Resumo: O presente trabalho tem por objetivo pesquisar o instituto do mandado de injunção nos moldes em que foi concebido na Constituição de 1988, observando suas peculiaridades, bem como o contexto constitucional e político, para ao final traçarmos o nosso entendimento quanto a melhor interpretação e aplicação, principalmente com relação à natureza da sentença e efeitos subjetivos da coisa julgada, com vistas a garantir o efetivo acesso à justiça. Nesse diapasão, pretendemos enfatizar os aspectos processuais do instituto, mas sem nos afastarmos de certos aspectos constitucionais que consideramos essenciais para um estudo completo, principalmente em razão da atual era neoconstitucionalista, em que todos os ramos do Direito merecem releitura em face da Constituição.
Palavras-chave: Mandado de Injunção. Aspectos Processuais. Sentença e Coisa Julgada. Acesso à Justiça.
Sumário: Introdução. 1. Premissas do mandado de injunção. 1.1. Origem 1.2. Natureza jurídica 1.3. Objeto 1.4. Causa de pedir. 2. Peculiaridades e delineamentos do mandado de injunção. 2.1. Competência. 2.2. Legitimidade ad causam. 2.3. Litisconsórcio passivo. 2.4. Procedimento. 3. Teorias sobre natureza da sentença e coisa julgada. 3.1. Generalidades. 3.2. Teoria da subsidiariedade. 3.3 Teoria da resolutividade. 3.4. Teoria da independência Jurisdicional. 3.5. Teorias mistas. 3.5.1. Teoria mista menor. 3.5.2. Teoria mista maior. Conclusão.
Introdução
O mandado de injunção foi previsto pela primeira vez na Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, como forma de controle concreto da inconstitucionalidade por omissão. A partir de então, juristas empenham esforços para interpretá-lo; é o que pretendemos realizar no presente estudo, sobretudo sob seus aspectos processuais, com intuito de traçar a melhor interpretação do Instituto com vistas ao acesso à Justiça.
Na primeira etapa, intitulada “premissas do mandado de injunção”, faremos uma abordagem sobre a origem e a natureza jurídica do instituto, objeto do processo e causa de pedir, momento em que analisaremos as similitudes com o Direito comparado, fixaremos a sua posição no ordenamento jurídico pátrio, bem como será definido o conteúdo da pretensão processual do impetrante e respectivo fundamento constitucional.
Na segunda parte, denominada “peculiaridades e delineamentos do mandado de injunção”, será observado uma série de aspectos processuais, tais como, objeto do processo, causa de pedir, competência, legitimidade ad causam, litisconsórcio e procedimento. A abordagem é de extrema importância, principalmente porque até a presente data não foi elaborado lei sobre processo e procedimento de mandado de injunção; sendo certo que da análise dessas peculiaridades e delineamentos processuais, poderemos extrair com maior firmeza a sua finalidade precípua, o que facilitará o enfrentamento da maior controvérsia que envolve o instituto, a ser analisada no terceiro capítulo.
E assim, na terceira e última parte, intitulada “teorias sobre natureza da sentença e coisa julgada”, abordaremos a controvérsia sobre conteúdo e eficácia da sentença e efeitos da coisa julgada em mandado de injunção, em que cada posicionamento doutrinário e jurisprudencial será analisado dentro de suas respectivas teorias, a saber: teoria da subsidiariedade, teoria da resolutividade, teoria da independência jurisdicional, teoria mista menor e teoria mista maior.
Fecharemos o presente estudo com o nosso posicionamento, como sendo aquele que mais se adequa à garantia do efetivo acesso à justiça; sendo que, ao final, concluiremos com um resumo dos pontos principais de cada capítulo.
1- Premissas do mandado de injunção
1.1- Origem:
O mandado de injunção previsto na Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 não guarda qualquer relação com o Direito alienígena[1]; entretanto, identificamos algumas similitudes no Direito inglês, norte-americano e alemão, senão vejamos:
A injuntion surgiu na Inglaterra no fim do século XIV, como um remédio amparado pelas regras de equidade (equitable remedy), a ser utilizado em hipótese de ausência de regulamentação ou ausência de decisões semelhantes (sistema common law) para a solução do caso concreto. Apesar de o Brasil adotar o sistema civil law[2], não há como negar a semelhança do instituto no que se refere ao mecanismo de decisão, que será baseada não na fonte direta do direito (lei, no sistema civil law; decisões judiciais, no sistema common law), mas em razão da ausência desta, o julgador deverá buscar em outras fontes (juízo de equidade, analogia, princípios gerais do direito) a solução para o caso sub judice.
O writ of injunction do Direito norte-americano também tem seus alicerces em um juízo de equidade, visto que a ordem não precisa constar de uma lei escrita (Borges, 2009, pp. 604-605); sendo certo que será impetrado com objetivos cominatórios, sempre que o fazer ou não fazer puder violar direitos fundamentais do cidadão[3]. No caso americano, podemos verificar as semelhanças principalmente a partir da análise de casos concretos, em que o writ teve importante papel na consecução da política de integração racial por intermédio do judicial review, cuja base doutrinária teve origem no pensamento progressista[4].
No Direito Alemão, há o verfasungsbeschwerde, que se trata de ação a ser ajuizada perante o Tribunal Constitucional sempre que houver afronta a direito fundamental do cidadão por ato ou omissão do Poder Público, como um mix entre mandado de segurança (no caso de ato de autoridade) e mandado de injunção (no caso de omissão de autoridade). Assim, o instituto é apto a tutelar o direito constitucional violado por omissão do Legislativo ou por omissão de autoridade administrativa, sempre quando houver algum dever imposto diretamente pela Constituição Alemã.
Alguns doutrinadores citam o Direito luso e iugoslavo como fonte de influência do mandado de injunção no Brasil[5]; sendo que a semelhança é retirada de dispositivos que preveem a ação de inconstitucionalidade por omissão. Discordamos de tal posicionamento, uma vez que o Brasil também inaugurou a previsão de ação de inconstitucionalidade por omissão na Constituição de 1988, tratando-se de instituto diverso, concebido no seio do controle abstrato de constitucionalidade. Por tais razões deixamos de realizar maiores comentários acerca do Direito comparado dos referidos países.
Traçadas as principais semelhanças com o Direito alienígena, sendo inegável que elas existem, impende, no entanto, reconhecer que o mandado de injunção concebido no Brasil de forma inédita pela Constituição de 1988 possui certas peculiaridades e requisitos próprios, motivo pelo qual não seria totalmente seguro tomar o ordenamento jurídico de outros países como paradigma.
Nesse sentido, oportuno citar as lições de Flávia Piovesan, verbis:
“A confrontação que se possa fazer com a injuction do direito americano, ou com a equity do direito inglês, ou ainda com o verfasungsbeschwerde do direito alemão, aponta a singularidade do mandado de injunção, que, por sua vez, tanto envolve um juízo de equidade (equity dos ingleses) como se volta à proteção dos direitos fundamentais da pessoa humana (injunctio dos americanos e verfasungsbeschwerde dos alemães), mas com características próprias e peculiares, já analisadas nos tópicos anteriores. De fato, nos moldes em que foi concebido, o mandado de injunção não encontra similar no direito alienígena. Trata-se de verdadeira inovação da Constituição de 1988” (2003, p. 178).
Portanto apenas alguns aspectos são similares ao Direito comparado; sendo certo que o mandado de injunção foi concebido de forma singular no ordenamento jurídico pátrio, de forma que iniciaremos a seguir o seu estudo nos moldes em que foi previsto na Constituição de 1988, observando suas premissas e peculiaridades.
1.2- Natureza jurídica:
O Mandado de Injunção está localizado no Título II (Dos Direitos e Garantias Fundamentais), Capítulo I (Dos Direitos e Deveres Individuais e Coletivos), inserido no art. 5º, inc. LXXI, da Constituição da República Federativa do Brasil promulgada em 1988, cuja norma contém o seguinte texto: “conceder-se-á mandado de injunção sempre que a falta de norma regulamentadora torne inviável o exercício dos direitos e liberdades constitucionais e das prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania”.
Antes de fixarmos a natureza jurídica do instituto em estudo, convém tecermos breves comentários acerca dos direitos fundamentais, garantias constitucionais e remédios constitucionais.
Direitos fundamentais são aqueles considerados essenciais para a existência digna da pessoa humana e estão previstos em normas constitucionais de cunho declaratório, enquanto as garantias constitucionais asseguram o exercício desses direitos e, consequentemente, estão previstas em normas constitucionais de cunho assecuratório (divide-se em garantia material e garantia instrumental); os remédios constitucionais são instrumentos processuais que têm por objetivo concretizar o exercício do direito garantido, previstos, pois, em normas constitucionais de cunho instrumental (garantia instrumental).
Oportuno transcrever as lições do constitucionalista português Jorge Miranda, a seguir:
“[…] os direitos representam por si só certos bens, as garantias destinam-se a assegurar a fruição desses bens; os direitos são principais, as garantias são acessórias; os direitos permitem a realização das pessoas e inserem-se direta e imediatamente, por isso as respectivas esferas jurídicas; as garantias só nelas se projetam pelo nexo que possuem com os direitos […] os direitos declaram-se, as garantias estabelecem-se” (Apud PAULO, 2012, p. 103).
Ou seja: a todo direito fundamental corresponde uma garantia constitucional que o assegura; e a toda garantia corresponde um remédio que a instrumentaliza. Mas nada impede, e não raro ocorre, que uma única disposição normativa encerra direitos fundamentais e garantias constitucionais, ou garantias (materiais) e remédios constitucionais (garantias instrumentais), ou, ainda, direitos fundamentais, garantias constitucionais (materiais) e remédios constitucionais (garantias instrumentais)[6].
Traçadas tais premissas, verificamos que o mandado de injunção tem natureza de garantia e remédio constitucional (ou, ainda, ação constitucional), à medida que é um instrumento processual que tem por objetivo assegurar direitos fundamentais inseridos na Constituição, cujo exercício esteja obstado em razão da ausência de norma regulamentadora (SANTOS, A.M.A. 1989. p. 25).
Nesse diapasão, o estudo do mandado de injunção está inserido na disciplina de Direito Processual Constitucional ou Direito Constitucional Processual, podendo ser analisado sob o enfoque constitucional em Direito Constitucional ou sob o enfoque processual em Direito Processual Civil[7]. In casu, pretendemos enfatizar os aspectos processuais do instituto, mas sem nos afastarmos de certos aspectos constitucionais que consideramos essenciais para um estudo completo, principalmente em razão da atual era neoconstitucionalista, em que todos os ramos do Direito merecem releitura em face da Constituição.
1.3- Objeto:
Com o objetivo de cumprir o anteriormente mencionado sobre a intenção de explorarmos os aspectos processuais do mandado de injunção, antes de fixarmos o seu objeto, cabe-nos discorrer sobre o conceito de objeto do processo, bem como a respectiva diferença entre os conceitos de objeto da cognição e objeto da demanda.
Sem embargo de posicionamento contrário[8], a melhor doutrina entende que o objeto do processo é a pretensão processual[9] (exigência de submissão do interesse alheio ao interesse próprio), a qual é materializada na demanda por intermédio do pedido do autor; assim, não havendo nenhuma questão preliminar a ser acolhida, o juiz passará à análise das questões de mérito (incluídas as questões prejudiciais), para, ao final, julgar o pedido, cujo mérito recairá sobre essa pretensão processual. Em outras palavras, o objeto do processo é o mérito da causa (e não as questões de mérito), visto que a própria pretensão processual consiste no mérito da causa.
No que se refere ao objeto da cognição, adotamos o posicionamento de que este é formado por um trinômio, mas não como doutrina que se refere às condições da ação, pressupostos processuais e mérito[10], e sim como sendo as questões preliminares (que se subdividem em condições da ação e pressupostos processuais), questões prejudiciais e mérito da causa (CÂMARA, 1995, p. 208). Portanto, o objeto de cognição é amplo, abrange questões processuais, questões de mérito, e até mesmo o próprio mérito da causa, apenas este último entendido como objeto do processo.
Por fim, quanto ao objeto da demanda, importa salientar que demanda é ato de impulso inicial à atuação do Estado-juiz, cujos elementos identificadores são as partes, a causa de pedir e o pedido. Assim, o pedido é o objeto da demanda, por intermédio do qual a pretensão processual é materializada, traçando-se, assim, os limites do mérito da causa. Em última análise, o objeto do processo (mérito da causa) recairá sobre o objeto da demanda (pedido), sendo certo que a tarefa precípua do juiz é justamente aplicar o Direito ao caso concreto para, em não havendo questões preliminares a serem acolhidas, julgar o mérito da causa e solucionar o caso concreto.
Traçadas tais premissas processuais básicas, cabe-nos, outrossim, breves comentários sobre a base teórica e filosófica da Constituição da República Federativa do Brasil promulgada em 1988, para melhor compreendermos o objeto do processo de mandado de injunção, senão vejamos:
A Constituição de 1988 adotou o Constitucionalismo Democrático, inspirando-se em valores humanos de isonomia material, solidariedade e justiça social, e consagrando expressamente em seu texto direitos sociais (direitos fundamentais de segunda geração, também denominados direitos prestacionais); nesse contexto, possui caráter Dirigente, à medida que impõe certos deveres de atuação positiva aos Poderes constituídos com a consequente redução do campo reservado à deliberação política majoritária.
Por isso, o constituinte originário preocupou-se com as hipóteses de omissão de medida para tornar efetiva norma constitucional – pois de nada adiantaria consagrar direitos prestacionais sem a respectiva garantia – prevendo, assim, os seguintes instrumentos para a solução da questão: ação direta de inconstitucionalidade por omissão e mandado de injunção.
O primeiro instrumento é identificado como ação constitucional pertinente ao controle abstrato/concentrado, não sendo por ora objeto de nossos estudos; enquanto o segundo instrumento, objeto de nossos estudos, é identificado como ação constitucional pertinente ao controle concreto/difuso, atuando como verdadeiro remédio constitucional, previsto no art. 5º, inc. LXXI, da CRFB. Nesta última hipótese, como bem salienta o Gilmar Mendes, busca-se a “declaração incidental de inconstitucionalidade sem pronúncia de nulidade” (et al, 2009, p. 1257).
Por todo exposto, concluímos que o objeto do processo de mandado de injunção é a pretensão processual de declaração da inconstitucionalidade da omissão com a respectiva regulamentação da norma constitucional, para a viabilização do exercício de direitos e liberdades fundamentais ou prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania (solução de um caso concreto), cujo conflito de interesses é caracterizado pela ausência de norma regulamentadora que inviabilize o exercício desses direitos e liberdades ou dessas prerrogativas[11], em que de um lado temos o suposto titular de um direito fundamental de eficácia limitada e, de outro, o sujeito ou órgão com o dever de editar a norma regulamentadora deste direito fundamental, supostamente em mora, e, ainda, o ente público ou privado com o dever de cumprir o mandamento constitucional regulamentado[12].
Assim, tecnicamente, ousamos discordar das seguintes lições de Gilmar Mendes:
“O mandado de injunção há de ter por objeto o não-cumprimento de dever constitucional de legislar que, de alguma forma, afeta direitos constitucionalmente assegurados (falta de norma regulamentadora que torne inviável o exercício de direitos e liberdades constitucionais e das prerrogativas inerentes á soberania e à cidadania” (et al, 2009, p. 1259).
Isso porque o descumprimento do dever constitucional de legislar não configura o objeto da injunção, mas sim a causa de pedir, assunto que reservamos para ser explanado autonomamente no item seguinte.
1.4- Causa de pedir:
O Brasil adotou a teoria da substanciação, que “vê na causa de pedir um conjunto de fatos, ou seja, o suporte fático da pretensão manifestada pelo demandante em juízo” (CÂMARA, 2003, p. 232); dividindo-se em causa remota, identificada pelo fato constitutivo do direito alegado pelo autor (fato jurídico relevante), e, em causa próxima, identificada pela lesão ou ameaça ao direito alegado (repercussão jurídica do fato).
Diante desses conceitos, não há qualquer dúvida que a causa de pedir remota do mandado de injunção é a existência de um direito subjetivo diante de um comando constitucional que imponha o dever de regulamentar esse direito; por sua vez, a causa de pedir próxima do mandado de injunção é a ausência de regulamentação que inviabilize o exercício desse direito subjetivo constitucional. Assim, em sentido amplo, causa de pedir é o descumprimento de um dever constitucional de legislar capaz de inviabilizar o exercício de um direito fundamental de eficácia limitada.
Quanto à causa de pedir próxima, embora não com essa denominação, Piovesan esclarece sobre a relação de causalidade entre a ausência da norma regulamentadora e a inviabilidade do exercício dos direitos e liberdades ou prerrogativas, conforme a seguir transcrito:
“Para que se compreenda o alcance do novo instituto, importa destacar que a concessão da injunção está condicionada a uma relação de causa e efeito. Vale dizer, a uma causa – a falta de norma regulamentadora – a ordem jurídica atribui uma consequência – a inviabilidade do exercício de direitos e liberdades constitucionais e das prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania” (2003, p. 134).
Mazzei parece compartilhar do mesmo entendimento com relação à existência dessa relação de causalidade ao concluir que “se a carência de norma reguladora não impedir o exercício e fruição do direito, não caberá mandado de injunção (já que se tratará de norma auto-aplicável)” (in DIDIER, 2011, p. 217).
No entanto, cabe aqui apenas uma ressalva. É que consideramos que a análise dessa relação de causalidade deve ser realizada como questão de mérito e não como questão preliminar, isto é, a ausência de inviabilidade de exercício de direitos e liberdades constitucionais ou prerrogativas não resultará no descabimento do mandado de injunção (extinção do proceso sem resolução de mérito), mas sim na não concessão da ordem de injunção (improcedência do pedido).
Apesar de entendermos que o objeto do processo de mandado de injunção consiste no mérito da causa, e que este mérito é a pretensão processual materializada na demanda através do pedido, não abarcando a causa de pedir[13], não conseguimos desvincular a análise desse pedido com a causa de pedir, uma vez que não há como examinar o mérito sem o fato jurídico e sua respectiva repercussão deduzida em juízo. Outrossim, segundo José Carlos Barbosa Moreira, toda questão relacionada à causa de pedir será considerada questão de fato, visto que constitui o suporte fático da demanda, embora podendo ser considerada como questão jurídica ao ser examinada sob a perspectiva do objeto do processo (1989, p. 208); motivo pelo qual não há como rechaçar a causa de pedir ab initio sem análise de provas (ainda que pré-constituídas) ou sem um exame mais profundo da questão, salvo se, aplicando a teoria da asserção (entendemos que sua aplicação não está restrita ao exame das condições da ação), seja possível verificar a inexistência de inviabilidade de exercício dos direitos e liberdades ou garantias nos limites da própria afirmação do impetrante. Neste último ponto, cumpre esclarecer que, em verdade, a causa de pedir exerce função dúplice, qual seja: em um primeiro momento, exerce a função de aferir pressuposto processual de existência de uma demanda ou pressuposto processual negativo de validade desta demanda, hipóteses em que, de fato, o processo poderá ser extinto na forma do art. 267, inc. IV, do CPC, em razão da respectiva inexistência ou nulidade do processo[14]; no segundo momento, e este o mais relevante, exerce a função de conduzir o julgamento do mérito sem, necessariamente, se confundir com ele.
Portanto, somente podemos concordar com a nomenclatura “requisitos” (ideia de pressuposto processual) que os doutrinadores costumam utilizar para designar a existência do dever regulamentar e a respectiva violação que inviabilize o exercício dos direitos e liberdades ou prerrogativas, quando se tratar do primeiro momento de função da causa de pedir acima mencionado. Ultrapassado esse momento, a ausência do dever regulamentar (que reflete na ausência de direito subjetivo constitucional), ou de ausência de violação que inviabilize o exercício desses direitos e liberdades ou prerrogativas, representa questões de fato (ainda que jurídica), a ser analisada como questão de fundo, influenciando no julgamento do mérito do mandado de injunção, cujo pedido deverá ser julgado improcedente[15].
Seguindo esse raciocínio, a ordem de injunção deve ser concedida com base em: 1) um comando constitucional que imponha o dever regulamentar (ainda que de forma implícita); e, 2) a violação de direitos e liberdades constitucionais ou prerrogativas, cujo exercício se tornou inviável em razão da mora legislativa[16].
Cumpre esclarecer que todos os Poderes têm a função de legislar, ainda que de forma atípica, como no caso do Executivo e do Judiciário; sendo certo que as normas constitucionais devem ser interpretadas sem rigor técnico e de maneira a conferir uma maior eficácia aos seus comandos. Portanto, a expressão “falta de norma regulamentadora” constante do inc. LXXI do art. 5º da CRFB, deve ser interpretada de forma ampla e sistemática, em consonância com o art. 103, parágrafo 2º, da CRFB (no que se refere à expressão “omissão de medida”), e entendida como “toda e qualquer medida para tornar efetiva norma constitucional, o que inclui leis complementares, ordinárias, decretos, regulamentos, resoluções, portarias, dentre outros atos” (PIOVESAN, 2003, p. 135).
Nessa esteira de raciocínio, podemos incluir no conceito de norma regulamentadora qualquer ato normativo, inclusive normas programáticas de cunho material[17] que, muito embora dependam de legislação e políticas públicas para serem implementadas, não podem se transformar em “promessas constitucionais inconsequentes”[18]. No entanto, o controle da inconstitucionalidade será realizado tão somente nos limites do mínimo essencial assegurado a esses direitos sociais não originários, já que em contrapartida temos o princípio da reserva do possível e da separação dos poderes, cuja harmonização decorre da teoria do grau mínimo de efetividade[19]. Impende salientar que é justamente dentro desse mínimo social que extraímos o direito constitucional subjetivo de normas programáticas e, correlatamente, o dever constitucional implícito de legislar.
Com relação à omissão legislativa parcial, trata-se de questão controvertida, em que vislumbramos a formação de duas correntes, senão vejamos: a primeira, entende que não há possibilidade de controle da omissão parcial, sob o argumento de que nesse caso existe regulamentação, não sendo o mandado de injunção a via própria para o exame de constitucionalidade ou justiça da regulamentação[20], cujo mecanismo próprio seria a declaração de inconstitucionalidade por ação de forma incidental ou principal[21]; a segunda, a qual nos filiamos, defende a possibilidade de controle da omissão parcial[22], principalmente nos casos de exclusão legal de um grupo ou pessoas em idênticas condições, ao fundamento de que a regulamentação inconstitucional por afronta ao princípio da isonomia é equiparável à ausência de norma regulamentadora para a parcela do grupo ou pessoas discriminadas.
Como defensor dessa segunda corrente doutrinária, vale citar os ensinamentos de Gilmar Mendes, a seguir transcritos:
“A omissão parcial envolve, por sua vez, a execução parcial ou incompleta de um dever constitucional de legislar, que se manifesta seja em razão do processo de mudança nas circunstâncias fático-jurídicas que venham a afetar a legitimidade da norma (inconstitucionalidade superveniente), seja, ainda, em razão da concessão de benefício de forma incompatível com o princípio da igualdade (exclusão de benefício incompatível com o princípio da igualdade” (2009, p. 1259).
Ressalta-se, no entanto, que não somos a favor do cabimento de mandado de injunção para o controle de regulamentos inconstitucionais. Os defensores dessa possibilidade sustentam que a invalidade da norma inconstitucional deve ser equiparada à falta de norma regulamentadora[23], fazendo alusão, inclusive, ao princípio da economia processual[24]. Não concordamos com esse raciocínio, tendo em vista que, a teoria da nulidade das normas inconstitucionais é, na maioria das vezes, relativizada por questões de interesse social e segurança jurídica (técnicas de modulação dos efeitos temporais da declaração de inconstitucionalidade previstas no art. 27 da Lei 9868/99), em que a declaração de inconstitucionalidade pode ter efeitos ex nunc ou prospectivos, hipótese em que a norma declarada inconstitucional chega a produzir efeitos no ordenamento jurídico[25], o que torna incompatível a equiparação.
Parte da doutrina assume posição que considera possível que a violação ensejadora de impetração de mandado de injunção seja por via indireta, nos casos em que a autoridade coatora deixa de conferir um determinado direito sob o argumento de que ele não estaria regulamentado, v.g., autoridade administrativa que deixa de analisar requerimento de aposentadoria especial sob o argumento de que este direito não foi regulamentado; sendo que a Suprema Corte possui alguns julgados com esse entendimento (vg. STF. AgRg no MI 4842 e MI 4484. Pleno. Relatora Min. Cármen Lúcia. DJ: 01.04.2013 e 02.04.2013, respectivamente. Acesso em 14.02.2014, ementa). No nosso ponto de vista, porém, não há de se falar em omissão do dever constitucional de regulamentar, mas sim em ato ilegal ou abusivo de autoridade coatora passível de ser atacado mediante a impetração de mandado de segurança.
Finalizamos o presente item concluindo que a causa de pedir próxima do mandado de injunção é a falta de norma regulamentadora, capaz de inviabilizar o exercício de direitos e liberdades ou prerrogativas, podendo essa omissão ser total ou parcial; bem como, a causa de pedir remota é a existência de qualquer direito subjetivo constitucional pendente de regulamentação, incluindo-se os direitos prestacionais, desde que nos limites do mínimo social de garantia, podendo o dever constitucional de legislar estar previsto expressa ou implicitamente.
2- Peculiaridades e delineamentos do mandado de injunção
2.1- Competência:
A competência para julgar mandado de injunção está expressamente prevista no art. 102, inc. I, Alínea q; art. 105, inc. I, alínea h, todos da Constituição da República; art. 121, parágrafo 4º, inc. V; e art. 125, parágrafo 1º, da Constituição da República c/c art. 161, inc. IV, alínea g, da Constituição do Estado do Rio de Janeiro[26]. Trata-se, pois, de competência absoluta.
O critério utilizado pelo Constituinte Originário levou em conta o órgão ou autoridade com atribuição para a elaboração ou expedição da norma regulamentadora. Nesse sentido, oportuno transcrever as lições de Flávia Piovesan, verbis:
“Ora, quando o texto constitucional fixa ao Supremo Tribunal Federal e ao Superior Tribunal de Justiça tais competências, não está com isso, a apontar ao pólo passivo da ação do mandado de injunção. Trata-se tão-somente de um critério de partilha de competências entre os órgãos jurisdicionais. A adoção deste critério de fixação de competência se pauta no órgão competente para a adoção da norma regulamentadora”. (Grifo Nosso. 2003, p. 146)
Assim, é competente o Supremo Tribunal Federal para julgar originariamente o mandado de injunção quando a atribuição para a adoção da norma regulamentadora for do Presidente da República, do Congresso Nacional, da Câmara dos Deputados ou de sua respectiva Mesa, do Senado Federal ou de sua respectiva Mesa, do Tribunal de Contas, de um dos Tribunais Superiores, ou do próprio Supremo.
Por sua vez, é competente o Superior Tribunal de Justiça para julgar originariamente o mandado de injunção quando a atribuição para adoção da norma regulamentadora for de órgão, entidade ou autoridade federal da administração direta ou indireta, salvo os casos de competência da Suprema Corte, dos órgãos de competência da Justiça Federal e da Justiça especializada.
No que se refere aos órgãos jurisdicionais estaduais, o Constituinte Originário deixou a cargo do Poder Constituinte Derivado Remanescente a tarefa de fixação de competência (art. 125, parágrafo 1º da CRFB); ocorre que a Constituição do Estado do Rio de Janeiro seguiu o mesmo critério do Constituinte Originário ao disciplinar que o julgamento do mandado de injunção será de competência originária do Tribunal de Justiça quando a elaboração do regulamento for de atribuição de órgão, entidade ou autoridade estadual da administração direta ou indireta (at. 161, IV, g, da CERJ). Sem muito esforço, entendemos que o Governador do Estado foi abrangido pela hipótese em comento, incluindo-o no conceito de autoridade estadual.
Embora o referido dispositivo da Constituição do Estado do Rio de Janeiro não faça alusão à omissão regulamentar do próprio Tribunal de Justiça, da Assembleia Legislativa ou respectiva Mesa, do Tribunal de Contas do Estado e do Prefeito da Capital e dos Municípios com mais de 200.000 eleitores, somos de entendimento que o mandado de injunção é também de competência originária do Tribunal de Justiça nesses casos. A uma porque essa interpretação extensiva está em consonância com a Constituição Federal, pois, ainda que não se possa falar propriamente em norma de repetição obrigatória garantidora do pacto federativo, traça-se um paralelo com os órgãos estaduais da administração com os órgãos do Legislativo e Judiciário. A duas porque, as normas referentes ao mandado de segurança são aplicáveis por interpretação analógica ao mandado de injunção[27], no que couber; motivo pelo qual o art. 161, inc. IV, alínea e, itens 2, 3 com ressalva, 4 e 7 são perfeitamente aplicáveis. Salienta-se que o item 1 – governador do Estado – já está abrangido pela própria alínea g, conforme acima mencionado, os itens 3, segunda parte, 5 e 6 – Presidente da Assembleia, Secretários de Estado e Procuradores Gerais da Justiça, do Estado e da Defensoria, respectivamente – não se aplicam ao mandado de injunção por não guardarem qualquer relação com a Constituição Federal.
As omissões regulamentares provenientes de órgãos, entidades ou autoridades municipais da administração direta ou indireta constituirão causa de pedir de mandado de injunção a ser processado e julgado em primeira instância, no caso do Estado do Rio de Janeiro, nas Varas de Fazenda Pública, de acordo com o disposto no art. 86, inc. I, alínea a, do CODJERJ. Seguindo a mesma linha de raciocínio acima esposada, aqui também deve ser traçado um paralelo para abranger a hipótese de omissão da Câmara Municipal ou sua respectiva Mesa, sendo inconcebível que a matéria seja julgada em Vara Cível, dado o interesse público que envolve a questão, salvo nas comarcas em que não há Vara de Fazenda.
2.2- Legitimidade ad causam:
O art. 5º, inc. LXXI, da CRFB prevê o mandado de injunção como garantia constitucional para “o exercício dos direitos e liberdades constitucionais e das prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania”, não fazendo qualquer restrição quanto à legitimidade; razão pela qual o referido dispositivo deve ser interpretado amplamente com o fim de extrair a máxima efetividade da norma.
Com relação à legitimidade ativa, o mandado de injunção pode ser impetrado por qualquer pessoa – natural ou jurídica – ou até mesmo os chamados sujeitos processuais descritos nos incs. III, IV e V do art. 12 do CPC, desde que estejam na condição de titular de direito fundamental, cujo exercício esteja inviabilizado em razão da falta de norma regulamentadora (NERY et al, 1996. p. 252).
Outrossim, em se tratando de mandado de injunção coletivo, o writ poderá ser impetrado por pessoa, órgão ou entidade representante do grupo ou classe atingida com a mora legislativa. No ponto, cumpre esclarecer que o Supremo Tribunal Federal fixou posicionamento a favor da possibilidade de impetração de mandado de injunção coletivo (STF. MI 361-RJ. Pleno. Relator p/ Acórdão Min. Sepúlveda Pertence. DJ: 17.06.1994 e MI 472-DF. Pleno. Min. Celso de Mello. DJ: 02.03.2001. Ementa. Acesso em 20 fev. 2014, ementa); sob o fundamento, em síntese, que o texto constitucional não realizou qualquer restrição nesse sentido, devendo a garantia instrumental instituída no art. 5º, inc. LXXI, da CRFB, ser interpretada em consonância com os arts. 5º, inc. XXI; 8º, inc. III; e 5º LXX, todos da CRFB.
O mandado de injunção é uma garantia instrumental que visa conferir efetividade aos direitos fundamentais, não podendo afastar a tutela de direitos coletivos, até porque, atualmente, verificamos o crescente fenômeno de reivindicações de índole social e a presença de demandas massificadas, o que acarretou a necessidade de “molecularização” dessas demandas como forma de otimizar o acesso à justiça e garantir a realização da justiça social por todos almejada[28]. Ou seja, a Constituição de 1988 possui vários dispositivos voltados à declaração e tutela de direitos coletivos, de forma que o mandado de injunção, ao pretender garantir o exercício de direitos e liberdades ou prerrogativas, não poderá deixar de fazê-lo em âmbito coletivo.
Sob essa perspectiva teleológica e sistemática, a legitimidade coletiva do mandado de injunção deve ser equiparada à legitimidade coletiva do mandado de segurança, aplicando-se, pois, o art. 21 da Lei 12.016/2009[29]. Mas não é só. Como se sabe, hodiernamente, podemos falar na existência de um microssistema processual coletivo, isso significa que no ordenamento jurídico pátrio há diversos diplomas legais dispondo sobre tutela coletiva, cada qual com princípios e regras próprias da matéria que pretendem normatizar, mas que devem ser aplicados de forma conjunta e harmônica, com o objetivo de maximizar a intercomunicação dos ditames comuns ao sistema, criando-se uma espécie de teoria geral do processo coletivo (AZEVEDO, 2012, pp. 111-129).
O Superior Tribunal de Justiça, em diversas ocasiões, manifestou-se a favor da aplicação conjunta e harmônica da legislação sobre processo coletivo[30]; sendo certo que as Leis 7.347/1982 e 8.078/1980 constituem o núcleo desse microssistema, em razão não só da intertextualidade e complementariedade entre esses dois diplomas (art. 21 da LACP e art. 90 do CDC), mas também pela respectiva irradiação para os demais, em razão do caráter conceitual e principiológico deles. Assim, não há como negar a aplicação da Lei de Mandado de Segurança (Lei 12.016/2009), da Lei de Ação Civil Pública (Lei 7.347/82), do Código de Defesa do Consumidor (Lei 8.072/90) e demais diplomas processuais coletivos ao mandado de injunção, no que couberem; motivo pelo qual entendemos que tanto o Ministério Público[31], quanto a Defensoria Pública, possuem legitimidade extraordinária para figurarem no polo ativo do mandado de injunção, de acordo com o art. 5º da Lei 7.347/82, e nos limites de suas respectivas funções institucionais (art. 127, caput, e art. 129, inc. II, da CRFB c/c art. 6º da LC 75/93, no que se refere ao MP; e art. 134 da CRFB c/c art. 4º, inc. VII da LC 80/94 com redação dada pela LC 132/2009, no que se refere à DP).
Dessa forma, as regras de legitimação ativa do mandado de injunção coletivo devem ser extraídas dos diplomas legais pertencentes ao microssistema de tutela dos direitos coletivos, sendo estes considerados de forma ampla para abranger os interesses individuais homogêneos, interesses coletivos stricto sensu, e também os interesses difusos. Nesse último ponto, pedimos vênia para discordar da posição de Flávia Piovesan, que sustenta o cabimento de mandado de injunção tão somente para a tutela de interesses coletivos stricto sensu, negando-o para a tutela de interesses difusos, e ficando omissa quanto ao cabimento para tutela de direitos individuais homogêneos[32]. Ao nosso sentir, a negativa não se justifica[33], pois, conforme será desenvolvido no item 3.5.2, defendemos a possibilidade de a sentença do mandado de injunção vir a produzir efeitos erga omnes (abstrativização do controle incidental), a depender do caso concreto; e isso não transforma o mandado de injunção em instrumento de tutela de direito objetivo, uma vez que a eficácia normativa da sentença é provisória, a regulamentar e possibilitar o exercício dos direitos e liberdades tão somente no período de vácuo legislativo. In casu, aplica-se o brocardo “quem pode o mais, pode o menos”, isto é, se a sentença de mandado de injunção individual pode vir a ter eficácia erga omnes, com maior razão a sentença de mandado de injunção coletivo produzirá eficácia erga omnes quando tiver por objeto a viabilização de exercício de um direito difuso.
Com relação à legitimidade passiva, vislumbramos a formação de três correntes, cujos fundamentos passaremos a expor, a seguir:
A primeira corrente sustenta que é parte legítima para ocupar o polo passivo do mandado de injunção o órgão, entidade ou autoridade que detenha o dever constitucional de regulamentar os direitos e liberdades constitucionais ou prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania ou à cidadania. Esse entendimento somente poderia ser aplicado paralelamente ao entendimento de eficácia da sentença de injunção de caráter meramente declaratório (teoria da subsidiariedade), o que justificaria a participação da relação jurídica processual tão somente daquele a quem se imputa a omissão e contra quem a mora será declarada em caso de procedência do pedido. Não é, porém, o que ocorre na prática. O Supremo Tribunal Federal adota esta corrente para fins de legitimidade desde seus primeiros julgados, e continua com a mesma linha de raciocínio mesmo depois da virada jurisprudencial que passou a admitir caráter normativo (teoria da resolutividade), e até mesmo em casos de eficácia erga omnes (teoria da independência jurisdicional)[34].
No nosso ponto de vista, equivoca-se a Suprema Corte ao tomar o critério de legitimidade passiva pelo critério de competência (art. 102, inc. I, alínea q; e art. 105, inc. I, alínea h), sendo que a não participação processual da pessoa pública ou privada que suportará o ônus da concessão do mandado de injunção viola a garantia de devido processo legal.
A segunda corrente entende que parte legítima para ocupar o polo passivo do writ é tão somente a pessoa pública ou privada que suportará o ônus da concessão de injunção, podendo o órgão, entidade ou autoridade morosa ser, eventualmente, intimada para prestar esclarecimentos. Como adepta desta corrente, podemos citar Flávia Piovesan (2003, p. 145)[35], ressaltando que a Ilustre doutrinadora defende o caráter normativo, provisório e inter partes da sentença de injunção (teoria da resolutividade). Não nos afastamos completamente desse entendimento, mas por considerarmos que em algumas situações seria mais prudente a participação também do órgão, entidade ou autoridade omissa, preferimos adotar a terceira corrente, sob os fundamentos que serão expostos a seguir.
A terceira corrente entende que tanto o órgão, entidade ou autoridade com atribuição para a regulamentação dos direitos e liberdades ou prerrogativas, quanto à pessoa pública ou privada que suportará o ônus de eventual concessão da ordem de injunção, deverão participar da relação jurídica processual no polo passivo da demanda. Rodrigo Mazzei (in DIDIER JR, 2011, pp. 257-265) admite essa corrente, em casos específicos, quando a sentença tiver dois comandos sucessivos, isto é, quando a primeira parte do dispositivo reconhece a mora e fixa prazo para a atividade regulamentar, e a segunda parte do dispositivo cria o regulamento para o caso concreto somente sob a hipótese de descumprimento do referido prazo (teoria mista menor); assim, nos dizeres do Ilustre doutrinador, haveria a formação de um litisconsórcio secundário (ou sucessivo).
Quanto a esse entendimento, fazemos uma pequena ressalva, qual seja, a existência de litisconsórcio entre o órgão, entidade ou autoridade omissa e a pessoa pública ou privada que suportará o ônus da regulamentação não está condicionada à adoção da teoria mista menor. Explicando: seja qual for a teoria adotada, com exceção da teoria da subsidiariedade, a sentença constitutiva regulamentará o direito fundamental do impetrante. Assim, de um lado, não há qualquer dúvida quanto à legitimidade da parte que suportará o ônus daí decorrente, pois os efeitos da sentença constitutiva atinge sua esfera patrimonial e/ou extrapatrimonial, a depender do Direito regulamentado. E, de outro lado, não há qualquer dúvida quanto à legitimidade da parte omissa, tendo em vista que qualquer sentença, até mesmo as constitutivas, possui parcela declaratória (no caso em tela o reconhecimento da omissão), sendo de bom alvitre que o órgão, entidade ou autoridade que detenha o dever constitucional regulamentar e responsável pela situação de inconstitucionalidade não figure apenas como uma espécie de amicus curiae para prestar esclarecimentos, mas sim como parte e com todos os poderes e ônus a ela inerentes, tais como, produção de provas, chamamento ao processo, reconhecimento da procedência do pedido com a respectiva edição da norma regulamentar, ou até mesmo podendo influir decisivamente na escolha dos parâmetros escolhidos pelo Judiciário para a elaboração do regulamento provisório.
Este último, o posicionamento que, para nós, mais se adequa aos ditames da garantia de devido processo legal (art. 5º, inc. LIV, da CRFB), por possibilitar ampla defesa para todos aqueles que, de alguma forma, possam ser atingidos com os efeitos da decisão; o que demonstra a existência de litisconsórcio passivo, cujo tema será desenvolvido no item a seguir.
2.3- Litisconsórcio passivo:
Ao adotarmos posicionamento que exige a presença tanto da parte a quem cabe o dever constitucional de legislar, como da parte que terá o seu patrimônio atingido pelos efeitos normativos da sentença, conclui-se pela inegável presença de litisconsórcio (necessário), cabendo-nos então prosseguirmos em sua classificação, embora encontremos alguns empecilhos na legislação para a sua configuração.
O litisconsórcio passivo pode ser simples ou unitário e facultativo ou necessário.
Considera-se litisconsórcio passivo simples (ou comum) aquele em que a sentença pode ser diferente para cada um dos réus, os quais são tratados como partes autônomas, em razão da natureza cindível da relação jurídica material ou pela autonomia desta entre cada um dos réus e o autor. Ao contrário, litisconsórcio passivo unitário é aquele em que a sentença deve ser uniforme para todos os réus, os quais são tratados como uma única parte, em razão da natureza incindível da relação jurídica material, que é una e indivisível (DIDIER Jr., 2009, pp. 308-309).
Outrossim, considera-se litisconsórcio passivo facultativo aquele em que pode ou não ser formado a critério da parte autora que escolherá com quem litigar, desde que os réus sejam parte legítima para figurarem no polo passivo da demanda. Por outro lado, litisconsórcio passivo necessário é aquele em que há obrigatoriedade de formação para a integração do polo passivo, exigindo-se, pois, a presença de todos os sujeitos que de alguma forma possui relação jurídica com a parte autora (DIDIER JR., 2009, pp. 309-312).
Portanto, o litisconsórcio passivo somente é necessário quando a natureza da relação jurídica material for incindível (litisconsórcio unitário) ou por exigência de lei; de onde se extrai que todo (ou quase todo) litisconsórcio passivo unitário é necessário, mas a recíproca não é verdadeira, pois o litisconsórcio necessário em decorrência da lei pode ser simples[36].
Oportuno transcrever as precisas lições de Didier Jr. sobre a relação entre litisconsórcio unitário e necessário, verbis:
“É o art. 47 do CPC que trata mais especificamente das hipóteses em que o litisconsórcio será, ou não, necessário. Por duas razões, diz o dispositivo aludido, ter-se-á o litisconsórcio necessário: a) quando o exigir a própria natureza da relação jurídica deduzida em juízo (ou seja: quando for unitário) ou b) quando o exigir a lei, independentemente da natureza da relação jurídica deduzida em juízo. Assim, percebe-se que o art. 47 do CPC pretendeu, corretamente, ligar a necessariedade, em princípio, à unitariedade. Mas será necessário também, disse-o agora sem muita clareza, quando assim o dispuser a lei. O que em certos casos deriva de específica disposição de lei é, portanto, a necessariedade do litisconsórcio e não a sua unitariedade” (2009, p. 309-310).[37]
O que pretendemos defender é a necessariedade do litisconsórcio passivo no processo de mandado de injunção; entretanto, por tudo o que foi acima exposto, e de acordo com o art. 47 do CPC, o litisconsórcio somente será necessário em razão da natureza incindível dos efeitos da sentença ou em razão da lei. É nesse ponto que surgem os empecilhos legislativos para a configuração de litisconsórcio passivo necessário entre o órgão, entidade ou autoridade omissa e a pessoa pública ou privada que suportará os efeitos da sentença, mas que deverão ser ultrapassados com base em interpretação sistemática dos princípios de direito processual constitucional e até mesmo utilizando o Direito comparado como fonte do Direito Processual Civil pátrio.
Antes de iniciarmos o esforço interpretativo para a conformação da existência de litisconsórcio passivo necessário no processo de mandado de injunção ao sistema processual brasileiro, cabe-nos explicar a posição de Rodrigo Mazzei, para quem o litisconsórcio é sucessivo (ou secundário), caso seja adotada a teoria mista menor da natureza da sentença de mandado de injunção.
Como mencionado no item anterior sobre legitimidade passiva, o doutrinador acima admite a possibilidade de litisconsórcio entre o órgão, entidade ou autoridade omissa e a pessoa pública ou privada que sofrerá os efeitos de eventual sentença de procedência nos casos em que esta tiver dois comandos sucessivos em seu dispositivo: O primeiro reconhecendo a mora e fixando prazo para a atividade regulamentar, cujo comando é direcionado, por óbvio, ao sujeito processual responsável pela edição da norma regulamentadora; e o segundo, sob a condição de descumprimento do primeiro, criando o regulamento para o caso concreto, cujo comando é direcionado, por óbvio, ao sujeito processual que suportará o ônus do regulamento provisório criado pelo Judiciário. Por isso, a conclusão de existência de litisconsórcio sucessivo (ou secundário), uma vez que a parte legítima sucessiva somente será atingida pelos efeitos da sentença em caso de descumprimento da sentença pelo legitimado passivo principal (ou primário), justificando-se ab initio a sua integração no polo passivo em prol da ampla defesa e do contraditório.
Conforme acima explicitado, importante destacar os dizeres de Rodrigo Mazzei, ao confrontar os ensinamentos de Fredie Didier sobre situação assemelhada de litisconsórcio existente entre a sociedade empresária e seus sócios, em caso de desconsideração da personalidade jurídica, a seguir:
“A exemplificação, ainda que não seja idêntica, possui similitude com a decisão proferida no mandado de injunção na posição intermediária (sic. teoria mista menor): a) não resolvida a pretensão de direito material exposta no writ através da elaboração legislativa para o exercício do direito, então b) o litisconsórcio secundário terá de ser aplicado, pois haverá a construção da norma (judicial) concreta que se direcionará diretamente ao mesmo. De outro giro, impetrado o mandado de injunção e resolvido o vácuo pelo litisconsorte principal (aquele que deveria editar a legislação regulamentadora), não haverá qualquer motivo para que se profira decisão contra o litisconsorte segundo (aquele que terá que cumprir a regulação judicial), que estará figurando no pólo passivo apenas para o caso de impossibilidade de emanação de provimento normativo pelo ente estatal” (in DIDIER JR., 2011, p. 260)[38].
Portanto, adotando-se a teoria mista menor, é brilhante o raciocínio de Mazzei quanto à existência de litisconsórcio sucessivo (ou secundário). Entretanto, por não adotarmos a referida teoria, prosseguiremos a abordagem para demonstração de existência de litisconsórcio necessário.
A necessariedade do litisconsórcio passivo em processo de mandado de injunção não decorre da unitariedade da relação jurídica material das partes envolvidas, havendo total separação entre o sujeito que detém o dever constitucional regulamentar e o sujeito que deverá cumprir os deveres regulamentados na sentença; trata-se, pois, de deveres distintos, com origens distintas, cuja sentença será diferente para cada réu (declaratória para o primeiro e constitutiva para o segundo)[39].
Por sua vez, a necessariedade do litisconsórcio passivo também não decorre de lei, simplesmente porque não há lei que regulamente o procedimento de mandado de injunção. Já tivemos a oportunidade de mencionar que a lei de mandado de segurança poderá ser aplicada ao procedimento do mandado de injunção, no que couber; sendo certo que não se aplica o art. 7º, inc. II e III da Lei 12.016/2009 ao caso em tela, uma vez que não se trata de relação entre autoridade coatora e órgão de representação judicial da pessoa jurídica da qual faz parte.
No entanto, sobressai das regras de experiência comum que tanto aquele que é responsável pela situação de inconstitucionalidade, quanto aquele que terá a sua esfera de direitos atingida pelos efeitos da sentença, deverão participar do processo que tem por objetivo justamente sanar essa situação de inconstitucionalidade; motivo pelo qual, tanto um quanto o outro deverão ser incluídos no polo passivo, em respeito ao devido processo legal, ampla defesa e contraditório, consagrados no art. 5º, incs. LIV e LV da CRFB.
Mas não é só. Entre os processualistas, muito se discute sobre a existência ou não da chamada intervenção iussu iudicis no sistema processual brasileiro, que nada mais é do que o ingresso de terceiro no processo por determinação do juiz.
O Código de Processo Civil de 1939 previa a hipótese em seu art. 91, o qual concedia ao juiz o poder de trazer ao processo terceiros que tivessem interesse na causa, ainda que indireto, sempre que conveniente a sua participação na relação jurídica processual. Nos dizeres de Moacyr Lobo da Costa, à época de vigência do referido dispositivo, este tinha por finalidade “trazer para o processo um terceiro que pode ser prejudicado pela sentença a proferir entre as partes originárias ou ao qual se pretende estender a eficácia dessa sentença” (1961, p. 133).
Vicente Greco Filho sustenta que o instituto da intervenção iussu iudicis está previsto no parágrafo único do art. 47 do Código de Processo Civil de 1973 (2003, p. 124). Diversamente, entendemos que esse dispositivo não consagrou o referido instituto, tratando-se a hipótese de relação processual jurídica incompleta em razão da ausência de litisconsórcio necessário, em que o magistrado, atendendo aos princípios de aproveitamento dos atos processuais e economia processual, intima a parte autora para que esta promova a citação do litisconsorte necessário, de forma a sanar o vício de invalidade causado pela ausência de parte no processo, sob pena de extinção do processo sem resolução do mérito, na forma do art. 267, inc. IV, do CPC (ausência de pressuposto processual de validade para o regular desenvolvimento do processo).
Isso não significa, porém, que o instituto da intervenção iussu iudicis não possa ser utilizado pelo magistrado no ordenamento jurídico pátrio, fazendo-se valer do Direito comparado como, por exemplo, o art. 107 do Código de Processo Civil Italiano[40]. Muito embora ainda não exista lei prevendo a necessariedade do litisconsórcio passivo entre o órgão, entidade ou autoridade omissa e a pessoa pública ou privada que sofrerá os efeitos da sentença no mandado de injunção, o magistrado ad cautelam deverá se valer da intervenção iussu iudicis para trazer ao processo um ou outro sempre que o impetrante indicar como réu apenas um dos dois.
Oportuno transcrever as lições de Nelson Finotti Silva sobre o instituto em comento, como forma de garantir o contraditório e o acesso à justiça, a seguir:
“Outrossim, a intervenção iussu iudicis garante a efetivação do direito fundamental do contraditório e de acesso à justiça. Pela dimensão publicística do direito processual e relevância do contraditório, em especial no processo civil, essa atuação de ofício do juiz cumpre efetivamente as garantias constitucionais processuais e os direitos fundamentais, legitimando, pois, o processo e a própria jurisdição”(2008, pp. 197-198).
Essa é, para nós, a única forma de adequar a finalidade do mandado de injunção com a natureza da sentença sem ferir o devido processo legal, como uma espécie de litisconsórcio necessário sui generis, em que parte da sentença necessariamente atinge o responsável pelo descumprimento do dever constitucional de legislar, e outra parte da sentença necessariamente atinge aquele que irá sofrer as consequências da regulamentação criada pelo Judiciário[41]. Portanto, enquanto não seja aprovada e promulgada a lei que regulamentará o procedimento de mandado de injunção com expressa previsão de existência de litisconsórcio passivo necessário[42], quando ambos não forem indicados como réus pela parte autora, a integração deverá ser realizada por intermédio de intervenção iussu iudicis, com base em interpretação sistemática dos princípios e garantias processuais constitucionais acima mencionados, bem como, socorrendo-se do art. 107 do CPC italiano.
2.4- Procedimento:
Como já tivemos a oportunidade de mencionar, até a presente data não há lei processual específica que regulamente o procedimento de mandado de injunção, a qual deverá ser elaborada pelo Congresso Nacional, na forma do art. 22, inc. I, da CRFB; entretanto, firmou-se o entendimento de que a Lei de Mandado de Segurança é aplicável analogicamente no que couber[43]; e, assim como no mandado de segurança, o Código de Processo Civil, subsidiariamente.
O referido entendimento tem por fundamento o fato de o mandado de injunção constituir uma garantia constitucional de aplicação imediata, ex vi do art. 5º, inc. LXXVI c/c 5º parágrafo 1º, da CRFB, conforme podemos verificar do julgamento da questão de ordem levantada no MI 107 (leading case), a seguir:
“[…] Assim fixada a natureza desse mandado, e ele, no âmbito da competência desta Corte – que esta devidamente definida pelo artigo 102, i, 'q' – auto-executável, uma vez que, para ser utilizado, não depende de norma jurídica que o regulamente, inclusive quanto ao procedimento, aplicável que lhe é analogicamente o procedimento do mandado de segurança, no que couber. Questão de ordem que se resolve no sentido da auto-aplicabilidade do mandado de injunção, nos termos do voto do relator” (STF. MI 107 QO-DF. Relator Min. Moreira Alves. Pleno. Julgamento: 23.11.1989. DJ: 21.09.1990. Ementa. Acesso em 09 mar. 2014).
A Lei 8.038/1990 (art. 24, parágrafo único) eliminou qualquer dúvida a respeito da questão, ao determinar expressamente a aplicação da Lei de Mandado de Segurança ao procedimento do mandado de injunção, no que couber. Assim, aplica-se a Lei 12.016/2009 no que se refere à petição inicial (art. 6º), no que se refere à citação e prazo de resposta (art. 7º), quanto ao recurso cabível nos casos de indeferimento da inicial (art. 10, parágrafo 1º), quanto ao ingresso de litisconsorte ativo após o despacho liminar positivo (art. 10, parágrafo 2º), quanto à intimação pessoal dos réus da sentença (art. 13), com relação ao recurso cabível da decisão que concede ou denega o writ impetrado em primeiro grau de jurisdição (art. 14) ou em única instância no Superior Tribunal de Justiça (art. 18), com relação à legitimidade ativa coletiva e os direitos a serem protegidos nesse tipo de demanda (art. 21 e 22), assim como no que se refere à impossibilidade de interposição de embargos infringentes e ausência de condenação em honorários advocatícios (art. 25).
Considerando que muitos dos dispositivos acima mencionados não serão aplicados ipse literis, mas sim adaptados à realidade do mandado de injunção, faz-se mister realizarmos alguns comentários, senão vejamos:
A petição inicial deverá conter os requisitos de que trata o art. 282 e 283 do CPC, conforme determina o art. 6º da Lei 12.016/2009. Dessa forma, muito embora não se possa falar em direito líquido e certo, assim como não haja necessidade de prova pré-constituída, devemos atentar para o fato de que o mandado de injunção possui procedimento sumário (no sentido de célere), sem espaço para dilação probatória, até porque a causa de pedir é baseada na existência de direito constitucional subjetivo cujo exercício esteja inviabilizado em razão do descumprimento do dever constitucional de legislar, bastando prova documental ou documentada de que o impetrante é titular do direito, liberdade ou prerrogativa, bem como demonstração da respectiva inviabilidade de exercício em razão da omissão legislativa. Trata-se, pois, de documentos ad substantia, a serem apresentados em conjunto com a inicial, na forma do art. 283 e 396 do CPC; eventualmente, será possível complementação probatória a depender do caso concreto, que também deverá consistir em prova documental ou documentada, sempre visando a aceleração e compressão dos atos processuais.
Nesse sentido, oportuno transcrever as lições de Mazzei:
“No mandado de injunção, por aplicar – em adaptação – a Lei 12.016/09 (que ‘substituiu’ a Lei n.º 1.553/51 no mundo jurídico), ocorre a compressão dos atos processuais, seguindo via procedimental sumária, com agilidade no plano temporal.
Evitam-se no mandado de injunção dilações probatórias, devendo a prova documentada ser carreada desde logo com a peça vestibular. […]
Na verdade, tanto a prova documental, quanto a prova documentada propiciam o encurtamento dos atos processuais, com cognição probatória mais curta, em apego à essência da Lei 12.016/09. Bem é verdade que há risco da prova documentada não ser hígida ou incontroversa o suficiente, fazendo com que seja necessário reclamar a complementação probatória e, via de talante, causando embaraço. […]
De todo modo, fixa-se no mandado de injunção identidade com os processos documentais, expressão essa que deve ser lida como ação constitucional que deve ser nutrida de prova documental e/ou documentada” (in DIDIER JR, 2011, p. 219-220).
Os impetrados (órgão, entidade ou autoridade responsável pela situação de inconstitucionalidade e pessoa pública ou privada que sofrerá as consequências do regulamento provisório criado na sentença) assumem a condição de parte ré (e não simples informantes), e, por isso, deverão ser citados (e não meramente notificados), bem como deverão apresentar contestação (e não mero esclarecimento)[44]. Isso ocorre porque, em verdade, o denominado mandado de injunção é instrumento que tem por finalidade garantir o exercício de direitos e liberdades constitucionais ou prerrogativas, e, para tanto, tem por objeto a declaração da situação de inconstitucionalidade por omissão com a respectiva normatização provisória; verifica-se, assim, uma situação de conflito de interesses a ser solucionada pelo Judiciário.
Embora com outra justificativa, Ulderico Pires dos Santos também compartilha do entendimento de que os sujeitos passivos do mandado de injunção deverão integrar a relação processual por intermédio de citação, verbis:
“Ao contrário do que ocorre nos casos de mandado de segurança, em que os sujeitos passivos são notificados para prestar informações, no mandado de injunção entendemos que deverão ser citados por oficial de justiça, ou carta dos escrivães ou secretários. E assim deve ser porque, nesse caso, são chamados para se defender […]” (1988. p. 51).
Nesse diapasão, fica evidente a necessidade de oportunizar a defesa dos impetrados mediante citação e prazo para apresentação de defesa (10 dias a contar da citação). No ponto, cumpre esclarecer que no mandado de injunção, em regra, não cabe exceção de incompetência, tendo em vista que as regras de competência estão previstas na Constituição Federal, Constituição Estadual e CODJERJ, e, portanto, eventual incompetência será absoluta; bem como, não cabe reconvenção, não havendo qualquer pretensão por parte dos impetrados em face do impetrante que se pudesse fazer conexa com a ação principal ou fundamento de defesa, até porque essa modalidade de resposta não se coaduna com o procedimento sumário em que o processo de mandado de injunção se desenvolve. Ademais, embora os impetrados possam apresentar defesas indiretas e acostar documentos na contestação, “não haverá réplica, nem abertura de prazo de vista para as partes se pronunciarem sobre documentos apresentados pela autoridade pública, para não prejudicar a rapidez com que a ordem deve ser decidida” (SANTOS U.P., 1988, p. 78).
No que se refere à possibilidade de impetração de Mandado de Injunção Coletivo, remetemos o leitor ao item 2.3, onde tivemos a oportunidade de discorrer sobre a matéria. Aqui, apenas acrescentamos que o art. 334 do Novo Código de Processo Civil (Substitutivo Paulo Teixeira aprovado pela Câmara dos Deputados em 26 de março de 2014), trouxe inovação consistente na possibilidade de conversão da demanda individual em demanda coletiva, observados os requisitos legais[45], sendo passível de aplicação ao processo de mandado de injunção tão logo o referido diploma legal seja promulgado e ultrapasse o período de vacatio legis de 1 (um) ano a contar da data de sua publicação oficial (art. 1.058 do NCPC).
Quanto aos recursos cabíveis, vejamos as seguintes possibilidades:
1) Se o mandado de injunção for de competência de Vara de Fazenda ou Vara Cível nas Comarcas em que não há Vara de Fazenda, caberá apelação da sentença que indeferir a inicial (art. 10, parágrafo primeiro, primeira parte, da Lei 12.016/09) e da sentença que conceder ou denegar a ordem de injunção (art. 14, caput, da Lei 12.016/09); sendo que a sentença que conceder a ordem deverá ser submetida ao reexame necessário, aplicando-se, pois, o parágrafo primeiro do art. 14 da Lei 12.016/09 c/c art. 475, caput, do CPC[46]. Julgado o recurso no Tribunal, e esgotadas todas as instâncias[47], a decisão colegiada poderá ser atacada por recurso especial ou extraordinário (art. 18, primeira parte, da Lei 12.016/09), desde que revele alguma das hipóteses do art. 105, inc. III, ou art. 102, inc. III, da Constituição Federal, respectivamente[48]. Por sua vez, da decisão colegiada de provimento do recurso por maioria não cabe embargos infringentes, na forma do art. 25 da Lei 12.016/09[49].
2) Se o mandado de injunção for de competência de um dos Tribunais Estaduais, caberá agravo da decisão do Relator que indeferir a inicial (art. 10, parágrafo primeiro, in fine, da Lei 12.016/09)[50]; esgotadas todas as instâncias, a decisão colegiada poderá ser atacada por recurso especial ou extraordinário (art. 18, primeira parte, da Lei 12.016/09), desde que revele alguma das hipóteses do art. 105, inc. III, ou art. 102, inc. III, da Constituição Federal, respectivamente. Não caberá recurso ordinário para o Superior Tribunal de Justiça, por ausência de previsão constitucional[51].
3) Se o mandado de injunção for de competência do Superior Tribunal de Justiça, da decisão do Relator ou Presidente do Tribunal que indeferir a inicial caberá agravo regimental (art. 10, parágrafo primeiro, in fine, da Lei 12.016/09 c/c art. 258 do RISTJ), da decisão colegiada que conceder a ordem caberá recurso extraordinário (art. 18, primeira parte, da Lei 12.016/09), desde que revele alguma das hipóteses do art. 102, inc. III, da CRFB; bem como, da decisão que denegar o mandado de injunção, caberá recurso ordinário (art. 18, in fine, da Lei 12.016/09 c/c art. 103, inc. II, alínea a, da CRFB). Não caberá embargos de divergência, já que o mandado de injunção é julgado originariamente pela Corte Especial (art. 11, inc. III c/c art. 266, a contrario sensu, do RISTJ).
4) Se o mandado de injunção for de competência do Supremo Tribunal Federal, em regra, somente caberá agravo regimental da decisão do Relator ou Presidente do Tribunal que indeferir a inicial (art. 10, parágrafo primeiro, in fine, da Lei 12.016/09 c/c art. 317 do RISTF), tendo em vista que não haveria interesse jurídico para a interposição de qualquer outro recurso, já que o mandado de injunção é, em regra, julgado originariamente pelo Plenário (art. 5º, inc. V, do RISTF, por analogia). No entanto, se tratar de caso excepcional de julgamento de mandado de injunção por turma em única Instância (art. 9º, inc. I, alínea e, do RISTF – contra ato omissivo do Tribunal de Contas da União e dos Tribunais Superiores), em tese, caberá recurso extraordinário; mas não caberá embargos de divergência, pois se trata de ação originária em única instância e não recurso (art. 330 do RISTF). Quanto ao recurso de embargos infringentes, além da vedação expressa do art. 25 da Lei 12.016/09, o art. 333 do RISTF não prevê hipótese de cabimento do referido recurso para atacar decisão em mandado de injunção, não sendo, portanto, cabível esse tipo de recurso[52].
5) Nunca é demais lembrar que caberá embargos de declaração em todos os itens (1 a 4) e hipóteses acima mencionados.
Por fim, discute-se a possibilidade de medida liminar em sede de mandado de injunção. Parte da doutrina entende pelo cabimento, desde que haja possibilidade de dano irreparável enquanto se aguarda a decisão final[53], contudo a jurisprudência da Suprema Corte tem negado tal possibilidade.
Oportuno transcrever a seguinte ementa:
“MANDADO DE INJUNÇÃO – LIMINAR. Os pronunciamentos da Corte são reiterados sobre a impossibilidade de se implementar liminar em mandado de injunção – Mandados de Injunção nºs 283, 542, 631, 636, 652 e 694, relatados pelos ministros Sepúlveda Pertence, Celso de Mello, Ilmar Galvão, Maurício Corrêa, Ellen Gracie e por mim, respectivamente. AÇÃO CAUTELAR – LIMINAR. Descabe o ajuizamento de ação cautelar para ter-se, relativamente a mandado de injunção, a concessão de medida acauteladora” (STF. AC 124 AgR. Pleno. Relator(a): Min. MARCO AURÉLIO. Julgamento: 23.09.2004. Ementa. Acesso em 12 mar. 2014).
Ao nosso sentir, não haveria qualquer empecilho para o deferimento da medida liminar, desde que esta consista na suspensão de processos judiciais e/ou administrativos, à semelhança da medida prevista no art. 21 da Lei 9.868/1999; sendo certo que o art. 124, parágrafo único, do REGITJRJ prevê hipótese de agravo regimental da decisão que concede ou nega liminar em mandado de injunção, o que corrobora com o nosso entendimento.
3- Teorias sobre natureza da sentença e coisa julgada
3.1- Generalidades:
O estudo da eficácia da sentença definitiva em mandado de injunção tem por objetivo a verificação dos efeitos decorrentes do conteúdo da resolução do mérito da causa; sendo que cada teoria pretende fixar a natureza da sentença (classificação quanto ao conteúdo) e pontuar os efeitos daí decorrentes, assim como, algumas incluem, também, a análise dos efeitos da coisa julgada.
De acordo com os ensinamentos de Alexandre Freitas Câmara há distinção entre conteúdo e efeitos da sentença, verbis:
“A sentença definitiva (isto é, a sentença que contém resolução do mérito, aquela que dá uma definição ao objeto do processo) se classifica em três espécies segundo o seu conteúdo. Note-se, porém, que esta é uma classificação das sentenças de procedência do pedido, uma vez que a sentença que rejeita o pedido do autor (dita “sentença de improcedência” ou “de rejeição”) será, sempre, meramente declaratória da inexistência do direito afirmado pelo autor.
Assim sendo, distinguem-se quanto ao conteúdo das sentenças definitivas, três espécies: meramente declaratórias, constitutivas e condenatórias. Note-se que preferimos falar aqui em classificação das sentenças quanto ao seu conteúdo, e não quanto aos seus efeitos, como preferem alguns dos autores que adotam esta forma de distinguir as sentenças definitivas. Por esta razão, parece-nos de bom alvitre iniciarmos esta parte da exposição apresentando a diferença entre conteúdo e efeitos da sentença.
A sentença, como qualquer ato jurídico, tem um conteúdo, assim entendidas as notas essenciais que a distinguem dos outros atos jurídicos. Além disso, é a sentença, em tese, e também aqui como todos os atos jurídicos, suscetível de produzir efeitos no mundo do direito. Designa-se por eficácia esta aptidão para produzir efeitos. É certo que os efeitos de um ato jurídico guardam correspondência com o seu conteúdo, o que se dá por imputação. […]
O efeito, porém, não se confunde com o conteúdo do ato jurídico, uma vez que este se localiza dentro do ato, enquanto aquele é necessariamente extrínseco. Como muito bem dito por Barbosa Moreira, ‘conteúdo e efeito são entidades verdadeiramente inconfundíveis. Aquilo que integra o ato não resulta dele; aquilo que dele resulta não o integra” (Grifo Nosso. 2003, p. 437/438).
Dessa forma, as sentenças definitivas são classificadas, quanto ao seu conteúdo, em declaratórias, constitutivas e condenatórias[54]. Em verdade, o que determina a natureza do conteúdo da sentença de procedência é justamente a natureza do pedido, pois, em homenagem ao princípio da congruência (arts. 128 e 460 do CPC), o juiz não poderá proferir sentença de procedência de natureza diversa da pedida, de onde se extrai que a sentença de procedência está atrelada à pretensão do autor (objeto do processo), que por sua vez nada mais é do que o mérito da causa exteriorizado e delimitado no pedido constante da demanda. Portanto, é correto afirmar que “a decisão guarda intrínseca relação com a demanda que lhe deu causa. Há entre elas um nexo de referibilidade, no sentido de que a decisão deve sempre ter como parâmetro a demanda e seus elementos”. (DIDIER, 2012, p. 312).
Assim é que, v.g., a ação de divórcio tem natureza constitutiva, uma vez que o pedido do autor consiste na desconstituição da situação jurídica de casado (determinação da dissolução do casamento), cujo efeito é o rompimento do vínculo matrimonial e demais implicações que essa modificação jurídica pode gerar (extinção de direitos e obrigações entre as partes). Parece simples, até óbvio; entretanto, o pedido exteriorizado também deve guardar relação com a própria pretensão (porque aquele é manifestação desta – v. item 1.3). Do contrário, poderá ser considerado juridicamente impossível ou improcedente, a depender do caso concreto.
Com relação ao mandado de injunção, por se tratar de um remédio constitucional de garantia de direitos e liberdades constitucionais ou prerrogativas que estejam inviabilizados em razão de omissão regulamentar, para que a pretensão seja legítima e o pedido procedente, não pode esbarrar em outras garantias constitucionais tais como a separação dos poderes. Em razão desta peculiaridade, foram criadas diversas teorias que têm por objetivo delinear a essência do mandado de injunção a partir do conteúdo e efeitos da sentença, tais como, teoria da subsidiariedade, teoria da independência jurisdicional, teoria da resolutividade e teoria mista menor e maior[55], sendo que algumas incluem, também, a análise dos efeitos da coisa julgada, o que passaremos expor a seguir.
3.2- Teoria da subsidiariedade:
A teoria da subsidiariedade parte da premissa de que o mandado de injunção tem por essência a declaração de inconstitucionalidade por omissão, razão pela qual, para que a pretensão do impetrante seja legítima (pedido procedente) deve estar limitada à respectiva declaração e, consequentemente, a sentença tem conteúdo meramente declaratório, cujo efeito é a certeza de determinada situação jurídica[56]; no caso do mandado de injunção, é a certeza da situação de inconstitucionalidade decorrente da omissão regulamentar que inviabilize o exercício de direitos e liberdades constitucionais ou prerrogativas.
Para os adeptos desta teoria, cabe ao Judiciário tão somente declarar a inconstitucionalidade da ausência de norma regulamentadora e, por sua vez, cientificar o órgão, pessoa ou autoridade omissa de sua mora “legislativa” [57].
O Supremo Tribunal Federal, desde o julgamento dos primeiros mandados de injunção, e durante longo tempo, esteve afeito a este posicionamento, assumindo uma postura tímida diante deste remédio constitucional inédito, criado na Constituição Federal de 1988. No julgamento do MI 107 (leading case) – em que foi levantada questão de ordem para resolver diversas questões processuais e procedimentais, a depender da definição da natureza e significado do mandado de injunção – chegou-se à conclusão de que o Tribunal “deveria limitar-se a constatar a inconstitucionalidade da omissão e determinar que o legislador empreendesse as providências requeridas” (MENDES et all, 2009, p. 1.260).
Oportuno transcrever trecho da ementa do MI 107 QO, conforme a seguir:
“[…] é ação que visa a obter do poder judiciário a declaração de inconstitucionalidade dessa omissão se estiver caracterizada a mora em regulamentar por parte do poder, órgão, entidade ou autoridade de que ela dependa, com a finalidade de que se lhe dê ciência dessa declaração, para que adote as providências necessárias, à semelhança do que ocorre com a ação direta de inconstitucionalidade por omissão (artigo 103, par-2., da carta magna) […]” (STF. MI 107 QO-DF. Relator Min Moreira Alves. Pleno. Julgamento: 23.11.1989. DJ: 21.09.1990. Ementa. Acesso em 09 mar. 2014).
Como se vê, à época, a Suprema Corte conferiu natureza meramente declaratória ao conteúdo da sentença, cujo efeito era certificar a situação de inconstitucionalidade e comunicar a mora ao órgão competente para a edição da norma regulamentadora. No ponto, cumpre esclarecer que, embora alguns doutrinadores, diante dessa constatação em questão de ordem, afirmem que se trataria então de ação mandamental/sentença mandamental[58], ousamos discordar desse posicionamento, tendo em vista que os efeitos da declaração de inconstitucionalidade não ultrapassava o âmbito da certeza jurídica da referida situação, visto que não havia (pelo menos na época) qualquer sanção pelo descumprimento da ordem judicial de injunção, que tão somente servia para fins de cientificação da mora[59]. O STF admite – não obstante a natureza declaratória do mandado de injunção (MI 107 – QO) – que, no pedido constitutivo ou condenatório, formulado pelo impetrante, mas, de atendimento impossível, contenha o pedido, de atendimento possível, de declaração de inconstitucionalidade da omissão normativa, com ciência ao órgão competente para que a supra (cf. MI’s 168, 107 e 232).
A teoria da subsidiariedade foi alvo de muitas críticas, o que passamos a enumerar:
Primo, essa interpretação leva-nos a crer que o mandado de injunção teria a mesma finalidade da ação direta de inconstitucionalidade por omissão, de forma que o constituinte teria criado dois instrumentos idênticos, em dispositivos diversos, apenas havendo uma única distinção quanto à legitimidade.
Nessa linha de raciocínio crítico, destaca-se as precisas lições de Piovesan:
“Ora, faltaria qualquer razoabilidade ao constituinte se criasse dois instrumentos jurídicos com idêntica finalidade. A duplicidade de instrumentos jurídicos afastaria a logicidade e coerência do sistema constitucional, mesmo porque não haveria sentido em centrar a legitimidade ativa no caso de ação direta de inconstitucionalidade por omissão nos entes elencados nos incs. I a IX do art. 103 e, ao mesmo tempo, admitir a ampla legitimidade do mandado de injunção, que pode ser impetrado por qualquer pessoa, se ambos instrumentos apresentassem idênticos efeitos” (2003, p. 151).
Secundo, essa orientação leva-nos à conclusão de que o mandado de injunção, que deveria ser remédio constitucional contra a ineficácia de algumas normas constitucionais que dependem de regulamentação para serem efetivadas, por si só, seria destituído de eficácia social. Logo, estar-se-ia ignorando o princípio da máxima efetividade das normas constitucionais e, por conseguinte, qualificando o mandado de injunção como um instrumento “capenga”.
José Carlos Barbosa Moreira, ao criticar a teoria da subsidiariedade, utilizou expressão semelhante, ao mencionar que seria “reduzir a inovação a um sino sem badalo. Afinal, para dar ciência de algo a quem quer que seja, servia – e bastava – a boa e velha notificação” (Grifo Nosso. MOREIRA Apud. BARROSO, 2003, p. 263).
Tertio, o magistrado ao proferir uma sentença de procedência meramente declaratória cumpre a sua função jurisdicional à medida que satisfaz a pretensão autoral. Assim, por exemplo, na ação de investigação de paternidade, a sentença que declara a relação jurídica entre as partes, por si só, produz os efeitos almejados pelo autor, tais como, a inclusão do nome do genitor na certidão de nascimento, a condição de herdeiro quando do falecimento do genitor. Outro exemplo, na ação declaratória de inexistência de débito tributário, a sentença que declara a inexistência de relação jurídica entre o Fisco e o não-contribuinte também basta em si, produzindo o efeito de impedir ou deslegitimar qualquer cobrança. Não raro, tais ações, de cunho declaratório, são cumuladas (ou cumuláveis) com outras ações, de cunho constitutivo ou condenatório: no primeiro exemplo, geralmente é cumulada com ação de alimentos; no segundo exemplo, quando tiver ocorrido o pagamento ilegítimo do tributo, normalmente é cumulada com ação de repetição de indébito. Mas isso não significa que o conteúdo da declaração e os efeitos daí decorrentes não bastam em si, mas sim que, diante da declaração, o autor também almeja outros efeitos, próprios de uma constituição-desconstituição ou condenação.
Mutatis mutandis, no mandando de injunção a simples declaração de inconstitucionalidade por omissão e notificação do órgão, pessoa ou autoridade responsável pela regulamentação da norma não bastam para a solução da controvérsia. Não podemos conceber que o constituinte originário criou um mecanismo judicial que não se presta a exercer a finalidade jurisdicional. Por sua vez, não é possível cumular qualquer outra pretensão ao mandado de injunção, que possui procedimento próprio, em analogia à Lei de Mandado de Segurança.
Perfeita é a conclusão de Rodrigo Mazzei, ao criticar a teoria da subsidiariedade, verbis:
“Em nosso sentir, a presente teoria não absorve o espírito de garantia constitucional do writ, porquanto a declaração do estado de inércia – assim como a mera cientificação desse estado – não é apta a satisfazer a pretensão do autor prejudicado pela omissão legislativa. É por isso que afirmamos: segundo a teoria da subsidiariedade, o mandado de injunção pouco tem de mandado – já que apenas cientifica – e menos ainda tem de injunção – pois, a declaração que deveria ser injuntiva (concedendo a integração normativa), se limita a certificar o estado de inércia do órgão responsável” (in DIDIER JR, 2011, p. 228).
Por todo exposto, entendemos que a presente teoria não se coaduna com os fins pelos quais o mandado de injunção fora criado; sendo certo que a própria jurisprudência da Corte Suprema evoluiu nesse sentido.
3.3- Teoria da resolutividade:
A teoria da resolutividade é, atualmente, a mais aceita entre os doutrinadores e os Tribunais. E isso representa uma vitória. Explicando: desde a promulgação da Constituição da República Federativa do Brasil em 1988, e durante longo período, o embate principal entre os juristas era sobre a possibilidade ou não de se conceder efeitos concretos em conjunto com o reconhecimento da omissão legislativa, ou, em outras palavras, sobre a possibilidade de o Poder Judiciário assumir uma postura ativa e adotar solução normativa, vindo a proferir decisão a que o Direito italiano denomina sentença aditiva.
É certo que a Constituição brasileira possui caráter inegavelmente iluminista, em que o ser humano passa a ser o epicentro do sistema jurídico, isto é, o texto constitucional positivou princípios ligados aos valores da pessoa humana, com garantia de igualdade material, solidariedade e justiça social, bem como uma série de promessas políticas e sociais para implementação desses valores.
Convém esclarecer, no entanto, que a atual Constituição inaugurou o Estado Democrático de Direito, ao menos no que diz respeito à forma pela qual atualmente é visto (Estado pós-moderno com adoção de filosofia pós-positivista e concepção neoconstitucionalista) após longos 21 (vinte e um) anos de ditadura militar (1964-1985). Isso significa que no início de sua vigência a mentalidade jurídica da época ainda tinha muitos resquícios ditatoriais, inclusive, a composição da Suprema Corte continuou a mesma após a promulgação da Constituição atualmente vigente; motivo pelo qual, não é difícil concluir o porquê, inicialmente, a referida Corte mantinha reservas em adotar uma postura ativa no exercício de sua função jurisdicional, sobretudo no que se refere ao julgamento do mandado de injunção.
Contudo, com o decorrer do tempo, a composição do Supremo foi se modificando, passando a integrar juristas com uma mentalidade mais moderna e mais adequada aos ideais constitucionais; assim, foi somente a partir do julgamento dos Mandados de Injunção n.º 670, 708 e 712 (STF. MI 670-ES. Pleno. Min. Relator Maurício Corrêa. Min. Relator p/ Acórdão Gilmar Mendes. Julgamento: 25.10.2007. DJ: 31.10.2008.; STF. MI 708. Pleno. Min. Relator Gilmar Mendes. Julgamento: 25.10.2007. DJ: 31.10.2008 MI 712-PA. Pleno. Min. Relator Eros Grau. Julgamento: 25.10.2007. DJ: 31.10.2008; todos com acesso em 21 fev. 2014). que o Supremo Tribunal Federal passou a adotar a teoria da resolutividade, conferindo verdadeira efetividade ao mandado de injunção, da maneira como a grande maioria dos doutrinadores vinham há muito defendendo, da forma como os impetrantes verdadeiramente pretendiam ao ingressar com o referido remédio constitucional e, em última análise, da maneira como o próprio constituinte originário almejava ao prever essa garantia contra as omissões legislativas[60].
Nesse contexto, a presente teoria parte da premissa de que o mandado de injunção tem por essência tornar viável o exercício de direito subjetivo constitucional pendente de regulamentação no caso concreto. Faz-se necessário, portanto, não só a declaração de inconstitucionalidade por omissão, como também a respectiva normatização com efeitos inter partes. Assim, para os adeptos desta teoria, a sentença de procedência em mandado de injunção possui conteúdo constitutivo de uma nova situação jurídica, qual seja, a viabilização do exercício do direito subjetivo constitucional que passa a estar regulamentado, cujo efeito é a criação de direitos e obrigações decorrente dessa regulamentação, que se limitará às partes, sem extensão àqueles que, em tese, são titulares do direito constitucional subjetivo sub judice, mas que não participaram do processo.
Como defensora da teoria da resolutividade, Flávia Piovesan, citando Clèmerson Merlin Clève, esclarece o seguinte:
“A decisão proferida em mandado de injunção, nesta ótica, permite remover, no caso concreto, a inconstitucionalidade por omissão em matéria de direitos subjetivos constitucionais. Em outras palavras, no caso de lacuna inconstitucional, caberá ao Poder Judiciário criar norma de decisão para o caso concreto, dentro da teologia do sistema normativo existente, sendo-lhe vedado editar normas de regulação gerais e abstratas, como já analisado quando do exame da primeira corrente interpretativa. Como pontua Clèmerson Merlin Clève: ‘neste caso, o órgão jurisdicional não irá propriamente exercer função normativa genérica, mas, sim, possibilitar ao impetrante, caso mereça procedência sua pretensão, a fruição do direito não exercitado em falta da norma regulamentadora. A norma jurídica individual criada pelo Judiciário não seria diferente das normas jurídicas concretas veiculadas por qualquer decisão judicial. O papel do Judiciário, então, não seria o de legislar, mas o de aplicar o direito ao caso concreto, revelando a normatividade já inscrita no dispositivo constitucional, e removendo eventuais obstáculos à sua efetividade” (2003, p. 159).
Impende salientar que antes do julgamento dos mandados de injunção 670, 708 e 712 a grande controvérsia em voga consistia na possibilidade ou não de o Judiciário emitir solução normativa a partir da constatação da inconstitucionalidade por omissão, isto é, a dicotomia sobre a natureza da sentença em mandado de injunção ser declaratória ou constitutiva. E, assim, com o julgamento dos referidos mandados de injunção, quando pela primeira vez o Supremo Tribunal Federal regulamentou o direito de greve do servidor público, vozes se levantaram para sustentar que a Corte Constitucional, em evolução jurisprudencial, passou a adotar a teoria da resolutividade; por essa razão, é muito comum citar os referidos mandados de injunção para indicar a adoção da referida teoria pela Suprema Corte, o que não deixa de ser correto.
Entretanto, diante da leitura do inteiro teor do voto do ministro Gilmar Mendes designado relator para o acórdão no MI 670, não podemos deixar de atentar para o fato de que houve previsão de efeitos erga omnes para coisa julgada formada com o trânsito em julgado da sentença, e, justamente por isso, uma avalanche de reclamações em seguida ajuizadas; o que daria indícios de adoção da teoria da independência jurisdicional.
Passemos, então, a analisar a teoria da independência jurisdicional, cuja peculiaridade é justamente quanto aos efeitos da coisa julgada formada pelo julgamento de procedência em mandado de injunção.
3.4- Teoria da independência jurisdicional:
A teoria da independência jurisdicional parte da premissa de que o mandado de injunção tem por essência tornar viável o exercício de direito subjetivo constitucional pendente de regulamentação e suprir a respectiva omissão do ordenamento jurídico como um todo; para tanto, faz-se necessário não só a declaração de inconstitucionalidade por omissão, como também a respectiva normatização com efeitos erga omnes, como única forma de efetivamente acabar com a situação de inconstitucionalidade decorrente da omissão legislativa.
Dessa forma, para os adeptos desta teoria, a sentença de procedência em mandado de injunção possui conteúdo constitutivo de uma nova situação jurídica, qual seja, a viabilização do exercício do direito subjetivo constitucional que passa a estar regulamentado, cujo efeito é a criação de direitos e obrigações decorrente dessa regulamentação. Mas, além disso, argumenta-se que, por se tratar de regulamentação de direito subjetivo constitucional e efetivo suprimento da omissão, possui efeitos erga omnes; razão pela qual, a partir da essência do mandado de injunção, pretende-se fixar não só a natureza do conteúdo da sentença e seus respectivos efeitos, como também os efeitos da coisa julgada. Ou seja, conforme os comentários de Mazzei sobre essa teoria, “a decisão judicial se estenderia abstratamente até mesmo para aqueles que não pediram a tutela jurisdicional, substituindo assim, em todos os termos, o órgão responsável pela edição da norma faltante” (in DIDIER JR, 2011, p. 228).
Neste último aspecto é que a presente teoria sofre fortes críticas, pois, segundo seus opositores, a concessão de efeitos erga omnes à coisa julgada formada pela sentença definitiva de procedência em mandado de injunção afronta o princípio da separação dos poderes, à medida que a regulamentação criada na sentença assumiria caráter geral e abstrato típico de lei, motivo pelo qual o Judiciário estaria usurpando função legislativa. Nessa linha de raciocínio, vejamos os comentários de Piovesan:
“Também há que se considerar que atribuir ao Poder Judiciário a elaboração de normatividade geral e abstrata implica em afronta ao princípio da tripartição dos poderes, tendo em vista que a produção de norma geral e abstrata é atividade típica e própria do Poder Legislativo” (2003, p. 149)
Outra crítica realizada por seus opositores é no sentido de que, em se tratando o mandado de injunção de instrumento de declaração incidental de inconstitucionalidade, deve limitar-se à tutela do direito subjetivo, que se encontra violado no caso concreto, de tal sorte que os efeitos da coisa julgada decorrente da restauração desse direito subjetivo deverão atingir somente as partes envolvidas na lide. Assim, de acordo com os dizeres de Piovesan: “não condiz com a finalidade de um instrumento de tutela de direito subjetivo, o intuito de sanear vícios de ordem jurídica, ou seja, de direito objetivo” (2003, p. 149).
Permissa venia, embora não sejamos adeptos da teoria da independência jurisdicional, mas por adotarmos posicionamento bastante assemelhado, ousamos discordar das duas argumentações críticas acima mencionadas, pelos motivos que passamos a expor:
No que diz respeito ao princípio da separação dos poderes, entendemos completamente viável que a coisa julgada formada pela sentença de procedência em mandado de injunção produza efeitos erga omnes, sem que isso venha configurar usurpação de função típica do Legislativo. Isso porque, hodiernamente, a teoria da tripartição dos poderes de Montesquieu não mais pode ser vista como a completa separação entre as funções a serem exercidas pelos poderes, mas sim concebida dentro de um sistema de freios e contrapesos para garantir – além do controle recíproco como originalmente proposto pelo filósofo francês em sua clássica obra “Do Espírito das Leis” – a harmonia e a cooperação entre os poderes, em homenagem à teoria dos diálogos institucionais.
Oportuno transcrever as precisas lições de Hachem sobre a questão, conforme a seguir:
“Quanto aos argumentos dirigidos contra a admissibilidade de atribuição de efeitos erga omnes no mandado de injunção, em função da suposta violação ao princípio da separação dos poderes, espera-se ter deixado suficientemente assinalado que inexiste qualquer afronta ao ordenamento constitucional pátrio. Como visto, o Estado Constitucional reclama, para a garantia da normatividade da Constituição e da efetividade dos direitos fundamentais, uma postura judicial ativa, sempre que esta se fizer necessária para contrabalancear o silêncio transgressor dos demais poderes estatais. Só assim, se poderá assegurar o equilíbrio entre os poderes, pedra de toque da teoria de Montesquieu, e que no Estado brasileiro contemporâneo é acolhida através de um sistema de freios e contrapesos, onde há a cooperação entre os poderes, e não mais uma rígida separação (2012, p. 176).
Por sua vez, no que diz respeito ao fato de o mandado de injunção servir à tutela de direito subjetivo por intermédio de controle incidental, não significa que o Judiciário não possa conhecer da inconstitucionalidade como algo que afeta o ordenamento jurídico como um todo, sobretudo em casos concretos de repercussão geral[61]. Outrossim, o regulamento criado pelo Judiciário, embora assuma potencialidade abstrata decorrente do efeito erga omnes, com a lei não se confunde, uma vez que não possui a característica de permanência, sendo editado provisoriamente até que o responsável pela omissão edite a norma regulamentadora.
Verifica-se que o Supremo Tribunal Federal, em sua trajetória jurisprudencial, atualmente é tendencioso à aplicação da teoria da independência jurisdicional, conforme podemos extrair do trecho de recente voto do Min. Gilmar Mendes referente ao julgamento da omissão da lei regulamentadora de aviso prévio proporcional ao tempo de serviço, verbis:
“Interessante ressaltar, ainda, a extensão possível dos efeitos advindos de decisão em mandado de injunção. O que se evidencia é a possibilidade de as decisões nos mandados de injunção gerarem efeitos concretos não somente em razão do interesse jurídico de seus impetrantes, estendendo-os também aos demais casos que guardem similitude.
Assim, em regra, a decisão em mandado de injunção, ainda que dotada de caráter subjetivo, comporta uma dimensão objetiva, com eficácia erga omnes, que serve para tantos quantos forem os casos que demandem a concretização de uma omissão geral do Poder Público, seja em relação a uma determinada conduta, seja em relação a uma determinada lei.
No julgamento da medida liminar da Reclamação Constitucional n.º 6.200/RN, no exercício da Presidência do Supremo Tribunal Federal, deferi parcialmente o pedido de liminar, reforçando o entendimento dos efeitos erga omnes decorrentes da dimensão objetiva das decisões proferidas nos Mandados de Injunção nº 670/ES, n.º 708/DF e nº 712/PA, para sua aplicação direta em casos semelhantes em que se discuta o exercício do direito de greve pelos servidores públicos (Rcl 6200/RN, Rel. Min. Gilmar Mendes, decisão monocrática, DJ 6.2.2009)” (STF. MI 943-DF. Pleno. Min. Relator Gilmar Mendes. Publicação: 30.04.2013. Inteiro Teor. Acesso em 21 fev. 2014).
Por todo exposto, não vislumbramos qualquer óbice na aplicação dos efeitos erga omnes à coisa julgada da sentença em mandado de injunção; não perfilhamo-nos, porém, à teoria da independência jurisdicional em razão de partirmos de premissa distinta para a aplicação do referido efeito.
3.5- Teorias mistas:
Pelas teorias mistas, como a denominação já quer significar, há a conjugação de premissas de duas teorias em uma só, de tal sorte que na teoria mista menor há a adoção conjunta da teoria da subsidiariedade e resolutividade, bem como na teoria mista maior há a adoção conjunta da teoria da resolutividade e independência jurisdicional; esta última, objeto de nossa preferência.
3.5.1- Teoria mista menor:
A teoria mista menor parte da premissa de que o mandado de injunção tem por essência principal a declaração de inconstitucionalidade por omissão desde que esta seja efetivamente suficiente para sanar a situação de anormalidade. Assim, para que pretensão do impetrante seja legítima, deve ser materializada em um pedido principal, declaratório, e um pedido secundário, constitutivo. Consequentemente, o dispositivo principal da sentença tem conteúdo meramente declaratório, com prazo para que o órgão responsável elabore a regulamentação, e o dispositivo secundário da sentença tem conteúdo constitutivo, com a respectiva solução normativa; sendo que essa segunda parte do dispositivo da sentença somente produzirá efeitos, caso o órgão responsável não cumpra com o seu dever constitucional de legislar dentro do prazo fixado na primeira parte da sentença. Portanto, a parte constitutiva da sentença está sob condição suspensiva, qual seja, o não cumprimento da parte declaratória da sentença por parte daquele que tem o dever constitucional de regulamentar direitos e liberdades constitucionais ou prerrogativas.
Em duas situações específicas a Suprema Corte adotou esse posicionamento. No julgamento do MI 283, sobre o direito à reparação econômica aos impedidos de exercer sua profissão no período de ditadura militar na forma do art. 8º, parágrafo 3º, do ADCT (STF. MI 283-DF. Pleno. Min. Sepúlveda Pertence. Julgamento 20.03.91. DJ: 14.11.1991. Acesso em 04 abr 2014); e no julgamento do MI 232, sobre o direito de gozar da imunidade previdenciária prevista no art. 195, parágrafo 7º, da CRFB (STF MI 232-RJ. Pleno. Min. Relator Moreira Alves. Julgamento: 02.08.91. DJ: 27.03.1992. Acesso em 04 abr 2014). No primeiro caso, assinalou-se o prazo de 45 (quarenta e cinco dias) dias, acrescido de 15 (quinze) dias para a sanção presidencial, para que o Congresso Nacional exercesse o dever de legislar a matéria, e ultrapassado esse prazo, a faculdade de o impetrante obter a liquidação de sentença para averiguação do quantum debeatur a título reparatório. No segundo caso, assinalou-se o prazo de 6 (seis) meses para que o Congresso Nacional adotasse as providências legislativas decorrentes do art. 195, parágrafo 7º, da CRFB, e, ultrapassado esse prazo, o impetrante passaria a gozar da respectiva imunidade.
A partir desses julgados, verifica-se que o Supremo Tribunal Federal, ainda timidamente, sinalizava para a adoção de uma solução normativa, conforme podemos depreender dos comentários de Gilmar Mendes sobre a questão:
“Percebe-se que, sem assumir compromisso com o exercício de uma típica função legislativa, O Supremo Tribunal Federal afastou-se da orientação inicialmente perfilhada, no que diz respeito ao mandado de injunção.
As decisões proferidas nos Mandados de Injunção n. 283 (Rel. Sepúlveda Pertence), 232 (Rel. Moreira Alves e 284 (Rel. Celso de Mello) sinalizam para uma nova compreensão do instituto e a admissão de uma solução ‘normativa’ para a decisão judicial" (2009, p. 1.264).
Embora adepto da teoria da resolutividade, Mazzei não descarta a adoção da teoria mista menor, mas limita a sua aplicação aos casos em que regulamentação do direito subjetivo constitucional possua carga condenatória, com necessidade de cisão do processo para que, em caso de não cumprimento da primeira parte declaratória do dispositivo da sentença, a liquidação seja realizada pela via própria no juízo ordinário. Oportuno transcrever os seus ensinamentos nesse sentido:
“Assim, em nossa concepção, não prospera a teoria da subsidiariedade, devendo dar-se prestígio à teoria da resolutividade.
De toda sorte, não descartamos a posição mista (ou intermediária), que também foi destacada em nosso texto […]
O referido posicionamento (ainda que adote postura intermediária) propicia alguma efetividade ao mandado de injunção, fazendo que ele seja instrumento útil para combater a mora legislativa, mas de uma maneira que não congestione aquela Corte que, para tanto, repassaria para o Juízo competente a fixação concreta e individual dos limites da decisão judicial, através das ações de liquidação de sentença. Contudo, sua aplicação fica limitada às hipóteses em que a lei permite a liquidação da sentença, de modo que seria mais utilizada em situações em que a decisão tiver capítulos com cargas condenatórias” (in DIDIER, 2011, p. 250-251).
Temos algumas ressalvas quanto a essa vinculação da teoria mista menor aos casos em que envolver necessidade de liquidação de sentença, tendo em vista que não é esse o verdadeiro sentido dessa teoria; a prova disso, é que, em posteriores julgados referentes ao direito de reparação econômica na forma do art. 8º, parágrafo 3º do ADCT, o Supremo Tribunal Federal, prescindindo de qualquer condição, determinou que os afetados poderiam se dirigir diretamente ao juízo competente a fim de liquidar o montante indenizatório, o que demonstra adoção direta de solução normativa para o caso, ainda que haja necessidade de respectiva liquidação (vg. STF. MI 562-RS. Pleno. Min. Relator Carlos Velloso. Min. Relator p/ Acórdão Ellen Gracie. Julgamento 20.02.2003. DJ: 20.06.2003. Ementa. Acesso em 09.04.2014)[62].
Concluímos que a teoria mista menor não é a mais indicada, pois revela certo conservadorismo do Tribunal em solucionar de pronto a questão, afastando-se da realidade para a qual o mandado de injunção foi criado, de forma que, hodiernamente, a sua adoção configuraria um retrocesso.
3.5.3- Teoria mista maior:
A teoria mista maior parte da premissa de que o mandado de injunção tem por essência tornar viável o exercício de direito subjetivo constitucional pendente de regulamentação no caso concreto ou suprir a respectiva omissão do ordenamento jurídico como um todo, a depender da repercussão do direito a ser regulamentado; para tanto, faz-se necessário não só a declaração de inconstitucionalidade por omissão, como também a respectiva normatização, que terá efeitos inter partes ou erga omnes.
Dessa forma, para os adeptos desta teoria, a sentença de procedência em mandado de injunção possui conteúdo constitutivo de uma nova situação jurídica, qual seja, a viabilização do exercício do direito subjetivo constitucional que passa a estar regulamentado, cujo efeito é a criação de direitos e obrigações decorrentes dessa regulamentação. Mas, além disso, argumenta-se que, a depender da natureza do direito subjetivo constitucional a ser regulamentado, bastará que a coisa julgada produza efeitos inter partes para o efetivo cumprimento da finalidade injuncional, ou dependerá que a coisa julgada produza efeitos erga omnes para efetivo suprimento da omissão e, consequentemente, o cumprimento da finalidade do mandado de injunção. Isso porque existem direitos e liberdades ou prerrogativas que são bem específicos a determinado caso concreto, como por exemplo, imagine-se que um determinado templo venha a sofrer restrições impostas pela Administração Pública, mas sem que essa restrição de fato fosse ilegal (porque do contrário seria hipótese de mandado de segurança), poderá então impetrar mandado de injunção para que o disposto no art. 5º, inc. VI, da CRFB seja regulamentado, cuja proteção deverá ser tutelada individualmente. Por sua vez, existem direitos que, pela sua própria natureza, demandam uma tutela expansiva para todo o ordenamento jurídico, como por exemplo, em casos que envolvam consumidores (art. 150, parágrafo 5º, da CRFB), aposentadoria especial de servidor público de todas as esferas federativas (art. 40, parágrafo 4º, da CRFB), e até mesmo nos casos de greve dos servidores públicos (art. 37, inc. VII, da CRFB) [63].
Como podemos perceber, o que justifica a concessão do efeito erga omnes é a repercussão do direito constitucional subjetivo a ser analisado no caso concreto. Portanto, enquanto na teoria da independência jurisdicional impõe-se a concessão de efeitos erga omnes para a formação da coisa julgada em todos os casos, como única forma de conferir efetividade ao mandado de injunção, suprindo a omissão do ordenamento jurídico como um todo; na teoria mista maior, flexibiliza-se esse entendimento, na medida em que o efeito erga omnes somente deverá ser concedido na hipótese de estar presente o requisito da repercussão geral.
No ponto, cumpre esclarecer que o ordenamento jurídico pátrio passa pelo fenômeno de aproximação dos sistemas civil law e common law, circunstância que, de alguma forma, é conferido efeito vinculante aos precedentes judiciais, o que podemos identificar em diversos dispositivos legais e constitucionais, senão vejamos: art. 103-A da CRFB c/c Lei 11.417/2006, que trata da súmula vinculante; art. 518, parágrafo primeiro, do CPC, que trata da súmula impeditiva de recurso; art. 557, caput, do CPC, que trata das súmulas como fundamento de negativa de recurso; art. 285-A do CPC, que trata da sentença definitiva de plano em caso de improcedência; art. 553-C, do CPC, que trata do julgamento dos recursos repetitivos pelo Superior Tribunal de Justiça; art. 102, parágrafo 3º, da CRFB c/c arts. 543-A e 543-B do CPC, que trata da repercussão geral. Este último tema, é o fundamento principal da teoria da abstrativização do controle difuso e, por consequência, da teoria mista maior, que defende a possibilidade de concessão de efeitos erga omnes em casos de questões relevantes que ultrapassem os interesses subjetivos da causa.
Em certos casos há necessidade que a decisão do Supremo Tribunal Federal em mandado de injunção tenha também força vinculante, principalmente para que os demais órgãos do Poder Judiciário estejam adstritos também a ratio decidendi, como nos casos de aposentadoria especial, cuja competência legislativa é comum entre todas as esferas legislativas, e, consequentemente, a causa também poderá ser julgada pelos Tribunais Estaduais. Nesse contexto foi aprovada a Súmula Vinculante n.º 33 na Sessão Plenária de 09 de abril de 2014, com a seguinte redação publicada no Dje n.º 77 de 24 de abril de 2014 (p. 1) e DJU de 24 de abril de 2014 (p. 1): “Aplicam-se ao servidor público, no que couber, as regras do Regime Geral de Previdência Social sobre aposentadoria especial de que trata o artigo 40, parágrafo 4º, inciso III, da Constituição Federal, até edição de lei complementar específica”.
Por todo exposto, adotamos a teoria mista maior, por entendermos que é esta que mais se adequa à finalidade do mandado de injunção na condição de um remédio constitucional viabilizador de efetivo acesso à justiça, condizente com a sistemática de declaração incidental de inconstitucionalidade no atual contexto de abstrativização do controle difuso.
Conclusão
Após o estudo das premissas básicas, peculiaridades e delineamentos, e teorias sobre eficácia da sentença e coisa julgada em mandado de injunção, fechamos o presente trabalho com um resumo dos pontos principais e conclusões sobre cada item abordado, inclusive, levantando-se hipótese para estudo posterior.
No que se refere à origem, identificamos algumas similitudes no Direito inglês, norte-americano e alemão. No entanto, reconhecemos que o mandado de injunção, da forma pela qual foi concebido no Brasil de forma inédita pela Constituição de 1988, possui certas peculiaridades e requisitos próprios, motivo pelo qual não seria totalmente seguro tomar o ordenamento jurídico de outros países como paradigma.
Verificamos que o mandado de injunção tem natureza de garantia e remédio constitucional (ou, ainda, ação constitucional), à medida que é um instrumento processual que tem por objetivo assegurar direitos fundamentais inseridos na Constituição, cujo exercício esteja obstado em razão da ausência de norma regulamentadora.
Com relação ao objeto do processo de mandado de injunção, concluímos que se trata de pretensão processual de declaração da inconstitucionalidade da omissão com a respectiva regulamentação da norma constitucional, para a viabilização do exercício de direitos e liberdades fundamentais ou prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania (solução de um caso concreto), cujo conflito de interesses é caracterizado pela ausência de norma regulamentadora que inviabilize o exercício desses direitos e liberdades ou dessas prerrogativas, em que de um lado temos o suposto titular de um direito fundamental de eficácia limitada e, de outro, o sujeito ou órgão com o dever de editar a norma regulamentadora deste direito fundamental, supostamente em mora, e, ainda, o ente público ou privado com o dever de cumprir o mandamento constitucional regulamentado.
Quanto à causa de pedir, concluímos que a causa de pedir próxima do mandado de injunção é a falta de norma regulamentadora, capaz de inviabilizar o exercício de direitos e liberdades ou prerrogativas, podendo essa omissão ser total ou parcial; bem como, a causa de pedir remota é a existência de qualquer direito subjetivo constitucional pendente de regulamentação, incluindo-se os direitos prestacionais, desde que nos limites do mínimo social de garantia, podendo o dever constitucional de legislar estar previsto expressa ou implicitamente.
A competência para julgar mandado de injunção está expressamente prevista no art. 102, inc. I, Alínea q; art. 105, inc. I, alínea h, todos da Constituição da República; art. 121, parágrafo 4º, inc. V; e art. 125, parágrafo 1º, da Constituição da República c/c art. 161, inc. IV, alínea g, da Constituição do Estado do Rio de Janeiro. Trata-se, pois, de competência absoluta.
Com relação à legitimidade ativa, o mandado de injunção pode ser impetrado por qualquer pessoa – natural ou jurídica – ou até mesmo os chamados sujeitos processuais descritos nos incs. III, IV e V do art. 12 do CPC, desde que estejam na condição de titular de direito fundamental, cujo exercício esteja inviabilizado em razão da falta de norma regulamentadora. Outrossim, em se tratando de mandado de injunção coletivo, o writ poderá ser impetrado por pessoa, órgão ou entidade representante do grupo ou classe atingida com a mora legislativa. No ponto, cumpre esclarecer que o mandado de injunção é uma garantia instrumental que visa conferir efetividade aos direitos fundamentais, não podendo afastar a tutela de direitos coletivos, até porque, atualmente, verificamos o crescente fenômeno de reivindicações de índole social e a presença de demandas massificadas, o que acarretou a necessidade de “molecularização” dessas demandas como forma de otimizar o acesso à justiça e garantir a realização da justiça social por todos almejada. Ou seja, a Constituição de 1988 possui vários dispositivos voltados à declaração e tutela de direitos coletivos, de forma que o mandado de injunção, ao pretender garantir o exercício de direitos e liberdades ou prerrogativas, não poderá deixar de fazê-lo em âmbito coletivo.
Com relação à legitimidade passiva, filiamo-nos à terceira corrente, que entende que tanto o órgão, entidade ou autoridade com atribuição para a regulamentação dos direitos e liberdades ou prerrogativas, quanto à pessoa pública ou privada que suportará o ônus de eventual concessão da ordem de injunção, deverão participar da relação jurídica processual no polo passivo da demanda. De um lado, não há qualquer dúvida quanto à legitimidade da parte que suportará o ônus daí decorrente, pois os efeitos da sentença constitutiva atinge sua esfera patrimonial e/ou extrapatrimonial, a depender do Direito regulamentado. E, de outro lado, não há qualquer dúvida quanto à legitimidade da parte omissa, tendo em vista que qualquer sentença, até mesmo as constitutivas, possui parcela declaratória (no caso em tela o reconhecimento da omissão), sendo de bom alvitre que o órgão, entidade ou autoridade que detenha o dever constitucional regulamentar e responsável pela situação de inconstitucionalidade não figure apenas como uma espécie de amicus curiae para prestar esclarecimentos, mas sim como parte e com todos os poderes e ônus a ela inerentes, tais como, produção de provas (ainda que pré-constituídas), chamamento ao processo, reconhecimento da procedência do pedido com a respectiva edição da norma regulamentar, ou até mesmo podendo influir decisivamente na escolha dos parâmetros escolhidos pelo Judiciário para a elaboração do regulamento provisório.
Consequentemente, defendemos a necessariedade do litisconsórcio passivo no processo de mandado de injunção. Sobressai das regras de experiência comum que tanto aquele que é responsável pela situação de inconstitucionalidade, quanto aquele que terá a sua esfera de direitos atingida pelos efeitos da sentença, deverão participar do processo que tem por objetivo justamente sanar essa situação de inconstitucionalidade; motivo pelo qual, tanto um quanto o outro deverão ser incluídos no polo passivo, em respeito ao devido processo legal, ampla defesa e contraditório, consagrados no art. 5º, incs. LIV e LV da CRFB. Portanto, enquanto não seja aprovada e promulgada a lei que regulamentará o procedimento de mandado de injunção com expressa previsão de existência de litisconsórcio passivo necessário, quando ambos não forem indicados como réus pela parte autora, a integração deverá ser realizada por intermédio de intervenção iussu iudicis, com base em interpretação sistemática dos princípios e garantias processuais constitucionais acima mencionados, bem como, socorrendo-se do art. 107 do CPC italiano.
Quanto às normas procedimentais a serem aplicadas ao processo de mandado de injunção, a Lei 8.038/1990 (art. 24, parágrafo único) eliminou qualquer dúvida a respeito da questão, ao determinar expressamente a aplicação da Lei de Mandado de Segurança ao procedimento do mandado de injunção, no que couber. Assim, aplica-se a Lei 12.016/2009 no que se refere à petição inicial (art. 6º), no que se refere à citação e prazo de resposta (art. 7º), quanto ao recurso cabível nos casos de indeferimento da inicial (art. 10, parágrafo 1º), quanto ao ingresso de litisconsorte ativo após o despacho liminar positivo (art. 10, parágrafo 2º), quanto à intimação pessoal dos réus da sentença (art. 13), com relação ao recurso cabível da decisão que concede ou denega o writ impetrado em primeiro grau de jurisdição (art. 14) ou em única instância no Superior Tribunal de Justiça (art. 18), com relação à legitimidade ativa coletiva e os direitos a serem protegidos nesse tipo de demanda (art. 21 e 22), assim como no que se refere à impossibilidade de interposição de embargos infringentes e ausência de condenação em honorários advocatícios (art. 25).
Ainda quanto ao procedimento, ao nosso sentir, não há qualquer empecilho para o deferimento da medida liminar, desde que esta consista na suspensão de processos judiciais e/ou administrativos, à semelhança da medida prevista no art. 21 da Lei 9.868/1999; sendo certo que o art. 124, parágrafo único, do REGITJRJ prevê hipótese de agravo regimental da decisão que concede ou nega liminar em mandado de injunção, o que corrobora com o nosso entendimento.
Identificamos diversas teorias que têm por objetivo delinear a essência do mandado de injunção a partir do conteúdo e efeitos da sentença, tais como, teoria da subsidiariedade, teoria da independência jurisdicional, teoria da resolutividade e teoria mista menor e maior, sendo que algumas incluem, também, a análise dos efeitos da coisa julgada.
No que diz respeito ao princípio da separação dos poderes, entendemos completamente viável que a coisa julgada formada pela sentença de procedência em mandado de injunção produza efeitos erga omnes, sem que isso venha configurar usurpação de função típica do Legislativo. Isso porque, hodiernamente, a teoria da tripartição dos poderes de Montesquieu não mais pode ser vista como a completa separação entre as funções a serem exercidas pelos poderes, mas sim concebida dentro de um sistema de freios e contrapesos para garantir a harmonia e a cooperação entre os poderes, em homenagem à teoria dos diálogos institucionais.
Por entendermos que a teoria mista maior é a que mais se adequa à finalidade do mandado de injunção na condição de um remédio constitucional viabilizador de efetivo acesso à justiça, condizente com a sistemática de declaração incidental de inconstitucionalidade no atual contexto de abstrativização do controle difuso, passamos a adotá-la no presente estudo.
A referida teoria parte da premissa de que o mandado de injunção tem por essência tornar viável o exercício de direito subjetivo constitucional pendente de regulamentação no caso concreto ou suprir a respectiva omissão do ordenamento jurídico como um todo, a depender da repercussão do direito a ser regulamentado; para tanto, faz-se necessário não só a declaração de inconstitucionalidade por omissão, como também a respectiva normatização, que terá efeitos inter partes ou erga omnes. Assim, o que justifica a concessão do efeito erga omnes é a repercussão do direito constitucional subjetivo a ser analisado no caso concreto. Portanto, enquanto na teoria da independência jurisdicional impõe-se a concessão de efeitos erga omnes para a formação da coisa julgada em todos os casos, como única forma de conferir efetividade ao mandado de injunção, suprindo a omissão do ordenamento jurídico como um todo; na teoria mista maior, flexibiliza-se esse entendimento, na medida em que o efeito erga omnes somente deverá ser concedido na hipótese de estar presente o requisito da repercussão geral.
É curioso constatar que tão somente em 2007, no que diz respeito ao direito de greve, o Supremo Tribunal Federal conferiu a verdadeira destinação para a qual o mandado de injunção foi criado, e, ao mesmo tempo, desolador verificar que ainda hoje, em 2014, o Legislativo e o Executivo até então permanecem omissos com relação aos seus respectivos deveres constitucionais de ‘legislar’ sobre direitos e liberdades ou prerrogativas cujo exercício dependam de regulamentação. De toda sorte, por considerarmos que a sociedade está em permanente progresso, e, assim, também o Direito em constante evolução interpretativa, defendemos que novas situações irão surgir, principalmente no tocante aos direitos sociais de prestação material, enquadrados no que se entende por mínimo social, cujo rol tende a aumentar, v.g. o direito à educação, de forma que o mandado de injunção jamais perderá a sua finalidade, sempre se prestando a tutelar novos direitos subjetivos constitucionais que dependam de regulamentação para a viabilização de seu exercício.
Outrossim, o Estado Constitucional pós-modernidade incorporou uma série de valores políticos e sociais no texto constitucional, o que acarretou a juridicização dessas matérias, e, por conseguinte, a possibilidade de controle judicial de políticas públicas e das relações sociais. Portanto, o fenômeno da judicialização da política e das relações sociais decorre da própria Constituição, como forma de contrabalancear os poderes, e, no caso do mandado de injunção, como forma de conferir efetividade à norma constitucional pendente de regulamentação.
Diante dessa constatação, levantamos a seguinte hipótese: a judicialização da política fere o princípio da separação dos poderes? Com o objetivo de defender a constitucionalidade da judicialização da política, iniciaremos novos estudos, como complementação do presente, com o seguinte tema: “Judicialização da política no tocante ao mandado de injunção”. O referido tema será objeto de futura pesquisa.
Finalizamos nossas conclusões com a seguinte frase de Mahatma Gandhi: “De nada adianta a liberdade se não temos liberdade de errar”. E assim, humildemente, deixamos livre o espaço para críticas e debates, como a mais alta manifestação da democracia através da liberdade de expressão.
Mestranda em Direito Público e Evolução Social – Acesso à Justiça e Efetividade do Processo (UNESA-RJ). Especialista em Direito Processual Civil (PUC-RJ). Especialista em Direito (EMERJ). Professora Substituta de Direito Processual Civil da UFRJ. Advogada
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