Resumo: Este artigo tem como objetivo explorar aspectos relevantes acerca da autonomia e da independência do Porder Judiciário no Brasil, através da análise histórica do período da República antes e depois da Constituição Federal de 1988. O objetivo específico desse trabalho é oferecer ao leitor um estudo sobre os desafios enfrentados pelo Poder Judiciário durante os períodos analisados e de suas características hoje, de modo que, com isso seja possível lançar um olhar crítico para o amanhã. Nesse sentido, privilegia-se os recursos históricos, bem como, o estudo de caso real "o Direito do Amazonas ao Acre setentrional" levado ao Supremo Tribunal Federal (STF), de modo a demonstrar o paradigma de suas características (tímido a proativo) ao longo do período estudado, o que permitiu obervar o protagonismo no cenário nacional do Poder Judiciário em relação aos Poderes Executivo e Legislativo, sobretudo nas últimas décadas.
Palavras-chave: Judiciário – Brasil – República – Independência – Autonomia.
Sumário: 1 – Introdução; 2 – O Judiciário nos primeiros tempos da República; 3 – O Judiciário e as decisões sobre questões Política e Jurídica e o caso do Direito do Amazonas ao Acre Setentrional; 4 – O Judiciário no período entre guerras (1918 a 1939); 5 – O Judiciário após a Constituição de 1988; 6 – Considerações Finais; Referências.
"O poder corrompe. O poder absoluto corrompe absolutamente" John Emerich Edward Dalberg-Acton [1]
1 – INTRODUÇÃO
A Constituição Federal de 1988 muito contribuiu com o fortalecimento institucional do poder judiciáro, com destaque para os artigos 96 a 99 que aparelharam o poder judiciário muito mais do que as Constituições anteriores, pois trouxeram importantes ferramentas para a independência institucional, quais sejam, a autonomia administrativa, financeira e orçamentária (COMPARATO, 2015, p.16).
A Emenda Constitucional de número 45 de 2004, conhecida popularmente como a emenda da reforma do Judiciário tratou de incrementar esse trabalho do constituínte originário no sentido de dotar o Poder Judiciário de maior independência, inclusive atribuiu ao Supremo Tribunal Federal novas prerrogativas e competências como, por exemplo, a possibilidade de criação de súmulas vinculantes cujos efeitos tornam-se vinculantes (com o perdão da redundância) em relação aos demais órgãos do Poder Judiciário e à administração pública direta e indireta, nas esferas Federal, Estadual e Municipal.
Outro destaque importante que merece ser dado a EC n° 45/2004 foi a criação do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que muito embora tenha enfrentado a resistência (ADI 3367)[2] da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), o que prevaleceu foi o entendimento de que a criação do CNJ representa uma grande vitória para consolidar a harmonia das instituições do Estado – especialmente dentro do poder judiciário dada a composição paritária de membros da própria magistratura (Art. 103-B da CF/88) -, sendo essa uma expressão natural do princípio na arquitetura política dos freios e contrapesos[3], além disso, ao fim e ao cabo, revela o avanço no aperfeiçoamento do sistema de controle da magistratura.
Apesar de todas as garantias institucionais constitucionalmente previstas e acima citadas, o Poder Judiciário não está imune aos efeitos políticos do Poder Executivo. Felizmento em menor grau do que outrora, conforme será visto adiante. A exemplo disso, a Justiça do Trabalho neste ano enfrenta uma crise financeira capaz de comprometer a adequada prestação jurisdicional, a partir da drástica redução do seu orçamento promovida pela lei Orçamentária Anual (Lei 13.255/2016), que reduziu 90% das despesas de investimento e 24,9% nas de custeio no orçamento. [4]
Entretanto, o fato é que o Poder Judiciário na nova Ordem Constitucional vem exercendo cada vez mais uma posição de destaque entre os demais poderes, especialmente em função do seu papel contramajoritário na proteção dos Direitos Fundamentais das minorias, que muitas vezes são esquecidos pelo poder político majoritário. Portanto, não raras as vezes o Poder Judiciário é instado a resolver conflitos cuja solução deveria ser viabilizada pelos demais poderes, contudo, em razão de sua inércia por razões diversas ou até mesmo por má gestão pública, essas questões políticas são judicializadas, a fim de evitar o perecimento dos Direitos Fundamentais envolvidos. Tal fenômeno é conhecido por Judicialização da Política.
Por outro lado, nem sempre o perfil institucional do Judiciário foi marcado por esse protagonismo. Na realidade a história nos mostra que a característica predominante desse poder era de traços conservadores (SALAZAR, 1975, p. 14; KOERNER, 1998 apud CHAVES).
É nesse compasso que o presente estudo se desenvolverá, tendo como objetivo principal investigar os aspectos relevantes da atução do Poder Judiciário no Brasil, entre o período de 15 de Novembro de 1889, quando foi proclamada a República até os dias atuais, especialmente com as inovações introduzidas no cenário nacional pela Constituição Federal de 1988, com foco na independência e na autonomia do Judiciário, como forma de adquir uma visão crítica sobre a sua atuação, a partir das informações históricas, aliadas a análise do caso concreto levado ao Supremo Tribunal Federal.
O presente estudo é de fundamental importância para que se possa adquirir uma percepção crítica sobre a atuação do Poder Judiciário ontem, hoje e amanhã.
2 – O Judiciário nos primeiros tempos da República
Em 15 de Novembro de 1889, através do Decreto n° 1 firmado pelo Marechal Deodoro – chefe do governo provisório – foi proclamada a República. Antes mesmo da primeira Constituição Republicana, ainda em 1890 foram criadas a Justiça Federal e o Supremo Tribunal Federal (STF) (MATHIAS, 2009, P. 215).
A denominação Supremo Tribunal Federal foi adotada na Constituição Provisória dos Estados Unidos do Brasil publicada com o Decreto n.º 510, de 22 de junho de 1890, e repetiu-se no Decreto n.º 848, de 11 de outubro do mesmo ano, que organizou a Justiça Federal. A primeira Constituição Republicana foi promulgada no ano seguinte, em 24 de Fevereiro de 1891 que em seus artigos 54 a 61 atribuiu ao STF dentre outras a competência para realizar o controle de constitucionalidade das leis. Naquela época o Supremo era sediado no Rio de Janeiro, a capital da República, e era composto por 15 Juizes (era essa a denominação do cargo e não ministros como é hoje) dentre os trinta Juizes Federais mais antigos e os cidadãos de notável saber e reputação elegiveis para o Senado, nomeados pelo Presidente da República com a aprovação do Senado[5].
Não é dificil concluir que na medida em que o Estado confere prerrogativas aos magistrados por via de consequência estará construindo as bases para fortalecer o Poder Judiciário. Partindo dessa premissa ainda no Decreto n° 510/1890 editado pelo Governo Provisório da República dos Estados Unidos do Brasil começaram a dotar os Juízes de garantias importantes para o exercíco de suas funções. A exemplo disso, o artigo 56 estabeleceu a vitaliciedade para os Juizes Federais que somente poderiam perder o cargo por sentença judicial. Igualmente ficou estabelecida a irredutibilidade dos vencimentos e o foro privilegiado para os Juizes do STF que somente poderiam ser julgados pelo Senado e os Juizes Federais pelo STF.
Além disso, foi garantida autonomia administrativa com a possibilidade dos Tribunais Federais poderem eleger entre os seus pares aquele que presidiria a instituição cuja competência no âmbito do tribunal era nomear e demitir os empregados, como eram chamados os serventuários, bem como dos ofícios da Justiça e organizar as secretarias, da mesma forma competia aos Juizes em suas circunscrições judiciárias (MATHIAS, 2009, p. 219)
Acresça-se um detalhe importante, o Procurador Geral da República era nomeado pelo Presidente da República – até aqui nenhuma surpresa -, mas o detalhe vem a seguir: ele deveria ser um dos membros do STF (artigo 57, § 2° do Decreto n° 510/1890). Ou seja, isso revela um resquício do sistema inquisitório, no qual as duas funções de acusar e julgar eram exercidas pelo mesmo órgão. O contrário do que temos hoje no sistema acusatório no qual cada instituição exerce as suas funções com independência e autonomia, o Ministério Público acusa e o Judiciário julga. Isso sem dúvida se harmoniza melhor com o Estado Democrático de Direito.
Desse modo, a estrutura do Poder Judiciário naquele momento histórico foi desenhada com o Supremo Tribunal Federal sendo a mais alta corte de Justiça do país e de Juizes e Tribunais Federais espalhados pelo Brasil, tantos quantos o Congresso Nacional criasse.
Em 24 de Fevereiro de 1891 o Congresso Nacional promulgou a Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil que manteve a mesma estrutura do Judiciário antes definida nos Decretos n° 510 e repetiu no 848, ambos de 1890.
Destaque-se por oportuno que nenhum desses atos normativos do início da República tratou sobre o Poder Judiciário Estadual, pois limitaram-se a definir a estrutura do Judiciário somente no âmbito Federal. (MATHIAS, 2009, p. 220)
Os primeiros tempos da República foram conturbados, sobretudo no âmbito político, com conflitos no legislativo, a renúncia de Deodoro da Fonseca e a ascensão de Floriano Peixoto entre outros. De modo que, o Judiciário, naturalmente, não passaria incólume dessa instabilidade institucional. Tanto que Floriano Peixoto, embaraçou o funcionamento do STF, ora não provendo as vagas, ora nomeando para três delas um médico pediatra e dois generais. (MATHIAS, 2009, p. 232)
Ademais, os governos de Deodoro e Floriano exerceram fortes pressões políticas a fim de que os julgamentos do STF se submetessem ao controle do Senado. Entretanto, essa posição sofreu duras críticas de Rui Barbosa e ao final sucumbiu. Porém, conseguiram estabelecer a competência do Senado para julgar os ministros do supremo em caso de impeachment, como é até os dias de hoje. (COMPARATO, 2015, p. 17)
3 – O Judiciário e as decisões sobre questões Política e Jurídica e o caso do Direito do Amazonas ao Acre Setentrional.
O início dessa nova forma de governo, especialmente com o advento do novo ordenamento em 1891, o Judiciário passou a viver momentos delicados nos quais se revelou viver uma espécie de "crise existencial", visto que, de maneira ainda muito tímida recuava em debruçar-se sobre questões levadas a sua apreciação ao argumento de que não era de sua alçada decidir sobre questões de natureza política, muito embora ainda que de forma oblíqua essas questões afetassem frontalmente direitos individuais.
Nesse compasso, honras sejam dadas a Rui Barbosa pela valorosa contribuição jurídica no início desse período que serviram como farol ao marinheiro desorientado em meio as águas turbulentas do mar revolto. De modo que, graças a ele, o Supremo Tribunal Federal pode encontrar o verdadeiro sentido de sua vocação na defesa da Ordem Constitucional e da proteção dos Direitos Fundamentais, mesmo quando estes estejam acorbertados sob o manto dos abusos políticos do Estado (NOGUEIRA, 1980, p.10).
Entretanto, ainda nos dias atuais, apesar de ser considerado ousado e por vezes chamado de ativista, o Judiciário tornou-se o fiel depositário da confiança depositada pelo povo, como sendo o reduto da reputação das instituições, em razão do descrédito moral dos demais poderes.
Entretanto, ele é composto por seres humanos e, portanto, é falho, estando sujeito as vicissitudes humanas de seus componentes de modo que vez por outra questões ideológicas ou políticas se sobrepõe a racionaldade jurídica que se espera dele.
Contudo o perfil proativo hoje é o que predomina, de há muito, o perfil tímido dessa instituição deixou de prevalecer, isso sem dúvidas graças a sua independência e autonomia em relação aos demais poderes que ao longo do tempo foi se consolidando a partir do amadurecimento institucional sob os auspícios dos revolucionários ares emanados do novo ordenamento jurídico democrático reflexo dos novos anseios sociais.
A exemplo desse perfil tímido e conservador da época destaque-se a valorosa contribuição de Rui Barbosa ainda no início do século passado, quanto a possibilidade de intervenção do Poder Judiciário nos atos Políticos dos demais poderes como costumeiramente temos hoje.
O referido caso tratava-se da judicialização levada a cotejo perante o STF pelo Estado do Amazonas patrocinada por Rui Barbosa em face da União, na qual se reivindicava o direito sobre o território acreano, uma vez que, pelo Tratado de Petrópolis entre o Brasil e a Bolívia, o Estado do Acre ficou sob a administração Federal.
Na defesa dos interesses do Amazonas Rui Barbosa sustentou preliminarmente que o Judiciário não poderia se furtar de apreciar causas cujo conteúdo fosse Político, primeiro porque em tese ela é uma Corte Política e segundo porque questões dessa natureza geralmente são relevantes socialmente, portanto, merecem passar pelo crivo do Poder Judiciário (ROCHAL)[6].
As razões de sua defesa trazem consigo um estudo minucioso sobre casos que também versavam sobre questões Políticas e que foram decidos pela Suprema Corte dos Estados Unidos da América, ressalvando que esses casos devem ser exceção e não a regra, uma vez que, o ambiente para se chegar a uma solução naturalmente deveria ser no Parlamento, entretanto, na impossibilidade de solução por essa via e instaurado o conflito não restaria outro caminho para a resolução da contenda senão através do Judiciário, visto que a essência da dessa instituição consiste na guarda dos direitos individuais, especialmente contra os abusos políticos porque é justamente pelos abusos Políticos que esses Direitos constumam perecer (NOGUEIRA, 1980, p. 07).
Contudo, o STF não julgou a causa, sendo a questão resolvida somente com o advento da Consituição Federal de 1934 que reconheceu ao Estado do Amazonas o Direito de ser indenizado pela União, em razão dos prejuízos a ele causados pela incorporação do Acre ao território nacional, resultado que sem dúvida se deu ao monumental trabalho desenvolvido por Rui Barbosa.[7]
4 – O Judiciário no período entre guerras (1918 a 1939)
Durante cerca de duas décadas duas Constituições formam publicadas, a de 1934, e 1937. Essa instabilidade política interna desencadeou uma revolução em 1930, chamada de Coluna Prestes e um golpe denominado de Estado-Novo em 1937, tudo isso era reflexo da mesma instabilidade política internacional do período.
Através do Decreto nº 19.398, de 11 de novembro de 1930 que instituiu o governo provisório dos Estados Unidos do Brasil e deu outras providências o Judiciário sofreu um grande ataque a sua independência, uma vez que, o artigo 5º estabeleceu a suspensão das garantias constitucionais e excluiu da apreciação judicial os decretos e os atos do Governo Provisório ou dos Interventores federais, praticados na conformidade desse decreto ou de suas modificações ulteriores, bem como, criaram (art. 16) o Tribunal Especial para processo e julgamento de crimes políticos, tribunais e outros que serão discriminados na lei de sua organização.
Desse modo, verifica-se que quando um governo tirano se instala no poder uma de suas primeiras medidas é afastar do judiciário o seu poder precípuo de julgar os atos jurídicos emanados desse governo ou decidirem sobre questões políticas. Isso vai se repetir na história em 1964 com a edição do Ato Institucional n° 01 pelos Militares que encabeçaram o Regime de Exceção.
E os ataques através desse primeiro ato foram no sentido de suspender as garantias constitucionais de vitaliciedade e estabilidade, fulminando com isso a independência dos magistrados, bem como de retirar do Judiciário o poder de apreciar a suspenção e/ou cassação dos direitos políticos decretados pelo regime (artigo 7° e 10 do AI n° 1). Com o AI n° 5 outras questões foram afastadas da apreciação do poder judiciário, como por exemplo nos casos de cassação de mandato eletivo.
Voltando a Constituição de 1934, o artigo 64 conferiu aos Juizes as garantias da vitaliciedade até os 75 anos, a inamoviblidade e a irredutibiliade dos vencimentos, por outro lado, o artigo 68 estabelecia expressamente que era vedado ao Poder Judiciário conhecer de questões eminentemente políticas.
Percebe-se com isso que, a principal estratégia utilizada para a manutenção do poder dos agente políticos, sobretudo em regimes antidemocráticos é imuniza-lo do controle do Judiciário e o principal ponto de ataque para atingir esse objetivo é mitigar a sua independência e a autonomia.
Ainda durante o período entre guerras foi decretada a Carta de 1937 que implantou o Estado Novo, a principal mudança na estrutura do Judiciário foi a extinção da Justiça Federal. Segundo (MATHIAS, 2009, p. 254) os membros do Poder Judiciário nessa época não gozavam em plenitude das garantias que naturalmente lhe são assegurados. Visto que, o artigo 91 elencava as garantias da vitaliciedade, inamovibilidade e irredutibilidade dos vencimentos com ressalvas de acordo com as restrições expressas na Constituição.
5 – O Judiciário após a Constituição de 1988.
Inicialmente é importante destacar que a Constituição Cidadã como também é conhecida cuidou de tratar sobre o Poder Judiciario como nenhuma outra Constituição e que mais tarde foi aperfeiçoada pela Emenda Constitucional n° 45/2004, dotando-o dos intrumentos necessário na luta pela proteção do Estado Democrático de Direito, revelando com isso o grau de confiança depositada nele e com ela a magnitude da responsabilidade que o Judiciário assumiu.
Foram muitas as inovações trazidas pela Constituição Federal de 1988, e pela EC n° 45/2004 que promoveu a reforma do Judiciário, além das inúmeras emendas constitucionais que produziram efeitos também nessa seara, de modo que, merece o destaque especialmente os artigos 92 a 126 da CF/88, essa autonomia no plano interno sem dúvida reflete a independência conquistada também no plano externo com relação aos demais poderes.
Sem embargos da importância dessas e de outras inovações, elas não serão trabalhadas amiúde nesse estudo porque aqui o foco consiste em abordado a mudança da postura que o Judiciário passou a adotar, sobretudo, o STF no enfrentamento das questões políticas levadas a sua apreciação.
Como visto anteriormente o Judiciário sempre teve uma postura conservadora e tímida no enfretamento de questões políticas, que no início do período analisado foi sabiamente combatido por Rui Barbosa, entretanto, o que vemos hoje é um Judiciário proativo e muitas vezes chamado de ativista quando não se exime de decidir questões com forte conteúdo político ou moral.
Como nada é criado por acaso, isto é, por trás dos fenômenos sociais sempre haverá uma razão histórica que o justifique, com esse não poderia ser diferente, ele surgiu porque após o final da segunda guerra mundial a humanidade percebeu que o Direito não poderia mais ser conivente com tantas mazelas. Desse modo, segundo (BARROSO, 2013 citado por NOGUEIRA, 2014) surgiu na Europa continental a redemocratização através do fenômeno conhecido como reconstitucionalização ou constitucionalização do Direito e outros termos a fins. Inicialmente na Alemanha com a Lei Fundamental de Bonn (Constituição Alemã de 1949), destaque especial para a criação do Tribunal Constitucional Federal, instalado em 1951.
Para (BARROSO, 2013), a partir de então, surge a concepção de Estado Constitucional Social, cuja ideia de ascensão científica do Direito Constitucional alastrou-se por outros países como a Itália, com a Constituição de 1947 e consequente instalação da Corte Constitucional de 1956. Nas décadas seguintes a reconstitucionalização espalhou-se por outros países como Portugal (1976), Espanha (1978), e no Brasil com o advento da Constituição Federal de 1988.
Segundo (BULOS, 2011 citado por NOGUEIRA, 2014) esse movimento de Constitucionalização do Direito, também chamado de Constitucionalismo Contemporâneo provocou mudanças significativas, a exemplo da tentativa de buscar a eficácia social das Constituições (efetividade), a prevalência do princípio da força normativa da Constituição e o aprimoramento da Hermenêutica Constitucional.
Em termos práticos, com o advento desse fenômeno tivemos no mundo jurídico transformações de modo mais sensível, tais como o desprestígio da lei em razão da insuficiência legislativa, seja pela simples ausência da norma para regular determinada conduta ou situação, ou ainda a impossibilidade de solução do caso concreto mesmo diante da regra, como nos casos de colisão de Direitos Fundamentais.[8]
Sem dúvida essas influências externas foram determinantes para as inovações introduzidas no Ordenamento Jurídico pelo Constituinte Originário de 1988 com reflexos na postura adota pelo Judiciário ao se debruçar sobre as questões levadas a baila, haja vista a responsabilidade e a confiança da sociedade depositada nele, tendo como princípio mor do Direito Constitucional e principal objetivo a ser alcançado a proteção da Dignidade da Pessoa Humana.
Diante dessa nova postura proativa do Poder Judiciário decorre um efeito colateral que precisa ser debatido com atenção pela sociedade e sobretudo pela comunidade jurídica sobre os limites desse Poder, uma vez que, em razão da sensibilidade política nas decisões judiciais, desde o pós-segunda guerra mundial, houve no Direito o que se pode chamar de uma maior imersão de valores morais na esfera jurídica através do Constitucionalismo.
Ocorre que, desse fenômeno decorre uma ampliação da subjetividade do intérprete provocando a ampliação dos efeitos da discricionariedade judicial. Sendo essa, conforme aponta (STRECK, 2012 citado por NOGUEIRA, 2014) um problema já há bastante tempo discutido pelos teóricos, desde a Escola do Direito Livre, passando pela Jurisprudência dos Interesses, pelo normativismo kelseniano, pelo positivismo moderado de Hart, até chegar aos autores argumentativistas, como Alexy, mas que todavia ainda não foi superado.
Com esse “novo” constitucionalismo é crível afirmar que no momento em que o intérprete deixa de aplicar uma norma, por exemplo, uma lei constitucionalmente instituída em detrimento de um princípio altamente subjetivo carregado de conteúdo valorativo (axiológico), evidencia-se aí um liame bastante estreito entre autoritarismo e a legitimidade da decisão judicial. Destaque-se que essa não é uma afirmação de que o Magistrado tenha sempre que seguir a lei em detrimento de um princípio que também possui valor normativo. Estou apenas destacando o fino liame entre as duas faces dessa nova postura da atuação do Poder Judiciário nesse novo cenário democrátivo.
Nesse ponto (COMPARATO, 2015, p. 17) adverte como sendo indispensável o estabelecimento de um sistema efetivo de controle dos órgãos judiciários e relembra a sábia lição de Montesquieu de que "é uma experiência eterna que todo homem que dispõe de poder é levado a dele abusar; ele vai até onde encontra limites".
É importante que se diga também que todas essas questões suscitadas acima estão ligadas intrínsecamente a questões de ordem hermenêuticas e filosóficas, ou seja, devem ser trabalhadas no campo da teoria da decisão, isto é, não são propriamente questões de natureza estruturante da tripartição dos poderes, porém são capazes de produzir efeitos diretos nessa arquitetura institucional do Estado, na medida em que afetam diretamente as suas funções.
O fato é que diante dos novos anseios sociais, sobretudo a partir do pós-segunda guerra mundial e da resposta do Estado através do fenômeno da Constitucionalização do Direito, tendo como princípio norteador a Dignidade da Pessoa Humana, o Judiciário assumiu uma enorme missão, sem precedentes, de proteger esse rol exemplificativo de Direitos e garantir a sua eficácia.
Todavia, é importante destacar que esse trabalho deve ser feito em parceria com os Poderes Legislativo e Executivo, os quais, na maioria das vezes, negligenciam a realização de suas atribuições acarretando com isso uma avalanche de reivindicações no judiciário que por seu turno acaba tendo de resolver além das suas atribuições também as dos demais poderes que por questões políticas optam por se manter inerte. Por conseguinte surge o fenômeno da despolitização da democracia que dá lugar à Juristocracia, na medida em que o Judiciário além de assumir as suas funções típicas também assume a função de legislar[9] externamente e executar políticas públicas[10].
6 – Considerações Finais.
Essa sucinta análise histórica e jurídica da estrutura do Judiciário durante o período analisado contribui para a compreensão crítica das instituições políticas do Estado, sobretudo, do Poder Judiciário como uma instituição política de suma importância para a proteção dos Direitos Fundamentais, porém, bastante reprimida pelos demais poderes ao longo da história.
Enquanto havia essa contenção mais acentuada do Poder Judiciário pelos demais poderes é possível notar um perfil conservador durante a execução de suas funções, entretanto, a partir do momento em que ele alcança a sua independência e autonomia com as devidas garantias institucionais no texto constitucional, sobretudo de 1988, esse perfil passa a ser mais proativo e dinâmico de modo a corresponder aos anseios sociais que andam a passos largos.
Esse aprimoramento não pode ser comemorado sem relembrar a relevante contribuição do grande jurista Rui Barbosa cujas ideias ecoaram ao longo do tempo, sendo elas essenciais para a consolidação desse modelo institucional democrático que temos hoje, sobretudo, com as conquistas alcançadas pelo Judiciário.
Destacou-se ainda, a preocupação com a elevada imersão de conteúdos axiológicos no Direito com o fenômeno da Constitucionalização, mormente com o controle da ampliação do Poder Judiciário decorrente disso. Sem perder de vista a importância desse efeito, sobretudo na proteção e na eficácia dos Direitos Fundamentais.
A análise permitiu traçar um panorama histórico institucional do Judiciário durante o período de 1889 até o presente, de modo a compreender as questões palpitantes que se apresentam na atualidade (judicialização da política, efetividade dos direitos fundamentais, ativismo judicial), com foco na atução do Poder Judiciário nas questões Políticas, graças a consolidação da sua independência e autonomia, ao lado da missão depositada nele pela Constituição cidadã.
Graduado em Direito pela Universidade Potiguar (UNP). Pós-graduando em Direito Tributário pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) e Pós-graduando em Residência Judicial pela UFRN/ESMARN
Compliance regulatório é um conjunto de práticas que visa assegurar que as empresas atuem em…
A negociação de acordos é uma prática essencial para empresas que buscam resolver conflitos, evitar…
A gestão de contencioso é uma atividade essencial para empresas que desejam administrar de forma…
A gestão de documentos é um conjunto de técnicas e procedimentos que envolve a organização,…
A administração do passivo de uma conta jurídica é um processo estratégico fundamental para qualquer…
A auditoria legal é um instrumento estratégico essencial para as empresas que desejam garantir a…