Autor: Samuel Pereira Cardoso – Bacharel em Direito pela Faculdade Carajás em 01/10/2021, OAB/PA 32.194, Pós-Graduando em Direito Civil e Processo Civil pela Faculdade Legale, Pós-Graduando em Advocacia Cível pela Escola Superior do Ministério Público e Mestrando em Propriedade Intelectual e Transferêcia de Teconologia para a Inovação pela Universidade Federal do Sul e Sudeste do Pará. E-mail: samuel.card12@gmail.com
Autor: Thainá Lopes Barros – Bacharela em Direito pela Faculdade Carajás em 30/10/2021, OAB/PA 32.427, Pós-Graduando em Direito Penal e Processo Penal pela Escola Brasileira de Direito. E-mail:. thainabarros94@gmail.com
Orientador: Ramon Gabriel Matos Cavalcante – Possui graduação em Direito pela Universidade Regional do Cariri (2006), especialização em direito do trabalho e previdenciário pela mesma instituição. Mestrado pelo programa de direitos sociais e políticas públicas, com linha de pesquisa em constitucionalismo contemporâneo pela UNISC. Atualmente é professor do curso de direito da Faculdade dos Carajás.
Resumo: O Novo Código de Processo Civil, trouxe notadamente significativas inovações ao ordenamento jurídico brasileiro, destaque-se a criação do incidente de resolução de demandas repetitivas (IRDR) que é capaz de solucionar litígios em massa, bem como tornar decisões modelos para demandas futuras. O presente artigo objetiva apresentar uma reflexão a partir de uma análise prática se há efetividade do princípio da segurança jurídica por meio do novo instituto processual, de forma que serão observados quais os impactos causados sobre as ações de CNR (Consumo Não Registrado) no 2° Juizado Especial de Marabá/PA, a partir do julgamento pelo Tribunal de Justiça do Estado do Pará do Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas, será analisado o instituto do IRDR na perspectiva processual, constitucional e da nova sistemática do CPC e sua adoção pelo Tribunal de Justiça do Estado do Pará. Quanto à metodologia, o método de abordagem neste estudo é o método indutivo, as técnicas de pesquisa adotadas são a bibliográfica e documental. Na pesquisa um destaque é que é possível observar que a fixação das teses jurídicas norteadoras garante uma previsibilidade, isso porque evita que causas idênticas sejam decididas de modo diverso o que leva-se a caracterizar o cumprimento da finalidade do IRDR na perspectiva processual e constitucional.
Palavras-chave: Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas; Segurança Jurídica; Efetividade
Abstract: The New Code of Civil Procedure, brought notably significant innovations to the Brazilian legal system, highlighting the creation of the incident of resolution of repetitive demands, capable of resolving mass disputes as well as making model decisions. This article aims to present a reflection from a practical analysis if there is effectiveness of the principle of legal certainty through the new procedural institute, the impacts caused on the actions of Unregistered Consumption will be observed in the 2nd Special Court of Marabá/PA from the judgment by the Court of Justice of the State of Pará of the Incident of Resolution of Repetitive Demands. As for the methodology, the method of approach in this study is the inductive method, the research techniques adopted are bibliographic and documentary, having a historical-comparative approach. In the research, a highlight is that it is possible to observe that the establishment of the guiding legal theses guarantees predictability, this because it prevents identical causes from being decided in a different way, so that the fulfillment of the purpose of the IRDR is characterized in the procedural and constitutional perspective.
Keywords: Repetitive Demand Resolution Incident; Legal Security; Effectiveness
Sumário: Introdução. 1. O Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas como Medida Efetiva de Garantia da Segurança Jurídica: Um estudo de caso no Tribunal de Justiça do Estado do Pará. Considerações Finais. Referências.
Introdução
O Novo Código de Processo Civil, Lei n°13.105 de 13 de março de 2015, trouxe notadamente significativas inovações ao ordenamento jurídico brasileiro, sendo possível observar que o legislador se atentou em ampliar as possibilidades de tornar vinculantes decisões judiciais tendentes à valorização dos precedentes.
Notadamente, destaque-se a criação do incidente de resolução de demandas repetitivas (IRDR) que é capaz de solucionar litígios em massa, bem como tornar decisões modelos para demandas futuras. Esse instituto se baseia em preceitos de direitos constitucionais como da razoável duração do processo e da segurança jurídica das decisões a partir da uniformização jurisprudencial.
Nesse contexto, utilizando como parâmetro de pesquisa o Tribunal de Justiça do Estado do Pará, tem-se que até o mês de janeiro de 2021, foram opostos 15 Incidentes, destes, somente 04 foram admitidos, resultando em um total de 17.590 processos sobrestados aguardando julgamentos. Dos incidentes admitidos pelo Tribunal do Estado do Pará encontra-se o de tema 4, que trata da definição das balizas de inspeção para apuração de Consumo Não Registrado (CNR) e, consequentemente, a validade das cobranças de débito a partir de inspeções realizadas pela concessionária Celpa/Equatorial Energia, dentro dessa perspectiva, há de se considerar grande interesse social, tendo em vista que se trata de assunto de ordem pública, em que têm os consumidores como vulneráveis.
Será utilizado como ambiente de pesquisa o 2º Juizado Especial Cível de Marabá/PA com a finalidade de responder: se há efetividade da segurança jurídica e quais os impactos causados sobre as ações de CNR (Consumo Não Registrado) no 2° Juizado Especial de Marabá/PA, a partir do julgamento pelo TJPA do IRDR (incidente de resolução de demandas repetitivas)?
Para alcançar o objetivo proposto serão analisados, o instituto do IRDR na perspectiva processual, constitucional e da nova sistemática do CPC e sua adoção pelo Tribunal de Justiça do Estado do Pará e, por fim, se investigará os casos sobre CNR que tramitam no 2º juizado Cível de Marabá/PA para definir que impactos podem incidir sobre os processos em seus julgamento e se há efetividade de princípios constitucionais como da segurança jurídica.
Quanto à metodologia, o método de abordagem neste estudo é o método indutivo, as técnicas de pesquisa adotadas são a bibliográfica e documental, possuindo abordagem histórico-comparativa.
A análise poderá mostrar benefícios ou consequências da aplicação do novo instituto do Incidente de Resolução de demandas repetitivas de forma prática quanto aos processos que estão tramitando e os novos que irão ser protocolados, verificando também o cumprimento de objetivos processuais e constitucionais, em tese a celeridade, duração razoável do processo e por fim a segurança jurídica.
1 O Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas como Medida Efetiva de Garantia da Segurança Jurídica: Um Estudo de caso no Tribunal de Justiça do Estado do Pará
Observa-se que o convívio social é capaz de criar conflitos, tendo em vista as diferenças de anseios e interesses existentes entre os indivíduos. Ocorre que nem sempre o Estado foi o responsável por dirimir esses conflitos, por muito tempo a sociedade resolveu seus conflitos por meio de suas próprias forças, a chamada autotutela ou mesmo a autocomposição.
Contudo, o Estado começa a exercer a função de terceiro com poder de decisão sobre as partes, sendo esse meio de resolução de conflito chamado de heterocomposição, que para Faraco (2014) é a forma mais vista nos dias de hoje, utilizada comumente na busca de soluções de conflitos, precisamente por meio da jurisdição, na qual o Estado-juiz dá solução impositiva aos casos concretos.
Dentro dessa perspectiva observa-se que com a abertura do Poder Judiciário ao povo, a partir do status democrático trazido pela Constituição (1988), observa-se certa crise a este Poder, visto que os inúmeros direitos sociais, individuais e meios de ações trazidas pela nova Constituição faz com que as buscas pelo Judiciário cresçam, diante disso fala-se em obstáculos enfrentados pelo Poder Judiciário, fazendo portanto necessário o estudo de formas que torne mais acessível ao povo e célere a aplicação da justiça e da lei em prol da sociedade brasileira (ALVES, 2017).
Por isso passou-se a existir a necessidade de criação de mecanismos que efetivassem princípios basilares constitucionais como do acesso à justiça, tempo razoável do processo, a segurança jurídica para promover a igualdade e outros. Nesse cenário, visando à contribuição ao poder Judiciário, o Poder Legislativo criou formas de solução de conflitos em que se pese o Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas.
O Novo Código de Processo Civil, trouxe inúmeras inovações para o processo civil brasileiro, entre elas uma importante ferramenta processual, a criação do Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas (IRDR), que possibilitou a decisão das demandas em massa que possuem questões jurídicas comuns, ou seja, o instituto objetiva a decisão de processos de maneira uniforme, sendo posto como um “processo-modelo” para os demais casos semelhantes (ABREU, 2016). Foi destinado no Novo Código de Processo Civil o Capítulo VIII exclusivamente para tratar do instituto, cuja previsão encontra-se nos artigos 976 a 987, devendo ser instaurado perante os Tribunais de Justiça e os Tribunais Regionais Federais. De acordo com (ABREU, 2016, p. 4):
O incidente apresenta-se não como um recurso, mas como um método de soluções de demandas múltiplas, em que se parte de um caso concreto entre litigantes individuais, cuja pretensão é apta a repetir-se. É, pois, mais uma medida para minimizar os efeitos decorrentes da massificação dos processos em trâmite no Poder Judiciário brasileiro, de modo a viabilizar a celeridade processual, além de um tratamento igualitário e segurança jurídica aos jurisdicionados.
Criou-se um instrumento na qual pode estabelecer uma tese jurídica única e, consequentemente, pacificar as demandas repetitivas ao fixar um único entendimento sobre determinada questão, afastando assim as decisões conflitantes, vinculando o tribunal, os órgãos e juízes que lhe são subordinados. Nesse mesmo sentido se posiciona (MARQUES, 2017, p. 81) “o incidente pretende trazer para o processo civil uma efetiva garantia de acesso à Justiça, nela incluídas, especialmente, a tão esperada segurança jurídica, isonomia e razoável duração do processo.” .
No artigo 976 do NCPC, temos previsto dois requisitos para a instauração do incidente, sendo necessário que exista a efetiva repetição de processos que contenham controvérsia sobre a mesma questão unicamente de direito e a existência de risco de ofensa à isonomia e à segurança jurídica. Ressalta-se que ambos os requisitos devem ser cumulativos.
Nesse sentido, além do mencionado artigo, atentar-se ao Enunciado nº 87 advindo do Fórum Permanente de Processualistas Civis (FPPC) ao qual dispõe:
art. 976, II: A instauração do incidente de resolução de demandas repetitivas não pressupõe a existência de grande quantidade de processos versando sobre a mesma questão, mas preponderantemente o risco de quebra da isonomia e de ofensa à segurança jurídica.”
Assim, considerando o que dispõe o diploma processual e o Enunciado, para que o incidente seja instaurado, não é necessário que haja uma grande quantidade de processos envolvendo a mesma questão de direito, basta que, os processos que estão pendentes possam trazer risco para a isonomia e ofensa à segurança jurídica.
Em sede de IRDR não se discute os direitos subjetivos nem a lide em si, mas busca-se resolver a questão jurídica comum a todos os processos que possuem a mesma demanda e que estão tramitando sob a mesma área de jurisdição de determinado tribunal. Não há uma decisão direta sobre tais processos, o que ocorre é que se resolve a questão jurídica, cabendo aos juízes aplicarem aos processos que se encontram suspensos a tese adotada ao caso concreto (MARQUES, 2017). Nesse sentido, tem-se a lição:
não haverá, no espaço de resolução coletiva do incidente, o julgamento da(s) causa(s) propriamente dita(s), mas apenas a definição jurídica da questão jurídica controvertida, que será posteriormente adotada para o julgamento da(s) causa(s) de onde este se originar, bem como nas demais demandas repetitivas fundadas em igual questão (MENDES; TEMER, 2015. p. 5)
Quando instaurado o incidente, enquanto ocorre sua tramitação, todos os processos que versem sobre a mesma questão de direito devem permanecer sobrestados até que seja definida a tese jurídica, logo após, quando a tese estiver firmada no incidente, será aplicável aos processos em curso e aos futuros, até que haja superação do entendimento ou revisão (MENDES; TEMER, 2015).
Cabe aos Tribunais de Justiça ou aos Tribunais Regionais julgar o incidente de processos de suas jurisdição. No âmbito dos Tribunais, é o regimento interno que indicará o órgão competente para o julgamento e a fixação da tese jurídica.
O Tribunal de Justiça do Estado do Pará é regulado pela Resolução n.º 13, de 11 de maio de 2016, trazendo na Seção II o procedimento para a instauração do incidente de resolução de demandas repetitivas. No Regimento Interno do TJPA em seu art. 24, inciso XIII, alínea “s”, tem-se a seguinte previsão:
Art. 24. O Tribunal Pleno é constituído pela totalidade dos Desembargadores e Juízes convocados, enquanto perdurar a convocação, instalado pelo Presidente do Tribunal e, nos seus impedimentos, sucessivamente, pelo Vice-Presidente e na ausência deste, segundo a ordem de antiguidade na Corte, competindo-lhe:
XIII – processar e julgar os feitos a seguir enumerados:
Assim, na jurisdição do Pará caberá ao Tribunal Pleno julgar os incidentes de resolução de demandas repetitivas, tal competência está prevista no art. 188 do citado regimento interno. Após distribuído, será incluído em pauta da sessão do Tribunal Pleno para deliberação do juízo de admissibilidade, analisando a presença dos respectivos pressupostos.
De acordo com Marques (2017) é necessária a correta delimitação do objeto e a ampla publicidade que está prevista no art. 979 do CPC, dada por meio de registro eletrônico no Conselho Nacional de Justiça acerca do pedido de instauração do Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas no âmbito daquele Tribunal. Isso porque, deve-se garantir o contraditório, além desses elementos auxiliarem na correta suspensão dos processos, dando também às partes a oportunidade de requerer a suspensão de processos que deveriam ter sido suspensos e não foram.
De acordo com o art. 980, parágrafo único do CPC, o prazo para que os processos fiquem suspensos compreende a 01 (um) ano, contudo, caso esse prazo seja superado, é cessada a suspensão dos processos, salvo decisão fundamentada do relator em sentido contrário. Ressalta-se que a suspensão ocorrerá somente no território de competência do tribunal, e não em todo território nacional. Em caso de futuras demandas, nas palavras de (SIMÃO, 2015, p. 26):
Outro aspecto relevante é notar que, apesar da suspensão do processo, admite-se o ajuizamento de novas demandas, mesmo enquanto houver a pendência de julgamento do Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas até mesmo para obstar a prescrição. Neste caso, entendemos que o Juiz deve receber a petição inicial e determinar a suspensão do processo mesmo antes de determinar a citação do réu.
Em relação ao julgamento ensina (FERNANDES; SIMÃO, 2017, pág. 121): “Ao final desta fase descrita acima, o relator profere seu voto junto com os demais julgadores. Esse julgamento abrangerá todos os fundamentos suscitados no processo para a formação da tese jurídica discutida, sendo favoráveis ou não”. Após fixada a tese jurídica, temos: “É nesse sentido que se deve ter em conta que a tese de direito resultante do procedimento de IRDR assume caráter de precedente, portanto, de caráter vinculativo, e não de jurisprudência, com mera função de orientação” (CALDEIRA, 2017, p. 113).
Fixada a tese jurídica definitiva da questão discutida no IRDR, haverá a necessidade de dar ampla divulgação e publicidade, aliás, essa publicidade deve acontecer tanto na admissão do incidente como também do julgamento (YAKAMOTO, 2016). Superada a fixação, e não interposto nenhum recurso cabível, todos os juízes e Tribunais no Estado, observarão e aplicarão a tese aos casos idênticos nos processos em tramitação e aos processos futuros, com base no que prevê o diploma processual.
O Tribunal de Justiça do Estado do Pará através do Núcleo de Gerenciamento de Precedentes – NUGEP, com o intuito de fomentar a instauração de novos IRDRs, fez um levantamento que resultou em um relatório quantitativo e qualitativo sobre o Incidente de Resolução de Demanda Repetitiva – IRDR, fazendo um estudo acerca de todos os incidentes ajuizados até o momento, incluindo os incidentes inadmitidos e as possíveis causas que levaram a ser inadmitidos, bem como os admitidos, os processos sobrestados a partir de cada incidente, o tempo entre a admissão e o julgamento de mérito, as teses jurídicas fixadas, além de um quadro comparativo de incidentes admitidos pelos Tribunais de Justiça Estaduais de médio porte.
A partir dessa análise tem-se hoje que foram suscitados no TJPA, um número de 15 incidentes, destes, 8 foram inadmitidos, percentual de 53%, 3 pendentes de admissibilidade, 20%, e apenas 4 admitidos, um percentual de 27%, dos admitidos resultaram no sobrestamento de 17.590 processos, com esses dados o TJPA ocupa o 7° lugar com o maior número de incidentes admitidos em todo o Brasil.
Dos quatro incidentes admitidos no TJPA, até o atual momento, tem-se o tema 04, incidente este admitido sob a relatoria do desembargador Constantino Augusto Guerreiro, em sessão realizada no dia 03 de abril de 2019, suscitado pelo Juízo da 3ª Vara de Juizado Especial Cível da Comarca de Ananindeua, com o objetivo de se determinar as balizas de inspeção para a apuração de consumo de energia não Registrado (CNR), e consequentemente, a validade das cobranças de débito realizadas a partir dessas inspeções feitas pela Concessionária de energia Celpa/Equatorial, na mesma oportunidade foi determinada a suspensão de todos os processos em trâmite em torno do TJPA que versavam sobre a matéria de CNR, até o julgamento de mérito, resultando daí a suspensão de 2.259 processos (RIBEIRO, 2019).
O juízo suscitante juntou 16 processos distribuídos entre as 1ª, 2ª e 3ª Varas de Juizado Especial Cível da comarca de Ananindeua, todas com a pretensão de desconstituição de débito decorrente de Consumo Não Registrado em razão de falha no medidor. O ofício do juízo se deu a partir do fato de que outras demandas de mesmo trato foram julgadas de formas divergentes entre as varas da comarca, e até mesmo pelas turmas recursais responsáveis pelos julgamentos dos recursos em âmbitos dos juizados especiais, motivo que ocasionou uma insegurança jurídica em se tratando de demandas que deveriam seguir a mesma linha de julgamento.
A relatoria do incidente considerou as reiteradas ações tratando do mesmo assunto e a divergência jurisdicional para fundamentação e admissão do incidente. De acordo com Excelentíssimo desembargador Constantino Augusto Guerreiro, (2019):
Há divergência precisamente no que tange aos meios de demonstração da validade da forma de apuração do consumo de energia não registrado pela prestadora do serviço e, consequentemente, da regularidade do débito originado a partir da eventual apuração de irregularidade no medidor de consumo de energia elétrica. A questão de direito é processual e é exatamente esta: quais os elementos de prova e atos formais são necessários para a concessionária demonstrar a validade do débito relacionado a consumo não registrado? Não há entendimento jurisdicional uníssono sobre essa questão, surgindo vários caminhos que ora levam à improcedência da demanda anulatória do débito, ora levam à procedência da demanda, de acordo com entendimento de cada magistrado a respeito dos documentos necessários à demonstração da validade do ato de inspeção de irregularidade. (TJPA – INCIDENTE DE RESOLUÇÃO DE DEMANDAS REPETITIVAS Nº 0801251-63.2017.8.14.0000. RELATOR: Des. CONSTANTINO AUGUSTO GUERREIRO. BELÉM-PA, 03 DE ABRIL DE 2019).
Pelo entendimento do desembargador Constantino Augusto Guerreiro estima-se que a admissibilidade do referido incidente, é o meio eficaz para uniformizar o entendimento em todo o Tribunal do Estado para nortear as demandas, tendo ainda pôr fim a garantia da isonomia e segurança jurídica.
De acordo com a Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL), “Consumo Não Registrado” trata-se do consumo que ocorreu, mas que não foi registrado pelo medidor pela falha na medição real, podendo ter como causa: defeito no medidor ou algum procedimento que impediu a medição correta, os famosos “gatos”, ficando a cargo da distribuidora de energia detectar a causa do consumo não medido, apurar quanto foi consumido e providenciar o faturamento (ANEEL, 2019).
Especificamente, utilizando-se de 22 processos tramitados na 2ª Vara do Juizado Especial Cível de Marabá/PA, é possível analisar de forma prática as demandas que contém conflitos sobre CNR, e ao compulsar os autos dos processos, verifica-se que os demandantes procuraram o Judiciário em tom de insatisfação pelo lançamento de faturas que consideraram em valores exorbitantes, alegando que as faturas estão fora do consumo real, e que se encontram impossibilitados financeiramente de efetuar o pagamento.
TABELA 01: NÚMEROS DOS PROCESSOS ANALISADOS
Número dos processos | Data de Distribuição | |
01 | 0802285-18.2019.814.0028 | 20/03/2019 |
02 | 0802290-40.2019.8.14.0028 | 20/03/2019 |
03 | 0806004-42.2018.814.0028 | 08/11/2018 |
04 | 0806702-14.2019.814.0028 | 30/07/2019 |
05 | 0809819-13.2019.8.14.0028 | 21/11/2019 |
06 | 0804973-16.2020.8.14.0028 | 21/08/2020 |
07 | 0808953-05.2019.8.14.0028 | 21/10/2019 |
08 | 0803157-33.2019.8.14.0028 | 21/10/2019 |
09 | 0805882-92.2019.8.14.0028 | 04/07/2019 |
10 | 0806996-03.2018.8.14.0028 | 18/12/2018 |
11 | 0809478-84.2019.8.14.0028 | 07/11/2019 |
12 | 0804505-23.2018.8.14.0028 | 03/09/2018 |
13 | 0806602-93.2018.8.14.0028 | 06/12/2018 |
14 | 0801642-60.2019.8.14.0028 | 27/02/2019 |
15 | 0810681-81.2019.8.14.0028 | 20/12/2019 |
16 | 0800074-72.2020.8.14.0028 | 09/01/2020 |
17 | 0806677-64.2020.8.14.0028 | 14/10/2020 |
18 | 0807607-19.2019.8.14.0028 | 03/09/2019 |
19 | 0804375-96.2019.8.14.0028 | 20/05/2019 |
20 | 0807202-17.2018.8.14.0028 | 28/12/2018 |
21 | 0800624-04.2019.8.14.0028 | 29/01/2019 |
22 | 0810204-58.2019.8.14.0028 | 05/12/2019 |
FONTE: DADOS DO SISTEMA PJE, 2021.
As alegações também se dão a partir da afirmativas de que houve inspeções por parte da concessionária de energia, e após as inspeções foram surpreendidos com faturas em alto valor, relatando ser referente à multa pela constatação de irregularidade do medidor, muitos dos demandantes entendem que as alegações de irregularidade do medidor são referentes aos famosos “gatos” fato que os levam a requerer judicialmente a comprovação por parte da fornecedora de energia sobre a veracidade das acusações.
Para os que entendem que não se refere diretamente à multas por acusações de “gatos” requerem a invalidade do débito por influir que os defeitos nos medidores não decorrem da vontade dos consumidores, sendo a responsabilidade da empresa de manter as condições dos medidores, a fim de que não apresentem falhas, acarretando aos consumidores o acúmulo de consumo e, consequentemente, a cobrança em alto valor.
Há ainda os que argumentam à legalidade da inspeção, trazendo aos fatos que não assinou o Termo de Ocorrência e Inspeção (TOI), requerendo a partir daí a desconstituição do débito, que por não ter assinado o documento, o documento teria vício capaz de ser nulo, e devido a isso a violação ao contraditório e a ampla defesa.
Salienta-se que 45% dos demandantes tentaram pela via administrativa solucionar amigavelmente o conflito (10), sendo por atendimento na empresa, com recursos indeferidos (05), ou pelo Programa de Proteção ao Consumidor (PROCON) com a tentativa de acordos (05), porém com resultados infrutíferos, não restando alternativas, senão propor as respectivas ações:
TABELA 02: PROCESSOS COM TENTATIVAS DE RESOLUÇÃO AMIGÁVEL PELA VIA ADMINISTRATIVA
TENTATIVA DE SOLUÇÃO NO PROCON | TENTATIVA DE SOLUÇÃO VIA ADMINISTRATIVA NA EMPRESA |
0806004-42.2018.814.0028 | 0802290-40.2019.8.14.0028 |
0806702-14.2019.814.0028 | 0809819-13.2019.8.14.0028 |
0804973-16.2020.8.14.0028 | 0804505-23.2018.8.14.0028 |
0806602-93.2018.8.14.0028 | 0801642-60.2019.8.14.0028 |
0810681-81.2019.8.14.0028 | 0804375-96.2019.8.14.0028 |
FONTE: DADOS DO SISTEMA PJE, 2021.
Devido às alegações de invalidade das faturas e a impossibilidade de efetuarem o pagamento por considerarem faturas exorbitantes, os requerentes no início dos processos solicitaram pedidos de tutela de urgência, liminarmente, para que a requerida suspendesse a ação de corte de energia, ou a retirada dos cadastros de restrição, ou a não inclusão, um total de 19 pedidos, dos pedidos apreciados pelo juízo da referida vara, 94% foram deferidos, visto apresentarem os requisitos essenciais, como o periculum in mora, Fumu boni iuris.
As fundamentações apresentadas pelos autores nas iniciais foram todas direcionadas a aplicação do Código de Defesa do Consumidor (CDC), referindo-se a vulnerabilidade nas relações, bem como a hipossuficiência e dificuldade técnica de provar, motivo pelo qual apresentaram requerimentos de inversão do ônus da prova e deferidos pelo juízo com base no artigo 6º, VIII, do CDC, nas decisões de liminar.
A empresa devidamente citada, apresentou contestações seguindo uma mesma ordem de fundamentação, afinal as demandas são similares, e ao argumentar as defesas a empresa alega que após verificadas as irregularidades nas unidades consumidoras através de realização de inspeções foram feitos os procedimentos previstos no art. 129 da Resolução n. 414/2010-ANEEL. Frisando ainda que as faturas contestadas nos litígios não se referem ao consumo do mês questionado, e sim ao período determinado em que não foi registrado o consumo real da energia elétrica, esclarecendo também que não se trata de aplicação e multa, feita tais considerações, a empresa se declara atuar plenamente conforme à legalidade.
A requerida também em sede de contestação esclarece que a constatação de irregularidades nas UCs, não significa expressamente a imputação de que os consumidores foram responsáveis pelo problema que ocasionou a impossibilidade de integral leitura do consumo, mas, uma vez que possuem a titularidade e se beneficiou da irregularidade encontrada, devem ressarcir a concessionária pelos kWhs efetivamente consumidos e não cobrados a época da irregularidade.
As contestações são acompanhadas de provas, afinal a empresa ficou com o ônus de provar devido à possibilidade técnica, dito isso, observa-se que a demandada junta a documentação que respalda o procedimento de fiscalização e cobrança instauradas pela empresa para apurar as irregularidades. Ao exame, verifica-se que a reclamada junta todos estes documentos exigidos para tornar válidas as cobranças de acordo com a resolução vigente, em um percentual de 81% dos processos, necessariamente os documentos que compõem o procedimento administrativo.
Dado o exposto, com base na referida análise processual, tem-se que o julgamento do incidente, consequentemente teve reflexos aos 22 processos tramitando na 2ª Vara do Juizado Especial de Marabá, que tiveram que ser julgados observando as teses que foram vencidas, visto que o magistrado, dentro da perspectiva de aplicação de tese fixadas em IRDR terá de aplicar tanto nos casos pendentes quanto nos casos futuros.
Assim sendo, devido ao objetivo exposto pela instauração do IRDR, foram fixadas as seguintes teses:
As citadas teses foram reconhecidas e fixadas no julgado realizado no dia 16 de dezembro de 2020 com uniformidade de votos dos desembargadores que integram o Tribunal Pleno do Tribunal de Justiça do Estado do Pará e, como destaque tem se no voto o desembargador Constantino Augusto Guerreiro:
Nesse contexto, se a validade da cobrança de consumo não registrado (CNR) está condicionada à realização do procedimento administrativo previsto na resolução normativa da ANEEL e se este procedimento constitui obrigação da concessionária de energia elétrica, mostra-se legítimo concluir que, nas ações declaratórias de indébito decorrente de consumo não registrado, caberá à concessionária de energia comprovar a regularidade do procedimento administrativo previsto nos arts. 115, 129, 130 e 133, da Resolução nº 414/2010. (TJPA – IRDR Nº 0801251-63.2017.8.14.0000. RELATOR: Des. CONSTANTINO AUGUSTO GUERREIRO. BELÉM-PA, 16/12/2020)
A par das determinações no julgado, para que as cobranças de CNR nas referidas ações sejam legítimas é necessário que a concessionária obedeça estritamente a todo o procedimento administrativo que está constituído nas teses firmadas, fundamentadas de acordo com a Resolução nº. 414/2010 da ANEEL. Resta, portanto, a atenção ao procedimento que se dá início pela fase de verificação, que se concretiza através de quatro atos que formarão a materialidade, a expedição do Termo de Ocorrência e Inspeção, perícia técnica no medidor e/ou equipamentos de medição, em termos prático, pode se dizer que a priori a realização de perícia técnica não é ato obrigatório, Relatório de Avaliação Técnica e Avaliação de histórico de consumo e grandezas elétricas. Finalizada a fase de verificação inicia-se a fase de Apuração do Valor compensável ou recuperável, e por fim a Fase de Apresentação, Contestação e Constituição Definitiva.
Dentre os 22 processos analisados que estão tramitando no 2º juizado especial da comarca de Marabá depreende-se que 100% destes foram aplicados a inversão do ônus da prova, incumbindo a CELPA/Equatorial comprovar que cumpriu com a regularidade do procedimento administrativo disciplinado na Resolução nº. 414/2010. Da análise, constatou-se que em 18 ações, equivalente a 81% dos processos, a concessionária cumpriu com o procedimento previsto nos incisos do art. 129 da Resolução nº. 414/2010, apresentando em suas contestações documentos como o Termo de Ocorrência de Inspeção (TOI), avaliação do histórico do consumidor, recursos visuais, cópia do respectivo TOI entregue ao consumidor e carta de CNR, diferente dos outros 4 processos analisados que não apresentaram tal documentação.
Além desses pontos, outro aspecto importante para a caracterização do CNR é a formalização do Termo de Ocorrência de Inspeção (TOI), procedimento firmado na primeira tese do IRDR que preconiza que o TOI deverá ser realizado na presença do consumidor contratante ou de seu representante legal, bem como de qualquer pessoa ocupante do imóvel no momento da fiscalização, desde que plenamente capaz e devidamente identificada.
Diante do exposto, fora observado que nos processos em trâmite no 2º juizado especial da comarca de Marabá, a concessionária de energia cumpriu em 82% das ações, equivalente aos 18 processos, a realização do TOI na presença do consumidor contratante ou de seu representante legal, bem como de qualquer pessoa ocupante do imóvel no momento da fiscalização, assegurando ao consumidor usuário o efetivo contraditório e a ampla defesa.
Atento, portanto, ao julgamento do Incidente e a necessidade de aplicação das teses firmadas com base no artigo 195 do regimento interno do Tribunal de Justiça do Estado do Pará, bem como ao que propõe objetivo do novo instituto no Novo Código de Processo Civil, o juiz titular da 2ª Vara do Juizado Especial de Marabá/PA, Dr. Augusto Bruno de Moraes Favacho, já retomou aos julgamentos dos processos que antes estavam suspensos pela admissão do IRDR, dos 22 processos analisado, já se encontram julgados 20 processos (90%) todos os processos Julgados Improcedentes para os requerentes e parcialmente procedentes os pedidos contrapostos pela requerida, e em todas as fundamentações encontram-se citadas as teses fixadas no IRDR.
Em análise dos referidos processos constata-se que o juízo entendeu que a Concessionária cumpriu as exigências determinadas pela resolução e o que fixou o Tribunal Pleno através do Incidente para fomentar o alegado, segue trecho de fundamentação da sentença prolatada pelo Juiz Augusto Bruno de Moraes Favacho nos autos do processo 0806677-64.2020.8.14.0028, (2021):
[ … ] que a concessionária de energia elétrica Reclamada fez a devida confecção do TOI, com a descrição da ocorrência constatada, memória descritiva dos cálculos do valor apurado referente às diferenças de consumos de energia elétrica e de demandas de potências ativas e reativas excedentes, dos elementos de apuração da ocorrência, bem como, concedeu a oportunidade de a Reclamante poder realizar sua defesa administrativa, conforme estabelece o artigos 115, 129, 130 e 133, da Resolução n° 414/2010, o que vai de consonância com a tese firmada pelo IRDR, validando a cobrança ora em discutida em juízo.
Resultando na improcedência da ação para o reclamante e parcialmente procedente a ação para o pedido contraposto, determinando que o reclamante efetue o pagamento do débito ora discutido.
Quanto aos demais processos, seguiram a mesma linha de fundamentação, que os reclamantes deixaram de pagar pelo real consumo de energia elétrica consumida, ou seja, no período de irregularidade usaram uma certa quantidade de energia elétrica, no entanto, pagaram valores bem menores em suas faturas anteriores a fatura de CNR, tal afirmativa se embasa nos documentos de comprovação juntados pela demandada, constatado daí que a reclamada procedeu nos termos da Resolução 414/2010, da ANEEL, a única ressalva feita pelo juízo foi quanto a forma de cálculo, que entendeu que deveria ser aplicado a forma prevista no artigo 115, ao invés do artigo 130 da Resolução, por não se trata de procedimento irregular e sim de deficiência na medição, motivo pelo qual, no mérito, não desconstituiu o débito, apenas determinou o recálculo, resultando em parcialmente procedente para os reclamantes, devido o recálculo, e parcialmente procedente o pedido contraposto por não desconstituir o débito.
Destarte, tendo por base a análise processual aqui discutida, pode-se desde já observar os efeitos causados a partir da uniformização das teses fixadas no IRDR, a qual direciona o julgador a um mesmo apontamento jurídico de forma a não causar a violação a princípios basilares do direito, principalmente aqueles norteadores do instituto aqui discutido, ao passo que antes da fixação das teses, pela literalidade do art. 129, § 2º da Resolução 414/2010 “[ … ] ao consumidor ou àquele que acompanhar a inspeção, no ato da sua emissão, mediante recibo” ficava em aberto a interpretação para os juízes determinar a legitimidade de quem recebeu ou acompanhou a inspeção, e tornar válida ou não a cobrança, portanto, com a fixação da tese, a divergência que poderia resultar em diferentes decisões, são sanadas, visto que declara válido o documento quando realizado na presença do consumidor contratante ou de seu representante legal, bem como de “qualquer pessoa” ocupante do imóvel no momento da fiscalização, desde que plenamente capaz e devidamente identificada, a amplitude fixada torna válida o TOI que antes poderia ser considerado invalido por ter sido assinado por qualquer pessoa.
Nessa ideia, nota-se que o julgamento dos 22 processos fundamentados nas teses fixadas, faz valer a finalidade do IRDR na perspectiva processual que é o julgamento em massa de demandas com o mesmo objeto de conflito, resultando numa igualdade de julgamento garantindo a segurança jurídica.
Nesse diapasão expressa Siqueira (2015 p. 23):
Essa rápida solução aos litígios repetitivos trazida pelo IRDR é interessante de vários ângulos pois se estabelece segurança jurídica, isonomia entre os jurisdicionados, ou seja, se tem a certeza de que todos os jurisdicionados receberão a mesma decisão, como a mesma qualidade e o mesmo conteúdo de julgamento, na hipótese em que se estiver diante do mesmo assunto.
Acredita-se que o julgamento do referido Incidente e a ampla divulgação sobre as balizas podem reduzir a distribuição de novas demandas sobre CNR, ou elevar as possibilidades de acordos, já que as partes ao levarem suas demandas ao advogado ou ao Centro de Atermação podem ser cientificado sobre como decidiu o Tribunal, claro, verificados os documentos probatório, e a possível decisão do juiz de 1° grau, levando as partes a um possível parcelamento, por exemplo, a ideia não é evitar o acesso à justiça, mas sim a solução consensual de conflitos.
Verifica-se também que diante da respeitada fixação das teses a empresa concessionária poderá ser mais cautelosa, e tornar ainda mais efetiva e clara as informações em relação ao procedimento estabelecido. De forma que esses conflitos possam ser resolvidos já na esfera administrativa, evitando o abarrotamento do poder judiciário com demandas que poderiam ser solucionadas de forma amigável. Essa necessidade se revela quando verificamos que dos 22 processos, 05 dos demandantes tentaram resolver no PROCON, outros 05 fizeram reclamações na reclamada, tendo seus pedidos indeferidos, e outros 12 buscaram a solução diretamente no Judiciário através das respectivas ações.
A empresa também, como forma de evitar o faturamento de valores altíssimos gerando incapacidade de os consumidores efetuarem o pagamento, poderia determinar meios eficazes de descobrir os defeitos ou as irregularidades já no início, afinal existe a necessidade que as concessionárias façam investimento tecnológico, inclusive é uma das exigências preconizadas na Lei 8.987/95, lei das concessões, em seu artigo 6º parágrafo 2º que assim dispõe: “(…) a atualidade compreende a modernidade das técnicas, do equipamento e das instalações e a sua conservação, bem como a melhoria e expansão dos serviços”.Podendo até mesmo, ser através de inspeções regulares, visto que a empresa como a detentora de técnicas tem essa capacidade, e a partir disso valorizar a relação com o consumidor.
Considera-se que o judiciário recebe de forma rotineira críticas em relação ao tempo dos processos, isso por parte da sociedade que se mostra muitas das vezes insatisfeita com a lentidão do Poder Judiciário, há ainda relatos quanto às decisões em casos semelhantes que a solução se dá de formas opostas. Nesse contexto, com base no presente trabalho foi possível observar como a justiça evoluiu, visto que a sociedade cresceu, e no decorrer do tempo, direitos foram sendo reconhecidos, acarretando uma vasta procura ao Judiciário para solução de litígios em que o Estado atua como jurisdicional.
Nesse mesmo diapasão, tem-se a necessidade de adaptação e criação de métodos capazes de satisfazer a sociedade que depende desse serviço, os jurisdicionados, devido a isso, ao longo dos anos o legislativo se preocupou em colaborar no combate a realidade de lentidão e insegurança jurídica no Poder Judiciário, com uma tendência notória de uniformização da jurisprudência e valoração de precedentes judiciais.
É nessa perspectiva que se nota a criação do Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas, instituto criado pelo Novo Código de Processo Civil que visa diminuir o tempo do processo a partir da ampliação do caráter vinculante das decisões em processos repetitivos, ficando a cargo dos tribunais a uniformização, afirmativa fundamentada no que expressa o artigo 926 do mencionado código, destacando que os tribunais devem se organizar de tal maneira que não pode haver divergências internas sobre questões jurídicas idênticas.
A partir da análise dos processos, foi adquirido suporte para definirmos os principais fundamentos fáticos, probatórios e de direitos, tudo isso com a finalidade de identificar os impactos causados sobre as ações que tramitam na respectiva unidade jurisdicional. Após a ciência e estudo sobre o julgamento do IRDR sobre CNR no Tribunal de Justiça do Estado do Pará, delimitou-se as balizas referentes à atuação da concessionária de energia em relação a inspeção para a apuração de consumo de energia não registrado e, consequentemente validar as cobranças de débito realizadas a partir dessas inspeções.
A conclusão que o trabalho chegou é que a CELPA/Equatorial está adotando em grande parte das ações as determinações corretivas definidas em tese do presente IRDR, atendendo às diretrizes inseridas na Resolução nº 414/2010 da ANEEL, representando ao equivalente a 90% de procedência nos pedidos contrapostos dos processos julgados, em que o juízo entendeu que a Concessionária cumpriu as exigências determinadas pela resolução e o que está fixado pelo Tribunal Pleno através do IRDR.
Neste contexto, se induz dizer que, os processos já julgados estão de acordo com as balizas fixadas no presente IRDR, possuindo os mesmos conjuntos probatórios apresentados pela parte requerida, onde apresenta a prova da efetivação e regularidade do procedimento administrativo disciplinado na Resolução nº. 414/2010 seguidos os mesmos sentidos de julgamentos, sendo os pedidos improcedentes para as partes autoras da ação, devendo estas arcar com o pagamento do consumo que outrora não fora registrado e, procedente ou parcialmente procedente para os pedidos contrapostos pela parte requerida, resultando na determinação do pagamento do consumo não registrado.
Portanto, é possível pontuar quais os impactos causados sobre essas ações a partir da uniformização das teses fixadas no IRDR, primeiramente, é possível observar que a fixação das teses jurídicas norteadoras garante uma previsibilidade, isso porque evita que causas idênticas sejam decididas de modo diverso, trazendo também previsibilidade nas futuras demandas, podendo assim as partes criar estratégias em suas alegações ou defesas, consequência disso também será uma maior atenção a questão do procedimento correto a ser seguido nas inspeções, tendo em vista que, na falta de alguma especificidade a cobrança não será válida.
Diante disso, é mister destacar o cumprimento da finalidade do IRDR na perspectiva processual e constitucional nas ações aqui debatidas, em vista que evitará a insegurança jurídica nas decisões judiciais por parte do juízo, considerando o julgamento dos processos de forma iguais, concretizando o que se chama de Estado Democrático de Direito, o julgamento em massa desses 22 processos também impacta no índice de produtividade da vara, e consagra o direito à razoável duração do processo, o conhecido princípio da celeridade processual, principalmente dos processos futuros, tendo em vista que se firmou uma tese, afinal as teses são vinculativas e evitam que o juízo fique buscando saídas para uma solução já apaziguada.
Verifica-se também que, diante da fixação dessas teses, podem-se reduzir as demandas, elevar-se a possibilidade de acordos e diminuir a quantidade de recurso, diante da pacificação do entendimento pelo TJPA e pelos resultados aqui colhidos ao demostramos que em grande parte das demandas a concessionária está cumprindo com o procedimento determinado. Evidencia-se ainda que, abre-se a possibilidade dessas demandas serem solucionadas ainda em fase administrativa, desafogando o judiciário, e especificamente o 2° Juizado Especial de Marabá/PA.
São impactos significativos ao consumidor, considerando que poderá contestar cada elemento constante no procedimento, garantindo o exercício do contraditório e da ampla defesa. Há de considerar também impactos econômicos considerando as condenações que determinam o pagamento dos valores auferidos, podendo no caso concreto haver apenas seu recálculo, mas não desonerá-lo da dívida, dito isso, levanta-se o questionamento da importância da conciliação nessas demandas, levando em conta os resultados colhidos em que apenas 45% dos demandantes tentaram pela via administrativa ou pelo Programa de Proteção ao Consumidor, visto a homologação de acordo nos casos de CNR que se mostram em valor indesejável de 0%.
A finalização do estudo e o conhecimento aqui adquirido durante todo o processo levaram a ponderar a importância da realização de acordos, bem como tornou mais efetiva e clara as informações em relação ao procedimento estabelecido. A construção desse conhecimento foi necessária para constatarmos os reais impactos causados nos processos que estão em trâmite e as futuras ações que podem ser postuladas no 2º Juizado especial de Marabá, de todo os aspectos observados conseguimos demonstrar que o julgamento do IRDR, refletiu seus efeitos as partes que deverão se atentar às alterações no consumo e as irregularidades do procedimento, e o julgamento de forma igual, sem divergências, efetivando os princípios constitucionais.
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