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O patrimônio genético e sua importância

A Carta Magna de 1988 alçou o patrimônio genético brasileiro à categoria de bem constitucionalmente protegido. Por patrimônio genético se deve compreender as informações de origem genética oriundas dos seres vivos de todas as espécies, seja animal, vegetal, microbiano ou fúngico.


Luís Paulo Sirvinskas[1] afirma que o patrimônio genético é formado pelos seres vivos que habitam o planeta Terra, o que inclui a fauna, a flora, os microorganismos e os seres humanos. A respeito do tema, o inciso I do art. 7º da Medida Provisória nº 2.186-16/01 define patrimônio genético como “informação de origem genética, contida em amostras do todo ou de parte de espécime vegetal, fúngico, microbiano ou animal, na forma de moléculas e substâncias provenientes do metabolismo destes seres vivos e de extratos obtidos destes organismos vivos ou mortos, encontrados em condições in situ, inclusive domesticados, ou mantidos em coleções ex situ, desde que coletados em condições in situ no território nacional, na plataforma continental ou na zona econômica exclusiva”.


Existe uma relação direta entre o patrimônio genético e a biodiversidade ou diversidade biológica, já que esta é o conjunto de vida existente no planeta ou em determinada parte do planeta. O art. 2º da Convenção Internacional sobre Diversidade Biológica, que foi promulgado pelo Decreto nº 2.519/98, determina que diversidade biológica “significa a variabilidade de organismos vivos de todas as origens, compreendendo, dentre outros, os ecossistemas terrestres, marinhos e outros ecossistemas aquáticos e os complexos ecológicos de que fazem parte; compreendendo ainda a diversidade dentro de espécies, entre espécies e de ecossistemas”.


A diversidade biológica é o mais importante pressuposto do direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, o qual é considerado pelo caput do art. 225 da Constituição Federal como bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida. Essa é uma consideração mais ampla acerca da temática ambiental, que leva em conta não apenas a individualidade dos recursos ambientais, mas especialmente a relação de interdependência de cada um destes entre si.


Na opinião de José Rubens Morato Leite[2], ao conceituar o meio ambiente o legislador brasileiro teve a intenção de destacar a relação de interação e unicidade entre os recursos ambientais, inclusive os seres humanos. É nesse sentido o entendimento de Antônio Herman de Vasconcellos e Benjamin:


Como bem – enxergado como verdadeira universitas corporalis é imaterial – não se confundindo com esta ou aquela coisa material (floresta, rio, mar, sítio histórico, espécie protegida etc) que a forma, manifestando-se, ao revés, como o complexo de bens agregados que compõem a realidade ambiental.


Assim, o meio ambiente é bem, mas como entidade, onde se destacam vários bens materiais em que se firma, ganhando proeminência na sua identificação, muito mais o valor relativo à composição, característica ou utilidade da coisa do que a própria coisa.


Uma definição como esta de meio ambiente, como macrobem, não é incompatível com a constatação de que o complexo ambiental é composto de entidades singulares (as coisas, por exemplo) que, em si mesmas, também são bens jurídicos: é o rio, a casa de valor histórico, o bosque com apelo paisagístico, o ar respirável, a água potável[3].”


Em vista disso o meio ambiente pode ser classificado de duas formas: como microbem e como macrobem. Enquanto na condição de microbem o meio ambiente é reduzido a um de seus elementos individuais, o que leva a destacar normalmente apenas o aspecto econômico ou estético desse bem, na condição de macrobem qualquer componente do meio ambiente merece ser protegido apenas por fazer parte de um sistema em que todas as partes estão interconectadas.


Se no macrobem é o aspecto imaterial do meio ambiente que se destaca, ao contrário do que ocorre com os microbens, é possível dizer que o patrimônio genético é um bem de contornos essencialmente extrapatrimoniais na medida em que diz respeito a uma espécie inteira ou a espécies inteiras e ao equilíbrio das espécies como um todo. São uma gama de informações estratégicas sob diversos aspectos, e necessárias ao equilíbrio do meio ambiente e à qualidade de vida da coletividade.


Em última análise isso implica dizer que a proteção da diversidade biológica não é apenas a garantia da sobrevivência de determinadas espécies e sim de toda e qualquer espécie, inclusive a humana, já que existe uma interdependência entre todas as formas de vida. É por isso que a defesa do patrimônio genético é consagrada pelo inciso II do § 1º do art. 225 da Constituição Federal como um pressuposto do direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado. 


Contudo, além de ser responsável pela estabilidade dos ecossistemas e uma das propriedades fundamentais do meio ambiente, o patrimônio genético constitui o fundamento das atividades sócioeconômicas. São diretamente dependentes da diversidade biológica a agricultura, a pecuária, a pesca, o turismo ecológico e uma grande parte das atividades industriais, como a indústria alimentícia, biotecnológica, cosmética, energética e farmacêutica.


Na verdade, exceto pelos minérios e pelos derivados do petróleo, todos os produtos e serviços colocados no mercado de consumo são retirados do estoque de biodiversidade da natureza, posto que têm origem animal, vegetal, microorgânica ou fúngica. São exemplos de tamanha riqueza os cereais, as flores, as frutas, as essências, os extratos medicinais, as madeiras, os óleos e as verduras.


Talvez a maior dificuldade para a defesa da diversidade biológica e de seu patrimônio genético seja o fato de na maioria das vezes tal exploração não resultar em benefício econômico imediato, já que o conhecimento do ser humano acerca das potencialidades dessas informações ainda é superficial. O fato é que, mesmo sem valor econômico estipulado, o patrimônio genético deve ser resguardado por conta de seu valor ecológico e por ser um elemento integrante do meio ambiente.



Notas:

[1] SIRVINSKAS, Luís Paulo. Manual de Direito Ambiental. 3 ed. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 246.

[2] LEITE, José Rubens Morato. Dano Ambiental: do Individual ao Coletivo Extrapatrimonial. 2 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003, p. 78.

[3] BENJAMIN, Antônio Herman de Vasconcellos e. Função Ambiental. In: BENJAMIN, Antônio Herman de Vasconcellos e (coord). Dano Ambiental: Prevenção, Reparação e Repressão. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1993, p. 75.

Informações Sobre os Autores

Maria Cecília Diniz Nunes Farias

Advogada e consultora jurídica

Talden Queiroz Farias

Advogado com atuação na Paraíba e em Pernambuco, Especialista Direito Processual Civil pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e em Gestão e Controle Ambiental pela Universidade Estadual de Pernambuco (UPE), Mestre em Direito Econômico pela Universidade Federal da Paraíba. Professor da Faculdade de Ciências Sociais Aplicadas da Paraíba e da Universidade Estadual da Paraíba. Assessor jurídico da Coordenadoria de Meio Ambiente da Secretaria de Planejamento da Prefeitura de Campina Grande (PB).


Equipe Âmbito Jurídico

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