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Grupo econômico antes e depois da reforma trabalhista

Nas relações de trabalho anteriores à reforma trabalhista é necessário haver hierarquia entre as empresas para a caracterização de grupo econômico

Em linhas gerais, quando se diz que empresas distintas, cada qual com personalidade jurídica própria, estão ligadas entre si sob uma determinada forma, elas constituem o chamado grupo econômico.

A caracterização do grupo econômico para efeitos trabalhistas, no entanto, tem gerado acirradas discussões, principalmente após a entrada em vigor da Lei 13.467/17, que ficou conhecida como reforma trabalhista.

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No campo do direito do trabalho a configuração de grupo econômico pode gerar a responsabilização de uma empresa por créditos trabalhistas de empregados de uma outra, desde que configurados alguns requisitos previstos em lei.

É possível, portanto, que em um processo trabalhista uma empresa seja condenada, mesmo sem ser a empregadora do postulante, a arcar com dívida trabalhista desta, caso caracterizada a formação do grupo.

Dessa forma, seria possível responsabilizar pela dívida trabalhista qualquer uma das empresas do grupo, podendo qualquer delas responder em individualmente pela totalidade do débito contraído pela empregadora.

Caracterizado o grupo econômico, a execução pode ser movida contra todas as empresas que formam o grupo ou em face de apenas uma delas, diretamente, por conta da chamada de responsabilidade solidária.

A definição de grupo econômico no direito do trabalho sofreu alteração após a entrada em vigor da reforma trabalhista, passando, a partir daí, a existir dois cenários, que volta e meia geram muita controvérsia no âmbito da justiça laboral.

Antes da reforma trabalhista, a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) previa a necessidade, para a configuração do grupo econômico, de haver uma relação de hierarquia de entre as empresas, devendo obrigatoriamente existir uma empresa principal exercendo direção, administração ou controle sobre as demais.

Era o que dispunha a antiga redação do parágrafo 2º do artigo 2º da CLT:

 

“Art. 2º – Considera-se empregador a empresa, individual ou coletiva, que, assumindo os riscos da atividade econômica, admite, assalaria e dirige a prestação pessoal de serviço.

 

  • 2º – Sempre que uma ou mais empresas, tendo, embora, cada uma delas, personalidade jurídica própria, estiverem sob a direção, controle ou administração de outra, constituindo grupo industrial, comercial ou de qualquer outra atividade econômica, serão, para os efeitos da relação de emprego, solidariamente responsáveis a empresa principal e cada uma das subordinadas.”

 

A nova lei, que entrou em vigor em novembro de 2017, altera a redação do parágrafo 2º e também inclui o parágrafo 3º, adicionando a possibilidade de configuração do grupo econômico mesmo quando cada uma das empresas tiverem sua autonomia, bastando que haja objetivo integrado, efetiva comunhão de interesses e atuação conjunta das empresas dele integrantes:

 

“§ 2º Sempre que uma ou mais empresas, tendo, embora, cada uma delas, personalidade jurídica própria, estiverem sob a direção, controle ou administração de outra, ou ainda quando, mesmo guardando cada uma sua autonomia, integrem grupo econômico, serão responsáveis solidariamente pelas obrigações decorrentes da relação de emprego.”

 

  • 3º Não caracteriza grupo econômico a mera identidade de sócios, sendo necessárias, para a configuração do grupo, a demonstração do interesse integrado, a efetiva comunhão de interesses e a atuação conjunta das empresas dele integrantes.”

 

Essa mudança legislativa, que admite a existência de grupo econômico por coordenação interempresarial, traça um contorno mais amplo da possibilidade de responsabilização da empresa não-empregadora.

A norma, porém, afasta expressamente a caracterização do grupo pela mera identidade de sócios.

A acepção da responsabilidade solidária de empresas ligadas entre si nem sempre foi uma questão muito clara nos tribunais trabalhistas. O próprio Tribunal Superior do Trabalho, antes  da entrada em vigor da reforma trabalhista, considerou, em vários julgados, que a mera demonstração nos autos de interferência de uma empresa na outra, com a administração comum, era suficiente para a caracterização do grupo econômico.

Essa jurisprudência foi mais tarde evoluindo ao longo do tempo, até que a posição do órgão de uniformização de entendimento entre as turmas do TST, a Subseção de Dissídios Individuais (SDI-I), ao analisar hipótese regida pela redação original do parágrafo 2º do artigo 2º da CLT, firmou-se no sentido de que não basta a simples comunhão de interesses ou administração conjunta para que seja configurado o grupo, sendo necessária a presença de relação hierárquica entre as empresas:

 

“RECURSO DE EMBARGOS EM RECURSO DE REVISTA. CONFIGURAÇÃO DE GRUPO ECONÔMICO. ART. 2º, § 2º, DA CLT. EXISTÊNCIA DE SÓCIOS EM COMUM. A interpretação do art. 2º, § 2º, da CLT conduz à conclusão de que, para a configuração de grupo econômico, não basta a mera situação de coordenação entre as empresas. É necessária entre elas, de efetivo controle de uma empresa sobre as outras. O simples fato de haver sócios em comum não implica por si só o reconhecimento do grupo econômico. No caso, não há elementos fáticos que comprovem a existência de hierarquia ou de laços de direção entre as reclamadas que autorize a responsabilidade solidária. Recurso de Embargos conhecido por divergência jurisprudencial e desprovido”. (TST-E-ED-RR- 0214940-39.2006.5.02.0472, relator: ministro Horácio Raymundo de Senna Pires, data de julgamento: 22/05/2014, Subseção I Especializada em Dissídios Individuais, data de publicação: DEJT 15/08/2014).

 

Existe até hoje, porém, certa resistência por parte dos que ainda defendem o contrário, questionando se até mesmo nas hipóteses em que restar inequívoca a mistura de patrimonial, os interesses comuns e a identidade societária entre as empresas demandadas, seria possível ser afastada a responsabilidade solidária por não configurado tipicamente o grupo econômico previsto na norma trabalhista original.

Essa é uma indagação que ainda causa rumores na comunidade jurídico-trabalhista, inclusive em algumas decisões judiciais, que entendem ser possível a aplicação da nova redação do artigo 2º da CLT às relações iniciadas ou já consolidadas antes da sua vigência.

Fato é que o TST, na sua missão precípua de uniformizar a jurisprudência nacional em matéria trabalhista, ao interpretar a norma jurídica, extraiu dela que a hierarquia é elemento imprescindível, em qualquer hipótese, para se caracterizar o grupo econômico nas relações havidas antes da entrada em vigor da nova redação do artigo 2º da CLT.

O diferencial, portanto, é saber se a relação jurídica que existiu entre as partes, objeto da demanda trabalhista, ocorreu antes ou depois da entrada em vigor da nova redação do artigo 2º da CLT.

Se inteiramente antes, não haverá caracterização de grupo econômico, caso não configurada a hierarquia entre a empresa principal e as subordinadas. Ficará isenta a empresa acionada na qualidade de devedora solidária se restar demonstrada apenas uma relação de coordenação entre elas.

Caso a relação de trabalho tenha ocorrido, em todo ou em parte, já na vigência da reforma trabalhista, a Justiça do Trabalho tem admitido a responsabilidade solidária na hipótese de existir apenas a comunhão de interesses e administração conjunta, não bastando, entretanto, a existência de sócios em comum.

 

 

Francisco de Assis Brito Vaz é sócio e coordenador do setor trabalhista da SiqueiraCastro em Brasília.

Graduou-se pela Universidade do Distrito Federal, em 2003. Especialista em Direito do Trabalho e Direito Processual do Trabalho pela UniAmerica, em 2021. Atuação por mais de 15 anos na advocacia contenciosa trabalhista-estratégica no Tribunal Superior do Trabalho, Supremo Tribunal Federal, tribunais regionais do trabalho e varas do trabalho. Membro da Comissão de Direito do Trabalho da Ordem dos Advogados do Brasil, Seccional do Distrito Federal. Membro da Comissão de Direito Sindical da Ordem dos Advogados do Brasil, Seccional do Distrito Federal. Membro da Comissão de Direito Digital, Tecnologias Disruptivas e Startups da Ordem dos Advogados do Brasil, Seccional do Distrito Federal. Coautor do Livro “Estratégias da Advocacia no TST” Leme-SP: Mizuno, 2022. Autor de diversos artigos jurídicos publicados na imprensa especializada sobre Direito do Trabalho e Direito Processual do Trabalho. Reconhecido pela Leaders League, edição 2021, como Leading no ranking de Contencioso Trabalhista de Volume (2021).

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