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O que é a Teoria Tridimensional do Direito

Resumo: Muito aclamada no meio acadêmico, a teoria tridimensional do Direito, está geralmente ligada à figura de Miguel Reale, talvez o maior jusfilósofo brasileiro, mas dificilmente é plenamente compreendida pelos que a evocam. Nesse sentido, este artigo visa sanar esta lacuna, em especial, daqueles alunos de graduação que sentem certas dificuldades com a linguagem da obra do renomado autor.

Palavras-chave: Teoria tridimensional; Direito; Filosofia; norma.

Abstract: Much acclaimed in academic circles, the three-dimensional theory of law, is generally linked to the figure of Miguel Reale, perhaps the greatest Brazilian jus philosopher, but hardly fully understood by the recall. Accordingly, this paper aims to remedy this gap, in particular, those graduate students who experience some difficulties with the language of the work of renowned author.

Keywords: Three dimensional theory; law; Philosophy; standard.

Miguel Reale é certamente a figura mais proeminente do pensamento jusfilosófico nacional. Sua Teoria Tridimensional do Direito ganhou destaque no meio acadêmico, não só no Brasil, como também em todo o mundo, principalmente na América Latina. Sua assertiva de que o Direito possui tríplice face – o fato, o valor e a norma – chegou a ser um clichê entre os estudantes da área jurídica, que não raro, mal compreendiam as nuances de tal filosofia.

Miguel Reale nasceu no interior de São Paulo, em São Bento do Sapucaí, em 6 de novembro de 1910 e faleceu aos 95 anos em São Paulo no dia 14 de abril de 2006. Formado pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, na juventude tornou-se um dos líderes do integralismo no Brasil, para depois tornar-se um dos principais liberais sociais do país. Foi Professor Catedrático da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo e Reitor desta mesma Universidade. É pai do também jurista Miguel Reale Júnior (ACADEMIA, 2007).

Filiado à corrente culturalista que dava grande ênfase ao Direito como fator cultural, Reale na verdade, não foi o primeiro teórico a formular uma teoria tridimensional do Direito, mas certamente foi quem a sistematizou de forma mais madura, ao ponto do renomado jurista e filósofo espanhol Ricaséns Siches no limiar de sua vida a ter adotado.

“Constata-se, dai, que a Teoria Tridimensional do Direito insere-se no âmbito do culturalismo jurídico. Ora, o culturalismo jurídico foi uma corrente que, de certa forma, nasceu com o pensamento kantiano. Kant, em sua obra Kritik der Sitten, havia observado que “A produção, em um ser racional, da capacidade de escolher os próprios fins em geral e, conseqüentemente, de ser livre, deve-se à cultura.” (GONZALEZ, 2000, p.3).

Como marco da Filosofia do Direito latino-americana, a Teoria Tridimensional (como o nome diz) parte do pressuposto de que o fenômeno jurídico deva ser analisado e compreendido sob uma visão que englobe os três aspectos epistemológicos mais utilizados pelos juristas e filósofos ao longo da História: o fato jurídico (a experiência), o valor e a norma propriamente dita. O problema crucial, segundo Reale (2003), é a questão de que o Direito sempre foi visto ou analisado sob enfoque unilateral, ou seja, priorizando-se apenas um dos aspectos supracitados. Critica que no decorrer da Era Contemporânea o Direito ora era restringido às normas outorgadas pelo Estado como pensavam os positivistas na linha de Kelsen ou como fenômeno social, na corrente historicista e sociológica, na qual o fenômeno jurídico era fruto das relações sociais ou do espírito cultural de determinada época.

É contra esses enfoques unilaterais que a Teoria Tridimensional vem rebater. Para Reale (2000), o Direito não é apenas a norma ou a letra da lei, pois é muito mais do que a mera vontade do Estado ou do povo, é o reflexo de um ambiente cultural de determinado lugar e época, em que os três aspectos – fático, axiológico e normativo – se entrelaçam e se influenciam mutuamente numa relação dialética na estrutura histórica, o que nos faz lembrar um pouco de Hegel.

Nesse sentido, Reale (2003) também rebate qualquer tipo de idealismo que faz do Direito um corpo abstrato de teorias, geralmente omissos em relação à sua realidade sócio-cultural. Em suma, nas palavras do jusfilósofo brasileiro: “Direito não é só norma, como quer Kelsen, Direito, não é só fato como rezam os marxistas ou os economistas do Direito, porque Direito não é economia. Direito não é produção econômica, mas envolve a produção econômica e nela interfere; o Direito não é principalmente valor, como pensam os adeptos do Direito Natural tomista, por exemplo, porque o Direito ao mesmo tempo é norma, é fato e é valor” (REALE, 2003, p.91).

Como processo dialético, o Direito para o autor não é algo acabado, está sempre em formação. Ao contrário do historicismo tradicional que via alguma condicionante histórica, a concepção realeana é aberta, como ele próprio diz: “O Direito é um processo aberto exatamente porque é próprio dos valores, isto é, das fontes dinamizadoras de todo o ordenamento jurídico, jamais se exaurir em soluções normativas de caráter definitivo” (REALE, 2000, p.574).

Apesar desse historicismo, a teoria de Reale (2003) não pode ser considerada relativista como muitos podem pensar a princípio. Fundada na própria condição humana o Direito tem como fator essencial a liberdade com todas suas nuances e aventuras, aos moldes de Ortega y Gasset.

Nesse sentido, o aparente relativismo da teoria de Reale (2003) é suplantado pela constatação de uma espécie de direito natural, a que o autor prefere chamar de “constante axiológica”, ou seja, valores inerentes ao ser humano como a vida, a liberdade, a igualdade, inerentes à condição humana.

“A vida do direito não pode, efetivamente, ser concebida senão como uma realidade sempre em mudança, muito embora, a meu ver, se possa e se deva reconhecer a existência de certas ‘constantes axiológicas’, ou, por outras palavras, de um complexo de condições lógicas e axiológicas universais imanentes à experiência jurídica” (REALE, 2003, p.85).

Esse sem dúvida é o grande mérito de Miguel Reale para a Filosofia do Direito. Tratar o fenômeno jurídico como parte do fenômeno cultural, alicerçado na própria postura humana, no vir a ser histórico, ciente de que as epistemologias da Fenomenologia e da Axiologia possam contribuir sobremaneira para o estudo mais acurado do fenômeno normativo, ao invés das visões unilaterais ainda predominantes no pensamento jurídico contemporâneo. A partir daí, o magistrado poderá ampliar sua visão e contemplar o mundo por trás da letra da lei.

 

Bibliografia
ACADEMIA Brasileira de Letras. Miguel Reale – Biografia. 2007. Disponível em: http://www.academia.org.br/abl/cgi/cgilua.exe/sys/start.htm?infoid=512&sid=182   Acesso em: 20 maio de 2012.
Gonzalez, Everaldo Tadeu Quilici. A Teoria Tridimensional do Direito de Miguel Reale e o novo Código Civil Brasileiro. Unimesp, 2000. Disponível em: http://www.unimep.br/phpg/mostraacademica/anais/4mostra/pdfs/145.pdf  Acesso em: 20 maio de 2012.
Gusmão, Paulo Dourado de. Introdução ao Estudo do Direito. 33ª ed., Rio de Janeiro: Forense, 2002
Reale, Miguel. Teoria Tridimensional do Direito. 5ª ed., Editora Saraiva, São Paulo, 2003.

____________, Filosofia do Direito. 19ª ed., Editora Saraiva, São Paulo, 2000.


Informações Sobre o Autor

Igor Antonio Michallene Augusto

Bacharel em Direito pelo UNILAVRAS e pós-graduando em Ensino Religioso e Teologia comparada pela ESAB


Equipe Âmbito Jurídico

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