalho, sendo pertinente a anotação de lavra de Delgado (2011, pág. 110):
“A Constituição de 1937 (não aplicada, é verdade), referindo-se a uma ‘Justiça do Trabalho’, induziria, alguns anos após, ao aperfeiçoamento do sistema, à medida que elevava seu patamar institucional. A Justiça do Trabalho seria, por fim, efetivamente regulamentada pelo Decreto-lei n. 1.237, de 1.5.1939.”[18]
Em 1943, surge o primeiro (e até aquele momento o único) trabalho significativo com ênfase a compilar e organizar as inúmeras legislações trabalhistas de modo inteligível e harmônico. A Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) teve a capacidade de conferir certa dinâmica ao direito trabalhista posto que esta obra não só uniu as diversas legislações justrabalhistas em um corpo material, foi além disso buscando aparar as efetivas ou aparentes discordâncias existentes entre as normas vigentes.
Delgado (2011, pág. 111) leciona que:
“O modelo justrabalhista então estruturado reuniu-se, anos após, em um único diploma normativo, a Consolidação das Leis do Trabalho (decreto-lei n. 5.452, de 1.5.1943). Embora o nome reverenciasse a obra legislativa anterior (consolidação), a CLT, na verdade, também alterou e ampliou a legislação trabalhista existente, assumindo, desse modo, a natureza própria a um código do trabalho.”[19]
A Constituição de 1946, implementou várias inovações, dentre elas destaca-se o fato de que finalmente a Justiça do Trabalho passa efetivamente a existir, sendo reconhecida como órgão integrante do Sistema Judiciário brasileiro. Sobre esta Constituição Nascimento (2009, pág. 51) afirma que:
“A de 1946 acolheu princípios liberais na ordem política, mas conservou, embora restabelecendo o direito de greve, as mesmas diretrizes, na medida em que não respaldou o direito coletivo do trabalho; destaque-se, na mesma Constituição, a transformação da Justiça do Trabalho, até então de natureza administrativa, em órgão do Poder Judiciário.”[20]
A Constituição de 1967, teve como seu grande destaque a introdução do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço, cuja criação se deu através da Lei nº 5.107/66.
Mas sem dúvida alguma, dentre as Constituições brasileiras, nenhuma foi tão abrangente e inovadora quanto a Constituição de 1988, a qual segundo Nascimento (2009, pág. 51):
“(…) valorizou o direito coletivo com a proibição da interferência do Poder Público na organização sindical, embora mantendo o sistema do sindicato único, iniciou, desse modo, uma tentativa de ampliação dos espaços do movimento sindical e enumerou uma série de direitos individuais dos trabalhadores (art. 7º).”[21]
3.2 O Empregado Doméstico no Direito Brasileiro
Durante muito tempo os trabalhadores domésticos não dispuseram de uma legislação própria que regulamenta a sua profissão. Talvez, a primeira legislação a açambarcar a relação jurídica entre o empregado doméstico e o seu patrão tenha sido o Código Civil de 1916, que não tratava do tema de maneira específica, mas, tão somente, fixava regras gerais acerca dos contratos de locação de serviços, o qual disciplinava o seguinte:
“Art. 1.216 – Toda espécie de serviços ou trabalho lícito, material ou imaterial, pode ser contratado mediante retribuição.”[22]
Em 30 de julho de 1923 houve a promulgação do Decreto n° 16.107, o qual passou a regulamentar de maneira específica os serviços dos domésticos, determinando quais seriam esses trabalhadores.
Posteriormente, adveio o Decreto-Lei n° 3.078 de 27/11/41, que tratou do empregado que laborasse em residências particulares mediante remuneração, resguardando a este trabalhador um aviso prévio de oito dias, depois de um período de prova de seis meses, também lhe conferiu o direito de rescisão do contrato em caso de atentado à sua honra ou integridade física, mora salarial ou falta de ambiente higiênico de alimentação e habitação, garantindo portanto melhores condições no ambiente de trabalho.
Atualmente o empregado doméstico é regido pela Lei 5.859/72, o conceito de empregado doméstico encontra-se estabelecido no art. 1º da Lei em comento, o qual dispõe o seguinte “ao empregado doméstico, assim considerado aquele que presta serviços de natureza contínua e de finalidade não lucrativa à pessoa ou à família, no âmbito residencial, destas (…).”
Acerca da definição de empregado doméstico Garcia (2011, pág. 106) diz:
“na realidade, pode-se entender que o empregado doméstico presta serviços, de natureza não econômica, à pessoa física ou à família, para o âmbito residencial destas. É doméstico não só o empregado que exerce funções internamente, na residência do empregador, como de limpeza, de faxina, de cozinhar, cuidando de crianças ou idosos, mas também o jardineiro, o vigia da casa, o motorista etc.”[23]
Os direitos trabalhistas conferidos aos trabalhadores domésticos encontram-se elencados no artigo 7º, parágrafo único, da Constituição Federal, in verbis:
“Art. 7º. (…)
Parágrafo único. São assegurados à categoria dos trabalhadores domésticos os direitos previstos nos incisos IV, VI, VIII, XV, XVII, XVIII, XIX, XXI e XXIV, bem como a sua integração à previdência social.”
A Constituição, embora reconheça direitos diversos aos demais trabalhadores (quer urbanos ou rurais), restringiu, severamente, os direitos a que fazem jus os empregados domésticos, lhes garantindo apenas salário mínimo nacional e seus reajustes periódicos; a irredutibilidade salarial, salvo convenção ou acordo coletivo em contrário; décimo terceiro salário; repouso semanal remunerado; gozo de férias anuais; licença maternidade por 120 (cento e vinte) dias; licença paternidade de 05 (cinco) dias; aviso prévio; e, aposentadoria.
No que tange ao art. 7º da Constituição Federal, Garcia (2011, pág. 107) faz uma explanação muito pertinente:
“Frise-se que o art. 7º, caput, da CF/1988, reconhece a possibilidade de outros direitos que visem à melhoria da condição do trabalhador, devendo o parágrafo único desse mesmo dispositivo ser interpretado neste contexto.”[24]
De fato, muitos dos direitos conferidos aos trabalhadores domésticos, somente lhes foram concedidos recentemente através de legislação ordinária, a exemplo da vedação de dispensa arbitrária ou sem justa causa da empregada gestante, direito que somente em 2006 foi estendido às domésticas, mediante a edição da Lei nº 11.324/06, que acrescentou o art. 4º-A a Lei nº 5.859/72.
Somente em 2006, os empregados domésticos passaram a ter direito a férias anuais de 30 dias, também por incremento legislativo da Lei nº 11.324/06, que alterou o art. 3º da Lei dos Empregados Domésticos, a qual anteriormente concedia a estes trabalhadores somente 20 (vinte) dias de férias.
Ao empregador doméstico é facultativa a inclusão de seu empregado no Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), sendo que tal previsão só passou a existir em nosso ordenamento jurídico em 2001, através do advento da Lei nº 10.208, que acrescentou à Lei nº 5.859/72 o art. 3º-A.
No que tange aos benefícios previdenciários os empregados domésticos fazem jus somente à aposentadoria por tempo de contribuição; aposentadoria por idade; aposentadoria por invalidez; e, auxílio doença.
Dentre os direitos não estendidos aos trabalhadores domésticos podemos citar o seguro-desemprego, remuneração diferenciada no período noturno, fixação da jornada de trabalho, salário-família e remuneração do serviço extraordinário, adicional por insalubridade ou periculosidade.
4 Direito Internacional do Trabalho
4.1 Aplicabilidade de Normas Internacionais
A relação existente entre o Direito Interno e o Direito Internacional é, sobremaneira, muito importante no que tange a normas Justrabalhistas, vez que muitas das normas que versam sobre as relações trabalhistas são produzidas no âmbito internacional e incorporadas no ordenamento jurídico interno.
Para que uma legislação internacional tenha aplicação no Brasil é necessário que obedeça o rito especificado na Constituição Federal, conforme ensinamento de Garcia (2011, pág. 48) a norma internacional para que tenha validade em nosso território necessita ser “celebrada, aprovada e ratificada, deve ser promulgada pelo Presidente da República, por meio de Decreto presidencial atestando a validade da norma jurídica”.[25]
Decorridos todos os trâmites supramencionadas a norma, segundo ensinamentos de Garcia (2011, pág. 48) “deve ser publicada no Diário Oficial da União, para receber a publicidade que se exige para a entrada em vigor” [26], somente então os preceitos da legislação internacional passam a ser aplicáveis e exigíveis em face dos cidadãos.
4.2 A hierarquia da norma internacional no ordenamento jurídico brasileiro
Acerca da relação estabelecida entre o Direito Interno e o Direito Internacional, existem duas vertentes teóricas que tentam explicá-la, os adeptos da Teoria Dualista assevera que o Direito Internacional e o Direito Interno são coexistem, mas de maneira completamente independente, enquanto os Monistas acreditam que não existem dois ordenamentos distintos, pelo contrário, o Direito Internacional e o Direito Interno são um mesmo ordenamento.
Nas palavras de Garcia (2011, pág. 45):
“– teoria dualista: em termos mais genéricos, defende que o Direito Internacional e o Direito interno compõem ordens jurídicas totalmente independentes, separadas e autônomas;
– teoria monista: o Direito Internacional e o Direito interno integram uma mesma unidade de ordem jurídica.”[27]
Hodiernamente a Teoria Monista é aceita de maneira majoritária, contudo, os doutrinadores divergem sobre a superioridade da norma internacional sobre a norma de Direito interno, há quem defenda que o Direito interno, em razão da soberania estatal, deve prevalecer sobre as regras de Direito Internacional; outros doutrinadores acreditam que em verdade a norma Internacional é superior a legislação interna.[28]
No ordenamento jurídico brasileiro a aplicação das normas internacionais pode possuir o patamar constitucional ou serem incorporadas como legislação ordinária (portanto, abaixo da Constituição), tudo dependerá do teor contido na legislação internacional.
A Constituição Federal, em seu artigo 5º e seus parágrafos, estabelece a forma como as normas internacionais serão incorporadas ao nosso ordenamento, senão vejamos:
“Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:(…)
§ 1º – As normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata.
§ 2º – Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte.
§ 3º Os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas constitucionais.
§ 4º O Brasil se submete à jurisdição de Tribunal Penal Internacional a cuja criação tenha manifestado adesão.”
No que tange a hierarquia atribuída aos tratados e convenções internacionais Garcia (2011, pág. 49) nos ensina que:
“(…) observam-se duas modalidades de tratados e convenções internacionais:
– normas internacionais sobre direitos humanos, hipótese em que, se forem aprovadas na forma do art. 5º, § 3º, da CF/88, serão equivalentes às emendas constitucionais (…);
– norma internacionais sobre temas distintos, hipótese em que após a aprovação, passam a figurar no ordenamento com a hierarquia equivalente às leis ordinárias.”[29]
4.3 A organização internacional do direito do trabalho
A Organização Internacional do Direito do Trabalho (OIT), foi criada após o fim da 1ª Guerra Mundial, mais precisamente em 1919, no intuito de promover ações que melhorassem as condições de trabalhadores visando, assim, reduzir os conflitos sociais.
A OIT é composta pelos mesmos países que integram a Organização das Nações Unidas. A instituição de subdivide em três órgãos principais: a Conferência ou Assembléia-Geral; o Conselho de Administração; e, a Repartição Internacional do Trabalho. Dentre estes órgãos da OIT, é de essencial relevância as funções exercidas pela Conferência, a qual possui como um de suas funções a elaboração de Convenções.
No que pertine às atividades desenvolvidas pela Conferência da OIT, Garcia (2011, pág. 51) assevera:
“A conferência é constituída pelos Estados-membros, com sessões pelo menos uma vez por ano, nas quais comparecem delegações compostas de membros do governo, representantes dos trabalhadores e dos empregadores. Sua tarefa é estabelecer as diretrizes fundamentais a serem observadas no âmbito da OIT, elaborando as Convenções e Recomendações.”[30]
Ressalte-se que as Convenções da OIT só passam a ter vigência no âmbito internacional um ano após o registro de duas ratificações pelos Estados-membros na Repartição Internacional do Trabalho, a qual tem como atribuições “documentar e divulgar suas atividades, publicando as Convenções e Recomendações”.[31]
5 Propostas de equiparação dos direitos dos empregados domésticos aos demais trabalhadores
5.1 Precedentes jurisprudenciais
A jurisprudência majoritária denega, incansavelmente, o reconhecimento de quaisquer direitos aos empregados domésticos que não se encontrem elencados na Lei nº 5.859/72, ou no parágrafo único da Constituição Federal, trata-se de um posicionamento estritamente legalista e que não se coaduna com os princípios informadores do Direito do Trabalho.
Contudo, tal posicionamento, ainda que de maneira incipiente e de forma paulatina, vem sofrendo alterações, e tem efetuado alguns avanços em favor do trabalhador doméstico, permitindo o reconhecimento de determinados direitos tais como a percepção de hora extra, neste sentido já se manifestou o Tribunal Regional do Trabalho (TRT) da 4ª Região, senão vejamos:
“EMENTA: TRABALHO SUPLEMENTAR REALIZADO POR EMPREGADO DOMÉSTICO. CONTROLE DE HORÁRIO. CARTÕES-PONTO. TRABALHO EM LIMITE SUPERIOR A 220 HORAS MENSAIS. O empregado doméstico contratado para trabalhar 220 horas mensais como emana dos documentos trazidos aos autos, sujeito a rígido controle de horários por meio de cartões-ponto, tem direito ao pagamento das horas trabalhadas além da carga horária mensal.”[32]
“EMENTA: EMPREGADO DOMÉSTICO. LABOR EM SOBREJORNADA. O fato de a empregada doméstica não ter direito a horas extras, assim entendido o pagamento da hora normal acrescida do adicional previsto em lei ou norma coletiva, não veda o direito à remuneração das horas laboradas além da carga legal. Não havendo estipulação em contrário, entende-se que a reclamante foi contratada para a jornada de oito horas e a carga mensal de 220 horas. Toda hora excedente corresponde a sobrejornada que confere o direito ao pagamento da hora normal.”[33]
Os precedentes acima citados têm utilizado de maneira analógica a disposição contida na Orientação Jurisprudencial nº 358 da SDI-1 do Tribunal Superior do Trabalho (TST), que possui o seguinte teor:
“OJ – SDI1 – n º. 358. SALÁRIO MÍNIMO E PISO SALARIAL PROPORCIONAL À JORNADA REDUZIDA. POSSIBILIDADE. DJ 14.03.2008.
Havendo contratação para cumprimento de jornada reduzida, inferior à previsão constitucional de oito horas diárias ou quarenta e quatro semanais, é lícito o pagamento do piso salarial ou do salário mínimo proporcional ao tempo trabalhado.”
Desta forma, por uma questão de Justiça Social, tem-se entendido que havendo a possibilidade de remuneração proporcional quando se tratar de jornada reduzida, mostra-se igualmente acertado remunerar a maior por trabalho que extrapole uma jornada razoável de trabalho, o que se mostra completamente em consonância com as normas de proteção aos Direitos Humanos, dos quais o Brasil é subscritor, a exemplo da Declaração Internacional dos Direitos Humanos.
O posicionamento adotado nos processos RO 0131000-82.2008.5.04.0010 e RO 0014200-59.2009.5.04.0131 representam uma verdadeira revolução, vez que buscando a promoção da Justiça Social os operadores do direito devem fundamentar seus atos não apenas no que dispõe a lei, mas também no que articulam os princípios adotados pelo ordenamento jurídico, tendo em vista que os princípios são uma síntese dos valores fundamentais adotados pela sociedade, da qual todos fazem parte.
5.2 Propostas legislativas nacionais
5.2.1 O Projeto de lei nº 1.626/1989
Dentre as propostas legislativas infraconstitucionais que visam à melhoria das condições trabalhistas merece menção o Projeto de Lei nº 1.626/1989 de autoria da deputada Benedita da Silva, que foi apresentado à Câmara dos Deputados em 07/03/1989.
O projeto legislativo em comento visava conceder aos trabalhadores domésticos, além dos direitos constitucionalmente garantidos (salário mínimo nacional e seus reajustes periódicos; a irredutibilidade salarial; décimo terceiro salário; repouso semanal remunerado; gozo de férias anuais; licença maternidade; licença paternidade; aviso prévio; e, aposentadoria), a remuneração por serviço extraordinário e noturno, seguro desemprego, fixação da jornada de trabalho e aplicação da CLT aos contratos trabalhistas domésticos.
Este projeto de lei previa, ainda, a ampliação dos direitos previdenciários conferidos ao empregado doméstico garantindo não só a aposentadoria por tempo de contribuição; aposentadoria por idade; aposentadoria por invalidez; e, auxílio doença, mas também, auxílio-acidente; abono natalidade; salário família; e, assistência médica, odontológica e farmacêutica extensiva aos dependentes.
Se com a Lei 5.859/72, os dependentes dos empregados domésticos, no âmbito previdenciário, só fazem jus a auxílio-reclusão e pensão, caso o Projeto de Lei nº 41/1991, os dependentes passariam a ter direito a pensão por morte; auxílio funeral; pensão; abono anual; e, auxílio-reclusão.
Aos empregadores domésticos seria assegurado o desconto no salário do empregado doméstico sobre as horas não trabalhadas; desconto sobre a moradia, se resguardados a salubridade e privacidade, alimentação e vestuário efetivamente fornecidos; e, recusa em aceitar familiares ou pessoas outras da relação do empregado no local de trabalho.
5.2.2 A Proposta de emenda constitucional (PEC) nº 478/2010
A PEC nº 478/2010, de autoria do Deputado Carlos Bezerra, traz em seu preâmbulo a seguinte redação:
“Revoga o parágrafo único do art. 7º da Constituição Federal, para estabelecer a igualdade de direitos trabalhistas entre os empregados domésticos e os demais trabalhadores urbanos e rurais.”
Do texto de justificação que acompanha a PEC podemos extrair uma frase que sintetiza de maneira bastante simples o motivo que ensejou a apresentação desta proposta legislativa “A limitação dos direitos dos empregados domésticos, permitida pelo já citado parágrafo único do art. 7º, é uma excrescência e deve ser extirpada.”[34]
5.3 A Convenção nº 189 da Organização internacional do trabalho (OIT)
Como já salientamos no ordenamento jurídico brasileiro a aplicação das normas internacionais pode possuir o patamar constitucional ou serem incorporadas como legislação ordinária (portanto, abaixo da Constituição), no caso da Convenção nº 189, por não versar sobre direitos humanos, será acrescida ao nosso ordenamento na qualidade de lei ordinária.
Para que uma legislação internacional tenha aplicação no Brasil é necessário que obedeça o rito especificado na Constituição Federal, no caso específico da Convenção da OIT, para que possa ser aplicada em território nacional, deverá ser analisada por comissão específica do Ministério do Trabalho que emitirá parecer à Presidência. Caos o parecer seja favorável, e haja anuência do Presidente, o documento será encaminhado para aprovação, por maioria simples, na Câmara e no Senado.
Frise-se que as Convenções da OIT só passam a ter vigência no âmbito internacional um ano após o registro de duas ratificações pelos Estados-membros na Repartição Internacional do Trabalho (órgão administrativo da OIT).
Ainda, no que pertine a incorporação da Convenção nº 189, há discussão acerca da necessidade de alteração constitucional, em virtude de possível conflito com o disposto no art. 7º, p.u., da Constituição Federal, o qual elenca os direitos dos empregados domésticos.
Aqueles que dispensam a modificação constitucional, fundamentam-se no art. 7º, caput, da Constituição, uma vez que este dispositivo reconhece a possibilidade de outros direitos que visem à melhoria da condição do trabalhador, cabendo ao operador do direito, interpretar o parágrafo único em conformidade com o disposto no caput do mencionado artigo.
De outro viés, os adeptos da alteração constitucional argumentam que em razão da diferenciação com que a Constituição trata a categoria dos empregados domésticos, para que haja a ratificação da Convenção nº 189 no Brasil se faz necessário a aprovação de uma Emenda Constitucional que revogue o parágrafo único.
Independentemente das discussões que permeiam a adoção da Convenção nº 189 pelo Brasil, fato é que, caso esta convenção venha a ser incorporada ao nosso ordenamento a condição do trabalhador doméstico sofrerá significativas alterações vez que a gama de direitos a que farão jus incluirá (além dos direitos que já possuem atualmente) a jornada de trabalho de 8 horas diárias e 44 horas semanais; o adicional de 50% e 20% para as horas extras e adicionais noturnos; descanso semanal de pelo menos 24 horas seguidas; direito à organização sindical, o FGTS deixará de ser facultativo, tornando-se obrigatório.
Além do mais a convenção em comento passará a garantir aqueles que residem no local de trabalho, aposentos condignos que lhes garantam privacidade, com ventilação e iluminação adequada; recebendo alimentação de boa qualidade e em quantidade satisfatória.
Saliente-se que em seu art. 19, a Convenção nº 189, dispõe que não afetará a aplicação de disposições mais favoráveis previstas em outras convenções internacionais e que sejam igualmente aplicáveis aos empregados domésticos.
Considerações finais
Durante muito tempo os empregados domésticos viveram à margem de qualquer tutela legal, sendo necessária muita luta para que alguns direitos lhes fossem conferidos e mesmo assim manteve-se ausente uma proteção ampla e eficaz a estes trabalhadores, contudo, hoje se busca reparar todo o erro cometido ao longo destas eras, a sociedade e seus dirigentes mostram o desejo de eliminar a discriminação legal que permeia a relação empregatícia doméstica.
Agora, mas do que nunca, o clamor social exige que os trabalhadores domésticos possuam os mesmos direitos que os demais empregados, almeja-se a extirpação de uma subespécie ou segunda categoria de trabalhadores, o Direito do Trabalho deve avançar e promover a equidade aludida pelo Princípio da Isonomia, tratando, de fato e de direito, igualmente todos os trabalhadores reconhecendo lhes os mesmos direitos independentemente do âmbito em que suas funções são exercidas.
O Direito não pode compactuar com o desrespeito e a desvalorização do trabalhador, perpetuando a discriminação e a marginalização legal em que vivem os empregados domésticos, posto que estes assim como qualquer outro trabalhador buscam apenas uma coisa exercer a sua atividade de maneira lícita e da forma mais digna possível.
Reconhecemos que a equiparação dos direitos dos empregados domésticos deve trazer consigo alguns pontos negativos, tais como o aumento de custo para manter um empregado doméstico, fato que possivelmente refletirá no aumento de demissões dessa categoria e diminuição da oferta para esse tipo de emprego o que poderia ocasionar o aumento do trabalho doméstico informal, exatamente o que se visa evitar.
Inobstante os possíveis reflexos negativos resultantes da equiparação, o Estado no intuito de proteger uma determinada parcela da população (empregador) não pode fazê-lo em detrimento dos direitos dos outros indivíduos (empregados), sob pena de semear e disseminar a injustiça, obstando a consecução da Justiça Social e desrespeitando os Princípios que instruem o Direito, e representam a norma acima da norma.
Ademais, em que pese os efeitos negativos, não podemos nos olvidar dos reflexos positivos advindos desta mudança, tais como a maior proteção ao trabalhador propiciando-lhe melhores condições de trabalho, valorizando o labor desenvolvido pelo empregado doméstico e pondo fim a discriminação e marginalização em que estes se encontram.
Embora, em um primeiro momento haja um revés na situação vivenciada pelos empregados, restringindo-lhes o mercado de trabalho, a equiparação dos direitos trabalhistas se mostra como a medida mais acertada em prol dos interesses não só dos empregados, mas, também dos empregadores domésticos que passaram a contar com pessoas realmente qualificadas para o exercício de uma função tão nobre que é zelar pelo bem-estar da família e do lar de outro indivíduo.
Advogada militante na Comarca de Aracruz/ES formada na Faculdade de Aracruz – FAACz antiga FACHA; pós-graduanda em Direito do Trabalho pela Universidade Paulista UNIP; defensora dativa atuante nos Juizados Especiai s da Fazenda Pública Municipal e Estadual; Cível; e Criminal da Comarca de Aracruz/ES
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