Consulta
A consulente por intermédio de seu ilustre Advogado, o Dr. João Paulo Netto, tem a honra de nos formular uma consulta envolvendo as seguintes questões:
1. As empresas A,B,C,D e E são co-proprietárias de um empreendimento comercial, envolvendo terreno, prédio e exploração comercial (shopping center), em diversas percentagens.
2. As mesmas empresas participam, com os mesmos percentuais do empreendimento acima, do capital social (de baixo valor) de uma empresa limitada, que administra o shopping center (recebe os alugueres mensais, paga as despesas e distribui mensalmente o recebimento líquido às
3. co-proprietárias, na proporção de participação de cada uma).
4. A Administradora não é co-proprietária, mas mera prestadora de serviços, mediante determinada remuneração mensal.
5. As co-proprietárias decidiram realizar a expansão do prédio destinado ao shopping center, com recursos captados no mercado oficial de capitais e já estão acordadas com determinado banco, que se dispõe a financiar a construção, mediante contrato padrão (liberação dos recursos em parcelas mensais, apoiadas em cronograma físico-financeiro).
6. Por motivos desconhecidos, o banco concederá o financiamento à Administradora, com garantia (hipotecária ou fiduciária) do empreendimento existente e dos recebíveis (alugueres futuros), portanto, com garantias das co-proprietárias do empreendimento e das futuras obras da expansão.
7. Os interessados pretendem realizar a operação com observância do seguinte modelo:
a) preliminarmente, constituirão um consórcio, segundo o modelo previsto no artigo 278 da lei 6.404/76 (lei das sociedades por ações), da qual participarão como consorciados, as co-proprietárias do empreendimento e a Administradora, esta como líder do consórcio, e que, portanto, dele participará como prestadora de serviços (administração das contas do consórcio) e tomadora do empréstimo, cujos recursos serão canalizados ao consórcio, mediante determinada remuneração, previamente combinada.
b) o empréstimo será resgatado pela Administradora, com a utilização dos recebimentos líquidos mensais pertencentes às co-proprietárias, as quais serão, nas ocasiões próprias, carreados para o consórcio e daí para o banco financiador, tudo sob a administração da Administradora.
8. Os interessados desejam saber se, além do imposto de operações financeiras (IOF) incidente sobre o empréstimo banco/Administradora, haverá incidências de outro IOF na operação idealizada por eles.
Opinião legal
Depreende-se da consulta que as empresas A, B, C, D, e E, co-proprietárias de um Shopping Center, são sócias de uma empresa limitada que administra o empreendimento comercial promovendo recebimento de alugueres, pagamento de despesas e distribuição mensal do recebimento líquido às co-proprietárias do Shopping Center na proporção do capital de cada uma.
As co-proprietárias do Shopping Center, desejando expandir seus negócios, pretendem captar recursos financeiros junto à determinada instituição financeira.
Para tanto, querem constituir um consórcio nos moldes do art. 278 da Lei nº 6.404/76 com a participação das cinco co-proprietárias retro mencionadas e com a participação, também, da Administradora (empresa F) que não é co-proprietária do empreendimento comercial, mas que figurará como líder do Consórcio a quem o Banco concederá o financiamento mediante garantia (hipotecária ou fiduciária) do empreendimento comercial e dos recebíveis (alugueres futuros).
Esse mútuo será resgatado pela Administradora com os recursos líquidos mensais das co-proprietárias, que serão carreados para o consórcio e daí para o banco financiador. A administradora perceberá remuneração previamente estipulada para a prestação dos serviços de administração do consórcio e intermediação do mútuo bancário.
A consulente deseja saber se nessa operação entre a administradora e o consórcio a quem serão repassados os recursos financeiros captados haverá incidência do IOF.
Para responder a essa indagação impõe-se o exame do fato gerador do IOF em seus aspectos nuclear e subjetivo.
O IOF, na verdade, desdobra-se em quatro impostos conforme previsão do art. 63 do CTN:
“Art. 63. O imposto, de competência da União, sobre operações de crédito, câmbio e seguro, e sobre operações relativas a títulos e valores mobiliários tem como fato gerador:
I – quanto às operações de crédito, sua efetivação pela entrega total ou parcial do montante ou do valor que constitua o objeto das obrigações, ou sua colocação à disposição do interessado;
II – quanto às operações de câmbio, sua efetivação pela entrega de moeda nacional ou estrangeira, ou de documento que a represente, ou sua colocação à disposição do interessado, em montante equivalente à moeda estrangeira ou nacional entregue ou posta à disposição por este;
III – quanto às operações de seguro, sua efetivação pela emissão da apólice ou do documento equivalente, ou o recebimento do prêmio, na forma da lei aplicável;
IV – quanto às operações relativas a títulos e valores mobiliários, a emissão, transmissão, pagamento ou resgate destes, na forma da lei aplicável.
Parágrafo único – A incidência definida no inciso I exclui a definida no inciso IV, e reciprocamente, quanto à emissão, ao pagamento ou resgate do título representativo de uma mesma operação de crédito.”
Interessa para o caso presente o exame do IOF concernente às operações de crédito.
Conforme prescrito no inciso I, do art. 63 do CTN o fato gerador consiste na efetiva “entrega total ou parcial do montante ou do valor que constitua o objeto das obrigações, ou sua colocação à disposição do interessado”.
A lei de regência, Lei nº 5.143, de 20 de outubro de 1966, por sua vez, dispõe em seu art. 1º, inciso I que o IOF tem como fato gerador “no caso de operações de crédito, a entrega do respectivo valor ou sua colocação à disposição do interessado”.
O Decreto nº 6.306, de 14 de dezembro de 2007, que regulamenta esse imposto dispõe:
“Art. 2º O IOF incide sobre:
I – operações de crédito realizadas:
a) por instituições financeiras (Lei nº 5.143, de 20 de outubro de 1966, art. 1º);
b) por empresas que exercem as atividades de prestação cumulativa e contínua de serviços de assessoria creditícia, mercadológica, gestão de crédito, seleção de riscos, administração de contas a pagar e a receber, compra de direitos creditórios resultantes de vendas mercantis a prazo ou de prestação de serviços (factoring) (Lei nº 9.249, de 26 de dezembro de 1995, art. 15, § 1º, inciso III, alínea “d”, e Lei nº 9.532, de 10 de dezembro de 1997, art. 58);
c) entre pessoas jurídicas ou entre pessoa jurídica e pessoa física (Lei nº 9.779, de 19 de janeiro de 1999, art. 13)”.
No que tange ao sujeito passivo da obrigação tributária o Código Tributário Nacional dispôs em seu art. 66 que:
“Contribuinte do imposto é qualquer das partes na operação tributada, conforme dispuser a lei”.
E a Lei nº 5.143, de 20 de outubro de 1966, prescreveu em seu art. 4º que “são contribuintes do imposto os tomadores de crédito e os segurados”.
No mesmo sentido, o art. 4º do Decreto nº 6.306/2007:
“Contribuintes do IOF são as pessoas físicas ou jurídicas tomadoras de crédito”.
Do exame dos dispositivos legais retro transcritos não se vislumbra, no caso sob consulta, dupla operação de crédito.
O fato gerador do IOF, na hipótese, é a efetiva entrega total ou parcial do montante ou do valor que constitua o objeto da obrigação, ou sua colocação à disposição do interessado (art. 63, I, do CTN , art. 1º, I, da Lei nº 5.143/66 e art. 3º do Decreto nº 6.306/2007) por uma instituição financeira, por uma entidade a ela equiparada, ou por qualquer pessoa física ou jurídica. E o sujeito passivo do IOF é a pessoa física ou jurídica tomadora do crédito.
Exige-se que uma instituição financeira ou uma entidade a ela equiparada, ou, uma pessoa física ou jurídica qualquer promova efetivamente a operação de crédito. Dessa forma, irrelevante, por si só, a equiparação trazida pelo art. 17 e parágrafo único da Lei nº 4.595, de 31 de dezembro de 1964 (Lei Bancária) que assim prescrevem:
“Art. 17. Consideram-se instituições financeiras, para os efeitos da legislação em vigor, as pessoas jurídicas públicas ou privadas, que tenha como atividade principal ou acessória a coleta, intermediação ou aplicação de recursos financeiros próprios ou de terceiros, em moeda nacional ou estrangeira, e a custódia de valor de propriedade de terceiros.
Parágrafo único. Para os efeitos desta lei e da legislação em vigor, equiparam-se às instituições financeiras as pessoas físicas que exerçam qualquer das atividades referidas neste artigo, de forma permanente ou eventual”.
De fato, a administradora, de per si, sequer é tomadora da operação de crédito, muito menos financiadora do crédito. Ainda que equiparada fosse a uma instituição financeira esse fato, por si só, não teria qualquer relevância jurídica, pois qualquer pessoa jurídica ou até pessoa física que pratique o fato tipificado na lei tributária poderá vir a ser o contribuinte do IOF, nos estritos termos do art. 4º, do Decreto nº 6.306/2007 c.c art. 13 da Lei nº 9.779, de 19 de janeiro de 1999[1].
Dessa forma, o que é importante não é o fato de uma entidade ser instituição financeira ou a ela equipada legalmente, mas o fato de ter praticado o ato configurador da situação abstratamente descrita na lei tributária que, uma vez ocorrida no mundo fenomênico, enseja, ipso fato, o surgimento da obrigação tributária (arts. 113, § 1º e 114, do CTN).
O exame detido da operação exposta pela consulente permite apontar como sendo o contribuinte do IOF o Consórcio. A administradora é apenas formalmente tomadora do mútuo por opção da instituição bancária financiadora, porém, enquanto líder do Consórcio formado por ela e outras cinco empresas (A, B, C, D e E), essas últimas sócias da administradora (empresa F), tudo nos termos do art. 66, do CTN, combinado com o art. 4º, da Lei nº 5.143/1966 e art. 4º do Decreto nº 6.306/2007.
Por razões que não vêm ao caso, o Banco se dispõe a efetuar a operação de crédito com a empresa líder, e não com o consórcio. Apesar de destituído de personalidade jurídica nada impediria de o consórcio firmasse contrato de mútuo bancário, no qual compareceriam todas as empresas participantes, inclusive a empresa líder do consórcio. Aliás, nos termos da Lei nº 12.402, de 2 de maio de 2011, o consórcio é obrigado a se inscrever no CNPJ podendo figurar como sujeito passivo da obrigação tributária em relação aos tributos administrados pela Secretaria da Receita Federal do Brasil (art. 1º).
Contudo, se a operação de crédito for feita com a administradora, empresa líder do consórcio, por opção do Banco financiador, mediante garantia de bens pertencentes às co-proprietárias que integram o consórcio, para que o mútuo seja resgatado por intermédio da administradora com os recursos provenientes da exploração comercial pelas co-proprietárias do empreendimento comercial, não se pode vislumbrar dupla operação de crédito. Os recursos canalizados para o consórcio são os mesmos obtidos pela administradora, empresa líder do consórcio.
Poder-se-ia cogitar de reempréstimo se a administradora celebrasse com o consórcio um novo contrato de operação de crédito em condições mais onerosas que aquela propiciada pela instituição bancária. Mas, nessa hipótese caracterizar-se-ia um quase contrato consigo próprio, pois a administradora firmaria o contrato como mutuante e ao mesmo tempo como co-mutuária, visto que ela é integrante, também, do consórcio na condição de líder. Assim, não haveria como afastar a confusão, ainda que parcial, entre credor e devedor, o suficiente para afastar o contrato de mútuo entre eles.
Outrossim, a administradora, como mera prestadora de serviços, não sendo co-proprietária do empreendimento comercial, por si só, não teria idoneidade econômico-financeira para figurar como tomadora do empréstimo. Seu capital é diminuto e nem possui ativos expressivos, pois conforme consta da cláusula segunda de seu contrato social a Administradora tem por objeto social apenas “a prestação de serviços de administração que estejam de qualquer forma relacionados às fases de construção e operação de empreendimentos de ‘Shopping Center’ em geral”. Operação de crédito é matéria estranha ao seu objetivo social que se limita aos serviços de administração de Shopping Center.
Por isso, a interpretação dos preceitos legais que definem o fato gerador do IOF e do seu respectivo contribuinte, à luz da situação fática narrada na consulta, não deixam margem de dúvidas de que o real contribuinte do imposto é o consórcio destinatário dos recursos financeiros para expansão do empreendimento comercial de que são co-proprietárias as cinco empresas já mencionadas (empresas A, B, C, D e E) que são sócias da administradora (empresa F), a qual, por sua vez, integra o consórcio na condição de empresa líder para fins de administrar o empreendimento comercial, canalizar o empréstimo bancário e proceder ulterior resgate do mútuo com os recursos financeiros das cinco co-proprietárias, tudo mediante percepção de remuneração preestabelecida.
É elementarmente sabido que quem promove operação de mútuo percebe, tal qual uma instituição financeira, juros e não remuneração preestabelecida a título de prestação de serviços, como acontece no caso sob exame.
Positivamente, o consórcio é o tomador da operação de crédito por intermédio da administradora que é sua empresa líder.
Diante do exposto, na nossa opinião, a operação de crédito vislumbrada nos termos da consulta implicará incidência de IOF apenas na operação entre o banco e a administradora.
Entretanto, para bem caracterizar a inexistência de segunda operação de crédito é conveniente que as cinco demais empresas consorciadas compareçam no contrato de financiamento, mesmo porque elas deverão oferecer garantia hipotecária ou fiduciária.
É a nossa opinião.
Especialista em Direito Tributário e em Ciência das Finanças pela FADUSP. Professor de Direito Tributário, Administrativo e Financeiro em várias instituições de ensino superior. Conselheiro do Instituto dos Advogados de São Paulo. Presidente do Centro de Pesquisas e Estudos Jurídicos. Ex Procurador-Chefe da Consultoria Jurídica do Município de São Paulo, Titular da cadeira nº 20 (Ruy Barbosa Nogueira) da Academia Paulista de Letras Jurídicas. Acadêmico, Titular da cadeira nº 7 (Bernardo Ribeiro de Moraes) da Academia Brasileira de Direito Tributário. Acadêmico, Titular da cadeira nº 59 (Antonio de Sampaio Dória) da Academia Paulista de Direito. Sócio fundador do escritório Harada Advogados Associados. Ex-Procurador Chefe da Consultoria Jurídica do Município de São Paulo.
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