Resumo: O paradigma da pós-modernidade abalou a compreensão dos fenômenos sociais, como também dos valores morais, das práticas culturais e dos modos pelos quais se entendem conceitos e instituições. Este artigo tem como objetivo demonstrar que o Direito também se engaja em tais mudanças; essencialmente no ordenamento jurídico e sua função perante a sociedade; além de poder ser agente de transformações que possibilitem a aplicação da justiça, longe do monopólio formal da normogênese da modernidade. A compreensão destas transformações tem como porta de acesso, as teorias de Marx Weber, de representantes da Escola Frankfurtiana e do sociólogo Boaventura de Sousa Santos que se ocupam de um objeto de estudo que possui fortes traços de ligação com os aspectos e reflexos da dita pós-modernidade na vida social e no papel “turbulento” e “performático” do Direito.
Palavras-chave: Paradigma. Pós-modernidade. Direito. Escola Frankfurtiana. Boaventura de Sousa Santos.
Abstract: The paradigm of postmodernity shook the understanding of social phenomena, but also of moral values, cultural practices and the ways in which they understand concepts and institutions. This article aims to demonstrate that the law also engages in such changes, primarily in the legal system and its function in society, and can be an agent of transformations that allow the application of justice, away from formal standart monopoly of modernity. Understanding how these transformations have access door, the theories of Marx Weber, representatives of the School and the Frankfurt School sociologist Boaventura de Sousa Santos dealing with an object of study that has strong traces of connection with the aspects and consequences of said post modernity in social life and in the paper "turbulent" and "performative" law.
Keywords: Paradigm. Postmodernity. Law. School frankfurtian. Boaventura de Sousa Santos.
Sumário: 1 Introdução. 2 Desenvolvimento. 2.1 Pressupostos Teóricos. 3 Conclusão. Referências.
1 INTRODUÇÃO
A pós-modernidade nasce (e para alguns teóricos ela ainda não existe como novo paradigma) no processo de contestação das certezas metafísicas do pensamento moderno na segunda metade do século XX, quando uma onda de revisionismo e romantismo varreu o pensamento ocidental. Jean François Lyotard (1998) já pressupunha uma “condição pós-moderna” ocasionada pela superação nas “grandes narrativas”, cujas formas de legitimação provinham do saber e da ciência. Nesse contexto contemporâneo verifica-se a desmedida valorização do homo ecconomicus individualista e da reemergência de fanatismos disfarçados sob um manto de religiosidade. Há, portanto, uma desrazão do mundo atual; vive-se, segundo Lindgren Alves (1996), numa nova Idade Média. Nesta, “é evidente o retorno da religião, a reafirmação dos dogmas como vetores sociais importantes; o fortalecimento das máfias, gangues e milícias privadas”, com códigos próprios de conduta e de justiça, em contraposição ao enfraquecimento do poder do Estado; a crescente massa de excluídos e marginalizados; o recurso crescente ao esoterismo para a solução dos problemas individuais; o renovado surto de fanatismos e intolerância e a estratificação social como um dado natural e necessário, senão divino. A força capitalista concentra cada vez mais a riqueza, ainda que para isso, o sistema necessite gerar o “anti-sistema” dos excluídos. (Todos esses aspectos em paradoxo com a tendência de uma “nova racionalidade”). Ver que o mundo passou da realidade moderna da razão iluminista para o hedonismo desenfreado, também incita a percepção do grau de transformação desses fatores sobre o Direito, cuja função está intrinsecamente ligada à vida social.
O processo de acumulação de capital na forma do Mercantilismo retrata o início da Modernidade e o subseqüente marco do pensamento jurídico. O surgimento da indústria e do Estado nacional liberal fundaram a corrente positivista e o monopólio normativo tendendo ao poder estatal com ênfase às fontes formais (contrárias às espontâneas). Tratava-se de uma nova maneira de pensar o Direito sob o viés da razão e que, por conseguinte, trouxe o crescente ato de legislar sistematicamente.
Com a possível mudança de paradigma explicitada pelo desencadeamento histórico, científico, sociopolítico e econômico, emerge a pós-modernidade. Pensar numa atividade jurídica aplicada a essa contemporaneidade “encantada”, fadada às comparações com o modelo feudal de pré-secularização é pensar em desafios aparentemente utópicos. Entretanto, o surgimento de um direito crítico demonstra uma tendência pós-positivista que, de certa forma, acompanha a demanda social e seu anseio à justiça sem negar o momento histórico “conturbado”, porém político-reflexivo.
A justificativa se dá pela própria atividade pós-moderna de desconstrução da razão e da verdade, ou melhor, da reconstrução de uma nova racionalidade inserida no bojo de uma ciência prudente; dá-se espaço então, ao Direito como sonho, cujo caráter deôntico possui essência em desejo social e não em disciplina normativa. Há o resgate do pluralismo e o interesse voltado aos conflitos da sociedade; o direito se fortalece no pressuposto da incompletude dos enunciados normativos e define-se como prudência.
2 DESENVOLVIMENTO
Com o advento desse novo momento chamado pós-modernidade, a crise interna do Direito torna-se evidente à medida que sente dificuldade de responder às demandas sociais e de compreender a conseqüente descrença popular na justiça promovida pelo Estado. Estabeleceu-se uma espécie de dicotomia; de um lado, o uso “alternativo” do Direito “nega” a segurança jurídica pretendida pela codificação; e de outro, a elaboração positiva de ordenamentos refletem nas relações materiais, mas ao mesmo tempo, teriam de ser revistos continuamente, dada a dinâmica e os anseios sociais. Trata-se de uma crise que afetou a própria identidade do estudo jurídico, mas que também descortinou a realidade antes não vista. Realidade esta, que faz do Direito um desejo, uma construção e um ideal de transformação (longe de ser uma máquina de fazer justiça).
2.1 Pressupostos Teóricos
Weber (1996) acreditava na ligação estreita da modernidade com a secularização (desencantamento). Porém, a modernidade ruiu e com ela foi-se embora aquela "secularidade utilitária" responsável pelo retraimento do sagrado. Ele descobriu ser possível designar com propriedade o longo período de racionalização religiosa por que passou o mundo ocidental em virtude da hegemonia cultural alcançada por essa forma “ética” de religião desencantadora "deste mundo": o judeo-cristianismo. No Ocidente ocorreu também um desenvolvimento da racionalidade jurídica que trouxe o conceito (moderno) de ordem jurídico-legal formalmente legítima e legitimamente revisável. Vale ressaltar que o fato de a igreja cristã e as leis sagradas terem se tornado cada vez mais diferenciadas e separadas da jurisdição secular tornou esse processo de transformação extremamente crucial. Isso porque abriu o caminho para a imposição de leis emanadas legitimamente apenas da autoridade secular e, além disso, trouxe o desenvolvimento lógico do formalismo jurídico, em íntima afinidade com as "intrínsecas necessidades intelectuais" dos juristas teóricos. Não por acaso Weber salienta como traço essencial da racionalidade do direito moderno seu caráter sistemático, e isto em função de ser o direito moderno, particularmente, "um direito de juristas". Entretanto, ele consegue constatar um levantamento do véu, a abertura de mais um caos mesmo naquela aura quase da ordem do supra-sensível de que se revestiam os axiomas jurídicos do direito natural. A tese de “destino inevitável” está presente quase que na totalidade da herança weberiana.
Habermas (1983) (representação da segunda geração da Escola de Frankfurt) discorda profundamente do conceito weberiano de ponto final, completamente dominado pelo positivismo jurídico que representa a colonização pós-direito natural, da esfera jurídica pela racionalidade técnico-instrumental-formal, a racionalidade dos meios. Trata-se de ver o direito como meio e não como valor. Em sua teoria da ação comunicativa, ele a coloca como base da construção do Direito como discurso. Nesse âmbito, as normas morais e jurídicas resultam de consensos comunicacionais, possíveis nas condições exigidas pela teoria do discurso de onde surgirão os direitos fundamentais. Existe, portanto, uma “saída” para Habermas (1989) não prevista por Weber; a ação comunicativa possibilita a origem de um espaço público onde a liberdade seja viável e não exista a manipulação dos indivíduos para que todos, numa situação de fala, sejam iguais. A modernidade na concepção weberiana traça o destino não otimista da unidade natureza-relações sociais-ordem jurídica; no parecer habermasiano a divisão dos tipos de ação possibilitam (e não é utópico como parece ser) um discurso harmonioso pressupostamente criado pelo Giro lingüístico.
Ainda na primeira geração da Escola de Frankfurt, Theodor Adorno e Marx Horkheimer (1985) chamam a atenção com a obra: “Dialética do esclarecimento” (do iluminismo) e sua notável preocupação com o papel libertador da razão norteando os primeiros conceitos e fundamentações da modernidade.
Impossível não citar, dada a temática em questão, o sociólogo Boaventura de Sousa Santos (2000), essencialmente em uma de suas obras : “A crítica da razão indolente”. Nessa obra, o autor define os parâmetros da transição paradigmática através de uma crítica à modernidade ocidental cujo determinismo mecanicista é cada vez mais inviabilizado pelas inúmeras descobertas e teorias científicas dentro de áreas mais diversas.
Boaventura afirma que o paradigma emergente não pode ser apenas um paradigma científico, como ocorreu no século XVI, mas, sobretudo, um paradigma social mais preocupado com a qualidade de vida dos seres humanos. Dessa forma, o conhecimento contemporâneo que começa a se manifestar tende ao não-dualismo e à superação de distinções tais como a divisão sujeito/objeto e natureza/cultura. A distinção entre ciências naturais e ciências sociais, que vem imperando nos caminhos para a construção dos saberes, deixa de existir, uma vez que esta separação origina-se em uma concepção mecanicista da natureza, contrapondo os conceitos de indivíduo e sociedade. O sociólogo considera o conhecimento (geral e jurídico) moderno não como autoritário nem determinista, mas constituído através de uma pluralidade metodológica (oriunda da unicidade entre sujeito e conhecimento).
O novo paradigma considera que a sociedade necessita do senso comum, pois ele enriquece suas relações no mundo. É capaz de também produzir conhecimento, pois possui uma dimensão libertadora que pode ser ampliada através do diálogo com o conhecimento científico. Trata-se do surgimento de uma nova racionalidade paradoxalmente encontrada na “desrazão” contemporânea, incitada pelo senso comum a fim de destacar uma nova configuração para o saber. O grande objetivo de Boaventura é desenvolver epistemologias (A transmissão epistemológica ocorre entre o paradigma da ciência moderna: conhecimento-regulação e o paradigma emergente do conhecimento prudente para uma vida decente: conhecimento-emancipação) e teorias sociais que combatam a proliferação da razão cínica, que alimentem o inconformismo contra a injustiça e a opressão e, por fim, que permitam reinventar os caminhos da emancipação social.
Existem inúmeras considerações acerca do atual processo de revolução do pensamento. A pós-modernidade configura-se (ou ainda não como novo paradigma) na mudança de valores e na investigação político-filosófica responsáveis pela articulação das linhagens alternativas que nascem da própria tradição. Mesmo que a situação humana contemporânea caminhe a passos largos com o “empedernir da ordem”, o Direito tem a função de colocar-se como equilíbrio axiológico e não como agente de imposição sobre um mundo que sente dificuldade em resolver seus próprios conflitos. É simplista notar que dinamismo social requer dinamismo do Direito; de um lado, a sociedade dialética atual, interioriza seus maiores conflitos e busca alternativas aparentemente irracionais para dirimir as incertezas, de outro lado, o Direito define-se como desejo social, como reação à ação de “sonhar com a justiça”.
3 CONCLUSÃO
A proposta referente ao papel do Direito dentro das inúmeras transformações constituintes do novo paradigma transcende o factível positivismo. A filosofia pós-moderna requer a politização jurídica como proposta de reflexão em todos os âmbitos do saber. Contrariando-se uma sociedade que caminha para o individualismo e uma ordem ocidental que vive às benesses do sistema global, o Direito deve se colocar como aspiração social, como canal de transformação compatível com a realidade atual.
A justiça, que tem aparentado defasagem, deve ser construída com base no desejo social, promovendo uma discussão que seja plural (e pluralizante), democrática e responsável. Desta forma, verifica-se um aumento na eficácia e dinamização da ordem jurídica, bem como uma maior especulação zetética.
Dentro da idéia de que o Direito é uma dimensão inacabada, que está continuamente sendo construída, o papel do jurista se coloca além da “operação” convencional da lei, mas está em assumir-se como um jus-filósofo, capaz de compreender a necessidade dos conflitos e aspirações pós-modernas. Estas necessitam do direito com proposta de revalorização hermenêutica e axiológica a fim de solapar o endurecimento do pragmatismo na resolução de conflitos no globo.
Graduada em Direito pela Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia – UESB
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