Nadja Aparecida Silva de Araujo[1]
Resumo: O trabalho apresenta um exame comparativo das regências legais das obrigações acessórias do regime tributário do contribuinte em contraponto com a disciplina do registro do comércio, a fim de tratar-se de repercussões processuais, especialmente em execução fiscal, do entendimento reiterado de que a publicidade atribuída ao arquivamento de atos societários em Junta Comercial teria eficácia erga omnes. Analisa-se especificamente o direcionamento do princípio da causalidade para fixação dos ônus sucumbencial na hipótese de descumprimento do dever tributário de atualizar dados cadastrais perante a Administração Tributária pelo contribuinte relacionado.
PALAVRAS-CHAVE: DIREITO TRIBUTÁRIO; OBRIGAÇÃO ACESSÓRIA; HIERARQUIA NORMATIVA; PUBLICIDADE DO REGISTRO DO COMÉRCIO.
Abstract: The paper presents a comparative review of the legal regencies of accessory obligations of the taxpayer’s in contrast to the discipline of trade registration, in order to deal with repercussions, in tax enforcement process, of the reiterated understanding that the publicity attributed to the filing of corporate acts in the Commercial Board would be effective erga omnes. Specifically, it analyzes the direction of the principle of causality to fix the succumbent damage regarding in case of non-compliance with the tax obligation to update registration data before the Tax Administration by the related taxpayer.
KEYWORDS: TAX LAW; ACCESSORY OBLIGATIONS; HIERARCHY OF RULES; TRADE REGISTRATION PUBLICITY.
Sumário: Introdução. 1. A obrigação tributária acessória na administração fazendária da era digital. 2. A obrigação tributária acessória do contribuinte de informar à Administração Fazendária alteração em seus dados cadastrais. 3. Repercussões processuais do descumprimento do dever do contribuinte de informar à Administração Fazendária alteração na estrutura empresarial. Conclusão. Referências.
Introdução
Na prática processual, é comum surgir exceção de pré executividade alegando ilegitimidade passiva ad causam de pessoa natural incluída no polo passivo da execução fiscal como corresponsável pelo crédito tributário exigido, por estar indicada no cadastro fazendário à época do fato gerador como administrador(a), sócio(a), representante legal da pessoa jurídica contribuinte. Em tal circunstância, constata-se que o contribuinte relacionado desatendeu ao dever tributário de manter atualizados os respectivos dados junto ao cadastro da Administração Fazendária, valendo-se da legislação regente do registro do comércio que atribui publicidade aos atos e documentos arquivados em Junta Comercial da circunscrição da sede empresarial. Ou seja, é entendimento comum e até mesmo adotado em decisões jurisprudenciais, ser suficiente o arquivamento do ato societário/empresarial na Junta Comercial local e despicienda a comunicação específica à Autoridade Fazendária.
Sabe-se que a informática permitiu a interligação entre os cadastros da Junta Comercial e o da Secretaria da Fazenda do Estado da sede empresarial, mas, a par disso, observa-se que, em geral, não há integração entre os bancos de dados do registro do comércio da matriz e o da Administração Fazendária interessada na circunstância local quanto a entidades empresariais inscritas como contribuintes em diverso(s) Estado(s). Então, nessa conjuntura, o lançamento tributário é feito com dados não correspondentes à realidade empresarial da época do fato gerador, inclusive apontando como corresponsáveis pelo crédito tributário pessoas naturais não integradas ao respectivo quadro societário naquele período.
Diante disso, analisa-se a questão na perspectiva do sistema tributário positivado, para construir uma interpretação das normas regentes da obrigação acessória, em geral atribuída ao contribuinte, de informar à Administração Fazendária, em prazo e modo estipulados, qualquer alteração referente a seus dados cadastrais e/ou quadro de sócios e administradores da pessoa jurídica vinculada, em contraponto à atribuição legal de publicidade ao arquivamento de atos empresariais no registro do comércio.
A importância da atuação do Particular na hodierna gestão administrativa dos tributos vem sendo desvelada há tempos, sendo de destacar-se a lição fundamental da Professora da Universidade Federal do Ceará, Denise Lucena Cavalcante:
“Enfocando a relação entre Fisco e cidadão-contribuinte em posição de igualdade e submissão à lei, resguardando somente a prevalência justificada do interesse público frente ao interesse privado, tem-se que a imposição tributária decorre não da mera soberania estatal, mas da ordem legal. Em outras palavras, o tributo deve ser pago não porque o Fisco está exigindo, mas porque a lei assim o determina. O Fisco tem o poder-dever de cobrar o tributo, e o cidadão-contribuinte o poder-dever de arrecadar – poder no sentido de ter a autorização e a possibilidade de efetuar tais atos. […]
Estes novos modelos de participação são bem visíveis na esfera da Administração Fazendária, que pouco faria hoje se não houvesse a colaboração efetiva do cidadão-contribuinte, que está cada dia mais comprometido com seus deveres fiscais, indo muito além do mero ato de pagar o tributo devido. O cidadão-contribuinte não é mais mero espectador e destinatário da norma tributária, mas, também, sujeito coadjuvante da própria imposição tributária.”[2]
Atualmente, a tecnologia da informação utilizada na administração fazendária está voltada, em boa parte, para o cumprimento de deveres tributários acessórios de prestação de informações por contribuintes, responsáveis tributários e terceiros, de modo que a Autoridade Fazendária – mais do que deslocar auditores fiscais até os estabelecimentos empresariais para vistoriar computadores, equipamentos, livros e documentação contábil – agora trata de analisar relatórios do monitoramento tecnológico das declarações enviadas periodicamente pelos Particulares para os bancos de dados da Administração Pública conectados à rede mundial de computadores, disso extraindo os suportes fáticos, econômicos e jurídicos da exigência fazendária, eventualmente formatando-a em lançamento tributário. E essas inovações na prática fazendária tem por suporte jurídico fundamental a dicção positivada no Código Tributário Nacional (CTN):
“Art. 147. O lançamento é efetuado com base na declaração do sujeito passivo ou de terceiro, quando um ou outro, na forma da legislação tributária, presta à autoridade administrativa informações sobre matéria de fato, indispensáveis à sua efetivação.
Art. 194. A legislação tributária, observado o disposto nesta Lei, regulará, em caráter geral, ou especificamente em função da natureza do tributo de que se tratar, a competência e os poderes das autoridades administrativas em matéria de fiscalização da sua aplicação.
Parágrafo único. A legislação a que se refere este artigo aplica-se às pessoas naturais ou jurídicas, contribuintes ou não, inclusive às que gozem de imunidade tributária ou de isenção de caráter pessoal.
Art. 199. A Fazenda Pública da União e as dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios prestar-se-ão mutuamente assistência para a fiscalização dos tributos respectivos e permuta de informações, na forma estabelecida, em caráter geral ou específico, por lei ou convênio.
Parágrafo único. A Fazenda Pública da União, na forma estabelecida em tratados, acordos ou convênios, poderá permutar informações com Estados estrangeiros no interesse da arrecadação e da fiscalização de tributos.”
Neste cenário da administração tributária de base tecnológica e ultra informatizada em conexão instantânea e cooperação com diversos segmentos da comunidade, importante agora renovar-se o olhar para esses dispositivos da Lei Geral Tributária, pois não se trata mais de simplesmente classificar[3] as modalidades do lançamento tributário (o lançamento por declaração do imposto de renda, como exemplo clássico da aplicação do Art. 147, CTN), fazendo-se necessário realinhar a interpretação dessas normas de regência da atividade e da comunicação entre atores da sociedade digitalizada, porque essa atuação externa produz efeitos na seara administrativa e, mais precisamente, na exigência que seja produzida a partir das informações recebidas no monitoramento dos dados enviados pelo contribuinte, responsável tributário ou por terceiro – por vezes, até formalizando um ‘lançamento de crédito tributário’. Por isso, firma-se como premissa deste estudo o entendimento de que as declarações enviadas periodicamente pelos Particulares se justificam no interesse de uma eficaz gestão administrativa dos tributos e terminam por condicionar[4] substancialmente o lançamento tributário que seja realizado posteriormente a partir da extração dos dados recebidos.
Nesse quadro, exsurge a figura da obrigação tributária acessória, imposta a Particular (contribuinte, responsável tributário ou terceiro), decorrente da legislação tributária e tendo por objeto as prestações, positivas ou negativas, nela previstas no interesse da arrecadação ou da fiscalização dos tributos, cuja inobservância deve ser sancionada com imposição de penalidade pecuniária (CTN, Art. 113, §§ 2° e 3°), vindo a doutrina desenhar os contornos desse direito posto:
“[…] essa obrigação tributária pretende que o sujeito passivo leve (consistente num fazer) ao conhecimento da pessoa competente (que figura no pólo ativo dessa relação jurídica) informações que lhe permitam apurar o surgimento de relações jurídicas de direito tributário material, de tal forma a instrumentalizar a atividade de arrecadação e de fiscalização de tributos, mas não apenas isso.
Pode essa norma jurídica obrigar que o sujeito passivo suporte (conduta humana de não fazer algo) a atividade de fiscalização efetuada pela pessoa competente, a teor do disposto no art. 196 do CTN, oportunidade na qual terceiros poderão ser intimados a prestar esclarecimentos sobre a pessoa fiscalizada de modo a permitir que o ente competente apure o eventual nascimento de obrigação tributária material (art. 197 do CTN).”[5]
A obrigação jurídica decorre do direito positivado, não sendo categoria lógica[6]. Disso se conclui, à evidência, ser necessário escrutinar o direito tributário positivado para perceber-se o desenho de obrigação tributária acessória estipulada para tal ou qual categoria de Particular envolvido em determinada circunstância com efeitos na seara tributária, já que será a normativa incidente na espécie que especificará exatamente a prestação a ser efetivada no interesse da atuação fazendária relacionada. Isso porque, por exemplo, as informações a serem enviadas por contribuinte diferem – na natureza, na periodicidade etc. – daquelas a serem prestadas por terceiro titular de registro de imóveis ou representante legal de administradora de cartões de débito/crédito[7]. Inclusive, na semântica restritiva que orienta a interpretação do direito tributário, reside a possibilidade de dispensa do Particular dos deveres acessórios de (não)realizar as prestações a ele imputadas no interesse da arrecadação/fiscalização dos tributos, pois a Lei Geral Tributária determina a interpretação literal para legislação tributária que disponha sobre dispensa do cumprimento de obrigações tributárias acessórias – Art. 111, III, CTN.
Disso se extrai outra premissa para este estudo: a obrigação tributária acessória deve ser materializada, ou dispensada, a partir dos exatos termos e limites positivados pelo sistema normativo tributário, mostrando-se ilegítimo em tal contexto uma interpretação extensiva, o emprego de analogia e, mais grave, a invocação de regra não tributária para disciplina do tema.
A partir da indicação na Lei Geral Tributária, Arts. 96; 113, § 2°, de que a obrigação tributária acessória decorre da legislação tributária, vê-se também o mesmo diploma legislativo já completar-lhe o sentido ao apontar os instrumentos normativos para a respectiva positivação: as leis, os tratados e as convenções internacionais, os decretos e as normas complementares que versem, no todo ou em parte, sobre tributos e relações jurídicas a eles pertinentes. Desse conjunto legislativo, são aqui destacados espécimes normativos que disciplinam, em sistemas jurídicos diversos, o dever instrumental em foco neste estudo:
“ALAGOAS– LEI Nº 5.900, DE 27 DE DEZEMBRO DE 1996
Art. 47 – O contribuinte é obrigado a comunicar as alterações dos dados cadastrais relativos a sua inscrição, a paralisação temporária e a cessação da sua atividade, na forma que dispuser a legislação.
Art. 50 […] § 11. As administradoras de cartão de crédito e/ou débito e as administradoras de “shopping center”, de condomínios comerciais e de empreendimentos semelhantes deverão, nos termos da legislação, informar ao fisco estadual:[…]
II – os dados relativos a bens, negócios, atividades ou outras informações que disponham a respeito dos contribuintes localizados no seu empreendimento, inclusive sobre valor locatício. (NR)* § 11 do art. 50, acrescentado pela Lei nº 6.846/07.”
“ESTADO DE SÃO PAULO – DECRETON° 45.490, DE 30 DE NOVEMBRO DE 2000
Artigo 25 – A transferência do estabelecimento a qualquer título, a mudança de endereço, a alteração de sócios, a suspensão ou encerramento das atividades do estabelecimento, bem como qualquer outra alteração dos dados anteriormente declarados (Lei 6.374/89, art. 19, na redação da Lei 12.294/06):
I – deverá ser comunicada à Secretaria da Fazenda, até o último dia útil do mês subseqüente ao da ocorrência, pelo contribuinte;
II – poderá ser promovida de ofício pela Secretaria da Fazenda, no interesse da Administração Tributária, nos termos de disciplina estabelecida pela Secretaria da Fazenda.
Parágrafo único – A transferência de titularidade do estabelecimento será comunicada tanto pelo transmitente quanto pelo adquirente.”
“UNIÃO FEDERAL (FAZENDA NACIONAL)– INSTRUÇÃO NORMATIVA RFB Nº 1.863, DE 27 DE DEZEMBRO DE 2018
DA ALTERAÇÃO DE DADOS CADASTRAIS
Art. 24. A entidade está obrigada a atualizar no CNPJ qualquer alteração referente aos seus dados cadastrais até o último dia útil do mês subsequente ao de sua ocorrência. […]”
Vê-se, portanto, que o dever instrumental do Particular de informar à Administração Tributária alterações fáticas e manter os respectivos dados atualizados no cadastro fazendário é regido, em segmentos jurídicos diversos, por lei, decreto, instrução normativa etc., com base, propriamente, na disciplina do Código Tributário Nacional na qualidade de lei complementar à Constituição de 1988, a qual dispõe que cabe à lei complementar estabelecer normas gerais em matéria de legislação tributária, especialmente sobre: obrigação, lançamento, crédito, prescrição e decadência tributários – Art. 146, III, b. Assim, em atenção à diretriz fundamental da Carta Constitucional, tratando a obrigação tributária acessória de temas relacionados com obrigação tributária, lançamento tributário e crédito tributário, a validade do dever instrumental em cada circunstância decorrerá desse entrelaçamento entre o respectivo diploma de regência detalhada (lei, decreto, instrução normativa etc.) com a Lei Geral Tributária.
Do rol de prestações positivas a serem materializadas por Particular no interesse da atividade fazendária, aqui se analisa o dever do contribuinte de informar à Administração Tributária qualquer alteração de seus dados jurídicos e econômicos para manter atualizado(s) o(s) cadastro(s) fazendário(s) a ele relacionado(s), tendo por contraponto a regência do registro público de empresas mercantis e atividades afins estabelecida pela Lei nacional n° 8.934, de novembro de 1994, a qual prescreve:
“Art. 61. O fornecimento de informações cadastrais aos órgãos executores do Registro Público de Empresas Mercantis e Atividades Afins desobriga as firmas individuais e sociedades de prestarem idênticas informações a outros órgãos ou entidades das Administrações Federal, Estadual ou Municipal.
Parágrafo único. O Departamento Nacional de Registro Empresarial e Integração manterá à disposição dos órgãos ou das entidades de que trata este artigo os seus serviços de cadastramento de empresas mercantis. (Redação dada pela Medida Provisória nº 861, de 2018)”
Vê-se como um problema no sistema jurídico o confronto circunstancial entre a disciplina do dever tributário instrumental do contribuinte em informar administrativamente as mudanças de seus respectivos dados cadastrais e uma lei ordinária – recentemente alterada por medida provisória – que positiva uma “desobrigação” às entidades empresariais de fornecer informações cadastrais à Administração Pública quando os mesmos dados tiverem sido apresentados à Junta Comercial competente ou ao Departamento Nacional de Registro Empresarial (atualmente integrado na estrutura do Ministério da Economia, Indústria, Comércio Exterior e Serviços). E, na prática cotidiana da Procuradoria Fazendária, esse regramento da Lei ordinária n° 8.934/1994 tem se destacado – em detrimento da normatividade da legislação tributária relacionada – vindo, inclusive, a jurisprudência apontar:
“Ementa PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO FISCAL. APELAÇÃO. LEGITIMIDADE DE PARTE PARA FIGURAR NO POLO PASSIVO DA AÇÃO. REQUISITOS AUSENTES. LIQUIDAÇÃO EXTRAJUDICIAL ARQUIVADA NA JUCESP. DISTRATO SOCIAL. DISSOLUÇÃO REGULAR DA SOCIEDADE. RECURSO IMPROVIDO.
– Conforme dispõe o art. 135, caput, do CTN, são requisitos para o redirecionamento da execução fiscal, a prática de atos com excesso de poderes ou a infração da lei, estatuto ou contrato social, revestindo a medida de caráter excepcional.
– Conforme a jurisprudência sedimentada de nossos tribunais, diz-se que a dissolução irregular da sociedade caracteriza infração a lei para os fins do estatuído no dispositivo em comento, salvo prova em contrário produzida pelo executado. É dizer, há, na espécie, inversão do ônus da prova, o que somente será afastada após a integração da lide do sócio com poderes de gestão.
– É também do entendimento jurisdicional pacificado no âmbito do E. Superior Tribunal de Justiça que com a alteração do endereço da empresa executada, quando atestada por certidão do Oficial de Justiça, sem a regular comunicação aos órgãos competentes há de se presumir a dissolução irregular.
– Assim, mister se faz examinar caso a caso a intercorrência de poderes de gestão do sócio a quem se pretende redirecionar a execução sob pena de lhe impingir responsabilidade objetiva não autorizada por lei, pelo simples fato de integrar o quadro societário. Nesse sentido, é de se esposar a tese no sentido de que para os fins colimados deve-se perquirir se o sócio possuía poderes de gestão, tanto no momento do surgimento do fato gerador, quanto na data da dissolução irregular. Isso porque, se o fato que marca a responsabilidade por presunção é a dissolução irregular não se afigura correto imputá-la a quem não deu causa.
– Na hipótese dos autos, a certidão do Oficial de Justiça de fl. 65 (21/06/2012), informa não ter encontrado bens do executado para proceder ao arresto, uma vez que a empresa executada estava fechada e sem movimentação de trabalho.
– Contudo, a executada arquivou junto à Junta Comercial do Estado de São Paulo – JUCESP em sessão do dia 02/08/2006 distrato social (fls. 70/71).
– Considerando o decidido por esta C. Turma e perfilhado pela E. Segunda Seção deste Tribunal nos autos dos Embargos Infringentes nº 0000262-23.2008.4.03.9999, adoto a tese de que, em casos como este, em que a executada averbou distrato social na Junta Comercial, dando publicidade ao ato e comunicando o órgão competente, deve-se presumir a inexistência de irregularidade no encerramento.
– Deve-se adotar o entendimento de que, embora o distrato social não exima a devedora do cumprimento de seu dever legal de pagar o tributo, que ainda pode ser cobrado, não justifica o reconhecimento da causa estabelecida no art. 135, III, do CTN, para o redirecionamento da cobrança em face do sócio, já que ele procedeu ao encerramento, presumidamente regular, e deu a devida publicidade a esse ato.
– Aplica-se ao caso a Súmula 430 do E. STJ, que dispõe que o mero inadimplemento da obrigação tributária pela sociedade não gera, per se, causa para responsabilização dos sócios gestores.
– Configurada a dissolução regular da empresa, incabível o redirecionamento do feito contra o espólio, como pretendido pela União, uma vez que não há notícia de falecimento dos sócios e estes, por sua vez, também não integram a lide executiva.
– A comunicação das alterações à JUCESP/SP confere a fé pública e a publicidade necessária que o ato exige, passando a ser oponível a terceiros, inclusive à União Federal. E, na hipótese, o distrato social foi comunicado e requerido à JUCESP/SP, conforme se extrai da ficha cadastral de fls. 70/71. Assim, reputa-se cumprida a obrigação acessória de atualização de dados perante a Fazenda Nacional.
– Apelação improvida.
Tipo Acórdão Número 0008777-09.2011.4.03.6130 00087770920114036130 Classe Ap – APELAÇÃO CÍVEL – 2223862 Relator(a) DESEMBARGADORA FEDERAL MÔNICA NOBRE Origem TRIBUNAL – TERCEIRA REGIÃO Órgão julgador QUARTA TURMA Data 21/02/2018 Data da publicação 19/03/2018 Fonte da publicação e-DJF3 Judicial 1 DATA:19/03/2018.” (Grifamos) [8] [9]
Essa decisão serve de parâmetro para este estudo por conter análise precisa do conflito entre as regências do sistema tributário e o do registro público das entidades empresariais. No caso, tratava-se de apelação da Fazenda Nacional interposta em face de sentença que declarou extinta a execução fiscal, por ausência de interesse superveniente, com fundamento no artigo 485, inciso VI, do Código de Processo Civil[10] e sem condenação em honorários advocatícios. Alegava a apelante, em síntese, o dever de o contribuinte prestar as informações necessárias ao Fisco e manter atualizada a respectiva situação cadastral. Aduziu que, não obstante a averbação do distrato social, a dissolução ainda era irregular e os sócios gerentes e/ou administradores seriam responsáveis pelos débitos tributários da empresa. Ademais, sustentava a possibilidade de prosseguimento da execução quanto ao espólio, nos termos do artigo 131, CTN. Pedia a reforma da sentença.
Como visto no acórdão transcrito acima, a solução jurisprudencial apontou naquele caso que a comunicação das alterações à Junta Comercial da circunscrição da matriz confere fé pública e publicidade ao ato empresarial, sendo por isso oponível a terceiros, inclusive ao Ente Público, de modo a considerar-se cumprida a obrigação tributária acessória de atualização de dados perante a Administração Fazendária.
Contudo, vislumbra-se nesse entendimento uma interpretação incompleta do regramento normativo incidente na circunstância, porquanto não analisado especificamente o confronto entre normas de segmentos jurídicos e hierarquias diversos, assim caracterizando uma inconsistência no sistema do direito positivo relacionado. Isso porque a obrigação tributária de manter atualizados os respectivos dados cadastrais junto à Administração Fazendária deve ser inserida no âmbito de normatividade da Lei Geral Tributária, especificamente quanto aos dispositivos dos Arts. 113, § 2°; 147, tratando-se, portanto, de matéria regida por lei complementar. E,
“sob o ponto de vista material, a lei complementar é a que tem por objetivo (conteúdo) a complementação da Constituição, quer ajuntando-lhe normatividade, quer operacionalizando-lhe os comandos [disso decorrendo que] a matéria das leis complementares é fornecida pela própria CF expressamente”[11].
À consideração do basilar princípio da hierarquia das normas, uma lei ordinária não deve ser aplicada para disciplinar matéria regida especificamente por lei complementar, pois “quando a lei complementar institui normas gerais [de direito tributário], ela se situa, na hierarquia normativa, entre a Constituição e a lei ordinária”[12]. Nesse sentido, é que a disciplina de obrigações tributárias imputáveis a microempresas e empresas de pequeno porte está positivada também por meio de lei complementar[13], que estabelece a regência específica do tema por esse tipo de instrumento normativo habilitado pelo vetor constitucional[14] do Art. 146, III, d – inclusive, quanto ao dever de arquivar as alterações empresariais junto a órgãos fazendários e de registro público, bem como, quanto à dispensa do cumprimento de obrigações tributárias acessórias[15]. Assim, nesse contexto, entende-se que as disposições da Lei n° 8.934/1994 são ineficazes para a pretendida “desobrigação” dos Particulares de informar ao Gestor Fazendário as alterações empresariais relacionadas, porquanto lei complementar nacional – hierarquicamente superior por disposição constitucional – normatiza o tema, a partir da regência da Constituição Republicana de 1988, Art. 146, III, b, d.
Portanto, a obrigação de natureza tributária de informar à Autoridade Fazendária as alterações na estrutura econômica empresarial (ou quaisquer outras que reverberem sobre obrigações tributárias ou lançamento de crédito tributário) persiste para o sujeito passivo (contribuinte ou responsável) e terceiro relacionado, mesmo que tenha havido a respectiva comunicação à Junta Comercial, simplesmente porque a Lei (ordinária) n° 8.934/1994 não tem validade/eficácia para dispor sobre obrigação e/ou lançamento de natureza tributária.
O dever instrumental do contribuinte de informar à Administração Fazendária, em prazo e modo indicados na legislação tributária, as inovações na organização empresarial tem importante repercussão no curso de execuções fiscais.
Sendo descumprida a obrigação tributária acessória, por exemplo, pela não atualização do endereço do contribuinte junto ao cadastro fazendário, é admitida a presunção de dissolução irregular da entidade empresarial, assim permitida a responsabilidade pessoal do gestor pelo crédito tributário em decorrência de infração da lei, com fundamento no Art. 135, III, CTN[16] e Súmula STJ 435. Se a desatualização dos dados cadastrais refere-se às pessoas naturais integrantes da estrutura societária ou do rol de gestores da entidade contribuinte, poderá ser apontado como corresponsável pelo crédito tributário quem já desincorporado do quadro societário da empresa à época do fato gerador, disso advindo questões sobre (i)legitimidade passiva ad causam e imputação dos ônus sucumbenciais pelo caso.
Vejamos.
“Art. 127. Na falta de eleição, pelo contribuinte ou responsável, de domicílio tributário, na forma da legislação aplicável, considera-se como tal:
I – quanto às pessoas naturais, a sua residência habitual, ou, sendo esta incerta ou desconhecida, o centro habitual de sua atividade;
II – quanto às pessoas jurídicas de direito privado ou às firmas individuais, o lugar da sua sede, ou, em relação aos atos ou fatos que derem origem à obrigação, o de cada estabelecimento; […]
Dessa regência de lei complementar à Constituição, observa-se que os dados para localização do contribuinte constituem-se como informação crucial à administração dos tributos, disso advindo a correlata obrigação tributária acessória ao Particular de informar, no prazo e modo estabelecido na legislação tributária, uma mudança do endereço empresarial. Assim, na circunstância em que a empresa que deixa de funcionar em seu domicílio tributário, sem informar a alteração à Administração Fazendária, está descumprindo o dever, positivado pela própria Lei Geral Tributária, de manter atualizado esse dado cadastral. E o gestor empresarial da época viola também, em paralelo, as regras específicas do direito privado/empresarial que estabelecem a obrigação de apresentar a mudança de endereço aos órgãos de registro do contrato societário ou estatuto, nos termos do Código Civil[18], Arts. 1.151, § 3°; da Lei Complementar n° 123, Art. 9°, caput (parte final), § 5°, quando se apresentar o contribuinte como microempresa ou empresa de pequeno porte; ou do Art. 158, da Lei n° 6.404/1976, tratando-se de sociedade por ações[19].
Certo é que a Administração Fazendária deve ter em seus bancos de dados o endereço atualizado do estabelecimento empresarial a todo tempo. Quando assim não acontece, ou seja, não sendo localizado o contribuinte em seu domicílio tributário indicado no cadastro fazendário, avultam indícios de dissolução irregular da empresa, vindo o Superior Tribunal de Justiça cristalizar o entendimento acerca da responsabilidade tributária do gestor em tal circunstância, como se destaca:
“Súmula 435
Presume-se dissolvida irregularmente a empresa que deixar de funcionar no seu domicílio fiscal, sem comunicação aos órgãos competentes, legitimando o redirecionamento da execução fiscal para o sócio-gerente.
Órgão Julgador PRIMEIRA SEÇÃO Data da Decisão 14/04/2010 Fonte DJE DATA:13/05/2010 RSTJVOL.:00218PG:00703”
Nesse quadro incide a regência do artigo 135, III, do CTN, assim positivando a responsabilidade da pessoa natural vinculada a contribuinte (administrador, diretor, representante legal) pela dívida tributária gerada em tal circunstância, porquanto o gestor empresarial que deixa de atualizar o domicílio tributário indicado ao cadastro fazendário comete infração à lei (tributária[20], civil[21], empresarial[22]) e ao contrato social/estatuto, violação legal essa que se distingue do mero inadimplemento crédito tributário – conforme dicção da Ministra Eliana Calmon[23] ainda na formação da posição jurisprudencial[24] cristalizada na Súmula STJ 435:
“[…] uma empresa nãopode funcionar sem que o endereço de sua sede ou do eventual estabelecimento se encontre atualizado na Junta Comercial e perante o órgão competente da Administração Tributária, sobpena de se macular o direito de eventuais credores, in casu, a Fazenda Pública, que se verá impedida de localizar a empresa devedora para cobrança de seus débitos tributários.
Isso porque o art. 127 do CTN impõe ao contribuinte, como obrigação acessória, o dever de informar ao fisco o seu domicílio tributário, que, no caso das pessoas jurídicas de direito privado, é, via de regra, o lugar da sua sede.
Assim, presume-se dissolvida irregularmente a empresa que deixa de funcionar no seu domicílio fiscal, sem comunicação aos órgãos competentes, comercial e tributário, cabendo a responsabilização do sócio-gerente, o qual pode provar não ter agido com dolo, culpa, fraude ou excesso de poder, ou ainda, que efetivamente não tenha ocorrido a dissolução irregular.
No direito comercial, há que se valorizar a aparência externa do estabelecimento comercial, não se podendo, por mera suposição de que a empresa poderia estar operando em outro endereço, sem que tivesse ainda comunicado à Junta Comercial, obstar o direito de crédito da Fazenda Pública.
Ainda que a atividade comercial esteja sendo realizada em outro endereço, maculada está pela informalidade, pela clandestinidade.
Assim, entendo presente indícios de dissolução irregular, e neste caso, é firme a jurisprudência desta Corte no sentido de que, nesta hipótese, não há que se exigir comprovação da atuação dolosa, com fraude ou excesso de poderes, por parte dos sócios, para se autorizar o redirecionamento da execução fiscal.
Necessário apenas que haja indícios da dissolução irregular.[…]”
E, neste ponto, reforça-se a posição de que essa regência do direito tributário do dever do contribuinte de informar à Administração Fazendária a mudança de seu domicílio tributário – esse que positivado, inclusive, mediante instrumento com caráter de lei complementar (o Art. 127, CTN) – mostra-se incompatível e, portanto, “deve prevalecer” sobre aquela indicação do Art. 61, da Lei ordinária n° 8.934/1994, cujo texto dispõe, em sentido diverso, uma “desobrigação” dos empresários de atualizar seus dados cadastrais perante os órgãos da Administração Pública.
Assim, nos processos de execução fiscal em que se estabeleça o confronto normativo – ou seja, quando presentes nos autos a prova do arquivamento no registro do comércio competente de alteração do endereço de estabelecimento empresarial (matriz ou filial), mas o contribuinte vinculado deixou de informar à Administração Fazendária do lugar a mudança, a tempo e modo estipulado na legislação tributária – entende-se que o descumprimento da obrigação tributária acessória caracteriza-se como infração específica à lei tributária (distinta do mero inadimplemento de crédito tributário devido) que demanda a aplicação do Art. 135, III, CTN, para a responsabilização pessoal pela dívida exequenda do gestor empresarial da época, esteja seu nome já indicado como corresponsável no título executivo (Art. 4°, caput, V, § 2°, da Lei das Execuções Fiscais[25]) ou mesmo que se faça necessário buscar o redirecionamento da execução fiscal para incluí-lo no polo passivo do feito.
Isso porque o descumprimento da obrigação tributária acessória de informar à Administração Fazendária as inovações havidas na estrutura empresarial, sendo condicionante da formalização de lançamento tributário materializado a partir dos dados cadastrais recolhidos na circunstância, resulta por ser, essa transgressão ao dever tributário, da mesma forma, a condicionante da formulação da execução fiscal com a inclusão do excipiente em seu polo passivo. Ou seja: entende-se que a ofensa à obrigação tributária acessória pelo contribuinte tem repercussão no processo executivo em decorrência do princípio da causalidade que orienta a imputação de ônus sucumbenciais.
Na clássica doutrina de Chiovenda, a parte sucumbente deve pagar as despesas processuais como ressarcimento ao vencedor para que esse, ao final do processo, possa receber o bem material pleiteado e veja restabelecida a situação econômica que teria caso o litígio não tivesse existido[26]. Nesse quadro, a sentença judicial deve prover para que o direito do vencedor não saia economicamente diminuído de um processo em que foi proclamada a sua razão. Contudo, a aplicação objetiva desse entendimento mostrou-se insuficiente, e até injusta em determinadas situações, de modo que o próprio Chiovenda traçou um temperamento à sucumbência pura e simples, a partir do critério da ‘evitabilidade da lide’, de modo a ser analisado se o sucumbente poderia abster-se do ato buscado mediante a lide, ou adaptar-se efetivamente à demanda, ou mesmo não ter ingressado com a demanda[27].
Outra vertente da processualística italiana, capitaneada por Carnelutti, vem apontar o princípio da causalidade como norte para o pagamento das despesas processuais, no sentido de haver justiça na atribuição dos custos a quem tornou necessário o serviço público da administração da justiça; também, por seu caráter oportuno, com vistas a tornar o cidadão mais cauteloso e ciente do risco processual que corre ao ajuizar uma ação[28]. Disso decorre a admissão doutrinária da responsabilização do próprio autor pelas despesas e honorários advocatícios quando, ainda que reconhecido como legítimo titular do direito pleiteado, tiver, desnecessariamente, escolhido a via judicial[29]. Nesse contexto, o Superior Tribunal de Justiça, há muito, fixou posição fundamental à aceitação jurisprudencial do princípio da causalidade como parâmetro de definição da responsabilidade pelas despesas processuais mediante a Súmula 303[30]: “Em embargos de terceiro, quem deu causa à constrição indevida deve arcar com os honorários advocatícios.”
Dessa forma, em determinados cenários, a jurisprudência tem destacado o princípio da causalidade para indicar como responsável pelo pagamento dos custos processuais a pessoa cuja atividade está vinculada ao ajuizamento da ação (com seus ônus econômicos), independentemente de essa ter-se saído vencedora ou sucumbente no desfecho do litígio.
Pois bem. Retornando ao nosso tema, relembre-se que a legislação tributária imputa a obrigação tributária acessória ao contribuinte, o qual deve informar à Administração Fazendária, no prazo e modo indicados, as alterações havidas na estrutura empresarial. Assim, vindo uma inovação no quadro societário de pessoa jurídica inscrita como contribuinte, caberá a esse ente cumprir com o dever tributário instrumental, mediante ato de seu representante legal. Importante aqui destacar-se que, em conformidade com os Arts. 109 e 110, CTN[31], o sistema tributário não dispôs a respeito da representação legal de entes inscritos como contribuintes para a prática regular do ato informativo ora estudado, de modo que a intermediação de pessoa natural na circunstância decorre unicamente da forma jurídica vista em cada caso[32].
Portanto, sendo constatada a falta de sociedade devedora-executada, a qual deixou de informar à Administração Fazendária alteração em seu quadro societário, entende-se que esse ilícito tributário vincula a pessoa jurídica (inscrita como contribuinte) à formatação do feito executivo em cujo polo passivo fora(m) incluído(s) o(s) respectivo(s) ex-diretor/administrador/representante legal. Nesse sentido, destaca-se a execução fiscal n° 0500723-61.2007.8.02.0041[33], cujo polo passivo fora inicialmente composto por sociedade anônima, contribuinte-devedora, e respectivos diretores da época do fato gerador, listados no cadastro fazendário, e incluídos como corresponsáveis pela dívida tributária exequenda, vindo em seu curso a ser proferida decisão nos seguintes termos:
“1. Trata-se objeção de executividade interposta por MARCOS ROBERTO TENÓRIO tendo por finalidade desconstituir o título executivo extrajudicial que instrui a presente ação de execução. […] Afirmou, ainda, que foi responsabilizado por dívida da executada, na qualidade de co-responsável tributário, ocorrida mais de dez anos após sua renúncia ao cargo de diretor de produção da Executada. […]
Considera-se essa decisão (interlocutória) como importante precedente[34] que reconhece a sociedade devedora-executada (e não a Fazenda Pública exequente) como a faltosa em sua obrigação tributária acessória e, por isso, causadora do ajuizamento das execuções fiscais em face de ex-diretor e, assim, responsável pelos prejuízos decorrentes do litígio, porquanto nela apontada a vinculação direta entre o ilícito tributário de omitir-se a contribuinte inscrita de informar à SEFAZ as alterações havidas no quadro societário com a inclusão do então excipiente no polo passivo da demanda. Inclusive, é válido destacar que a sociedade executada naquele caso alagoano, mesmo tendo sido regularmente citada, aproveitava-se, até então, do desvio procedimental instaurado pela exceção de pré executividade e que interrompera o andamento normal da execução, assim permanecendo formalmente inerte e silente, sem ter sofrido gravame econômico ou restrição de natureza jurídica ou patrimonial porquanto não houvera qualquer penhora, nem indisponibilização de bens ou direitos de pessoa alguma e o juízo executivo encontrava-se descoberto, sem garantia, havia mais de dez anos. Disso concluir-se que esse decisum mostra-se inteiramente imbuído do sentido propagado por Carnelutti acerca da causalidade ser princípio de justiça distributiva que “melhor se presta à fixação das despesas processuais, sem as amarras, por vezes insensíveis da sucumbência, pois há situações em que imputar ao vencido, pelo fato objetivo da derrota, o ônus do pagamento das despesas processuais e honorários, configura-se a mais profunda injustiça”[35].
Aliás, esse é também o sentido construído pela jurisprudência na formulação da Súmula STJ 303, impondo-se relembrar um dos entendimentos erigidos em pilar da corrente defensora da causalidade como parâmetro de definição da responsabilidade de pagar os custos processuais, em balizamento da aplicação pura e simples do princípio da sucumbência:
“Ementa EMBARGOS DE TERCEIRO. SUCUMBÊNCIA.
SE OS LOTES INDICADOS A PENHORA ACHAVAM-SE INSCRITOS NO REGISTRO DE IMÓVEIS EM NOME DA EMPRESA EXECUTADA, NÃO DANDO O EMBARGADO, POIS, CAUSA DE MODO OBJETIVAMENTE INJURÍDICO AOS EMBARGOS, DEVENDO-SE ANTES A CONSTRIÇÃO A DESÍDIA DO EMBARGANTE, QUE NÃO DILIGENCIOU A TRANSCRIÇÃO DOS TÍTULOS, NÃO LHE PODEM SER IMPOSTOS OS ÔNUS SUCUMBENCIAIS. A JUSTIFICATIVA DO PRINCIPIO DA SUCUMBÊNCIA ESTÁ NA CAUSALIDADE.
RECURSO NÃO CONHECIDO.
Processo REsp 70401 / RS RECURSO ESPECIAL 1995/0036217-1 Relator(a) MIN. COSTA LEITE (0353) Órgão Julgador T3 – TERCEIRA TURMA Data do Julgamento 11/09/1995 Data da Publicação/Fonte DJ 09/10/1995 p. 33560 RSSTJ vol. 24 p. 62 RSTJ vol. 76 p. 300.”
Nesse litígio decidido pelo STJ, a discussão tratava da responsabilidade pelos custos advindos dos embargos de terceiro porquanto, o terceiro-embargante, embora vencedor por ter alcançado a desconstituição da penhora de seus imóveis em execução ajuizada em face de outrem, não recebera provimento judicial concessivo de crédito pela sucumbência da parte exequente (que perdeu a garantia advinda da penhora então desfeita), à consideração de que fora a respectiva omissão/negligência do autor embargante no trato de seus negócios – já que não levara a registro a escritura de compra venda dos bens – que permitira a vinculação desse patrimônio à parte executada, a qual permanecia no registro imobiliário como titular dos terrenos penhorados.
Então, cotejando-se os pronunciamentos jurisdicionais do STJ e do Magistrado alagoano, constata-se que o fundamento para as duas aplicações da causalidade como norteador da responsabilidade pelos custos de processos com matérias de segmentos jurídicos diversos reside na omissão ilícita do contribuinte quanto à atualização dos dados cadastrais esses que apresentados na ação judicial na forma como o foram, exatamente pelo descumprimento do atinente dever tributário acessório pela devedora executada no primeiro caso (precedente específico para execuções fiscais), e a desatenção ao ônus negocial de providenciar registro e publicidade ao nome do comprador dos imóveis no segundo caso (referente a embargos de terceiro em execução comum).
Conclusão
No atual cenário da administração tributária baseada na tecnologia da informação, em conexão instantânea e cooperação com diversos segmentos da comunidade, a exigência tributária – eventualmente formalizada como ‘lançamento’ – que seja produzida a partir dos dados enviados por contribuinte, responsável tributário ou terceiro, surge condicionado, em sua essência, por essa atividade do Particular monitorado pelos agentes da tributação.
Mesmo na hodierna economia calcada na tecnologia de comunicação ultra veloz, a obrigação tributária acessória deve ser materializada, ou dispensada, a partir dos exatos termos e limites positivados pelo sistema normativo tributário, mostrando-se ilegítimo em tal contexto uma interpretação extensiva, o emprego de analogia e, mais grave, a invocação de regra não tributária para disciplina do tema. Isso, em atenção à própria disposição do Art. 146, III, b, da Carta Constitucional, que indica a lei complementar para disciplina dos temas atinentes à obrigação tributária, ao lançamento tributário e ao crédito tributário, de modo que a validade jurídica de uma obrigação tributária acessória decorre desse entrelaçamento entre o respectivo diploma de regência detalhada (lei, decreto, instrução normativa etc.) com a Lei Geral Tributária, assim caracterizado como tal o Código Tributário Nacional.
Vê-se como problema do sistema normativo tributário, a recorrente solução jurisprudencial indicativa de que a comunicação de alterações à Junta Comercial da circunscrição da matriz confere fé pública e publicidade ao ato empresarial, sendo por isso oponível a terceiros, inclusive ao Ente Público, de modo a considerar-se também cumprida a obrigação tributária acessória de atualização desses mesmos dados perante a Administração Fazendária.
A restauração da normalidade jurídica em tal circunstância demanda análise específica do confronto entre normas de segmentos e hierarquias diversos (direito tributário x direito privado; âmbito de normatividade da lei complementar x da lei ordinária), a fim de excluir-se essa inconsistência do sistema do direito positivo relacionado. Impõe-se destacar que a obrigação tributária de manter atualizados os respectivos dados cadastrais junto à Administração Fazendária é matéria regida por lei complementar, submetida às disposições do Código Tributário Nacional, Arts. 113, § 2°; 127; 147; e da Lei Complementar n° 123 (essa que disciplina especificamente os contribuintes que se apresentem como microempresas ou empresas de pequeno porte). Nesse segmento, a obrigação de natureza tributária de informar à Autoridade Fazendária as alterações na estrutura econômica empresarial (ou quaisquer outras que reverberem sobre obrigações tributárias ou lançamento de crédito tributário) persiste para o sujeito passivo e terceiro relacionado, mesmo que tenha havido a respectiva comunicação à Junta Comercial, simplesmente porque a Lei (ordinária) n° 8.934/1994 não tem validade/eficácia para dispor sobre obrigação e/ou lançamento de natureza tributária.
Sabe-se que os dados para localização do contribuinte constituem-se como informação crucial à administração dos tributos, disso advindo a correlata obrigação tributária acessória ao Particular de informar, no prazo e modo estabelecido na legislação tributária, uma mudança do endereço empresarial. Assim, na circunstância em que a empresa deixa de funcionar em seu domicílio tributário, sem informar essa alteração à Administração Fazendária, está descumprindo o dever, positivado pelo Art. 127, CTN, de manter atualizado esse dado cadastral. E o gestor da época viola também, em paralelo, as regras específicas do direito privado/empresarial que estabelecem a obrigação de apresentar a mudança de endereço aos órgãos de registro do contrato societário ou estatuto. Então, não sendo localizado o contribuinte em seu domicílio tributário indicado no cadastro fazendário, avultam indícios de dissolução irregular da empresa, vindo o Superior Tribunal de Justiça cristalizar o entendimento acerca da possibilidade de responsabilização tributária do gestor em tal circunstância, assim indicando na Súmula 435 os critérios para aplicação do Art. 135, III, CTN – esteja seu nome já indicado como corresponsável no título executivo ou mesmo que se faça necessário buscar o redirecionamento da execução fiscal para incluí-lo no polo passivo da demanda.
Outrossim, entende-se que a ofensa à obrigação tributária acessória pelo contribuinte tem repercussão no processo executivo em decorrência do princípio da causalidade que orienta a imputação de ônus sucumbenciais. Assim, no caso em que constatada a falta de pessoa jurídica devedora-executada, a qual deixou de informar à Administração Fazendária alteração em seu quadro societário, entende-se que esse ilícito tributário vincula a pessoa inscrita como contribuinte com a causa do ajuizamento do feito executivo em cujo polo passivo fora(m) incluído(s) o(s) respectivo(s) ex-diretor/administrador/representante legal, de modo que o princípio da causalidade deve ser o vetor de definição do sujeito obrigado ao pagamento das verbas sucumbenciais a vencedor excluído da demanda mediante declaração de ilegitimidade passiva ad causam em exceção de pré executividade ou embargos à execução fiscal: nessa hipótese, indicando o contribuinte faltoso como o responsável para suportar os ônus da sucumbência – em conformidade com exemplos jurisprudenciais indicados.
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[1] Procuradora do Estado de Alagoas. Mestre em Direito Público (UFPE). nadja.asaraujo@gmail.com
[2] (CAVALCANTE, 2004, p. 30).
[3] Cf. (DE SANTI, 2001, p. 215-216): “Na classificação empreendida pelo CTN, o critério empregado dirigiu-se ao ato-fato administrativo, mais precisamente ao fato da conformação do procedimento. Trata-se de classificação que considera seus pressupostos, i.é, os atos e fatos que conformam o ato-fato, como fato jurídico fonte do ato-norma. Classifica o processo, alcançando, indiretamente, o produto desse processus: o ato-norma administrativo de lançamento. Apercebeu disso Paulo de Barros Carvalho, asseverando que a “fonte da tricotomia reside no índice de colaboração do administrado, com vistas à celebração do ato”. O Código Tributário Nacional classificou o ato-norma em função do ato-fato. Assim, os “lançamentos” por declaração e de ofício exigem a participação do agente público competente, para prática daqueles atos-fatos necessários para preencher os respectivos suportes fácticos, em conformidade com o esboço do art. 142. Algo distinto ocorre, entretanto, nos chamados “lançamentos por homologação”. Nestes, o crédito apresenta-se formalizado independentemente de qualquer ato-fato administrativo; sem prescindir, entretanto, como veremos, de norma individual e concreta de similar estrutura àquela da relação jurídica intranormativa do ato-norma administrativo de lançamento tributário.”
[4] Cf. (XAVIER, 2001, p. 177): “[…] os atos pressupostos […] reentram num grupo de fatos que, genérica e talvez impropriamente, se podem designar como “condições” do lançamento, por se integrarem na cadeia dos fatos antecedentes, revestindo até na generalidade dos casos a característica de a sua realização apenas se justificar com vista a que de futuro o lançamento venha a ser praticado. […] os atos pressupostos são atos de qualificação jurídica de situações, cuja verificação a lei reputa indispensável para que o lançamento se possa praticar, ou se possa praticar de certo modo.”
[5] (ZOCKUN, 2005, p. 119).
[6] Cf. (BORGES, 2001, p. 38): “[…] é ao direito posto que incumbe definir os requisitos necessários à identificação de um dever jurídico qualquer como sendo um dever obrigacional. Significa dizer: a obrigação é definida, em todos os seus contornos, pelo direito positivo.”
[7] Vide o CTN, Art. 197. Mediante intimação escrita, são obrigados a prestar à autoridade administrativa todas as informações de que disponham com relação aos bens, negócios ou atividades de terceiros: I – os tabeliães, escrivães e demais serventuários de ofício; II – os bancos, casas bancárias, Caixas Econômicas e demais instituições financeiras; III – as empresas de administração de bens; IV – os corretores, leiloeiros e despachantes oficiais; V – os inventariantes; VI – os síndicos, comissários e liquidatários; VII – quaisquer outras entidades ou pessoas que a lei designe, em razão de seu cargo, ofício, função, ministério, atividade ou profissão. Parágrafo único. A obrigação prevista neste artigo não abrange a prestação de informações quanto a fatos sobre os quais o informante esteja legalmente obrigado a observar segredo em razão de cargo, ofício, função, ministério, atividade ou profissão.
[8] No mesmo sentido e com idênticos fundamentos, o Acórdão Número 0003443-64.2015.4.03.6126 00034436420154036126 Classe Ap – APELAÇÃO CÍVEL – 2231468 Relator(a) DESEMBARGADORA FEDERAL MÔNICA NOBRE Origem TRIBUNAL – TERCEIRA REGIÃO Órgão julgador QUARTA TURMA Data 18/10/2017 Data da publicação 08/11/2017 Fonte da publicação e-DJF3 Judicial 1 DATA:08/11/2017.
[9] No processo n° 0008777-09.2011.4.03.6130, posteriormente, foram julgados embargos de declaração com efeitos infringentes pelo saneamento de omissão, assim alterando o resultado do caso no sentido de redirecionar a execução fiscal em face dos sócios remanescentes, mas sem tratar da questão central analisada neste estudo.
[10] LEI Nº 13.105, DE 16 DE MARÇO DE 2015. Art. 485. O juiz não resolverá o mérito quando: […] VI – verificar ausência de legitimidade ou de interesse processual; […]
[11] (COELHO, 1999, p. 287-288).
[12] (ÁVILA, 2004, p. 131).
[13] LEI COMPLEMENTAR Nº 123, DE 14 DE DEZEMBRO DE 2006. Art. 1° Esta Lei Complementar estabelece normas gerais relativas ao tratamento diferenciado e favorecido a ser dispensado às microempresas e empresas de pequeno porte no âmbito dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, especialmente no que se refere: I – à apuração e recolhimento dos impostos e contribuições da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, mediante regime único de arrecadação, inclusive obrigações acessórias; II – ao cumprimento de obrigações trabalhistas e previdenciárias, inclusive obrigações acessórias; […]
[14] CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL DE 1988. Art. 146. Cabe à lei complementar: […] III – estabelecer normas gerais em matéria de legislação tributária, especialmente sobre: […] d) definição de tratamento diferenciado e favorecido para as microempresas e para as empresas de pequeno porte, inclusive regimes especiais ou simplificados no caso do imposto previsto no art. 155, II, das contribuições previstas no art. 195, I e §§ 12 e 13, e da contribuição a que se refere o art. 239.
[15] LEI COMPLEMENTAR Nº 123, DE 14 DE DEZEMBRO DE 2006. Art. 9° O registro dos atos constitutivos, de suas alterações e extinções (baixas), referentes a empresários e pessoas jurídicas em qualquer órgão dos 3 (três) âmbitos de governo ocorrerá independentemente da regularidade de obrigações tributárias, previdenciárias ou trabalhistas, principais ou acessórias, do empresário, da sociedade, dos sócios, dos administradores ou de empresas de que participem, sem prejuízo das responsabilidades do empresário, dos titulares, dos sócios ou dos administradores por tais obrigações, apuradas antes ou após o ato de extinção. § 1° O arquivamento, nos órgãos de registro, dos atos constitutivos de empresários, de sociedades empresárias e de demais equiparados que se enquadrarem como microempresa ou empresa de pequeno porte, bem como, o arquivamento de suas alterações, são dispensados das seguintes exigências: […] § 5° A solicitação de baixa do empresário ou da pessoa jurídica importa responsabilidade solidária dos empresários, dos titulares, dos sócios e dos administradores no período da ocorrência dos respectivos fatos geradores. […] Art. 18-A. O Microempreendedor Individual – MEI […] § 13. O MEI está dispensado, ressalvado o disposto no art. 18-C desta Lei Complementar, de: I – atender o disposto no inciso IV do caput do art. 32 da Lei no 8.212, de 24 de julho de 1991; II – apresentar a Relação Anual de Informações Sociais (Rais); e III – declarar ausência de fato gerador para a Caixa Econômica Federal para emissão da Certidão de Regularidade Fiscal perante o FGTS. […] § 16-A A baixa do MEI via portal eletrônico dispensa a comunicação aos órgãos da administração pública.
[16] LEI Nº 5.172, DE 25 DE OUTUBRO DE 1966. Art. 135. São pessoalmente responsáveis pelos créditos correspondentes a obrigações tributárias resultantes de atos praticados com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos: I – as pessoas referidas no artigo anterior; II – os mandatários, prepostos e empregados; III – os diretores, gerentes ou representantes de pessoas jurídicas de direito privado.
[17] LEI N° 10.406, DE 10 DE JANEIRO DE 2002. Art. 45. Começa a existência legal das pessoas jurídicas de direito privado com a inscrição do ato constitutivo no respectivo registro, precedida, quando necessário, de autorização ou aprovação do Poder Executivo, averbando-se no registro todas as alterações por que passar o ato constitutivo. […] Art. 46. O registro declarará: I – a denominação, os fins, a sede, o tempo de duração e o fundo social, quando houver; […]Art. 997. A sociedade constitui-se mediante contrato escrito, particular ou público, que, além de cláusulas estipuladas pelas partes, mencionará: I – nome, nacionalidade, estado civil, profissão e residência dos sócios, se pessoas naturais, e a firma ou a denominação, nacionalidade e sede dos sócios, se jurídicas; II – denominação, objeto, sede e prazo da sociedade; […] Parágrafo único. É ineficaz em relação a terceiros qualquer pacto separado, contrário ao disposto no instrumento do contrato. Art. 998. Nos trinta dias subseqüentes à sua constituição, a sociedade deverá requerer a inscrição do contrato social no Registro Civil das Pessoas Jurídicas do local de sua sede. […] Art. 999. As modificações do contrato social, que tenham por objeto matéria indicada no art. 997, dependem do consentimento de todos os sócios; as demais podem ser decididas por maioria absoluta de votos, se o contrato não determinar a necessidade de deliberação unânime. Parágrafo único. Qualquer modificação do contrato social será averbada, cumprindo-se as formalidades previstas no artigo antecedente.
[18] LEI N° 10.406, DE 10 DE JANEIRO DE 2002. Art. 1.150. O empresário e a sociedade empresária vinculam-se ao Registro Público de Empresas Mercantis a cargo das Juntas Comerciais, e a sociedade simples ao Registro Civil das Pessoas Jurídicas, o qual deverá obedecer às normas fixadas para aquele registro, se a sociedade simples adotar um dos tipos de sociedade empresária. Art. 1.151. O registro dos atos sujeitos à formalidade exigida no artigo antecedente será requerido pela pessoa obrigada em lei, e, no caso de omissão ou demora, pelo sócio ou qualquer interessado. § 1° Os documentos necessários ao registro deverão ser apresentados no prazo de trinta dias, contado da lavratura dos atos respectivos. § 2° Requerido além do prazo previsto neste artigo, o registro somente produzirá efeito a partir da data de sua concessão. § 3° As pessoas obrigadas a requerer o registro responderão por perdas e danos, em caso de omissão ou demora.
[19] LEI N° 6.404, DE 15 DE DEZEMBRO DE 1976. Art. 158. O administrador não é pessoalmente responsável pelas obrigações que contrair em nome da sociedade e em virtude de ato regular de gestão; responde, porém, civilmente, pelos prejuízos que causar, quando proceder: I – dentro de suas atribuições ou poderes, com culpa ou dolo; II – com violação da lei ou do estatuto. § 1º O administrador não é responsável por atos ilícitos de outros administradores, salvo se com eles for conivente, se negligenciar em descobri-los ou se, deles tendo conhecimento, deixar de agir para impedir a sua prática. Exime-se de responsabilidade o administrador dissidente que faça consignar sua divergência em ata de reunião do órgão de administração ou, não sendo possível, dela dê ciência imediata e por escrito ao órgão da administração, no conselho fiscal, se em funcionamento, ou à assembléia-geral. § 2º Os administradores são solidariamente responsáveis pelos prejuízos causados em virtude do não cumprimento dos deveres impostos por lei para assegurar o funcionamento normal da companhia, ainda que, pelo estatuto, tais deveres não caibam a todos eles. § 3º Nas companhias abertas, a responsabilidade de que trata o § 2º ficará restrita, ressalvado o disposto no § 4º, aos administradores que, por disposição do estatuto, tenham atribuição específica de dar cumprimento àqueles deveres. § 4º O administrador que, tendo conhecimento do não cumprimento desses deveres por seu predecessor, ou pelo administrador competente nos termos do § 3º, deixar de comunicar o fato a assembléia-geral, tornar-se-á por ele solidariamente responsável. § 5º Responderá solidariamente com o administrador quem, com o fim de obter vantagem para si ou para outrem, concorrer para a prática de ato com violação da lei ou do estatuto.
[20] Vide acima a transcrição do CTN, Arts. 113; 127; 147.
[21] Vide acima a transcrição do Código Civil, Art. 1.151, § 3°.
[22] LEI N° 6.404, DE 15 DE DEZEMBRO DE 1976. Art. 135. […] § 1º Os atos relativos a reformas do estatuto, para valerem contra terceiros, ficam sujeitos às formalidades de arquivamento e publicação, não podendo, todavia, a falta de cumprimento dessas formalidades ser oposta, pela companhia ou por seus acionistas, a terceiros de boa-fé. Art. 153. O administrador da companhia deve empregar, no exercício de suas funções, o cuidado e diligência que todo homem ativo e probo costuma empregar na administração dos seus próprios negócios. Art. 154. O administrador deve exercer as atribuições que a lei e o estatuto lhe conferem para lograr os fins e no interesse da companhia, satisfeitas as exigências do bem público e da função social da empresa. […]
[23] Acórdão Número 2007.03.03820-3 200703038203 Classe RESP – RECURSO ESPECIAL – 1017732 Relator(a) ELIANA CALMON Origem STJ – SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA Órgão julgador SEGUNDA TURMA Data 25/03/2008 Data da publicação 07/04/2008 Fonte da publicação DJE DATA:07/04/2008. Ementa PROCESSO CIVIL E TRIBUTÁRIO ? EXECUÇÃO FISCAL ? OFENSA AO ART. 535, II DO CPC ? INOCORRÊNCIA ? DISSOLUÇÃO IRREGULAR ? SÓCIO-GERENTE ? REDIRECIONAMENTO ? INTERPRETAÇÃO DO ART. 135, INCISO III, DO CTN. […] 2. É pacífica a jurisprudência desta Corte no sentido de que o simples inadimplemento da obrigação tributária não caracteriza infração à lei, de modo a ensejar a redirecionamento da execução para a pessoa dos sócios. 3. Em matéria de responsabilidade dos sócios de sociedade limitada, é necessário fazer a distinção entre empresa que se dissolve irregularmente daquela que continua a funcionar. 4. Em se tratando de sociedade que se extingue irregularmente, impõe-se a responsabilidade tributária do sócio-gerente, autorizando-se o redirecionamento, cabendo ao sócio-gerente provar não ter agido com dolo, culpa, fraude ou excesso de poder. 5. A empresa que deixa de funcionar no endereço indicado no contrato social arquivado na junta comercial, desaparecendo sem deixar nova direção, é presumivelmente considerada como desativada ou irregularmente extinta. 6. Imposição da responsabilidade solidária. 7. Recurso especial parcialmente provido. (Grifamos)
[24] Outros exemplos de decisões jurisprudenciais pertinentes ao argumento exposto: “Ementa AGRAVO INTERNO EM AGRAVO DE INSTRUMENTO. TRIBUTÁRIO. EXECUÇÃO FISCAL. EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE. DISSOLUÇÃO IRREGULAR. PRESCRIÇÃO. 1 – Cuida-se de AGRAVO INTERNO, interposto por RONALDO BEZERRA DE OLIVEIRA E SOUZA, contra decisão monocrática que negou provimento ao recurso de agravo de instrumento por ele interposto para fins de reforma da decisão que rejeitou a exceção de pré-executividade por ele apresentada. 2 – Sustenta o Recorrente que o próprio juízo de primeiro grau reconheceu que o sócio utilizou-se de meio oficial para informar à Receita que qualquer ato relacionado à empresa “Ebenezer Negócios e Serviços Ltda.” deveriam ser encaminhados para seu endereço residencial. A parte agravante informa ter havido a configuração da prescrição intercorrente no caso em apreço, pois entre a constituição do crédito tributário e a citação do Recorrente, em razão do redirecionamento da execução fiscal, transcorreram mais de cinco anos. 3 – No caso em tela, restou evidenciada a dissolução irregular da empresa executada, pois a mesma não foi encontrada no último endereço registrado na Junta Comercial, conforme informação constante às fls. 98, sendo admissível o redirecionamento da execução para os sócios-gerentes, conforme orientação do STJ quando do julgamento do REsp 1371128/RS, em sede de Recursos Repetitivos (Tema 630). 4 – Em que pese a apresentação do documento de fls. 170, por meio do qual a parte solicita à Receita Federal que todas as correspondências sejam encaminhadas para o endereço situado à Rua Dom Pedro II, n.º 115, apto. 101, certo é que o Recorrente não se desincumbiu do ônus de proceder às devidas alterações junto aos órgãos comerciais (RCPJ ou Junta Comercial). Nesse sentido: REsp 1017732 / RS, Relatora: Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, DJe 07/04/2008, que figura como um dos precedentes originário da Súmula 435, por meio do qual o STJ destaca a necessidade de comunicação tanto aos órgãos tributários quanto aos comerciais. 5 – Como destacado pela Fazenda Nacional às fls. 229, a alteração do endereço requerida pelo Agravante não foi alterada perante o cadastro da RFB, nos moldes preconizados pela administração fazendária. […] 8 – Diante do explanado, não verifico a existência de argumentos suficientes a formar convencimento que enseje a concessão do efeito pretendido pela parte agravante. Desta forma, diante do cenário constatado neste particular, não vislumbro razões a recomendar a modificação do entendimento externado em sede de decisão monocrática. 9 – Agravo interno interposto por RONALDO BEZERRA DE OLIVEIRA E SOUZA não provido. Acórdão Número 0001794-68.2017.4.02.0000 00017946820174020000 Classe AG – Agravo de Instrumento – Agravos – Recursos – Processo Cível e do Trabalho Relator(a) THEOPHILOANTONIO MIGUEL FILHO Relator para Acórdão THEOPHILOANTONIO MIGUEL FILHO Origem TRIBUNAL – SEGUNDA REGIÃO Órgão julgador 3ª TURMA ESPECIALIZADA Data 25/04/2018 Data da publicação 02/05/2018.” (Grifamos)
[25] LEI N° 6.830, DE 22 DE SETEMBRO DE 1980. Art. 4º – A execução fiscal poderá ser promovida contra: […] V – o responsável, nos termos da lei, por dívidas, tributárias ou não, de pessoas físicas ou pessoas jurídicas de direito privado; e […] § 2º – À Dívida Ativa da Fazenda Pública, de qualquer natureza, aplicam-se as normas relativas à responsabilidade prevista na legislação tributária, civil e comercial.
[26] Cf. Abdo apud (SARRO, 2015, p. 9).
[27] Cf. (SANTOS FILHO, 1998, pp. 33-34).
[28] (SANTOS FILHO, 1998, p. 34).
[29] (SARRO, 2015, p. 11).
[30] SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. Órgão Julgador CORTE ESPECIAL Data da Decisão 03/11/2004 Fonte DJ DATA:22/11/2004 PG:00411RSSTJVOL.:00024PG:00047RSTJVOL.:00183PG:00626RSTJVOL.:00185PG:00672.
[31] LEI Nº 5.172, DE 25 DE OUTUBRO DE 1966. Art. 109. Os princípios gerais de direito privado utilizam-se para pesquisa da definição, do conteúdo e do alcance de seus institutos, conceitos e formas, mas não para definição dos respectivos efeitos tributários. Art. 110. A lei tributária não pode alterar a definição, o conteúdo e o alcance de institutos, conceitos e formas de direito privado, utilizados, expressa ou implicitamente, pela Constituição Federal, pelas Constituições dos Estados, ou pelas Leis Orgânicas do Distrito Federal ou dos Municípios, para definir ou limitar competências tributárias.
[32] Vide a disciplina regente da (re)presentação de pessoa jurídica e entes despersonificados que se inscrevam como contribuintes, tendo como núcleo fundamental o Código Civil e o Código de Processo Civil, dos quais são destacados:
LEI N° 10.406, DE 10 DE JANEIRO DE 2002. Da Sociedade Não Personificada CAPÍTULO I Da Sociedade em Comum Art. 990. Todos os sócios respondem solidária e ilimitadamente pelas obrigações sociais, excluído do benefício de ordem, previsto no art. 1.024, aquele que contratou pela sociedade. CAPÍTULO II Da Sociedade em Conta de Participação Art. 991. Na sociedade em conta de participação, a atividade constitutiva do objeto social é exercida unicamente pelo sócio ostensivo, em seu nome individual e sob sua própria e exclusiva responsabilidade, participando os demais dos resultados correspondentes. Parágrafo único. Obriga-se perante terceiro tão-somente o sócio ostensivo; e, exclusivamente perante este, o sócio participante, nos termos do contrato social. Art. 993. O contrato social produz efeito somente entre os sócios, e a eventual inscrição de seu instrumento em qualquer registro não confere personalidade jurídica à sociedade. Parágrafo único. Sem prejuízo do direito de fiscalizar a gestão dos negócios sociais, o sócio participante não pode tomar parte nas relações do sócio ostensivo com terceiros, sob pena de responder solidariamente com este pelas obrigações em que intervier.
LEI N° 13.105, DE 16 DE MARÇO DE 2015. Art. 75. Serão representados em juízo, ativa e passivamente: […] V – a massa falida, pelo administrador judicial; VI – a herança jacente ou vacante, por seu curador; VII – o espólio, pelo inventariante; VIII – a pessoa jurídica, por quem os respectivos atos constitutivos designarem ou, não havendo essa designação, por seus diretores; IX – a sociedade e a associação irregulares e outros entes organizados sem personalidade jurídica, pela pessoa a quem couber a administração de seus bens; X – a pessoa jurídica estrangeira, pelo gerente, representante ou administrador de sua filial, agência ou sucursal aberta ou instalada no Brasil; XI – o condomínio, pelo administrador ou síndico. […] § 2° A sociedade ou associação sem personalidade jurídica não poderá opor a irregularidade de sua constituição quando demandada.
[33] ALAGOAS. Juízo da Comarca de Capela. Execução Fiscal n° 0500723-61.2007.8.02.0041. Decisão interlocutória de 04/12/2006, Fls. 51-54. Disponível em <https://www2.tjal.jus.br/cpopg/show.do?processo.codigo=1500000FL0000&processo.foro=41&uuidCaptcha=sajcaptcha_1359f64ec38047a6aaed70de5207f307> Acesso em 26/06/2019.
[34] Outro julgamento com o mesmo entendimento ora defendido: “Ementa AGRAVO DE INSTRUMENTO. PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO FISCAL. AUSÊNCIA DE PROCURAÇÃO, PRECLUSÃO LÓGICA E AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO ADEQUADA DO RECURSO. INOCORRÊNCIA. EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE. ILEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM. EXCLUSÃO DO EXCIPIENTE DO PÓLO PASSIVO DO FEITO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS INDEVIDOS. CULPA EXCLUSIVA DA EXECUTADA. […] 2. Não vislumbro a ocorrência de preclusão lógica no caso concreto ou ausência de fundamentação adequada do recurso; no caso, a ora agravante justificou que pleiteou a inclusão do sócio gerente no polo passivo do feito, por culpa da executada, em razão da ausência de informações à Secretaria da Receita Federal da incorporação da empresa agravada. […] 5. A condenação em honorários é decorrente da sucumbência ocorrida, nos termos do art. 20 do CPC, pois, ordinariamente, incumbe ao vencido a obrigação de arcar com o custo do processo. 6. Cabe àquele que dá causa ao ajuizamento indevido arcar com os ônus da sucumbência, nos termos do que preconiza o princípio da causalidade. 7. A análise dos autos revela que, diante da não localização da empresa executada em sua sede, consoante o AR negativo de fl. 31 e extrato do CNPJ de fls. 35, onde consta que a empresa encontra-se em situação cadastral cancelada perante o órgão administrativo, é que foi requerida a inclusão do Sr. Roberto Guttmann Serwaczak Slowinski, constante dos cadastros da Secretaria da Receita Federal como sócio-gerente, no polo passivo do feito, conforme documentos de fls. 14/15, o que foi deferido pelo d. magistrado de origem. 8. Posteriormente, a ABN AMRO SECURITIES HOLDING BRASIL S/A, na qualidade de sucessora por incorporação da empresa agravada BARINGSUCYRITIES DO BRASIL S/C LTDA, fato não informado à Secretaria da Receita Federal, opôs exceção de pré-executividade alegando a ilegitimidade passiva do sócio, resultando em sua exclusão do polo passivo da demanda, com a concordância da agravante (fl. 132). 9. Compete ao próprio devedor prestar as informações referentes aos dados cadastrais junto às repartições públicas, de forma a manter regularizado e atualizado o seu assentamento. 10. In casu, descabe a condenação da exequente ao pagamento dos honorários advocatícios, uma vez que a inclusão do sócio no polo passivo do feito deveu-se a erro do contribuinte que não informou à Receita Federal qualquer alteração de seus dados cadastrais nem de seu quadro de sócios e administradores. 11. Matéria preliminar arguida em contraminuta rejeitada e agravo de instrumento provido. Acórdão Número 0066524-81.2005.4.03.0000 00665248120054030000 Classe AGRAVO DE INSTRUMENTO – 244010 (AI) Relator(a) DESEMBARGADORA FEDERAL CONSUELO YOSHIDA Origem TRF – TERCEIRA REGIÃO Órgão julgador SEXTA TURMA Data 18/03/2010 Data da publicação 05/04/2010 Fonte da publicação e-DJF3 Judicial 1 DATA:05/04/2010 PÁGINA: 493.” (Grifamos)
[35] (SANTOS FILHO, 1998, p. 35).
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