Categories: ECARevista 121

O agir pedofóbico e suas consequências

Resumo: O presente estudo tem como objetivo precípuo o reconhecimento do agir pedofílico em nossa sociedade, além de suas consequências na vida do menor exposto a violência, procurando expor a temática de forma clara, fundamentando-a através de ensinos doutrinários e jurisprudenciais existentes.

Palavras-chaves: Pedófilo. Características. Crianças. Consequências.

Abstract: The present study has as main objective the recognition of pedophile act in our society, and their consequences on the child exposed to violence, seeking to expose the theme clearly the reasons for it through existing doctrinal and jurisprudential teachings.

Keywords: Pedophile. Characteristics. Children. Consequences.

Sumário: Introdução. 01. Características dos agentes portadores do transtorno da sexualidade – Pedofilia. 02. As consequências da prática pedofílica para as crianças vitimizadas. Conclusão.

Introdução

Consabido que a pratica da Pedofilia é considerada um desvio da sexualidade, e tais atos se manifestam em indivíduos que apresentam preferências sexuais por crianças.

Sua prática está alcançando altos patamares em nossa sociedade, vitimizando milhares de infantes, deixando-as com sérias sequelas psicológicas e físicas, das quais os acompanhará ao longo de sua vida se não conseguirem um acompanhamento clínico devido.

Desta forma e aprofundando-se com a sutileza necessária, iremos levantar questões altamente relevantes para contribuição da temática, tentando descrever as possíveis características dos indivíduos que cometem atos de pedofilia, além de entender que tipo de crianças são buscadas como “presas” ideais para o cometimento de tais atos criminosos.

Em último plano, destacaremos as possíveis consequências ocasionada às crianças vítimas de abuso sexual, que poderão ensejar desde traumas psicológicos, podendo ser tratado com o decorrer dos anos, até mesmo ao cometimento de suicídio, quando não superado, na fase adulta.

01. Características dos agentes portadores do transtorno da sexualidade – pedofilia.

Existem ainda muitas teorias a respeito do agir pedofílico, porém, ao contrário do que muitos possam vir a pensar, os indivíduos portadores dos transtornos trazidos pela pedofilia são pessoas difíceis de serem identificadas no seio de nossa sociedade.

Muito embora existam controvérsias, constatamos, por meio de pesquisa doutrinária realizada, que existem três características inerentes aos agentes pedofílicos, quais sejam:

“I. A pessoa possui intensa atração sexual, fantasias sexuais ou outros comportamentos de caráter sexual por menores de 14 anos de idade, ao longo de um período de, pelo menos, seis meses;

II. A pessoa decide realizar os seus desejos ou o seu comportamento é afetado por eles, e/ou tais desejos causam estresse ou dificuldades intra e/ou interpessoais;

III. A pessoa possui mais de 16 anos de idade e é pelo menos cinco anos mais velha do que a (s) crianças(s) citadas no critério I.”

Tais critérios elencados pelo Manual Diagnóstico e Estatístico de Desordens Mentais são de demasiada subjetividade, não podendo ser vistos de forma individual dentro do comportamento de uma pessoa com transtornos dessa natureza, razão pelo qual, dificulta o diagnóstico da patologia.

Para corroborara ao assunto, trazemos em destaque os ensinamentos do doutrinador Jorge Trindade (2010, p. 67), que esclarece um pouco mais sobre o comportamento dos pedófilos quando revela que: “como eles não possuem um jeito específico de ser, podem permanecer muito tempo num grupo ou numa comunidade sem que sejam reconhecidos”.

Acrescenta ainda o médico e doutrinador, Genival Veloso França (2011, p. 277) em seu livro de medicina legal que:

“A pedofilia é mais comum entre indivíduos do sexo masculino com graves problemas de relacionamento, na maioria das vezes por serem portadores de complexo ou sentimento de inferioridade. São quase sempre portadores de personalidade tímida, e que se sentem impotentes e incapazes de obter satisfação sexual com mulheres adultas. Geralmente são portadores de distúrbios emocionais que dificultam um relacionamento sexual normal.”

Desta forma e ao contrario sensu, podemos concluir que o indivíduo pedofílico não possui suas características bem delimitadas, por este motivo não podem ser identificados com facilidade dentro de um grupo social. Também não procuram ajuda médica psiquiátrica e nem psicológica, pois não reconhecem tal comportamento como um distúrbio da personalidade, já que não chega a incomodá-los, razão pela qual nos impede de tomar as medidas preventivas necessárias para combater o problema.

Por isso se segue o entendimento até dos profissionais da área de saúde, psiquiatras e psicólogos, que o indivíduo portador de distúrbios pedofílicos possui total ciência do ato ilícito do qual pratica. Afirma-se também que eles não sentem e não apresentam qualquer tipo de remorso ou culpa por tais práticas, pelo contrário, apresentam um comportamento frio.

Seguindo essa linha de raciocínio, afirma Jorge Trindade que os pedófilos geralmente não apresentam transtornos psiquiátricos, mas se caracterizam pela falta de empatia, baixa autoestima e desenvolvimento de dissonância cognitiva, o que seja: conflito de ideias, crenças ou opiniões incompatíveis. (2010, p. 47).

Para além da controvérsia apontada, apesar de não existir uma característica dominante que descreva e identifique ao certo os indivíduos portadores da pedofilia, estes traçam estratégias bem peculiares para conseguir a aproximação desejada com o menor e aliciá-los. Diante disso, Jorge Trindade revela que:

“Para terem sucesso na tarefa de aliciar crianças, os pedófilos apresentam-se como charmosos, simpáticos, compreensivos, úteis, atenciosos, afetivos, disponíveis emocionalmente e voltados para crianças e amigáveis com elas”. (2010, p. 25-26)

Aqueles indivíduos que sentem “amor por crianças”, costumam transparecer simpatia, ter carinho por elas e estarem sempre dispostos a dar a devida atenção de que os menores necessitam, por isso estão sempre envoltos de crianças, analisando seus comportamentos, para, na melhor ocasião, praticaram o crime de abuso sexual.

Em contrapartida, quando conseguem consumar o ato de abuso sexual, tentam justificar culpando as vitimas, fazendo-os acreditar que foram os causadores de seus próprios maus. Vejamos os relatos de Jorge Trindade ao tema:

“De um modo geral os abusadores sexuais costumam ser criativos ao desenvolver estratégias de atuação e de evitação. São habilidosos em acusar a própria vítima, em elaborar manobras de sedução, em construir alegações de circunstâncias especiais de justificação, em invocar falso remorso, em inverter a situação ou em produzir confrontações benéficas, artimanhas ou chantagens do tipo emocional, de culpabilização da vítima, de rechaço familiar, de estigmatização social e, em muitos casos, de ameaça física”. (2010, p. 27)

Vejamos por pertinência a posição de Sanderson que é de suma importância ao contexto, quando destaca um ponto bastante relevante sobre as características que envolvem os pedófilos, pois acredita ser este um predador sexual disfarçado de homem gentil, ou seja, em analogia ao “lobo em pele de cordeiro”.

E acrescenta ainda que o ser pedófilo possui o maior interesse em parecer normal e simpático e, então, se mistura no contexto social para evitar suspeitas. (2005, apud TRINDADE; BREIER, 2010, p. 25).

Daí a dificuldade de se identificar o indivíduo pedófilo, pois agem como pessoas aparentemente normais, aproveitando-se da ingenuidade e inocência do menor para ganhar sua confiança e amizade, no intuito de cometer os atos de abusos sexuais.

 De acordo com as descrições encontradas em artigo publicado pela revista Âmbito Jurídico, esses indivíduos pedófilos possuem uma constante negação sobre a culpabilidade de seus atos, que os conduz a deslegitimar a versão das vítimas, culpando-as por uma suposta sedução, a negar os fatos ou simplesmente seguir abusando delas sem que exista reprovação ou qualquer censura.

Essas são as características mais comuns presentes nos autores de delitos sexuais contra as crianças. Alegam, também, que os menores buscam, conscientemente a atividade sexual com o adulto e que consentem, explicitamente, as relações.

Na verdade, como já salientado, não existe um perfil único para descrever o sujeito pedófilo, mas afirma com propriedade Jorge Trindade que essa é uma condição multivariada, onde depende de inúmeros fatores, inclusive educacionais, institucionais e culturais. A personalidade do pedófilo costuma ser polimorfa e, geralmente, “os amantes das crianças” estão bem conscientes de suas ações e das consequências delas advindas. Não sentindo remorso, nem culpa pela prática de seus atos. (2010, p. 44).

Importante também salientar que os pedófilos tendem a escolher crianças que apresentem maior grau de vulnerabilidade, aproveitando-se da solidão que algumas delas possam vir a apresentar, da falta de confiança e, principalmente, da falta de supervisão parental, ao passo que, procuram preencher esse vazio e fazendo com que elas se sintam merecedoras de toda uma atenção especial, ganhando dessa forma sua inteira confiança, para, posteriormente, cometer o crime de abuso sexual.

Muitos procuram se inserir, através de uma aproximação, na família da possível vítima para conhecer a rotina desse grupo, tentando fabricar, por meio de dissimulações, uma intimidade, inclusive com o menor, ao ponto de ganhar sua confiança e amizade, e não despertando qualquer tipo de desconfiança por parte dos responsáveis legais ou qualquer outra pessoa.

Nesse diapasão, acrescenta Jorge Trindade (2010, p. 28), com total propriedade no assunto, que: “o pedófilo constrói essa rede criminosa pacientemente, de maneira consciente e detalhada, fio após fio, de modo que a criança não percebe a situação que está sendo tramada e como ela está sendo envolvida”.

Continuando nas lições de Jorge Trindade (2010, p. 29), destacamos a seguinte afirmativa:

“O pedófilo vai criando um ambiente aparentemente favorável para a vítima, um clima de segurança, de apoio e de disponibilidade para a criança, tornando-a ainda mais vulnerável, pois esse é o primeiro passo para que se inaugure o caminho do abuso, porque a criança não quer perder essa “amizade”.”

Fechando um parêntese e na perspectiva já sinalizada, sustenta-se que para ocorrer o abuso sexual contra crianças, este costuma se realizar por meios de enganos e manipulações. Aquele que sente “amor por crianças” aproxima-se do âmbito familiar do menor fazendo um estudo dos pontos considerados vulneráveis por ele daquele grupo, para, posteriormente, iniciar uma relação supostamente amigável com a criança que parece ser, psicologicamente, mais suscetível a sofrer interferência persuasiva, com a finalidade de cometer o ato ilícito do abuso sexual.

Nesse contexto, vale registrar, ainda, que ao contrário do que há muito se pensava, o pedófilo para conseguir consumar o ato criminoso do abuso sexual, dificilmente usa da violência física. Ele se aproveita da confiança que a criança deposita nele para tentar plantar na cabeça da vítima que a culpa do ato ilícito é exclusivamente dela, e que se seus genitores chegarem a descobrir o ocorrido, eles irão puni-la.  Isso deixa a criança fragilizada e por temer a reação dos pais, acaba não revelando os atos libidinosos, ficando inerte a situação.

Por outro lado, estima-se que quando os agentes pedófilos não conseguem atingir seus objetivos libidinosos, podem partir para violência física, perpetrando contra as crianças os mais variados tipos de agressões, podendo até chegar ao homicídio doloso.

Por causa de tais atitudes, acabam por muitas vezes apanhados pelas autoridades policiais e respondendo a processo penal pelo ato criminoso praticado.

Recolhemos aqui os ensinamentos de Jorge Trindade (2010, p. 30) sobre o tema em questão, quando ele afirma que:

“Outras vezes, perturbados em seus desejos, o pedófilo pode recorrer a atos de violência explícita em relação à criança ou àqueles que suscitaram a descoberta dos fatos. Quando isso acontece, normalmente se interrompe o silêncio que é imposto a vítima, mas os danos causados já foram graves.”

Falamos até o presente momento sobre as vítimas em potencial dos pedófilos, que são menores de idade, todavia, ainda não descrevemos seus pormenores, que desafia uma análise mais profunda.

Em verdade, são crianças que perecem ser mais frágeis, que possuem os aspectos mais infantilizados, ou seja, parecem demonstrar maior inocência, são verdadeiramente puras. Estas são as vítimas que mais sofrem abusos sexuais por parte desses agentes.

Ao contrário censo, aquelas crianças hipersexualizadas, que apresentam um comportamento precoce, não são alvos atrativos para a personalidade pedofílica, pois seu comportamento assemelha-se a de pessoas adultas, perdendo dessa forma seu atrativo para a prática sexual.

É relevante salientar que os atos de abuso sexual contra crianças podem ser praticados tanto por homens quanto por mulheres.

Apesar de existir registro de dados relacionados à pedofilia e ao abuso sexual, estes são imprecisos, pois muitos atos continuam encobertos pelo medo das consequências que podem vir com a revelação. Porém, chega-se à estimativa de que em cada cem casos relacionados, 20% (vinte por cento) desses sejam praticados por mulheres, e que elas possuem preferência por crianças abaixo de cinco anos de idade. Portanto, concluímos que tanto homens como mulheres são agentes perfeitamente capazes de praticar abusos de natureza sexual contra crianças (TRINDADE; BREIER, 2010, p. 67).

Percebemos em última análise que, os dados precisos e definitivos sobre o cometimento de abuso sexual infantil são geralmente muito difíceis de serem estatisticamente relacionados e agrupados, notadamente quando não se tem na nossa cultura a tradição de registros tão confiáveis. (TRINDADE; BREIER, 2010, p. 64)

Outro ponto a se avaliar é que a prática pedofílica não está só relacionada à consumação de atos de abuso sexual contra vulnerável, ela também pode caracterizar-se por meio de carícias maliciosas perpetradas pelo agente pedofílico, seja por meio de beijos, toques incestuosos na criança, ou, ainda, pela prática de masturbação na presença delas, configurando por si só o abuso infantil.

Por fim, segundo o Relatório Mundial sobre Violência e Saúde, as crianças também podem vir a serem vítimas de abuso sexual por agentes pertencentes ao mesmo ciclo familiar e não só por estranhos, e estes acabam apresentando características próprias de personalidade e comportamento, tal como a baixa autoestima, o controle deficiente de seus impulsos, problemas de saúde mental e até podem apresentar comportamentos antissociais. (2002, p. 67)

E ainda, os pais que praticam abuso contra seus filhos menores mostram irritação e perturbação maiores em respostas aos estados de humor e comportamento de seus filhos; são menos dedicados, afetuosos, brincalhões e compreensivos em relação aos menores, e são mais controladores e hostis.

Genival Veloso França afirma que quando existem indivíduos pedofílicos dentro do elo familiar, e estes possuem uma renda abaixo da média, os distúrbios quase sempre se apresentam acompanhados do uso de álcool e, em muitos casos, ocorrem contatos incestuosos envolvendo os próprios filhos, enteados ou parentes próximos. Na maioria dos casos, a criança é ameaçada, submetendo-se a esses atos e temendo represália do adulto. (2011, p. 277).

02. As consequências da prática pedofílica para as crianças vitimizadas.

Crianças que são vítimas de abusos sexuais por agentes com comportamento pedofílico carregam consigo marcas profundas por toda a vida, por este motivo necessitam de apoio e devem ser acolhidas por seus familiares para conseguirem superar momentos tão traumáticos.

Urge salientar que é dever do Estado e também de toda sociedade zelar pelo bem-estar de nossas crianças e adolescentes através de ações proativas, combatendo com rigor necessário o surgimento de novas vítimas, e aplicando sansões efetivas e urgentes em casos de crimes desta natureza.

Quando tomamos conhecimento de um crime destas proporções contra menores, as primeiras providências a serem tomadas são: submeter a vítima a exames médicos para obter novas provas da evidência do abuso, entrevistas psicológicas, contato com o serviço social, com o Conselho Tutelar, com a Polícia, com o Ministério Público e com a Justiça. Em casos mais graves, quando não se encontra outra forma de fazer cessar o abuso, e até que se reconstruam condições seguras e saudáveis de restabelecimento de convívio, a criança poderá precisar ser separada da família. (TRINDADE; BREIER, 2010, p. 83-84).

Contudo, afirma Genival Veloso de França, que existem certas manifestações exteriorizadas pela criança vítima de abuso sexual, que podem ser verificadas por meio de exame clínico (perícia medica), feito por profissional especializado na área.

Ressalta ainda que tais manifestações comportamentais devem ser perseguidas e levadas em consideração, pois, por meio delas, pode-se chegar a descoberta do ato criminoso. Vejamos alguns exemplos: mudança brusca de comportamento com relação aos amigos, medo de determinadas pessoas ou lugares, recusa a exame, resposta pronta e imediata negando ter sido tocada por adulto, o uso de expressões ligadas ao ato sexual, insinuações sobre práticas sexuais ou determinados indivíduos, entre outros tipos comportamentais. (VELOSO, 2011, p. 267),

Todavia, a manifestação de tais comportamentos pode estar relacionada também há outros fatores, e até com tipo de agressão sofrida, com a idade do agressor, com a idade da vítima, com duração e frequência do abuso sofrido, com o tipo de ato sexual praticado, com a relação existente entre a criança e o abusador, com a questão do uso da força ou da violência perpetrada pelo abusador, a reação trazida com a revelação do abuso por parte de familiares, etc.

Para corroborar como o assunto, vale destacar os ensinamentos de Jorge Trindade sobre algumas dessas consequências no comportamento infantil quando vitimizadas em sua liberdade sexual, quais sejam:

“A vítima pode apresentar condutas sexualizadas, conhecimento atípico sobre sexo, sentimentos de estigmatização, isolamento, hostilidade, desconfiança, medo, baixa autoestima, sentimentos de culpa, fracasso ou dificuldades escolares, precocidade sexual, transtorno de estresse pós-traumático (TEPT – DSM – IV – TR, 2002), dificuldades relacionais, especialmente com homens, pais e os próprios filhos, ansiedade, tensão, distúrbios alimentares, etc”. (2010, p. 82).

Noguerol acrescenta ainda que as consequências do abuso sexual contra crianças possam vir da forma de transtornos funcionais, como:

“Pesadelos, terrores noturnos, dificuldades de conciliar o sono, medo de escuro, enurese diurno-noturna, estranhamento. Como expressões de problemas de conduta, agressões físicas, choro fácil, retraimento, raiva, não querer se desnudar ou tomar banho, não querer fazer ginástica, e realizar desenhos sexualizados; na adolescência, fuga de casa, automutilação, consumo de drogas, roubos, antissociabilidade e delinquência; com dificuldades escolares, problemas de concentração, atenção e memória, etc.” (1997, apud TRINDADE; BREIER 2010, p. 82)

Acrescenta ainda o referido autor que a criança pode viver o abuso e não manifestar sinais de trauma, pois os sintomas, já há muito salientado, podem estar sendo sufocado pela família, ou somente vir a se manifestar tardiamente, quando adultos.

Portanto, tudo que não se exterioriza na infância, poderá ver-se projetado em permanentes passagens a atos da vida adulta, afirma Hirigoyen. (2002, apud TRINDADE; BREIER, 2010, p. 82).

Para corroborar ao tema, Alessandra Simões (2003), psicóloga clínica e de aconselhamento, por meio de artigo publicado no Boletim do Instituto de Apoio à Criança – IAC, vem destacar outras possíveis consequências que podem causar sérios problemas para quem é vítima de abuso sexual, são elas: pesadelo ou perturbações do sono; interesse especial pelo sexo, inapropriado para idade da criança; retorno à infância, inclusive a comportamentos típicos dos bebês; depressão, ansiedade, afastamento, tristeza, indiferença; auto-mutilação; tentativa de suicídio; fuga; problemas de álcool e ou drogas; problemas de disciplina ou atos delinquentes; atividade sexual precoce; problemas médicos como infecção urinária, dor pélvica ou hemorragia vaginal inexplicáveis e recorrentes; dores, inchaços, fissuras ou irritações na boca, vagina e ânus.

Há de se destacar também uma questão não menos importante de que os menores que possuem sua dignidade sexual molestada muitas vezes são revitimizados, ou seja, continuam sofrendo abusos por reiteradas vezes, e por temerem seus agressores e as consequências que podem advir com a revelação do ato criminoso, porque são ameaçadas, acabam permanecendo no ciclo doentio de sofrimento, pois não conseguem enxergar alternativa e se veem só.

Um estudo feito na cidade de Genebra, sobre o abuso infantil e suas consequências, pela Organização Mundial de Saúde no ano de 2002, mostrou que a debilitação da saúde causada por abuso infantil, constitui uma parcela significativa da carga global de doenças, dando uma maior atenção aos distúrbios psiquiátricos e comportamentos suicidas. (KRUG, 2002, p. 69).

Através dos dados fornecidos pela OMS, constatamos que atualmente existem evidências de que a maior parte das doenças encontradas nos adultos – inclusive cardiopatia isquêmica, câncer, doença pulmonar crônica, síndrome do intestino irritável e fibromialgia – estão relacionadas a experiências de abuso durante a infância. Os mecanismos aparentes para explicar estes resultados é a adoção de fatores de riscos comportamentais como o ato de fumar, o abuso do álcool, dieta alimentar deficiente e a falta de exercícios (KRUG, 2002, p. 69).

Ressaltando o que foi mostrado no Relatório Mundial sobre Violência e Saúde, as manifestações físicas, comportamentais e emocionais do abuso variam entre crianças, dependendo do estágio de desenvolvimento quanto à ocorrência do abuso e de sua gravidade, da relação entre o perpetrador e a criança, da duração desse abuso, e de outros fatores presentes no ambiente da criança (KRUG, 2002, p. 69).

E por fim, como são milhares os sintomas apresentados por vítimas de abuso sexuais, o que mais importa é sabermos e aprendermos a identificar quando uma criança está sendo vítima de abuso sexual, para tomarmos as providências cabíveis e necessárias que possam fazer cessar o ato criminoso e impedir com que essas crianças sejam revitimizadas.

Conclusão

Diante de todo o exposto, podemos concluir que muito embora a pedofilia se esconda dentro de um ambiente privado, o gesto pedofílico ultrapassa o nível do particular e invade o ambiente social, colocando-se no lado oposto do bem coletivo e dos interesses da sociedade.

O agir pedofílico agride toda a comunidade na medida em que o “outro” da relação é sempre um sujeito privado de anuência: a criança. (Trindade, 2010, p. 36).

Crianças vitimizadas por condutas pedofílicas carregam consigo duros traumas que podem perdurar ao longo de suas vidas, ocasionando transtornos psicológicos graves, que poderão levar até a morte se não descobertos e tratados inicialmente.

Como família, é nosso dever velar pela dignidade e respeito de nossos pupilos. Por outro lado, o Estado e a sociedade também possuem o dever-poder dado pela Constituição Federal de combater o crime de abuso sexual infantil que vitimiza milhares de inocentes. Por esta razão, consideramos de suma importância ações efetivas de combate à pedofilia, a pornografia infantil e a crimes de abuso sexual, dentro dos rigores da lei.

Assim, é mister destacar que o tema da pedofilia exige a soma de esforços de muitas instituições, da polícia, do ministério público e da justiça, das organizações governamentais e não governamentais, locais, estaduais, nacionais, estrangeiras e internacionais. Ademais, somente uma abordagem multidisciplinar pode fazer frente às questões científicas que a pedofilia, o sujeito pedofílico e suas vítimas suscitam. Nesse aspecto, tanto o direito quanto a psicologia e a sociologia estão sendo urgentemente convocados a integrarem um novo território epistemológico a serviço da pessoa humana, da saúde e da justiça. (Trindade, 2010, p. 71).

 

Referências
CASTRO, Joelíria Vey de; BULAWSKI, Cláudio Maldaner. O perfil do Pedófilo: Uma Abordagem da Realidade Brasileira. Boletim IBCCRIM. Revista Liberdades, nº 06, artigo 03, p. 52-73, jan. / abr. 2011. Disponível em: <http://www.revistaliberdades.org.br/>. Acesso em: 10 ago. 2011.
COUTINHO, Miguel. Pedofilia e Abuso Sexual de Menores. O que é pedofilia. Boletim do Instituto de Apoio à Criança – IAC. Lisboa/Portugal.  Separata n. 06, n. 68, abr. / jun. 2003. Disponível em: <http://www.iacrianca.pt/images/stories/pdfs/boletim/Separata68.pdf>. Acesso em: 06 out. 2010.
FELIPE, Jane. Afinal, quem é mesmo pedófilo? Instituto de Estudos de Gênero. Universidade Federal de Santa Catarina. Cadernos Pagu. v. 26 p. 201-223, jan. / jun. 2006. Disponível em: <http://www.ieg.ufsc/revista_detalhe_volume>. Acesso em: 05 out. 2010.
FORTE, Carlos. Crimes Ligados a Pedofilia – O que é Pedofilia? Associação Mineira do Ministério Público – AMMP Notícias. n. 34, p. 8-9, mar. 2011. Disponível em: <http://www.todoscontrapedofilia.ning.com>. Acesso em: 25 set. 2010.
FRANÇA, Genival Veloso de. Medicina Legal. 9 ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2011.
KRUG, Etienne G. et al. Relatório mundial sobre violência e saúde. Organização Mundial de Saúde. Genebra, 2002.
MENDONÇA, Delane Barros de Arruda. A pedofilia no direito penal brasileiro. Dissertação (Mestrado em Direito Publico) – Faculdade de Direito do Recife, Centro de Ciências Jurídicas da Universidade Federal de Pernambuco, Recife, 2007.
RODRIGUES, Willian Thiago de Souza. A pedofilia como tipo específico na legislação penal brasileira. Revista Âmbito Jurídico, Rio Grande, v. 59, nov. 2008. Disponível em: <http://www.ambitojuridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=5071>. Acesso em: 02 set. 2010.
SIMÕES. Alexandra. Pedofilia e Abuso Sexual de Menores. O Porquê do Silêncio… Boletim do Instituto de Apoio à Criança – IAC. Lisboa/Portugal.  Separata n. 06, n. 68, abr. / jun. 2003. Disponível em: <http://www.iacrianca.pt/images/stories/pdfs/boletim/Separata68.pdf>. Acesso em: 06 out. 2010
TRINDADE, Jorge; BREIER, Ricardo. Pedofilia: aspectos psicológicos e penais. 2 ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2010.
VADE Mecum. Estatuto da Criança e do Adolescente. 11ª ed. atual e ampl. – São Paulo: Saraiva, 2013.

Informações Sobre o Autor

Cecília Pinheiro Barbosa

Advogada. Graduada em Direito pela Faculdade Integrada do Ceará Fortaleza/CE. Nível Superior em Tecnologia da Informação e Marketing Estratégico


Equipe Âmbito Jurídico

Recent Posts

Prejuízos causados por terceiros em acidentes de trânsito

Acidentes de trânsito podem resultar em diversos tipos de prejuízos, desde danos materiais até traumas…

4 dias ago

Regularize seu veículo: bloqueios de óbitos e suas implicações jurídicas

Bloqueios de óbitos em veículos são uma medida administrativa aplicada quando o proprietário de um…

4 dias ago

Os processos envolvidos em acidentes de trânsito: uma análise jurídica completa

Acidentes de trânsito são situações que podem gerar consequências graves para os envolvidos, tanto no…

4 dias ago

Regularize seu veículo: tudo sobre o RENAJUD

O Registro Nacional de Veículos Automotores Judicial (RENAJUD) é um sistema eletrônico que conecta o…

4 dias ago

Regularize seu veículo: como realizar baixas de restrições administrativas

Manter o veículo em conformidade com as exigências legais é essencial para garantir a sua…

4 dias ago

Bloqueios veiculares

Os bloqueios veiculares são medidas administrativas ou judiciais aplicadas a veículos para restringir ou impedir…

4 dias ago