Resumo: Este artigo pretende analisar a legalidade de prática ordinária em instituições de ensino superior relacionadas à falta de informação aos seus alunos sobre os locais em que podem realizar o estágio obrigatório previstos em alguns cursos de graduação. A pesquisa aborda a relação jurídica existente, os direitos e deveres violados, bem como a responsabilização civil sob o prisma do dano moral coletivo.
Palavras-chave: instituições de ensino superior. Estágio obrigatório. Dano moral coletivo.
Abstract: This article intends to analyze the legality of ordinary practice in Higher Education Institutions related to the lack of information to the students about the places in which they can perform the obligatory internship foreseen in some undergraduate courses. Issues related to the existing legal relationship, the rights and duties violated, as well as civil liability under the prism of collective moral damage will be addressed.
Keywords: Higher Education Institutions. Obligatory internship foreseen. Collective moral damage.
Sumário: Introdução. 1. Da relação consumerista. 2. Dos deveres das instituições de ensino superior. 3. Da inversão do ônus da prova. 4. Do dano moral coletivo. Conclusão. Referências.
INTRODUÇÃO
Por meio do presente artigo pretende-se aclarar a prática antijurídica, que não raras vezes, são perpetradas por instituições de ensino superior no que tange à falta de informação aos seus alunos acerca dos locais em que podem realizar o estágio obrigatório previstos em alguns cursos de graduação.
Tal lesão viola interesses qualificados como coletivos Stricto Sensu, estes sendo integrantes do gênero direitos coletivos Lato Sensu, visto que são esses interesses transindividuais, de que são titulares consumidores determináveis pela relação jurídica base, qual seja, a contratação de uma instituição de ensino superior para a prestação de serviços educacionais, podendo, portanto, serem tutelados pelos legitimados coletivos adequados, tais como Ministério Público e, eventualmente, Associações regularmente constituída e com pertinência temática.
Serão abordados assuntos relacionados a relação existente, aos direitos e deveres violados, bem como sobre a responsabilização civil sob o prisma do dano moral coletivo.
1. DA RELAÇÃO CONSUMERISTA
É certo que na concepção do Código de Defesa do Consumidor, todas as pessoas (in casu alunos), que possuem relação contratual com prestadora de serviços educacionais, enquadram-se visivelmente no conceito de consumidor, trazido pelo art. 2º do Código de Defesa do Consumidor, posto que são pessoas que utilizam os serviços educacionais como destinatários finais, sendo que as instituições de ensino superior são fornecedoras, por serem pessoa jurídica de direito privado que desenvolvem atividades de prestação de serviços educacionais (CDC, art. 3º).
Ainda que sem maiores discussões, apenas para ilustração, traz-se a lume entendimento jurisprudencial acerca do caráter consumerista da prestação de serviços educacionais:
“PROCESSUAL CIVIL – AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS – RELAÇÃO DE CONSUMO ENTRE INSTITUIÇÃO DE ENSINO E ALUNO – APLICAÇÃO DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR – RESPONSABILIDADE OBJETIVA DAQUELA – DENUNCIAÇÃO DA LIDE À EMPRESA PRESTADORA DE SERVIÇOS – DESCABIMENTO – INTELIGÊNCIA DO ART. 88, DA LEI CONSUMERISTA – RECURSO DESPROVIDO. A denunciação da lide é descabida nas ações embasadas no Código de Defesa do Consumidor, por expressa disposição legal (art. 88, do CDC)". (TJ-SC – AI: 3513 SC 2005.000351-3, Relator: Marcus Tulio Sartorato, Data de Julgamento: 29/04/2005, Terceira Câmara de Direito.)
2 . DOS DEVERES DAS INSTITUIÇÕES DE ENSINO SUPERIOR
Conforme abordado, o presente artigo se destina fundamentalmente a discutir a disponibilização de vagas, por instituições de ensino superior, e de meios pelos quais seus alunos poderão fazer o estágio obrigatório, e que esta informação seja devida e oportunamente disponibilizada aos estudantes.
Num primeiro momento, observa-se a obrigação da empresa de fornecer meios aos alunos para que realizem a disciplina de estágio obrigatório.
Parece e, é óbvia, a razão pela qual não se deve admitir que a instituição de ensino superior se afaste da relação de estágio. Ora, se o estágio é obrigatório, ou seja, condição sine qua non para a conclusão do curso, e que a Instituição de Ensino Superior controla os tipos de estágio que são admitidos, não há como aceitar que o aluno fique inviabilizado de realizar o estágio e consequentemente concluir o curso porque a empresa não deixa claro quais os locais que preenchem seus requisitos e serão aceitos.
A lei 8.662/93, inclusive, traz a importância da Instituição de Ensino na definição do local de realização de estágio:
“Art. 14. Cabe às Unidades de Ensino credenciar e comunicar aos Conselhos Regionais de sua jurisdição os campos de estágio de seus alunos e designar os Assistentes Sociais responsáveis por sua supervisão.”
Esta norma, ainda, foi complementada por alguns Conselhos de Classe/Profissionais, como se extrai, a título de exemplo, da Resolução do Conselho Federal de Serviço Social, de nº 533, de 29 de setembro de 2008:
“Art. 1º. As Unidades de Ensino, por meio dos coordenadores de curso, coordenadores de estágio e/ou outro profissional de serviço social responsável nas respectivas instituições pela abertura de campo de estágio, obrigatório e não obrigatório, em conformidade com a exigência determinada pelo artigo 14 da Lei 8662/1993, terão prazo de 30 (trinta) dias, a partir do início de cada semestre letivo, para encaminhar aos Conselhos Regionais de Serviço Social de sua jurisdição, comunicação formal e escrita, indicando: I- Campos credenciados, bem como seus respectivos endereços e contatos; II- Nome e número de registro no CRESS dos profissionais responsáveis pela supervisão acadêmica e de campo; III- Nome do estagiário e semestre em que está matriculado.”
Ademais, várias são as obrigações das instituições de ensino superior para com o estágio, conforme o artigo 7º da lei de estágio, lei 11.788/08:
“Art. 7º – São obrigações das instituições de ensino, em relação aos estágios de seus educandos:
I – celebrar termo de compromisso com o educando ou com seu representante ou assistente legal, quando ele for absoluta ou relativamente incapaz, e com a parte concedente, indicando as condições de adequação do estágio à proposta pedagógica do curso, à etapa e modalidade da formação escolar do estudante e ao horário e calendário escolar;
II – avaliar as instalações da parte concedente do estágio e sua adequação à formação cultural e profissional do educando;
III – indicar professor orientador, da área a ser desenvolvida no estágio, como responsável pelo acompanhamento e avaliação das atividades do estagiário;
IV – exigir do educando a apresentação periódica, em prazo não superior a 6 (seis) meses, de relatório das atividades;
V – zelar pelo cumprimento do termo de compromisso, reorientando o estagiário para outro local em caso de descumprimento de suas normas;
VI – elaborar normas complementares e instrumentos de avaliação dos estágios de seus educandos;
VII – comunicar à parte concedente do estágio, no início do período letivo, as datas de realização de avaliações escolares ou acadêmicas.”
Assim, considerando a dimensão e a importância da Instituição de Ensino na definição dos locais de estágio, além da obrigação legal que a obriga a controlar e identificar os campos de estágio, faz-se imperioso que as instituições de ensino superior efetivamente propiciem aos alunos condições de realizar o estágio obrigatório, apresentando-os lista com locais que atenderiam a esta demanda.
Tal obrigação passa-se, inclusive, pelo dever de informação que paira sobre as instituições de ensino superior.
O dever de informar é princípio fundamental na Lei nº. 8.078, sendo inicialmente tratado nos incisos II e III do art. 6º, e, junto ao princípio da transparência estampado no caput do art. 4º, traz uma nova formatação aos produtos e serviços oferecidos no mercado.
Na sistemática implantada pela lei em comento, o fornecedor está obrigado a prestar todas as informações acerca do produto e do serviço de maneira clara e precisa, não se admitindo falhas ou omissões. A informação passou a ser componente necessário do produto e do serviço, que não podem ser oferecidos no mercado sem ela. Trata-se de um dever exigido mesmo antes do início de qualquer relação.
Lembrando o princípio da transparência, o mesmo se traduz na obrigação de o fornecedor dar ao consumidor a oportunidade de tomar conhecimento do conteúdo do contrato que está sendo apresentado.
Assim, da soma dos princípios, compostos de dois deveres — o da transparência e o da informação —, fica estabelecida a obrigação de o fornecedor dar cabal informação sobre seus produtos e serviços oferecidos e colocados no mercado, bem como das cláusulas contratuais por ele estipuladas.
No caso articulado, a ausência da informação quanto aos serviços educacionais que são fornecidos por instituições de ensino superior causa danos diretos aos seus consumidores/alunos.
Afinal, o dever de informação vai além do momento da negociação, visto que é obrigação do fornecedor não apenas oportunizar ao consumidor o conhecimento amplo de todas as características serviço contratado, mas também manter o consumidor ciente de toda e qualquer alteração ou inclusão no contrato, para que seja possível ter prévio acesso a todas as regras de cumprimento das obrigações impostas pelo fornecedor.
De fato, o local da realização do estágio obrigatório é definido por regras estabelecidas pelas próprias instituições de ensino superior. Ora, se estas definem tais critérios sem a participação de seus consumidores, que deixem tais exigências claras, informando aos consumidores a maneira de cumprir tais requisitos, assim como deve esclarecer quais os locais que serão aceitos com base nestas premissas.
3. DA INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA
Partindo do pressuposto que, in casu, estamos diante de uma relação de consumo, na qual o consumidor é usuário dos serviços educacionais prestados pelas instituições de ensino superior, o ônus da prova é distribuído ope legis, uma vez que o Código de Defesa do Consumidor busca fornecer ao consumidor meios que possibilitem a defesa de seus direitos em juízo.
Neste sentido, assevera o inciso VIII do Art. 6º da Lei Federal nº 8078/90:
"Art. 6º São direitos básicos do consumidor:(…)
VIII – a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiências;"
Não fosse o caso de situação prevista no Código de Defesa do Consumidor, estaríamos diante de um exemplo claro onde haveria a necessidade da distribuição dinâmica do ônus da prova, pois, embora via de regra o ônus de comprovar fato constitutivo de um direito cabe a quem o alega, restando a parte contrária demonstrar fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor, há casos em que deve o juiz atribuir o ônus da prova de modo diverso, nos termos dos §§ 1º e 2º do artigo 373 do Código de Processo Civil.
Destarte, insta ressaltar que as instituições de ensino superior são quem armazenam todas as informações referentes aos alunos, aos cursos, aos estágios e às regras destes. Logo, exigir que o consumidor comprove que pagou valores indevidos, ou quando ocorre nova abusividade e qual o valor desta abusividade não se mostra razoável, cabendo às instituições de ensino superior as informações necessárias.
4. DO DANO MORAL COLETIVO
Sem olvidar da possibilidade da indenização por dano individual (material e moral), a qual prescinde da atuação coletiva, o presente artigo visa demonstrar a importância da tutela coletiva, razão pela qual foca e se prende ao dano moral coletivo.
O artigo 5º, inciso X, da Constituição Federal assenta a reparabilidade do dano moral no nosso ordenamento jurídico. Corroborando com tal disposição máxima, o Código de Defesa do Consumidor, em seu artigo 6º, incisos VI e VII, acompanhou a Carta Superior, sem deixar dúvidas quanto à possibilidade de reparação do dano, seja este individual, coletivo ou difuso.
Concebe-se, atualmente, na sociedade de massa, que o sujeito passivo de ato ilícito também pode ser uma coletividade, quando atingidos um número significativo de pessoas e transcende-se, portanto, a questão individual.
No caso verberado, as pessoas a serem protegidas são todas aquelas que fazem, fizeram ou farão cursos de graduação que dependam de estágio obrigatório para sua conclusão.
É impossível calcular a quantidade de consumidores/alunos que já enfrentaram tal problemática e que já passaram por cursos e tiveram dificuldades com a disciplina de Estágio Obrigatório.
Não é incorreto deduzir, ainda, que alguns destes estudantes, em casos análogos, foram obrigados a pagar rematrícula e novas mensalidades, simplesmente para que pudessem fazer a disciplina de estágio obrigatório e concluir o curso, ainda que não a tenham feito somente por culpa das instituições de ensino superior.
Observe-se que é claro o enriquecimento ilícito das instituições de ensino superior em tais casos, porquanto recebem as mensalidades dos alunos semestralizados e, então, aferem lucro com novas mensalidades no semestre seguinte, visto que os alunos não conseguiram fazer a disciplina no semestre correto em razão da falta de orientação da sua instituição de ensino e/ou indisponibilidade das empresas.
Impõe-se, nessa esteira, a condenação das instituições de ensino superior ao pagamento de valor, a título de indenização por dano extrapatrimonial coletivo, também denominado dano moral coletivo, a ser revertido ao fundo criado pelo artigo 13 da Lei nº 7.347/85.
Necessário, sobre o assunto, fazer menção à proposital alteração aplicada ao caput do art. 1º da Lei nº 7.347/85, promovida em junho de 1994 pela Lei nº 8.884.
Originariamente, a sua redação era a seguinte: “Art. 1º Regem-se, pelas disposições desta lei, sem prejuízo da ação popular, as ações de responsabilidade por danos causados (…)”.
A Lei nº 8.884 estabeleceu nova redação: “Art. 1º. Regem-se, pelas disposições desta lei, sem prejuízo da ação popular, as ações de responsabilidade por danos morais e patrimoniais causados”.
Evidente, portanto, o propósito da nova redação: proteger, por meio de ação de responsabilidade, aspectos morais (não-patrimoniais) dos direitos coletivos e difusos. Na verdade, a alteração legal colimou explicitar que os danos ali referidos são os morais e patrimoniais.
Nessa senda, com base na expressa previsão legal, tanto a doutrina como a jurisprudência têm destacado a importância do dano moral coletivo na proteção dos direitos metaindividuais, sobressaltando seu caráter punitivo, o que, no direito americano, foi definido como “teoria do desestímulo”, através do qual se entende que, através da reparação do dano moral causado, criar-se-ia um desestímulo de novas agressões ao bem jurídico tutelado.
Xisto Tiago de Medeiros Neto ressalta bem a importância do dano moral coletivo na sociedade moderna:
“A ampliação dos danos passíveis de ressarcimento reflete-se destacadamente na abrangência da obrigação de reparar quaisquer lesões de índole extrapatrimonial, em especial as de natureza coletiva, aspecto que corresponde ao anseio justo, legítimo e necessário apresentado pela sociedade de nossos dias. Atualmente, tornaram-se necessárias e significativas para a ordem e a harmonia social a reação e a resposta do Direito em face de situações em que determinadas condutas vêm a configurar lesão a interesses: juridicamente protegidos, de caráter extrapatrimonial, titularizados por uma determinada coletividade. Ou seja, adquiriu expressivo relevo jurídico, no âmbito da responsabilidade civil, a reparação do dano moral coletivo (em sentido lato).” [1]
Importantíssimas as ponderações de Luiz Gustavo Grandinetti Castanho de Carvalho acerca do assunto: 1) mostra-se inconveniente a separação rígida entre interesse público-pena e interesse privado-reparação (ressarcimento ou reintegração); 2) quando se protege o interesse difuso, o que se está a proteger em última instância, é o interesse público; 3) tal interesse público pode ser pelo modo clássico de tutela dos interesses públicos, tipificando-se a conduta do agente causador do dano como crime e sancionando com uma pena criminal, mas pode ocorrer, por razões várias, que o ordenamento jurídico não tipifique tal conduta como crime, caso em que os instrumentos próprios para a proteção de interesses privados acabam assumindo nítida função substitutiva da sanção penal; 4) deve-se admitir uma certa fungibilidade entre as funções sancionatória e reparatória em matéria de interesses difusos lesionados; e 5) com essa conformação e preocupação, surge o recém denominado dano moral coletivo, o qual deixa a concepção individualista caracterizadora da responsabilidade civil para assumir uma outra mais socializada, preocupada com valores de uma determinada comunidade e não apenas com o valor da pessoa individualizada.[2]
O dano moral coletivo, para Carlos Alberto Bittar Filho, indica “injusta lesão da esfera moral de uma dada comunidade, ou seja, é a violação antijurídica de um determinado círculo de valores coletivos”. Em seguida, o autor esclarece que:
“Quando se fala em dano moral coletivo, está-se fazendo menção ao fato de que o patrimônio valorativo de uma certa comunidade (maior ou menor), idealmente considerado, foi agredido de maneira absolutamente injustificável do ponto de vista jurídico: quer isso dizer, em última instância, que se feriu a própria cultura, em seu aspecto imaterial. Tal como se dá na seara de dano moral individual, aqui também não há que se cogitar de prova da culpa, devendo-se responsabilizar o agente pelo simples fato da violação”.[3]
Quanto à finalidade da condenação por dano moral coletivo, Carlos Alberto Bittar Filho sustenta que se busca, por meio desta, reparação e punição do ente causador da lesão:
“[…] da técnica do valor de desestímulo, a fim de que se evitem novas violações aos valores coletivos, a exemplo do que se dá em tema de dano moral individual; em outras palavras, o montante da condenação deve ter dupla função: compensatória para a coletividade e punitiva para o ofensor; para tanto, há que se obedecer, na fixação do “quantum debeatur”, a determinados critérios de razoabilidade elencados pela doutrina (para o dano moral individual, mas perfeitamente aplicáveis ao coletivo), como, v.g., a gravidade da lesão, a situação econômica do agente e as circunstâncias do fato.”[4]
A condenação por dano moral coletivo, além de buscar o ressarcimento metaindividual, implica em sanção de natureza civil por ofensa a direitos coletivos ou difusos. A reparação por dano moral desse jaez se justifica como meio de dotar de eficácia a tutela dos interesses coletivos.
Importante ressaltar que muitos doutrinadores apresentam certa resistência em adotar a tese da função punitiva da responsabilidade civil. Todavia, mesmos estes, como é o caso de Fernando Noronha, em sede de violação a direitos metaindividuais, abrem uma exceção, indicando a função especial que assume a condenação por dano moral coletivo:
“Em especial quanto aos danos transindividuais […], com destaque para os resultantes de infrações ao meio ambiente, tem sido muito enfatizada a necessidade de punições 'exemplares', através da responsabilidade civil, como forma de coagir as pessoas, empresas e outras entidades a adotar todos os cuidados que sejam cogitáveis. para evitar a ocorrência de tais danos. A Lei da Ação Civil Pública (Lei nº 7.347/85) indiretamente veio estimular a imposição dessas punições através do instituto da responsabilidade civil, quando abriu a possibilidade de condenação em indenizações que revertem para fundos de defesa de direitos difusos […]”[5]
A função punitiva também é defendida por Maria Celina Bodin de Moraes:
“[…] de aceitar-se, ainda, um caráter punitivo na reparação de dano moral para situações potencialmente causadoras de lesões a um grande número de pessoas, como ocorre nos direitos difusos, tanto na relação de consumo quanto no Direito Ambiental. Aqui, a ratio será a função preventivo-precautória, que o caráter punitivo inegavelmente detém, em relação às dimensões do universo a ser protegido.”[6]
Como argumento adicional ao reconhecimento do caráter punitivo do dano extrapatrimonial coletivo, indique-se que o valor da condenação não vai para o demandante, sendo convertido em benefício da própria comunidade, destinando-se a fundo, conforme indicado no art. 13 da Lei nº 7.347/85.
Portanto, o dano moral coletivo constitui hipótese de condenação em dinheiro com função punitiva e reparadora, face à ofensa a direitos difusos e coletivos (em sentido estrito).
Assim, tem-se um instrumento que visa conferir eficácia à tutela de interesses coletivos, haja vista seu caráter não patrimonial. Na hipótese, como já destacado, há ofensa clara e direta aos direitos dos consumidores/estudantes, decorrente da impossibilidade criada pela instituição de ensino superior aos alunos para que realizem o estágio obrigatório na graduação correlata.
Por outro lado, conforme o que extensivamente exposto, é possível observar que, assim como o dano coletivo material, o dano moral coletivo implica em uma necessidade de reparação por instrumentos processuais novos. Se estes instrumentos não forem aplicados, o dano moral, coletivo não será reparado e a violação dos valores ideais da comunidade restará impune.
As dificuldades advindas da subjetividade dos parâmetros a serem fixados não devem constituir motivo para a inexistência do direito, em face desse fundamento. Por outro lado, a finalidade da reparação dos danos extrapatrimoniais não se assenta em fatores de reposição, senão de compensação.
Em face das tradicionais críticas quanto à valoração do prejuízo moral coletivo, cabe ao legitimado coletivo a ingrata tarefa de indicar valor que ‘repararia’ o dano causado à sociedade, e ao magistrado a ainda mais indigesta tarefa estimar o valor da reparação de ordem moral, ambos adotando os critérios de razoabilidade, proporcionalidade e, principalmente, o fato de desestímulo que a indenização por dano moral acarreta.
Ademais, deve o magistrado levar em consideração que a reparação do dano moral coletivo representa para a coletividade um reconhecimento pelo Direito de valores sociais essenciais.
CONCLUSÃO
Não se questiona o fato de as instituições de ensino superior não estarem obrigadas a realizar convênios e poderem exigir de seus alunos que façam o estágio em locais que atendam suas diretrizes, mas é inadmissível que as instituições de ensino superior obriguem os alunos a realizarem a disciplina de estágio obrigatório, mas não os apresentem quais são as opções de locais viáveis e em quantidade suficiente para todos os alunos.
É certo, ainda, que a própria lei propicia liberalidade às instituições de ensino superior em firmarem convênios para estágios obrigatórios, sendo, assim, dever destas fornecerem tantas vagas para estágio quantas bastem para que todos os alunos façam a disciplina de estágio obrigatório, informando-os previamente das opções, de forma a oportunizar a todos que concluam o curso no período correto.
Deflui-se, ante o acima alinhavado, que uma vez inobservada tal obrigação, as instituições de ensino superior violam o disposto no artigo 7º da Lei 11.788/08 e artigo 14 da Lei 8.662/3, sem olvidar, ainda, ante a natureza consumerista, da violação ao dever de informação e transparência dispostos no art. 4º e 6º, incisos II e III, do Código de Defesa do Consumidor.
Uma vez violada tal obrigação pelas instituições de ensino superior, abre-se aos legitimados coletivos a resolução por meio da judicialização da matéria ou, quiçá, pelos instrumentos de resolução extrajudiciais adequados, com fito de tutelar os consumidores/alunos, sendo cabível, além da obrigação de fazer decorrente da disponibilidade de tantas vagas quantas necessárias e a observância do dever de informação e transparência, a condenação em danos morais coletivos.
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