O moderno canto das sereias: o discurso político; ensaio sobre o discurso produzido pelos marqueteiros políticos

“O discurso não é simplesmente aquilo que traduz as lutas ou os sistemas de dominação, mas aquilo que se luta, o poder que queremos nos apoderar”. (Michel Foucault).

Resumo: Há muito tempo quem está dominando esta parafernália são os chamados “marqueteiros”, que preparam desde discurso, entrevista, debates, ou seja, todo e qualquer pronunciamento vem eivado da interpretação baseada em aspectos científicos, e técnicos, de como, o que, e quando se falar, tendo um controle total sobre o candidato, a ponto de ele deixar de reproduzir o próprio pensamento, para se tornar uma “pessoa” conforme o marqueteiro idealizou baseado nas pesquisas de opinião pública, de dados coletados, e de um programa que também é reproduzido pelo formatador de perfil de plantão.

Palavras chaves: Discurso; Política, Marqueteiro; Lei; Candidato.

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Abstract: Long ago who is dominating this fashion are called "marketers" who prepare from speech, interview, debate, ie, any pronouncement comes riddled technical interpretation based on scientific aspects, and how, what, and when talking, having a total control over the candidate to the point he left to play the thought itself, to become a "person" as envisioned marketer based on public opinion surveys, collected data, and a program that is also reproducedby the formatter call profile.

Keywords: Speech, Politics, marketer; Law; Candidate.

Sumário: Introdução; 1. As diversas formas de campanha eleitoral e o discurso; 2. O discurso político e suas características escondidas; 3. Os perigos do Discurso Político; Conclusão.

Introdução

Em pleno ano de eleições, se observa a multiplicação dos discursos televisivos, em jornais, na internet, enfim, em todos os meios de comunicações que possam dar azo a esta modalidade de divulgação.

Há muito tempo quem está dominando esta parafernália são os chamados “marqueteiros”, que preparam desde discurso, entrevista, debates, ou seja, todo e qualquer pronunciamento vem eivado da interpretação baseada em aspectos científicos, e técnicos, de como, o que, e quando se falar, tendo um controle total sobre o candidato, a ponto de ele deixar de reproduzir o próprio pensamento, para se tornar uma “pessoa” conforme o marqueteiro idealizou baseado nas pesquisas de opinião pública, de dados coletados, e de um programa que também é reproduzido pelo formatador de perfil de plantão.

Este quadro verdadeiro dos dias atuais demonstra que aquela frase, aquele pensamento posto, que a observação bem feita, nada mais é do que as mãos desse profissional que forja um perfil em um candidato com uma equipe que o acompanha diuturnamente e sem cessar para não deixar perder e nem passar nada. É como um papel ensaiado para uma peça de teatro onde o autor fala, age e atua como o diretor assim determina. Este teatro político criado nas últimas décadas tem encontrado eco no povo, despreparado para esta atuação, pois, com este despreparo de conseguir interpretar o que existe por trás desta atuação, são vítimas destes atores no papel de políticos e acreditam que as palavras, os atos cênicos magistralmente ensaiados correspondem com a verdade.  

Diante desta afronta surgem as perguntas: Como se proteger desta fraude? Há como identificar estes discursos maquiados? Quais as soluções que se poderiam ser imposta para acabar com este império do marketing?

1. As diversas formas de campanha eleitoral e o discurso

Estes discursos tem espaço nos meios de comunicações de forma seletiva, se escolhe aqueles que mais profusão se pode alcançar, e se povoa com toda sorte de informações buscando fazer frente a toda sorte de importância necessária para o avanço tão importante para se ter domínio no cenário político.

Como eles se apresentam, cumpre buscar para construir o formato que se é dado:

a) Propaganda eleitoral: este o meio oficial atrativo e gratuito pela legislação, tendo cada partido direito a uma quantidade de tempo estabelecida pela representatividade em sua composição no Congresso Nacional, ou na Assembleia Legislativa Estadual, ou na Câmara Municipal. Com isso e para a conquista de um maior tempo se faz a chamada aliança partidária se comprometendo a relocar os partidos dessa aliança no futuro governo. Nesta propaganda que nos dias atuais têm inserções todas as semanas por algum partido político, se faz uso da linguagem arrebatadora e construída de forma a induzir aqueles que assistem a imaginarem através do que se vê e se escuta uma realidade no mínimo distorcida. Na campanha eleitoral oficial, aquela próxima ao dia de eleição é notória como se usa e abusa de dados discutíveis, de imagens formatadas, de linguagem populista, usando nesta figura da língua portuguesa, um mecanismo de aproximação com a população mais pobre, mais simples. Este uso é comum entre oradores para se fizer entendido, para se fizer compreendido, mas o abuso, e os traços usados deste método nos discursos políticos beira a ilegalidade, uma vez usarem de artimanhas e ficar a margem do ilegal, em seu uso.

b) Comícios eleitorais: Esta modalidade de campanha arrebata os possíveis eleitores e traz uma forma de “feedback”, de como a campanha na TV e rádio andam, possibilitando resgatar imagens e entrevistas para a campanha televisiva e radiofônica. Numa mescla de simpatizantes e de pessoas “contratadas” para estarem ali, se usa e abusa de jargões populares, nos discursos acalorados, principalmente falando do passado, atacando os chamados “inimigos”, que são nomeados ao bel prazer do candidato que tem o microfone para fazer uso de todos seus discursos. A cena é típica, sempre há os chamados “cabos eleitorais” que a cada frase de efeito, vibra, grita, se impõe para a “multidão” que ali está para assistir se manifeste, mesmo que sem compreender o que está sendo dito, o importante é se manifestar para gravar imagens que farão parte do programa eleitoral na TV. A manipulação neste certame é evidente, a condução de ânimo dos expectadores é evidente, o uso de recursos que aumente a aceitação do eleitorado é claro. Há como no teatro os atores coadjuvantes, os figurantes, ocupam seus papéis e mantém fiéis ao que está escrito, seguindo rigorosamente a encenação para que a peça alcance seu apogeu, possa fazer o povo sonhar. Então a pompa, é indispensável e toda forma de demonstração de poder devem a todo custo ser escancarada.

c) Debates públicos: Embora exista aqui no Brasil ele é um meio utilizado de formas as avessas do que se vê fora de nosso país. Aqui aquele que está distante, normalmente falta, não comparece para não ser alvo dos demais debatedores, esta estratégica usada também há muitos anos tem proporcionado um espetáculo à parte na corrida eleitoral. Não foram poucas as vezes que no debate do segundo turno se viu um único candidato comparecer enquanto o outro simplesmente ficou ausente. Esta estratégica marqueteira calcula se o candidato que está à frente vai perder quanto se faltar e quanto ganharia se comparecesse, nesta subtração é decidida presença ou ausência.  Não há como se pode ver respeito ao debate, mas só se importa com os números finais, cumpre dizer que mesmo quando o candidato comparece, as perguntas, assuntos, e temas, são previamente enviados, para que o marqueteiro tenha tempo de maquiar as respostas e poder “produzir” material que atenda a resposta “necessária”. Tudo muito longe da lisura, do bom debate, da transparência, da necessidade que se teria de reproduzir os fatos tão necessários para formar a opinião e decisão do eleitor. Mesmo dizendo que é ao vivo, todas estas providências proporciona aos candidatos amplas vantagens de defesa, e a fuga de assuntos mais pertinentes a necessidade do cargo. Com todo este preparo fica quase impossível se perceber o despreparo do candidato, a falta de experiência, a falta de projetos, a falta de liderança, como tudo é muito ensaiado meticulosamente e regado ao bom treino, descobrir o que de fato é aquele candidato passa a ser quase impossível.

d) Entrevistas a programas de TV e rádio: Infelizmente a exemplo do que já foi descrito acima, tudo é previamente combinado, acertado, caso não faça assim, não há entrevista. Desta forma mesmo qualquer pretensão de arrancar fatos do candidato fica engessado com esta postura protecionista dos marqueteiros, que assumem uma postura de donos do candidato, e de tudo que se diz respeito a eles.

Diante destes fatos fica evidente não ser o objetivo central dos candidatos se mostrarem como realmente são, mas sim, criarem uma imagem de “marketing”, que atenda seu eleitorado, não estaria longe dos fatos afirmarem que é uma forma de propaganda enganosa, uma vez não se poder perscrutar aquele que se candidata a este ou aquele cargo político, mas permitir que um marqueteiro, tenha a posse de “fazer”, de “criar”, um personagem que seja vendável a todos para este ser eleito.

O discurso fica afiado ao “programa de governo”, ou propostas, produzido e revisto pela equipe de “marketing” do candidato, todas as falas, expressões, palavras chaves, jargões, tudo isso é solto de forma estratégica para um objetivo final, todos os passos, até a aparência, forma de se vestir, corte de cabelo, tudo absoluto tudo é visto e revisto pelo marqueteiro. No fim, não há uma pessoa disputando uma eleição, mas um produto criado em cima de um projeto, um boneco de ventrículo que só fala conduzido por uma ordem expressa, de seu mentor, de seu proprietário.

Para ampliar esta ideia visualizando o que de fato se tem feito neste território, cumpre observar:

“Marketing político é o segmento específico dentro da comunicação mercadológica voltado para o ambiente político que visa estreitar a relação de expectativa de um determinado grupo de pessoas em relação à um candidato através de suas propostas e projetos. A propaganda é uma tentativa de influenciar a opinião e a conduta da sociedade, que ao expressar uma ideologia, manifesta-se politicamente. Duas campanhas que fizeram sucesso na história foram a de Adolf Hitler com seu regime nazista e a recente campanha liberal do atual presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, com ajuda de seus estrategistas Joseph Goebbels e David Axelrod, respectivamente. Fazer com que milhões de pessoas sigam uma ideologia não é tarefa fácil e exige muita inteligência e persuasão da parte desses marqueteiros. Paul Joseph Goebbels, figura chave do regime nazista, é alemão, nascido em Berlim. Foi nomeado Ministro do Povo e da Propaganda do governo Nazista graças aos seus belos textos e seu perfil fervoroso exercendo severo controle sobre as instituições educacionais e os meios de comunicação. Admirável, não por sua ideologia, mas pela sua capacidade de fazer um único líder mobilizar uma nação por uma causa nada convencional. Criou o cumprimento “Heil Hitler”, que mais tarde desempenhou o papel de cumprimento entre alemães seguidores da ideologia, que até hoje é usado por muitos metaforicamente. A propaganda nazista foi o principal instrumento de ascensão e um dos principais pilares de sustentação do regime de Hitler.É verdade que a arte de convencer pela palavra é bem antiga. Napoleão Bonaparte, por exemplo, dizia: “Para ser justo, não é suficiente fazer o bem, é igualmente necessário que os administrados estejam convencidos”. (http://www.trabalhosfeitos.com/ensaios/Melhores-Marketeiros-Pol%C3%ADticos-Da-Hist%C3%B3ria/7206.html).

2. O discurso político e suas características escondidas

O discurso que deveria servir para apresentar as propostas e intenções dos candidatos políticos, hoje tem uma nova função: a de passar uma imagem; que nem sempre corresponde com a verdade; de uma pessoa muitas vezes desconhecida, ou ainda, que durante grande parte de sua vida pensava de uma forma, mas que pelas habilidosas mãos de um profissional, consegue sem ser muito notado, mudar totalmente sua postura e seu pensamento.

Essa mágica, se assim se pode chamar, tem possibilitado e muito a ascensão de pessoas ao cenário político que se não usasse deste recurso jamais se quer poderiam pleitear concorrer a qualquer cargo eletivo. Com esta prática contumaz essa impossibilidade tem se transformado em realidade e elevado a condição de ser possível se eleger qualquer pessoa independente de quem seja, de possuir um passado obscuro, de ser alguém que se falasse sem estas rédeas de um técnico, fatalmente seria afugentado e escorraçado nas urnas.

Foucault, já tratava deste tema no ano de 1970, então isso não é absolutamente uma novidade, apenas aqui no Brasil se tem abusado de forma escancarada deste instrumento sem uma medida razoável. Cumpre ver o que o filósofo afirma:

“[…] em toda sociedade a produção do discurso é ao mesmo tempo controlada, selecionada, organizada e redistribuída por certo número de procedimentos que tem por função conjurar seus poderes e perigos, dominar seu acontecimento aleatório, esquivar sua pesada e terrível materialidade”. (Foucault, 2009, p. 8,9).

Como demonstra o texto foucaultiano, o discurso cumpre um papel de controlar, selecionar, organizar e redistribuir certo “número de procedimentos”, com a finalidade de proteger e assegurar o poder de perigos, dominando acontecimentos aleatórios, assim fazendo o controle de todos os aspectos que se julgue necessário, mantendo o objetivo final.

 O discurso desta feita passa a ser um ingrediente a ser preparado com todos os engodos possíveis para enganar a todos menos avisados do seu perigo e alcance, e se isso só não bastasse, ainda gera uma imagem ao candidato que ele jamais possuiria caso não estivesse nas mãos técnicas de um marqueteiro.

Nesta mesma esteira de análise do discurso encontra-se Aristóteles, na vanguarda com sua obra Retórica que apresenta um baluarte em matéria de análise da forma do discurso:

“Em "Retórica", o filósofo grego analisa com precisão os elementos que constituem um discurso. A leitura do livro mostra que alguns conceitos tidos hoje como inovadores já eram analisados pelo pensador, como o fato de a retórica ser dividida em três tipos: a política (ou deliberativa); a forense (ou legal); e o epidíctico (ou a oratória que censura ou louva um determinado elemento, aspecto, personagem). No caso da retórica deliberativa, Aristóteles teoriza que a maneira mais importante e efetiva para obter sucesso em persuadir o eleitorado e dissertar sobre as coisas públicas é entender profundamente as formas de governo, assim como seus costumes, suas instituições e seus interesses. Isso porque, argumenta Aristóteles, "os homens são convencidos por considerações de seus interesses; e seu interesse está baseado na manutenção da ordem estabelecida".” (http://filosofia.uol.com.br/filosofia/ideologia-sabedoria/17/a-arte-de-palavrear-artificio-bastante-usado-nos-discursos-133499-1.asp)

 Usando deste elemento retórico, Aristóteles dispõe sobre três tipos existentes: “a política (ou deliberativa); a forense (ou legal); e o epidíctico (ou oratória que censura ou louva um determinado elemento, aspecto, personagem).” Uma vez expondo estes elementos distintivos, discorre sobre o papel da retórica na política “Aristóteles teoriza que a maneira mais importante e efetiva para obter sucesso em persuadir o eleitorado e dissertar sobre as coisas públicas é entender profundamente as formas de governo, assim como seus interesses”.

Na moderna forma de se fazer política e especialmente campanha, o que importa é o que o marqueteiro descobre, tem sensibilidade através de técnicas arrojadas que podem levaram fatalmente o programa eleitoral a reproduzir o que é de interesse do povo, mesmo que, lá no fundo todos saibam que muitas destas famosas promessas de campanha nunca deixem de serem só promessas assim mesmo, se iludem como que hipnotizados como abelha para um tacho quente de doce, que ao sobrevoa-lo terá fatalmente suas asas derretidas, mais nada importa, só o prazer de poder voar, sem se importar com o perigo.

Ainda neste tema retórica cumpre verificar mais uma citação que dispõe sobre o tema:

“A discussão mais comum, hoje em dia, gira em torno da chamada retórica de Perelman, que tirou seus exemplos de discursos filosóficos e políticos, entre outros. Devido a isso ele assume o caráter de convencimento que a retórica proporciona aos discursos dos oradores. "Eu diria que a retórica se configura por um conjunto de estratégias linguísticas que visam à persuasão por meio da comoção", opina a professora e doutoranda em Linguística pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Suzana Leite Cortez. João Bôsco Cabral dos Santos, doutor em Estudos Linguísticos pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), explica melhor: "o orador chama atenção construindo uma imagem que espelhe aquilo que seus ouvintes gostariam de ouvir. A gesticulação e a forma como se aproxima, toca e fala com as pessoas têm que estar em sintonia com a forma como as palavras são ditas e como esse orador direciona seu olhar". Para João Bôsco dos Santos, "nos dizeres políticos é preciso falar o que o outro quer ouvir de si, como se fosse o outro dizendo para si mesmo". http://filosofia.uol.com.br/filosofia/ideologia-sabedoria/17/a-arte-de-palavrear-artificio-bastante-usado-nos-discursos-133499-1.asp)

 Neste estudo levado a efeito pela pesquisadora Suzana Leite Cortez, afirma: “a retórica se configura por um conjunto de estratégias linguísticas que visam à persuasão por meio da comoção”. Ora, se assim é o elemento teatralidade, aparência e opulência são obrigatórias na construção deste discurso, sem haver nenhuma importância de se cumprir ou não o que foi prometido, idealizado, ou até mesmo, vislumbrado. Tudo é um jogo de cena, e como tal, precisa apenas de luz, câmera e ação.  

Já para o estudioso e Doutor em Estudos Linguísticos João Bôsco Cabral dos Santos, "o orador chama atenção construindo uma imagem que espelhe aquilo que seus ouvintes gostariam de ouvir. […] nos dizeres políticos é preciso falar o que o outro quer ouvir de si, como se fosse o outro dizendo para si mesmo”…] Como mais uma vez pode se ver, o que importa não é a busca da veracidade nas palavras, no compromisso deposto, mas sim, apresentar o que o povo quer e deseja ouvir, quem consiga atingir este objetivo, quem alcance esta meta, certamente terá mais sucesso na empreitada de ganhar a eleição sem, contudo, estar compromissado em fazer minimamente qualquer coisa que tenha assumido como a famosa “promessa de campanha”.

3. Os perigos do Discurso Político

Se é certo assumir que política é a arte da persuasão, certo também é admitir que no discurso político esta prática é levada a efeito numa tangente infinita. Não há limites para que o marqueteiro, grande cérebro pensante da campanha possa produzir em forma de discurso.

Movido por pesquisas que flexiona e estabelece o ânimo do eleitorado, os marqueteiros usam e abusam da retórica para chegar ao grande objetivo que é deixar o povo curvado ante a ideia de melhorias, de conquistas, de possibilidades que jamais fizeram, ou farão parte das verdadeiras intenções dos candidatos. O que se está em jogo é vencer ou vencer e não em mudar a ordem das coisas.

“O discurso que seduz e convence produz uma espécie de deleite: ele diz aquilo que se espera ouvir, porém de modo agradável. […] Quando considerado do ponto de vista subjetivo, é útil tudo o que é do interesse de quem pensa os critérios da utilidade e a maneira de praticá-los. Quando considerado do ponto de vista objetivo, o útil apresenta-se sob a forma de resultados. Assim, para o bom funcionamento da sociedade como lugar dos muitos discursos é mister que os critérios e as práticas subjetivas configuradores do poder construam os seus "cantos de sereia", isto é, que representem a prática da vida segundo um modelo aparente, otimizador das relações de produção que, não obstante, esconde a ambigüidade de ser "belo e agradável", quer dizer, apaixonante, mas também restritivo e condicionante. Ser ético passa a ser seguir as determinações codificadas e não pensá-las, muito menos problematizá-las. Do ponto de vista dos resultados obtidos com a prática freqüente dos valores, a ética destina-se aos elementos da coletividade. Contudo, tendo-se em conta a subjetividade produtora de valores, o útil não se mostra nos resultados, mas nos interesses que entoam a ordem melódica do canto da sereia: o poder efetiva-se por meio dos discursos e aquele que o exerce se regozija com a realidade político-social mantida nos limites da aparência”. http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0101-32622004000300005

a) “O discurso que seduz e convence produz uma espécie de deleite: ele diz aquilo que se espera ouvir” – Nesta assertiva se encontra todo o necessário para extrair o entendimento de como funciona esta ideia daninha do discurso político: esta é chave que o marqueteiro descobriu para encantar, hipnotizar, o eleitorado.

b) “é útil tudo o que é do interesse de quem pensa os critérios da utilidade e a maneira de praticá-los”- Esta é o grande papel do especialista, do técnico que faz a leitura do eleitorado e decodifica, transmitindo ao candidato e seu diretório como se deve agir. Há uma simbiose impermeável, impenetrável.

c) “como lugar dos muitos discursos é mister que os critérios e as práticas subjetivas configuradores do poder construam os seus "cantos de sereia" ”- O canto das sereias ocorre quando o discurso assume o papel de induzir os eleitores a tomar como verdade absoluta aquilo que é prefigurado no discurso eleitoral. A representação deste canto leia-se promessas de campanhas é como a lenda das sereias e os marinheiros, nela, o marinheiro que ouvisse este canto ficavam tão certo que encontraria a sereia (o estereótipo da mulher perfeita) só que em forma de peixe, que enfrentava o mar, sem proteção a fim de alcança-la. Assim tem acontecido no moderno canto das sereias.

d) “a realidade político-social mantida nos limites da aparência” – A aparência é o grande objetivo tentado e muitas vezes alcançado por estes maestros das modernas campanhas políticas. A forma de se vestir, o que, quando e com quem falar, o que come, quando, com quem, os furos de reportagens, muitas vezes criados com o fim único de gerar esta “aparência” de herói e único salvador da situação.

Estes são os maiores perigos existentes no discurso político uma vez serem estes destituídos da busca da veracidade, da realidade ou até de mostrar o que de verdade pensa o político por trás das palavras.

É mel na boca das pessoas cansadas de lutar sem vitória que ao escutarem e acreditarem nas palavras alvissareiras, se entrega a este sonho e lutam para vitória do seu candidato.

Cumpre ainda lembrar:

“A política passará a ser exercida em todos os meandros da sociedade e será definida como a arte da persuasão. Persuasão como convencimento e persuasão como falácia e hipocrisia. […] A retórica anuncia a figura do orador que luta para subjugar a massa de seus ouvintes. O lugar do discurso reveste-se de poder, passando a ser o lugar da autoridade. […] o lugar da autoridade política e aqueles que a ela se submetem. […]o modo de ser dos cidadãos, obedece à dualidade de posições sociopolíticas defendida pelos retóricos: de um lado a formação de uma classe de políticos-oradores que tende a ocupar os cargos públicos, de outro a formação de uma massa de receptores de discursos, manipulados em suas paixões, docilizados pela aparência dos discursos políticos. […] Opera-se uma cisão entre o sentido paidêutico necessário à constituição de uma sociedade ciente dos valores a serem praticados e uma imagem da política que se perpetua pelo fetiche e pela facilidade de aceitação promovida pela publicidade fabricada”. http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0101-32622004000300005

Não há dúvida que o texto acima embora reporte o tempo sofístico, traz e muito bem a realidade vivida nos dias atuais, principalmente na frase: “Persuasão como convencimento e persuasão como falácia e hipocrisia”, vem ao encontro da real situação presenciada na chamada moderna política. Se pudessem os eleitores ouvissem de fato e de verdade os que os políticos que eles elegem pensam, acreditam, e pretendem, jamais votariam neles. A falácia e hipocrisia ficaram descobertas e seria impossível apoiar tais pessoas. Daí entender, compreender o papel dos marqueteiros e o trabalho em mudar a ordem das coisas.

Cumpre ainda observar o que o texto acima cita: “de um lado a formação de uma classe de políticos-oradores que tende a ocupar os cargos públicos, de outro a formação de uma massa de receptores de discursos, manipulados em suas paixões, docilizados pela aparência dos discursos políticos”. A manipulação das paixões, que impulsiona as pessoas a se sentirem lembradas, amparadas, como ainda diz o texto em comento, docilizados, ou seja, levados a crerem naquilo que escutam torna tudo simples, verdadeiro, mas, sem perceberem a maquiagem e máscaras que todos eles usam a escolha das palavras certas, das frases de efeito, do tema correto, torna aquele que ouve uma presa fácil, inocente e sem chance de lutar contra esta onda de produção técnica.

Não é por menos que Foucault assim preceitua toda esta torrente:

“Não há sociedade onde não existam narrativas maiores que se contam, se repetem e se fazem variar; fórmulas, textos, conjuntos ritualizados de discursos que se narram, conforme circunstâncias bem determinadas. […] o discurso nada mais é do que um jogo, de escritura, no primeiro caso, de leitura, no segundo, de troca, no terceiro, e essa troca, essa leitura e essa escritura jamais põem em jogo senão signos. O discurso se anula, assim, em sua realidade, inscrevendo-se na ordem do significante”. (Foucault: 2009, p. 22 e 49).

Foucault deslustra toda a questão quando afirma: “o discurso nada mais é do que um jogo”, aqui há a clara demonstração do que vem a ser este jogo, ainda utilizando de suas palavras quando ele encerra dizendo “o discurso se anula, assim, em sua realidade”, é algo criado na forma de jogo com realidade própria, não a quem pensamos a que desejamos mais ao que seu interlocutor deseja. Não está na chamada realidade social, mais na realidade política que não se coaduna, apenas existe com função de manipulação e condução para uma ação certa, levar as pessoas a acreditarem cegamente naqueles que proferem, sem analisarem, sem pensarem nem lembrem o passado de quem está pronunciando. “O discurso nada mais é do que um jogo”.!

Conclusão

Ao rever questão tão necessária nos dias atuais fica evidente a artificialidade imposta nas campanhas eleitorais graças aos marqueteiros, que para não fazerem conhecidos seus candidatos/patrão, criam através do discurso controlado tudo que se possa reproduzir. A questão fica mais grave quando se observa algumas pessoas assumindo determinados cargos eletivos, sem preparo nenhum fruto apenas de uma imagem criada e desenvolvida por estes técnicos.

O que fazer? Como proceder para promover uma mudança nesta questão?

Mudanças na legislação e o endurecimento da própria opinião pública seriam de suma importância. Na legislação, a questão de fazer cumprir o plano de governo que também é feito pelos marqueteiros, com base em pesquisas públicas. Ora, se colocou no papel, se defendeu se usou da TV e rádio para divulgar, nada mais salutar do que cumprir exatamente o que ali foi proposto. Certamente não é algo fácil de fazer, mais seria divino presenciar a dificuldade entre falar e executar e ainda, diminuir o papel destes profissionais na arte do engodo, nas campanhas eleitorais.

Quanto à população ser mais exigente quanto aos debates reais não estes impostos pelos donos das campanhas, as agências contratadas para criar um candidato. Ir participar ser indagado, ser exposto em suas ideias, demonstrar se conhece mesmo do que está dizendo, e não se valer apenas do teleponto. Enfim, haver uma campanha mais real, com pessoas de verdade, não criadas, inventadas.

Por fim, é fato que estas coisas acontecem por dois fatores difíceis de aceitar mais que se não considerados serão sempre deixados à margem. O primeiro e muito importante é a educação geral. Hoje temos uma educação genérica, muito esparsa onde certamente há um benefício enorme para os pretendentes a superficialidades, pois, para eles os ouvintes tem que serem tal qual eles. Para uma melhora a qualidade neste quesito tem que ser mudado, aprender a pensar, a ter senso crítico, questionar acaba por serem fatores preponderantes.

Em segundo, não há fórmulas mágicas para se mudar as coisas ou o estado das coisas. Promessas fáceis, recompensas simples, devem ser totalmente e cuidadosamente desconsideradas. Temos que estar mais dispostos a saber o que devemos fazer, onde podemos ajudar, do que só exigir isto ou aquilo. As injustiças praticadas por décadas não serão de forma mágicas recuperadas. Não há recompensa sem trabalho. Talvez o maior engodo pregado e preconizado em todos os tempos é receber mais do que doar. A história está aí para descortinar esta mentira anunciada.

É possível e plenamente realizável existir alguém que assuma acima destas maquinarias modernas ser aquele que use da verdade, da realidade para poder transformar o país.

Acreditar é preciso!

 

Referências:
FOUCAULT, Michel, A ordem do Discurso, Ed. 18° , São Paulo, Ed. Loyola:2009.

Informações Sobre o Autor

Marcos Antônio Duarte Silva

Doutorando em Ciência Criminal UBA Mestre em Filosofia do Direito e do Estado PUC/SP Especialista em Direito e Processo Penal formado em Direito e Teologia Professor de Processo Penal e Direito Penal da Faculdade de Rondnia FARO Professor de Pós-Graduação da UNIJIPA pesquisador da PUC/SP e da CNPq


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Equipe Âmbito Jurídico

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