Resumo:O estudo tem por finalidade estudar a execução trabalhista e o artigo 475-J do CPC, procurando discutir as implicações de aplicação subsidiária deste artigo ao Processo do Trabalho. Desenvolve-se uma análise da execução no processo do trabalho, dos princípios que a norteiam, passando ao estudo mais minucioso do artigo em tela. Abordam-se também as várias correntes interpretativas referentes ao prazo, momento e natureza jurídica da multa de 10% contida no art. 475-J do CPC.O presente trabalho procura demonstrar também a efetividade da execução trabalhista e os problemas em se utilizar dos instrumentos jurídicos da recente reforma do CPC, mais especificamente do artigo em comento. Busca-se, por fim, demonstrar a incompatibilidade de aplicação do art. 475-J do CPC ao processo do trabalho, apresentando a posição esposada pelo Tribunal Superior do Trabalho sobre o tema.
Palavras-chave: Execução trabalhista. Multa do art. 475-J do CPC. Reforma do processo civil. Cumprimento da sentença.
Abstract:The study aims at studying and implementing labor article 475-J of the CPC, trying to discuss the implications of this article subsidiary application of Process Work. It develops an analysis of the implementation process of the work, the principles that guide, going to study more detailed article on the screen. It addresses also the various current interpretations regarding the duration, timing and nature of the legal penalty of 10% contained in article 475-J of the CPC.
This work also seeks to demonstrate the effectiveness of implementation and the labor problems in using the legal instruments of the recent reform of the CPC, more specifically comment on the article. The aim is to ultimately demonstrate the incompatibility of application of article 475-J of the CPC to work process, with the position espoused by the Superior Labor Court on the issue.
Keywords: Execution labor. Fine article 475-J of the CPC. Reform of civil procedure. Enforcement of the sentence.
Sumário: 1. Introdução. 2. Execução Trabalhista. 2.1.1. Princípio da Igualdade de Tratamento. 2.1.2. Princípio da Natureza Real da Execução. 2.1.3. Princípio da Limitação Expropriatória. 2.1.4. Princípio da Utilidade para o Credor. 2.1.5. Princípio da não prejudicialidade do devedor. 2.1.6. Princípio da especificidade. 2.1.7. Princípio da responsabilidade pelas despesas processuais. 2.1.8. Princípio do não aviltamento do devedor. 2.1.9. Princípio da livre disponibilidade do processo pelo credor. 2.2. A aplicação subsidiária do CPC à CLT. 3. O Estudo do artigo 475-J do CPC. 3.1. Quantia Certa. 3.2. Natureza Jurídica da multa do art. 475-J do CPC. 3.3. Prazo para pagamento da multa do art. 475-J do CPC. 3.4. Momento para o pagamento da multa do art. 475-J do CPC. 4. Impossibilidade da aplicação do artigo 475-J do CPC ao processo do trabalho. 5. Conclusão. Referências bibliográficas.
1. Introdução
As inovações trazidas pela Lei 11.232/2005 modificaram de forma substancial a execução no processo civil. Antes, havia a existência de dois processos distintos: um de conhecimento, que seria extinto por meio de sentença e o processo de execução, destinado a efetivar o conteúdo obrigacional da sentença.
Agora, com as modificações ocorridas, houve o desaparecimento do “processo de execução de título judicial” e o surgimento de uma “fase de cumprimento da sentença”, dentro do mesmo processo de conhecimento.
Assim, o juiz, mesmo depois de proferir a sentença, continuará a realizar os atos destinados a cumprir o determinado no processo cognitivo, independente da formação de novo processo. Este é o chamado sincretismo processual, pois num único processo são implementados atos cognitivos e executivos.
O art. 475-J do CPC surge também advindo desta transformação no processo de execução. Ele prevê uma multa de 10% para aquele que no prazo de 15 dias, não pagar voluntariamente, a importância de quantia devida em sentença.
O grande debate aflora, porque muitos juízes do trabalho em nome da celeridade e razoável duração do processo têm utilizado tal artigo subsidiariamente ao processo do trabalho, esquecendo-se que a CLT tem rito próprio para sua execução, conforme demonstra os artigos 779 e 889 da CLT.
É de se ter em mente que ainda que por via indireta – ou seja, quando a Lei 6.830/80 não se mostre suficiente ao tratamento da matéria – a incidência, na execução promovida no processo do trabalho, de disposições próprias ao processo civil não dispensa a observância dos requisitos exigidos do direito processual comum ao processo do trabalho. (FIOREZE, 2006, p. 67)
Portanto, a princípio, impossível o cabimento subsidiário do art. 475-J do CPC ao processo do trabalho. Ademais, frise-se que o Direito Material e Processual do Trabalho possui regras e princípios específicos que não podem ser violados, mesmo em nome da celeridade e dinamismo no cumprimento da sentença, sob pena de ferir vários outros princípios.
2. Execução trabalhista
Um dos capítulos do Processo do Trabalho que tem sido apontado como grande entrave ao acesso real e efetivo, à Justiça do Trabalho, pelo trabalhador é o da execução trabalhista. Mesmo a CLT prevendo um procedimento simplificado para a execução vem perdendo terreno para a inadimplência, contribuindo para a falta de credibilidade da jurisdição trabalhista. (CHAVES, 2006, p.215-225).
O processo trabalhista tem como previsão, a aplicação subsidiária do processo comum, presente nos artigos 769 e 889 da CLT. Existem dois requisitos para aplicação da norma processual civil: a omissão da CLT e a compatibilidade com os princípios que regem o processo laboral.
No caso da execução impõe-se ainda ordem na aplicação subsidiária: primeiro deve-se recorrer à lei de execuções fiscais, Lei nº 6.830/80, e só depois às disposições do CPC.
O Código de Processo Civil atualmente, está passando por reformas significativas, eliminando a burocracia na execução, visando atender aos princípios da simplicidade, celeridade e efetividade do procedimento (AROUCA, 2007, p. 545). As reformas instituíram o sincretismo processual, tornando o processo dinâmico, de modo que procedimentos cognitivos, executivos e acautelatórios coexistem e vão se encaixando ao longo do processo de acordo com a necessidade de efetivação da tutela jurisdicional requerida.
Começando pela Lei 8.952/94, foi instituída a execução das obrigações de fazer e não fazer, nos arts. 461 e 461-A, CPC, por meio de multas pecuniárias, garantindo ao magistrado poderes antes impensáveis para efetivação dos provimentos judiciais. As reformas foram se seguindo até culminar na Lei 11.232/05, que apresentou, dentre outras inovações, o cumprimento de sentença com aplicação da multa pecuniária do art. 475-J.
Estas reformas levaram a afirmar que o CPC reformado instituía uma nova lógica ao direito de ação que, no código original, consistia em um direito a um provimento judicial de mérito e agora consistiria em um direito fundamental à tutela jurisdicional adequada e efetiva.
Pressupõe verdadeiro empenho do juiz em dar ao jurisdicionado o bem da vida, postulado nas melhores condições possíveis e em tempo hábil, compreendendo-se quaisquer atos de natureza cognitiva, executiva ou cautelar, que garantam um processo de resultados.
Neste contexto, os magistrados trabalhistas de 1º grau, na maioria dos casos, acharam por bem empregar subsidiariamente o art. 475-J do CPC à CLT, visando dar mais efetividade, celeridade e dinamismo ao processo de execução trabalhista.
Todavia, esqueceu-se que a Consolidação já traz em si normas específicas que regulam o seu processo de execução, não tendo que se falar em aplicação subsidiária do CPC, principalmente do seu art. 475-J.
Ademais, tais inovações não podem ser aplicadas de qualquer forma ao Processo do Trabalho, mas devem se adequar e se estabelecer de forma a serem compatíveis com este ramo especial do Direito, qual seja, o Direito do Trabalho como um todo, englobando tanto o direito material quanto o direito processual.
2.1 Princípios da Execução Trabalhista
Executar tem como sentido realizar, cumprir, levar a efeito. No sentido jurídico, a palavra assume significado mais apurado, embora conservando a idéia básica de que, uma vez nascida, por ajuste entre particulares ou por imposição sentencial do órgão próprio do Estado, a obrigação deve ser cumprida, atingindo-se no último caso, concretamente, o comando da sentença que a reconheceu ou, no primeiro caso, o fim para o qual se criou (CHAVES, 2006).
Quando a sentença, não voluntariamente, for cumprida dá ensejo a outra atividade jurisdicional, destinada à satisfação da obrigação consagrada em um título. Essa atividade estatal de satisfazer a obrigação consagrada, num título que tem força executiva, não adimplida voluntariamente pelo credor, se denomina execução forçada.
Contudo, antes de adentrar nas particularidades da execução trabalhista, faz-se necessário sintetizar os princípios da execução trabalhista, abaixo relacionados.
2.1.1. Princípio da Igualdade de Tratamento das Partes
Esse princípio encontra fundamento no art. 5º, caput, da CF, que estabelece a igualdade formal de todos perante a lei. Para o processo do trabalho há naturalmente, uma desigualdade substancial que, via de regra, existe entre os sujeitos da lide, visto que o credor é o economicamente fraco da relação que necessita da satisfação de seus créditos. O devedor, por outro lado, é o economicamente forte. Trata-se, portanto, do princípio da igualdade substancial ou real que encontra respaldo no art. 3º, II e III da CF.
2.1.2. Princípio da Natureza Real da Execução
Antigamente, a execução era pessoal, ou seja, o devedor quando não pagava a dívida era submetido a sacrifícios que comprometiam a sua integridade física ou sua liberdade, sendo, às vezes, até previsto a pena de morte para o devedor reincidente.
Lembra Manoel Antônio Teixeira Filho que na Lei de XII Tábuas, “decorridos trinta dias da data do proferimento da sentença, facultava-se ao credor conduzir o devedor a juízo, valendo-se, se necessário, de medidas drásticas e violentas” (TEIXEIRA FILHO, 2004, p.52).
Quando o Estado avoca para si o monopólio da prestação jurisdicional, a execução se faz no patrimônio do devedor, que passa a ficar sujeito à constrição e à expropriação. A execução passa então a ser real e não mais pessoal. O artigo 591 do CPC corrobora com tal entendimento ao dispor “que o devedor responde, para o cumprimento de suas obrigações, com todos os seus bens presentes e futuros, salvo as restrições estabelecidas em lei.” (VADE MECUM, 2010, p.440).
Este princípio é reafirmado pelo artigo 646 do CPC, segundo o qual a execução por quantia certa tem por objetivo expropriar bens do devedor, a fim de satisfazer o direito do credor. (VADE MECUM, 2010, p. 439). A natureza real da execução também encontra fundamento no artigo 5º, LXVII da CF, que proíbe prisão por dívidas, salvo a do responsável pelo inadimplemento voluntário e inescusável de obrigação alimentícia.
2.1.3. Princípio da Limitação Expropriatória
Implica esclarecer que embora o devedor tenha de pagar sua dívida com patrimônio de todos os seus bens presentes e futuros, há limitação quanto a esta expropriação.
A limitação refere-se à quantidade e à qualidade dos bens que serão objetos de constrição e expropriação.
Assim, dispõe o artigo 659 do CPC que, se o devedor não pagar a dívida, o oficial de justiça penhorar-lhe-á apenas os bens suficientes ao pagamento da dívida e seus acessórios. Se outros bens existirem, não serão alcançados pela execução. (VADE MECUM, 2010, p. 442).
No mesmo sentido, o art. 692, parágrafo único do CPC, determina a suspensão da arrematação, logo que o produto da alienação dos bens bastar ao pagamento do credor (VADE MECUM, 2010, p. 446). Assim, tal princípio tem a finalidade de expropriar somente os bens que consigam pagar a dívida do credor.
2.1.4. Princípio da Utilidade para o Credor
Por tal princípio entende-se que a execução deve ser útil ao credor, evitando-se aqueles atos que possam comprometer tal utilidade. Encontra fundamento no artigo 659, parágrafos 2º e 3º do CPC e também no artigo 40, parágrafo 3º da Lei 6830/80.
2.1.5. Princípio da Não-Prejudicialidade do Devedor
Esse princípio é largamente utilizado pela doutrina e jurisprudência, tendo respaldo no artigo 620 do CPC, segundo o qual, “quando por vários meios o credor puder promover a execução, o juiz mandará que se faça pelo modo menos gravoso para o devedor” (VADE MECUM, 2010, p. 438).
Insta esclarecer que no processo do trabalho, o credor será o empregado que normalmente se vê em situação humilhante, vexatória, desempregado e passando por dificuldades financeiras. Este princípio, na verdade, foi elaborado pensando no processo civil em que as pessoas possuem relações civis de igualdade.
Assim, ocorrendo conflito entre princípio da não-prejudicialidade e o princípio da utilidade ao credor, o juiz trabalhista deve dar atenção e preferência para este último, haja vista que o devedor na Justiça Laboral, em tese, é a parte mais forte economicamente da relação processual.
Contudo, tendo em vista a ampliação da competência da Justiça do Trabalho, haverá casos em que o devedor poderá ser o empregador e o credor da União, no caso da ação de execução das multas da DRT, hoje chamadas de SRTE (Superintendências Regionais do Trabalho e Emprego). Neste caso, entende Carlos Henrique Bezerra Leite que “caberá ao juiz, no caso concreto, adotar a hermenêutica que seja mais condizente com a condição econômica e social do devedor.” (BEZERRA LEITE, 2008, p. 943).
2.1.6. Princípio da Especificidade
Este princípio está consagrado nos artigos 627 e 633 do CPC, que dizem respeito à execução das obrigações para entrega de coisa, de fazer ou não fazer, decorrentes do título judicial. Assim, o credor tem direito de receber, além de perdas e danos, o valor da coisa, quando esta não lhe for entregue, se deteriorou, não for encontrada ou não for reclamada do poder de terceiro adquirente.
Desse modo, não constando do título o valor da coisa, ou sendo impossível a sua avaliação, o exequente far-lhe-á a estimativa, sujeitando-se ao arbitramento judicial para apuração em liquidação, do valor da coisa e eventuais prejuízos. São exemplos deste princípio as hipóteses de retenção dos instrumentos de trabalho de propriedade do empregado pelo empregador.
Dispõe o art. 633 do CPC que:
“Se no prazo fixado, o devedor não satisfizer a obrigação, é lícito ao credor, nos próprios autos do processo, requerer que ela seja executada à custa do devedor, ou haver perdas e danos, caso em que ela se converte em indenização.”
No processo do trabalho, é comum a sentença que condena o empregador a reintegrar o empregado ao emprego. Caso o empregador não cumpra a sentença, deverá arcar com o pagamento de multas, geralmente por dia de atraso.
2.1.7 Princípio da Responsabilidade pelas Despesas Processuais
As despesas processuais no processo civil correm por conta do executado, mesmo no caso de remição da dívida (pagamento). Todavia, para o processo laboral, o artigo 769 da CLT prescreve que as custas no processo ou fase de execução serão pagas ao final, sempre a cargo do executado.
2.1.8. Princípio do Não-Aviltamento do Devedor
Este princípio está intimamente ligado ao princípio da dignidade da pessoa humana, consagrado no art. 1º, III, da CF. Dispõe também sobre a impenhorabilidade dos bens do devedor.
2.1.9. Princípio da Livre Disponibilidade do Processo pelo Credor
Este princípio na verdade é formado por outros subprincípios. Assim, ele trata da possibilidade da execução trabalhista seja iniciada pelo próprio juiz, de ofício, conforme informa art. 878 da CLT (VADE MECUM, 2010, p. 961), bem como refere-se à competência para execução e cumprimento da sentença, sendo, em princípio, feito pelos órgãos de primeiro grau.
Estes são, pois, alguns dos princípios aplicados também à execução trabalhista.
2.2. A Aplicação Subsidiária do CPC à CLT
Possui a CLT três artigos que tratam da aplicação subsidiária de outras normas. São eles, o artigo 8º, parágrafo único da CLT, que versa sobre a aplicação do Direito Comum quando há omissão na parte de direito material da CLT; o artigo 769 da CLT, que versa sobre a omissão da CLT quanto ao direito processual do trabalho e o artigo 889 da CLT que trata da omissão da CLT na execução.
Dispõe o artigo 769 da CLT que: “Nos casos omissos, o direito processual comum será fonte subsidiária do direito processual do trabalho, exceto naquilo em que for incompatível com as normas deste Título.”
Assim, esta é a regra em matéria processual. Isto porque nem tudo está regulado na CLT, por isso surge a necessidade deste artigo para ligar o direito processual do trabalho ao direito processual comum, evitando as omissões porventura existentes na CLT.
Para que tal artigo seja aplicado é necessário que haja: a omissão na CLT e a compatibilidade com as normas do Título X, que trata do Processo Judiciário Trabalhista.
Desse modo, primeiro deve existir a omissão, para depois ocorrer à compatibilidade. Esta última diz respeito às regras contidas nos artigos 763 a 910 da CLT, isto é, apenas aquelas regras do Título X da Consolidação das Leis Trabalhistas.
Portanto, como sugere Sérgio Pinto Martins:
“Parece que toda a questão no direito processual do trabalho é saber se existe omissão na CLT para se aplicar o CPC. O mais difícil é dizer quando existe omissão, pois há afirmações no sentido de que haveria omissão intencional do legislador e não se aplicaria o CPC, como quando se discutia a aplicação da reconvenção ao processo do trabalho”. (MARTINS, 2008, P.101).
Por outro lado, ensina o artigo 889 da CLT que:
“Art 889 CLT – Aos trâmites e incidentes do processo da execução são aplicáveis, naquilo em que não contravierem ao presente Título, os preceitos que regem o processo dos executivos fiscais para a cobrança judicial da dívida da Fazenda Pública Federal.” (VADE MECUM, 2010, p. 962).
Assim, as normas previstas na Lei 6.830/80 serão de aplicação subsidiária na execução trabalhista, na inexistência de norma específica da CLT.
O mencionado artigo não faz referência expressa à aplicação subsidiária de outra norma, mas é isso que vai ocorrer. Apenas dispõe que para que haja a aplicação de outras normas é preciso que elas não sejam contrárias aos princípios da CLT e ao que consta no Título X da CLT.
Portanto, a regra será a seguinte: primeiro usa-se as normas previstas na CLT ou lei trabalhista nela não inserida. Inexistindo disposição nestas, daí o intérprete se socorrerá da Lei 6830/80. Caso esta última também seja omissa e não resolva a questão, então, utilizar-se-á o CPC, conforme argumenta artigo 769 da CLT.
Todavia, deve-se esclarecer que quando a CLT dispuser que se aplica em primeiro lugar o CPC, essa será a regra, como se infere do artigo 882 da CLT, que manda utilizar o artigo 655 do CPC quanto à ordem preferencial de bens a serem penhorados. Este é o entendimento de Sérgio Pinto Martins. (2008, p. 101-102).
No entanto, há autores que entendem no sentido de ser observada a Lei 6.830/80 em detrimento do CPC, como ilustra Luciano Athayde Chaves:
“De outro lado, é bem verdade que as Varas do Trabalho, costumeiramente, têm aplicado o CPC como fonte primeira de preenchimento das lacunas na execução trabalhista, pela tradição na utilização do Código de Processo. Inclusive o próprio artigo 882, da CLT, determina a observância da ordem preferencial da penhora prevista no artigo 655, do CPC, quando, na verdade, há disposição expressa, sobre a ordem legal dos bens a serem penhorados, no art. 11 da Lei 6830/80.” (2008, p.34).
Nota-se, portanto, que ao analisar o artigo 882 da CLT (VADE MECUM, 2010, p. 961), doutrinadores divergem quanto à lei que deverá ser aplicada em primeiro lugar: o CPC ou a Lei 6.830/80.
Diante disso, é possível entender a enorme dificuldade dos magistrados e estudiosos do direito do trabalho em aplicar subsidiariamente as normas do CPC à CLT.
3. Estudo do Artigo 475-J do CPC
Dispõe o artigo 475-J do Código de Processo Civil:
“Caso o devedor, condenado ao pagamento de quantia certa ou já fixada em liquidação, não o efetue no prazo de quinze dias, o montante da condenação será acrescido de multa no percentual de dez por cento e, a requerimento do credor e observado o disposto no art. 614, inciso II, desta Lei, expedir-se-á mandado de penhora e avaliação. (Incluído pela Lei nº 11.232/05 – DOU de 23.12.05)
§ 1o Do auto de penhora e de avaliação será de imediato intimado o executado, na pessoa de seu advogado (arts. 236 e 237), ou, na falta deste, o seu representante legal, ou pessoalmente, por mandado ou pelo correio, podendo oferecer impugnação, querendo, no prazo de quinze dias. (Incluído pela Lei nº 11.232/05 – DOU de 23.12.05)
§ 2o Caso o oficial de justiça não possa proceder à avaliação, por depender de conhecimentos especializados, o juiz, de imediato, nomeará avaliador, assinando-lhe breve prazo para a entrega do laudo. (Incluído pela Lei nº 11.232/05 – DOU de 23.12.05)
§ 3o O exequente poderá, em seu requerimento, indicar desde logo os bens a serem penhorados. (Incluído pela Lei nº 11.232/05 – DOU de 23.12.05)
§ 4o Efetuado o pagamento parcial no prazo previsto no caput deste artigo, a multa de dez por cento incidirá sobre o restante. (Incluído pela Lei nº 11.232/05 – DOU de 23.12.05).
§ 5o Não sendo requerida a execução no prazo de seis meses, o juiz mandará arquivar os autos, sem prejuízo de seu desarquivamento a pedido da parte. (Incluído pela Lei nº 11.232/05 – DOU de 23.12.05”). (VADE MECUM, 2010, p. 423-424).
O artigo acima alterou de forma significativa a execução por título executivo judicial no Processo Civil, que antes era um processo autônomo em face do de conhecimento, tendo início com a petição inicial e terminando por sentença, para transformá-lo numa fase do processo, qual seja, a do cumprimento da sentença.
Desse modo, o CPC retornou ao chamado sincretismo processual ou procedimento sincrético, onde as fases de conhecimento e execução se fundem num único processo.
O que se buscou com tais alterações, sem dúvida nenhuma foi consagrar o objetivo de efetividade no plano processual, pois a partir do momento em que se reconhece a existência de um direito, necessária se faz a utilização de mecanismos que permitam a entrega deste, no plano exterior ao processo. Nesse sentido, pode-se citar entendimento de Cássio Scarpinella Bueno:
“Uma vez obtido o reconhecimento do direito indicado como ameaçado ou lesionado, e que, por isto mesmo, justifique a atuação do Estado-juiz (a prestação da tutela jurisdicional), seus resultados devem ser efetivos, isto é, fora do processo.” (BUENO, 2007, P. 146).
Para que se possa entender de forma clara e precisa, o que é a chamada “efetividade do processo”, é necessário consignar o entendimento do processualista José Carlos Barbosa Moreira:
“Para o prestigiado processualista, um processo jurisdicional efetivo deve apresentar as seguintes características: (a) deve dispor de instrumentos de tutela adequados na medida do possível, a todos os direitos (e outras posições jurídicas de vantagem) contemplados no ordenamento, quer resultem de expressa previsão normativa, quer se possam inferir no sistema; (b) estes instrumentos devem ser praticamente utilizáveis, ao menos em princípio, sejam quais forem os supostos titulares dos direitos (e das outras posições de vantagem) de cuja preservação ou reintegração se cogite, inclusive quando indeterminável o círculo dos eventuais sujeitos; (c) impende assegurar condições propícias à exata e completa reconstituição dos fatos relevantes, a fim de que o convencimento do julgador corresponda, tanto quanto puder, à realidade; (d) em toda extensão da possibilidade prática, o resultado do processo há que ser tal que assegure à parte vitoriosa, o gozo pleno da específica utilidade a que faz jus, segundo o ordenamento; (e) o atingimento de semelhantes resultados deve-se dar com o mínimo dispêndio de tempo e energias.” (MOREIRA, 2007, p. 197).
Pode se perceber que se colocado em prática o princípio da “efetividade da jurisdição”, uma vez que se pretende trazer resultados práticos para o plano exterior do processo, o legislador necessita criar meios para que se encontrem tais resultados, a fim de que se entregue de forma absoluta, a prestação jurisdicional. Neste sentido é que se promoveram as grandes alterações no Código de Processo Civil, como, por exemplo, a criação de um capítulo que trata da “etapa de cumprimento de sentença”, ou seja, foi acrescentado mais um capítulo (capítulo X- Do cumprimento de sentença) ao Título VIII do Livro I do Código de Processo Civil. Num desses novos artigos, encontra-se o art. 475-J do CPC. (VADE MECUM, 2010, p. 423-424).
Assim, com as alterações trazidas pela Lei 11.232/2005 ao CPC e a forte influência da busca pela efetividade no processo civil, fizeram com que magistrados da Justiça do Trabalho começassem a aplicar o artigo 475-J do CPC subsidiariamente à CLT, a fim de que a parte sucumbente no processo pague de forma mais célere a quantia a que fora condenada, não se perdendo mais tempo, ou seja, existe a necessidade de se acelerar o cumprimento da obrigação vinculada a uma decisão judicial.
3.1. Quantia certa
O primeiro aspecto do artigo 475-J do CPC é que ele só pode ser aplicado quando a condenação é de quantia certa ou já fixada em liquidação. Caso a sentença seja ilíquida não poderá ser aplicada a multa prevista no aludido artigo.
3.2 Natureza jurídica da multa do art. 475-J do CPC
A multa tem o objetivo de coagir o devedor a pagar o devido ao credor, e não deste se enriquecer a custa do devedor. Alguns doutrinadores (BUENO apud WAMBIER, 2006) entendem que a multa tem natureza coercitiva, ou seja, não representa penalidade em decorrência de conduta de má-fé processual do devedor. É sanção processual para cumprimento da sentença e tem caráter pedagógico, para que haja cumprimento voluntário da sentença.
Outra parte da doutrina sustenta que o caráter da multa é punitivo, pois a multa somente incidirá caso não haja o cumprimento voluntário da obrigação dentro do prazo legal. Dessa forma, o devedor seria apenado com a multa, que seria acrescida ao total do débito, posição essa sustentada por Fredie Didier (2007, p. 470) entre outros doutrinadores. Por essa linha de entendimento, a aplicação da multa se daria ope legis, antes mesmo do início da fase de cumprimento de sentença.
A partir da entrada em vigor da Lei 11.232/2005, a multa por descumprimento da sentença, que condena ao pagamento de quantia certa passa a ser mais um dos efeitos da decisão, sendo um efeito condicionado à verificação de um evento futuro e incerto, como o não cumprimento voluntário pelo devedor, o que não lhe retira, todavia, a natureza jurídica de punição. Assim entende Vitor Monteiro. (MONTEIRO apud BRUSCHI, 2006).
O acréscimo de uma multa de dez por cento sobre o valor da condenação, no prazo estabelecido pelo juiz, constitui mais uma tentativa de evitar que a execução se arraste por anos ou décadas; se bem que, mau pagador é, sempre, mau pagador, em juízo ou fora dele, com multa ou sem ela. Opinião esposada por Araken de Assis. (2006, p. 101).
3.3 Prazo para pagamento da multa do art. 475-J do CPC
O art. 475-J tem gerado algumas dúvidas quanto ao procedimento de aplicação. O prazo para pagamento no processo civil é de 15 dias, quando transposto para o processo do trabalho, surge dúvida se tal prazo se modificaria ou não.
Uma primeira corrente adota o prazo de 48 horas para pagamento, pois este é o prazo que a CLT traz no bojo do seu art. 880, visto que este seria mais célere que o prazo civilista de 15 dias. (SOUTO MAIOR, 2006, p. 922). Nesse sentido, também ensina Sérgio Pinto Martins: “não se aplica o prazo de 15 dias, pois não há omissão na CLT”. (2008, p. 107). A segunda corrente posiciona-se interpretando que o prazo de 15 dias tem tal extensão para coincidir com o prazo recursal da apelação. Portanto, transpondo-se a regra para o processo trabalhista, no qual o recurso ordinário tem prazo de oito dias, seria então este o prazo do executado para pagar o débito. (GENERH, 2008, p. 455).
A terceira posição tem como aplicável, o prazo de 15 dias aduzido no art. 475-J. Tal fato acontece, pois não há coincidência entre o prazo para cumprimento da sentença e o prazo para apelação. Isto ocorre porque seus termos iniciais podem ser completamente distintos, pois o prazo da apelação começa da intimação da publicação da sentença e o prazo para cumprimento, só correrá após líquida a mesma.
Também não se deve utilizar o prazo de 48 horas da CLT, visto que aí sim, o magistrado estaria por ferir o devido processo legal, pois não fez aplicação subsidiária e sim pinçou o que considerava melhor das normas do art. 475-J e do art. 880, CLT, criando terceira norma, da lavra do próprio magistrado. Na procura da norma mais favorável deve-se respeitar o caráter científico e sistemático do direito, utilizando o conjunto de regras que melhor se adapta considerando-se como um todo unitário. É o que reza a teoria do conglobamento. (DELGADO, 2007, p. 200).
Com extrema clareza ensina Luciano Athayde Chaves:
“Logo, é de se concluir que a opção pelo prazo estampado no dispositivo em estudo decorreu do exercício do poder político próprio do processo legislativo, e guarda proporcionalidade com os objetivos perseguidos, já que o lapso temporal concedido ao devedor é razoavelmente adequado para a satisfação da obrigação. Por tais razões, penso que o instituto em foco deve ser absorvido pelos intérpretes e aplicadores do Processo do Trabalho, acolhendo o mesmo prazo (15 dias) fixado no CPC”. (2006, p. 57).
3.4 Momento para o pagamento da multa do art. 475-J do CPC
Muito tem se discutido também qual o momento para pagamento de tal multa. Athos Gusmão Carneiro afirma que “a lei alerta para o tempus iudicati de quinze dias, concedido para que o devedor cumpra voluntariamente sua obrigação”. Para ele, o prazo passa automaticamente a fluir independentemente de qualquer intimação, na data em que a sentença ou acórdão é proferido ou se torna exequível, quer por haver transitado em julgado, quer por ter interposto recursos sem efeito suspensivo. (2007, p.54).
Esclarece que:
“O prazo transcorre a partir do momento em que a decisão jurisdicional reúne eficácia suficiente para autorizar a execução do julgado, mesmo quando a hipótese comportar ainda execução provisória. Não assiste razão, data vênia, àqueles que sustentam a necessidade de que o demandado seja pessoalmente intimado, para que fique em mora e comece a fluir o prazo dos 15 dias para o adimplemento da prestação determinada na sentença condenatória. Com a intimação da sentença o réu está ciente do prazo previsto em lei, para que cumpra a decisão e pague a quantia devida. Não o fazendo, estará inadimplente e sujeito à incidência da multa”. (2007, p. 57-58).
Araken de Assis afirma que o prazo começa a correr a partir do momento em que a sentença condenatória produz efeitos. Ele aduz que “o prazo flui da data em que a condenação se tornar exigível. É o que se extrai da locução condenado ao pagamento de quantia certa, ou já fixada em liquidação”. (2006, p. 212).
Fato é que não se pode aplicar a multa em execução provisória e nem antes do trânsito em julgado (CÂMARA, 2006, p. 116), ainda que o recurso seja recebido apenas no efeito devolutivo, pois a decisão pode ser mudada em grau de recurso. A pessoa não pode pagar um valor se a decisão não é definitiva.
Assim, embora o artigo 466 do CPC faça referência a trânsito em julgado e o art. 475-J do mesmo diploma legal não use essa expressão, a lógica se impõe que, somente com o trânsito em julgado é que a multa será aplicada, tanto que o art. 475-O do CPC exige caução para levantamento do depósito, mostrando que a decisão não é definitiva, tanto que é provisória. O devedor não pode ser obrigado a pagar o valor em execução que é provisória, justamente em razão de que ainda não transitou em julgado. Ademais, a execução deve ser feita de forma menos onerosa para o devedor, como ensina o artigo 620 do CPC.
Para outros, o prazo se inicia a partir da intimação na pessoa do advogado. (NERY JUNIOR, 2007, p. 6410)
Logo, no processo civil, o prazo de 15 dias deve se iniciar a partir do momento em que a parte é intimada para cumprir a sentença ou acórdão, desde que a sentença seja líquida.
Em relação ao processo do trabalho, para aqueles que entendem que cabe aplicação da multa do at. 475-J do CPC ao processo do trabalho (MARTINS, 2008, p. 112), o momento de aplicação desta será depois da citação, na execução para pagar em 48 horas, caso o devedor não pague a dívida.
No processo do trabalho há a necessidade de o devedor ser citado para o pagamento da dívida em 48 horas, como informa o artigo 880 da CLT. Não basta, portanto, ter sido feita a liquidação da obrigação contida na sentença. Outros entendem que deve ser desnecessária intimação específica e muito menos citação, em decorrência do cumprimento de sentença ser mera fase processual, que já foi constituída pela citação no início da fase cognitiva. Opinião esposada por Luciano Athayde Chaves.
Esclarece o autor:
“Ora, não faz sentido algum se manter o intérprete fiel ao disposto no art. 880 da CLT, enquanto o processo comum dispõe, agora, de uma estrutura que superou a exigência de nova citação para que se faça cumprir as decisões judiciais, expressando, assim, maior sintonia com as idéias de celeridade, economia e efetividade processuais. É a hipótese mais do que evidente de lacuna ontológica do microssistema processual trabalhista”. (2006, p. 54).
4. Impossibilidade de aplicação do art. 475-J do CPC ao processo do trabalho
Um dos defensores da não aplicação do artigo 475-J do CPC ao processo do trabalho é o professor Estevão Mallet. Ele entende que:
“A previsão de ônus adicional de 10 % no caso de inadimplemento da condenação no pagamento de quantia certa, na forma do art. 457-J, do Código de Processo Civil, busca tornar menos interessante, do ponto de vista econômico a mora do devedor. Afinal, caso se execute, pouco mais ou menos, o mesmo valor que deveria ser pago voluntariamente, é desprezível a vantagem decorrente do pronto cumprimento do julgado. O artigo 880, caput, Consolidação das Leis do Trabalho, não se refere, porém, a nenhum acréscimo para a hipótese de não satisfação do crédito exequendo, o que leva a afastar-se a aplicação subsidiária, in malam partem, da regra do artigo 475-J do Código de Processo Civil; tanto mais diante de seu caráter sancionatório. Solução diversa, ainda que desejável, do ponto de vista teórico, depende de reforma legislativa”. (2006, p. 197-205).
No mesmo sentido, leciona o professor da Faculdade de Direito de São Paulo, Jorge Pinheiro Castelo, que assim se posiciona:
“No processo do trabalho é questão controvertida tendo em vista o disposto nos artigos 880 e 882 da CLT, que determinam que o devedor seja citado, para que, em 48 horas, pague ou garanta a execução, mediante nomeação de bens à penhora na ordem do art. 655 do CPC.
Ocorre que os artigos 880 e 882 da Consolidação foram fixados sob a ótica de dois processos distintos, o processo de conhecimento findo e o processo de execução, iniciado com nova citação do devedor para a execução autônoma ex intervalo, tanto é que se exigia a citação do devedor para cumprir a obrigação voluntariamente, ou para se opor à execução.
Entretanto, a aplicação de penalidade (multa de 10%) deve estar disciplinada no procedimento legal como garantia do Estado Democrático contra o arbítrio que poderia ocorrer sobre aquele que se encontra no estado de sujeição.
No caso do processo do trabalho não se trata de omissão, mas de falta de previsão específica para esse acréscimo de poder ao Juiz.
O aumento de poder na atividade jurisdicional não se trata de questão acessória ou de regra menor e meramente instrumental de procedimento, mas que impacta na configuração do processo democrático ou na geração do processo autoritário.
Trata-se de questão metodológica e técnica, da qual depende a coerência no tratamento dos institutos processuais e a solução dos diversos problemas processuais. A indefinição com relação à diretriz básica do sistema jurídico produziria inevitáveis contrastes lógicos, que comprometeriam a compreensão do sistema processual do trabalho de modo científico.
Daí, a aplicação da multa de 10% para o processo do trabalho encontra óbice no fato de que a penalidade, por envolver aumento de poder, depende sempre de previsão legal específica, que no caso, não existe na disciplina própria da execução trabalhista para a qual a conseqüência do não-pagamento é, apenas, a execução forçada com a constrição legal”. (2008, p. 95-96).
Manifesta-se também contrário à aplicação do art. 475-J do CPC à Consolidação, o juiz aposentado do Tribunal Regional do Trabalho da 9ª. Região, o jurista Manoel Antônio Teixeira Filho, que assim entende:
“È conveniente advertir que leis de processo civil não revogam leis do processo do trabalho; e vice-versa. Sob este aspecto, pode-se cogitar não só de autonomia, mas de “soberania” dos sistemas próprios de cada um.
Quanto à multa de 10%, julgamos ser também inaplicável ao processo do trabalho. Ocorre que esta penalidade pecuniária está intimamente ligada ao sistema instituído pelo art. 475-J, consistente em deslocar o procedimento da execução para o processo de conhecimento. Como este dispositivo do CPC não incide no processo do trabalho, em virtude de a execução trabalhista ser regida por normas (sistema) próprias (art. 786 e 892), inaplicável será a multa, nele prevista.” (2006, p. 287).
As principais mudanças da recente reforma do Código de Processo Civil estão no regime de cumprimento de sentença. Todavia, embora simplifiquem e acelerem o caminho destinado à satisfação do direito, essas inovações não se aplicam integralmente ao processo do trabalho. De acordo com regime o da CLT, o devedor continua com o direito à nomeação de bens, o que não mais existe no regime do CPC.
Os embargos à execução sempre suspendem o cumprimento da sentença, visto que o regime da CLT não permite que a execução importe a liberação do depósito ou atos de alienação da propriedade, antes do julgamento definitivo pela Justiça do Trabalho, exceção feita ao depósito recursal, que pode ser liberado com o trânsito em julgado da condenação, conforme art. 899, par. 1º da CLT (VADE MECUM, 2010, p. 962). Quanto à multa do art. 475-J do CPC, ela não se aplica ao processo do trabalho porque a CLT tem em seu artigo 882, disposição específica sobre os efeitos do descumprimento da ordem de pagamento (VADE MECUM, 2010, p. 961).
Cumpre esclarecer que, a execução trabalhista com seus institutos próprios é, e continua sendo, muito mais rigorosa do que a processual comum. Exemplo disso é o depósito recursal prévio que não existe na execução de sentença cível. Ademais, há o sistema BACEN-JUD que é um programa de computador que comunica o Poder Judiciário ao Banco Central, facilitando a pesquisa e bloqueio de numerário depositado em contas bancárias de executados. Ele teve origem no processo comum, mas foi amplamente utilizado na Justiça Laboral. Assim, torna-se difícil para o executado que mantém numerário suficiente no banco procrastinar a execução.
Dessa forma, no Direito do Trabalho como um todo (estendendo-se então ao processo do trabalho) vigem princípios e regramentos próprios, os quais têm por finalidade a proteção do trabalhador na condição de hipossuficiente.
Aqueles que defendem a aplicação do artigo 475-J do CPC para pagamento dos créditos trabalhistas usam como argumentos, a necessidade de um processo mais ágil com resultados céleres, a busca da efetividade da decisão judicial ante o advento do princípio constitucional da duração razoável do processo, insculpido no art. 5º, LXXVIII, CF, introduzido pela Emenda Constitucional 45/2004, a natureza eminentemente alimentar do crédito trabalhista e a lacuna de efetividade contida na CLT.
Apóiam-se também nos Enunciados 66 e 71 da 1ª Jornada de Direito Material e Processual na Justiça do Trabalho, ocorrida em novembro de 2007, na sede do TST. Estes Enunciados dispõem:
“66. APLICAÇÃO SUBSIDIÁRIA DE NORMAS DO PROCESSO COMUM AO PROCESSO DO TRABALHISTA. OMISSÕES ONTOLÓGICAS E AXIOLÓGICAS. ADMISSIBILIDADE. Diante do atual estágio de desenvolvimento do processo comum e da necessidade de se conferir aplicabilidade à garantia constitucional da duração razoável do processo, os arts. 769 e 889 da CLT comportam interpretações conforme a Constituição Federal, permitindo a aplicação de normas processuais mais adequadas à efetivação do direito. Aplicação dos princípios da instrumentalidade, efetividade e não-retrocesso social.
71. ART. 475-J DO CPC. APLICAÇÃO NO PROCESSO DO TRABALHO. A aplicação subsidiária do art. 475-J do CPC atende às garantias constitucionais da razoável duração do processo, efetividade e celeridade, tendo, portanto, pleno cabimento na execução trabalhista.”
Todavia, tais argumentos não se sustentam. Isto porque do ponto de vista jurídico, a sistemática processual contida na CLT não autoriza o juiz a pinçar artigos de lei, de sua conveniência, para teoricamente impulsionar de forma mais rápida o desfecho processual almejado pelo credor. O Estatuto Laboral é claro e cristalino, quanto à forma de se proceder na execução de valores deferidos por decisão judicial, a teor dos artigos 769, 880 e seguintes da CLT.
Dentro deste contexto, não se justifica a adoção de penalidade do artigo 475-J do CPC ante a sua absoluta incompatibilidade com o sistema processual celetista, ainda que na prática, mormente, na primeira instância, muitos juízes venham adotando-a e, em muitos casos, sem o trânsito em julgado da decisão, em verdadeira tentativa de constranger o devedor, violando frontalmente os princípios do devido processo legal e da realização da execução pelo meio menos gravoso, como se não houvesse lei, assumindo uma atitude arbitrária.
4.1 Posição do Tribunal Superior do Trabalho
A mais alta Corte Trabalhista do país por meio de suas 3ª e 6ª Turmas, já se manifestou contrariamente à aplicação do artigo 475-J no âmbito do processo laboral, uma vez que a CLT possui regras claras e próprias a respeito da execução, destarte não permitindo as ilações que muitos juízes vêm fazendo para justificar a imposição da multa de 10%.
As decisões dispõem assim:
“RECURSO DE REVISTA. EXECUÇÃO. INAPLICABILIDADE DO ARTIGO 475-J DO CPC AO PROCESSO DO TRABALHO.
1. Segundo a unânime doutrina e jurisprudência são dois os requisitos para a aplicação da norma processual comum ao Processo do Trabalho: i) ausência de disposição na CLT a exigir o esforço de integração da norma pelo intérprete; ii) compatibilidade da norma supletiva com os princípios do processo do trabalho.
2. A ausência não se confunde com a diversidade de tratamento: enquanto na primeira não é identificável qualquer efeito jurídico a certo fato a autorizar a integração do direito pela norma supletiva na segunda se verifica que um mesmo fato gera distintos efeitos jurídicos, independentemente da extensão conferida à eficácia.
3. O fato juridicizado pelo artigo 475-J do CPC não-pagamento espontâneo da quantia certa advinda de condenação judicial possui disciplina própria no âmbito do Processo do Trabalho (art. 883 da CLT), não havendo falar em aplicação da norma processual comum ao Processo do Trabalho.
4. A fixação de penalidade não pertinente ao Processo do Trabalho importa em ofensa ao princípio do devido processo legal, nos termos do artigo 5º, inciso LIV, da Constituição da República. (Acórdão, Processo n. TST-RR-765/2003-008-13-41.8, 3ª. Turma. Relatora: Maria Cristina Peduzzi, Recorrente: Companhia Energética da Borborema – CELB, Recorridos: Antônio Silva Vicente e Campina Prest Service Ltda. – publicado DJ 22/02/2008).
Diante disso, entende-se que a razão está com o TST, uma vez que o Estatuto Obreiro não é omisso, no tocante aos meios a serem empregados pelo executado, na busca da satisfação de seu crédito e, desta forma, não se mostra razoável, apenas retirar um artigo do CPC para aplicá-lo ao sistema celetista, sob pena de violação dos mais elementares princípios constitucionais, como a garantia do devido processo legal e o respeito à própria essência do Estado Democrático de Direito.
5. Conclusão
O presente estudo teve como objeto principal trazer as implicações de aplicação do artigo 475-J do CPC ao processo do trabalho. Não restam dúvidas de que o legislador buscando dar efetividade a prestação jurisdicional, lançou meios de forçar o devedor a cumprir com o pagamento da quantia a que fora condenado. Ocorre que, estes meios não podem sobrepor aos princípios e regras específicas do Direito do Trabalho, uma vez que estes têm o condão de acabar com as desigualdades existentes entre trabalhadores e empregadores, principalmente no tocante ao aspecto econômico.
Desta forma, não existe sentido algum aplicar uma norma que venha a onerar ainda mais o empregado, quando este estiver submetido a uma execução para pagamento de dívida de quantia certa.
Anteriormente, o processo do trabalho inspirou as novas disposições do CPC de 1973, como da audiência una, perito único, citação postal. Todavia, hoje, o processo do trabalho encontra-se estagnado, apenas observando as modificações ocorridas no processo civil, que vem se aperfeiçoando, com pequenas mudanças. A vanguarda atual do direito processual encontra-se com o processo civil e não mais no processo do trabalho.
Não há dúvidas a respeito da necessidade de mudanças na CLT. A inovação é necessária, porém deve ser feita para melhor (reformatio in mellius), para aperfeiçoar e não para piorar (reformatio in pejus). Ressalta-se ainda que o texto celetista contém muita coisa boa e que deve ser conservada.
Não obstante o desejo de se buscar uma maior efetividade da prestação jurisdicional, no âmbito do processo do trabalho, o que se tem observado é uma atitude deliberada dos juízes de 1ª instância que, baseados no argumento de que se trata de verba alimentar, adotam o art. 475-J do CPC para constranger o credor a pagar o estabelecido em sentença. Assim, agindo dessa forma, os magistrados acabam por atropelar os princípios constitucionais, visto que a execução trabalhista possui regras próprias, não existindo, portanto, motivos para se importar o art. 475-J do CPC para aplicá-lo subsidiariamente ao processo do trabalho.
Vale lembrar que tais alterações trazidas pelo CPC são novas e que dúvidas existem sobre a omissão na CLT para se aplicar o CPC quanto às reformas ocorridas no processo civil. Somente a jurisprudência, com o tempo, irá dizer se são aplicáveis ou não ao processo do trabalho.
De todo o exposto, tem-se que o art. 475-J do CPC contribuirá para fomentar mudanças na mentalidade daqueles que venham a litigar e dos operadores do direito, porém, é indispensável a participação ética e legal de todos os que militam na Justiça do Trabalho para buscar um processo célere sem jamais ferir o respeito aos princípios que regem o Direito e o Processo do Trabalho, dentre eles, a proteção ao trabalhador.
Estudante do Mestrado em Direito do Trabalho da PUC/MG. Pós-Graduada em Direito de Empresa pelo IEC – Institutos de Educação Continuada da PUC/MG. Pós-graduada em Direito e Processo do Trabalho pela Universidade Uniderpe Anhanguera. Advogada.
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