Resumo: O presente artigo intitulado O Trabalho Doméstico e sua jornada de trabalho a partir da Emenda Constitucional n° 72/2013 explica inicialmente a evolução que tal Emenda significou e seus princípios específicos, interligando a relação de trabalho e a relação de emprego. A escolha do tema se justifica devido à preocupação da legislação com a função social e valorização social da condição humana. Para tanto, serão utilizados como fontes leis, doutrinas e artigos. Assim, esteartigo analisa a proteção legal dos empregados domésticos, suas garantias, informando, no mérito, a cerca das garantias implementadas, bem como sua efetivação.
Palavras- chave: Empregado Doméstico. Emenda Constitucional nº 72/2013. Direitos.[1]
Abstract:This article entitled The domestic work and their the working day from the Constitutional Amendment nº 72/2013 initially explains the evolution that this amendment meant and their specific principles, interconnecting the working relationship and employment relation. The choice of subject is justified due to concern of the legislation with the social function and enhancement social of the human condition. Therefore, they will be used as sources laws, doctrines and articles. Thus, this article analyzes the legal protection of domestic employees, its guarantees, informing, in merit, about the implemented guarantees as well as its effectiveness.
Keywords:Domestic Employee. Constitutional Amendment nº 72/2013. Rights.
Sumário: Introdução. 1. Breve Histórico das Leis Anteriores à EC nº 72/2013. 2. O Conceito de Empregado Doméstico. 3. Os Direitos Previstos no Art. 7º da Constituição Federal e os Empregados Domésticos. 4. Os Direitos Conquistados com a EC n° 72/2013. 4.1. Garantia e Proteção do Salário (art. 7º, VII e X, da CF). 4.2. Duração da Jornada de Trabalho (art. 7, XIII, da CF). 4.3 Redução dos Riscos de Acidente no Trabalho (art. 7º, XXII). 4.4. Proibição de Diferença Salarial e Discriminação Salarial ou sobre Critério de Admissão( Art. 7º, XXX e XXI, CF). 4.5. Proibição de Trabalho Noturno, Perigoso e Insalubre (art. 7º, XXXIII, CF).5. Contrato de Trabalho: Relação entre Empregador e Empregado. 6. Jornada de Trabalho, o Intervalo Intrajornada e seu Controle. Conclusão. Referências
Introdução
Conquistar garantias, como as trabalhistas, não é tão rápido, muitas delas são adquiridas por meio de lutas e revoluções³. As garantias trabalhistas previstas na Carta Magna foram asseguradas devido à união dos trabalhadores para reivindicar melhores condições.
Ao se tratar do empregado doméstico a busca por garantias fica bem clara. No Brasil Colônia, os domésticos eram escravos que trabalhavam na casa de seus senhores, sem qualquer remuneração, além da jornada de trabalho ser excessiva, quase sem descanso.
Conforme se extrai do advogado Matheus Viana Ferreira[i], em seu artigo sobre empregados domésticos (2014, s/p):
“No Brasil, do período colonial (1500-1815) até o fim do período imperial (1889), praticamente todo o trabalho doméstico era exercido por escravos, inicialmente índios e, depois, negros africanos. Assim sendo, verifica-se que, desde as épocas mais remotas, o trabalho doméstico era considerado sem valor, desprestigiado por ser executado por escravos ou servos. Consequentemente, o exame detalhado da natureza do serviço doméstico não pode deixar de passar pela análise da escravidão.”
Já Amauri Mascaro Nascimento[ii] assevera que houve predomínioda escravidão (2009, p. 43), que fez do trabalhador simplesmente uma coisa, sem possibilidade sequer de se equiparar a sujeito de direito. O escravo não tinha, pela sua condição, direitos trabalhistas.
Tais empregados não tinham o reconhecimento de seus direitos que passaram a surgir de forma mais nítida com a Revolução Industrial.Entretanto, a Constituição de 1988 não reconhecia ainda uma condição que assegurava uma proteção aos domésticos. O emprego doméstico, apesar de semelhante ao emprego comum, tem suas peculiaridades, tendo em vista, principalmente, a estreita relação existente entre patrão e empregado, precisava de uma legislação que desmitificava o empregado doméstico como “parte da família do empregador” e fosse encarado como um trabalhador que cumpre seus deveres e tem um ressalvo legal a sua condição.
Com a falta de regulamentação, aos empregados domésticos não eram asseguradas muitas garantias básicas dos trabalhadores, como o limite diário de jornada, adicional noturno, fundo de garantia por tempo de serviço, como exemplo.
Conforme se desprende do artigo 7º, parágrafo único, da Lei Maior[iii], antes da Emenda Constitucional 72/2013:
“Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social: Parágrafo único. São assegurados à categoria dos trabalhadores domésticos os direitos previstos nos incisos IV, VI, VIII, XV, XVII, XVIII, XIX, XXI e XXIV, bem como a sua integração à previdência social.”
Porém, após a alteração do texto constitucional em análise acima, com a Emenda 72/2013[iv], nasce polêmicaprincipalmente quanto à aplicação imediata de seus dispositivos ou não, bem como pela importância dela no dia a dia das famílias brasileiras, devendo ser analisada de forma critica e fundamentada como estão elencados na Constituição Federal Brasileira de 1988 os direitos dos trabalhadores domésticos, especialmente no que concernem as mudanças introduzidas por esta.
A primeira lei a tratar desse assunto foi a Lei nº 5.859, de 11 de dezembro de 1972[v] que dispôs acerca da profissão do empregado doméstico, especificando em seu artigo 1º que o empregado doméstico é aquele que presta serviços de natureza contínua e de finalidade não lucrativa à pessoa ou à família, no âmbito residencial delas.
Após a aprovação daquela lei, o reconhecimento do trabalho doméstico como profissão se tornou mais claro, conciso, legal e, para esses empregados iniciou-se a efetividade de algumas garantias e direitos que antes só eram garantidos aos trabalhadores urbanos e rurais. Por este motivo, ainda no intuito de estarem melhores amparados por uma legislação específica para os domésticos, a Emenda Constitucional trouxe melhorias.
1. Breve Histórico das Leis Anteriores à EC nº 72/2013
Durante muito tempo, os trabalhadores domésticos não possuíam uma legislação própria que regulamentava sua profissão. O Código Civil de 1916 trazia em seu artigo 1.216[vi] que toda espécie de serviços ou trabalho lícito, material ou imaterial, poderia ser contratado mediante retribuição.
Demonstrando que a relação de trabalho entre patrão e empregado doméstico seria configurada lícita pela prestação do serviço mediante retribuição. Em outras palavras, o doméstico para trabalhar, perceberia remuneração. No entanto sem caráter lucrativo, apenas para suprir suas necessidades básicas.
Apenas em 1972, com a Lei nº 5.859, que tais empregados tiveram alguns direitos assegurados, como a proibição de descontos no salário por fornecimento de alimentação, vestuário, higiene ou moradia e o direito a férias anuais remuneradas de trinta dias, por exemplo.
Conforme Elaine S. Reis (2012, s/p)[vii]:
“Em 30 de julho de 1923 houve a promulgação do Decreto n° 16.107, o qual passou a regulamentar de maneira específica os serviços dos domésticos, determinando quais seriam esses trabalhadores.Posteriormente, adveio o Decreto-Lei n° 3.078 de 27/11/41, que tratou do empregado que laborasse em residências particulares mediante remuneração, resguardando a este trabalhador um aviso prévio de oito dias, depois de um período de prova de seis meses. Também lhe conferiu o direito de rescisão do contrato em caso de atentado à sua honra ou integridade física, mora salarial ou falta de ambiente higiênico de alimentação e habitação, garantindo, portanto, melhores condições noambiente de trabalho.”
O Decreto nº 16.107/1923[viii]instituía a identificação dos locadores de serviços domésticos, os quais seriam: os cozinheiros e ajudantes, copeiros, arrumadores, lavadeiras, engomadeiras, jardineiros, hortelões, porteiros ou serventes, enceradores e costureiras, por exemplo.
Já o Decreto-Lei n° 3.078 de 27/11/41[ix], trouxe como avanço o aviso prévio de oito dias como direito, após o empregado trabalhar seis meses, além da rescisão contratual. Ou seja, alguns avanços já estavam ocorrendo com tais leis, positivando à luz da dignidade da pessoa humana, um empregado doméstico como trabalhador e possuidor de direitos.
O grande avanço ocorreu com a regulamentação dos direitos dos empregados domésticos por meio da Lei nº 5.859/72, que tratava sobre a profissão do empregado doméstico com apenas oito artigos, ou seja, garantia poucos direitos aos trabalhadores que desempenhavam tal atividade.
De acordo com José Soares Filho (s/p, s/a):“a Lei nº 5.859, de 11 de dezembro de 1972, conferiu-lhe direito a férias e aos benefícios e serviços previstos na Lei Orgânica da Previdência Social, na qualidade de segurado obrigatório.”
Um ano após, foi aprovado o Decreto-lei nº 71.885/73[x] que, em seus quinze artigos, tratou sobre as anotações que deveriam ser feitas na Carteira de Trabalho, e ainda, sobre a Previdência Social, como por exemplo, o limite de tempo para se associar a ela.
Conforme o doutrinador GleibiPretti[xi] (p. 80, s/a): “A Lei nº 5.859/72 foi regulamentada pelo Decreto 71.885/73 e trata dos empregados domésticos.”
Com o advento da Constituição Federal, em seu artigo 7º, parágrafo único, o direito ao repouso semanal remunerado a estes também foi estendido. Já a Lei nº 10.208/01 trouxe mais direitos regulados, porém, de forma facultativa para o empregador: o recolhimento do FGTS e o seguro desemprego.
Em 2006 houve outra positivação para os empregados domésticos, a Lei de nº 11.234/06[xii] que dispunha sobre a estabilidade à gestante, a proibição de descontos por concessão de alimentação, vestuário, higiene ou moradia, além de descanso nos feriados.
Em 2012, criaram a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 66/2012 que, após ser aprovada e promulgada – tornou-se a Emenda Constitucional (EC) nº 72/2013[xiii]. Tal emenda estendeu os direitos já garantidos aos trabalhadores em geral, na Constituição Federal, aos empregados domésticos.
É possível afirmar que os direitos foram sendo efetivados aos empregados domésticos com o passar do tempo, de acordo com as necessidades que foram surgindo com maior enfoque, seja com relação aos direitos das gestantes, a Carteira de Trabalho ou até mesmo sobre a Previdência Social.
Porém, antes de tratar das mudanças e direitos que foram sendo acrescentados e regulamentados, é necessário tratar-se do conceito de empregado doméstico.
2. O Conceito de Empregado Doméstico
Empregado doméstico é aquela pessoa que presta serviços de natureza contínua e de finalidade não lucrativa à pessoa ou à família no âmbito residencial desta (artigo 1° da Lei nº5859/72), ou seja, é necessária a prestação de serviço sem lucro, à pessoa física ou à família no âmbito residencial, bem como a natureza de continuidade.
Conforme o autor Maurício Godinho Delgado[xiv] (pág. 21, ano 2014):
“Tecnicamente, empregado doméstico é a pessoa física que presta, com pessoalidade, onerosidade e subordinadamente, serviços de natureza contínua e de finalidade não lucrativa à pessoa ou à família, em função do âmbito residencial destas. Na definição jurídica aqui exposta encontram-se os cinco elementos fático-jurídicos próprios a qualquer relação empregatícia (pessoa física; pessoalidade; onerosidade; subordinação; não eventualidade). Nela se encontram discriminados os quatro elementos fático-jurídicos comuns a qualquer empregado, e que não têm qualquer especificidade na relação empregatícia doméstica: pessoa física do prestador; pessoalidade; onerosidade; subordinação.”
Para ser empregado doméstico não é necessário trabalhar apenas dentro da casa do empregador, executando tarefas relacionadas à limpeza, organização, entre outras.
Dessa forma, é mais que necessário uma regulamentação sobre esses diversos tipos de trabalho, que englobam a mesma profissão: o empregado doméstico, pois, com essa Emenda Constitucional (EC) estes empregados passaram a ter maior segurança com relação ao serviço desempenhado e seus novos direitos garantidos.
Porém, ainda nem todos os direitos previstos no artigo 7º, em seus incisos, da Constituição Federal estão assegurados aos domésticos. Mas o avanço das garantias de certa forma foi relativo ao desenvolvimento da sociedade. Em breve, discutir-se-á sobre quais direitos abstratos do art. 7º estão sendo efetivamente cumpridos na vida concreta.
3. Os Direitos Previstos no Art. 7º da Constituição Federal e os Empregados Domésticos
Conforme se desprende da CF, estão previstos trinta e quatro direitos aos empregados de todas as classes (urbanos e rurais).
Toni Frank Britto Santos[xv](2013, s/p) destacou os direitos que foram positivados aos domésticos, no parágrafo único do art. 7º, da Constituição Federal:
“O que chama a atenção neste artigo e vem sido há muito tempo discutido é o seu parágrafo único, que trata justamente dos direitos garantidos ao empregado doméstico. Observa-se que o Legislador Constituinte se preocupou em detalhar taxativamente quais seriam os direitos garantidos á esta classe de trabalhadores. Sendo assim lhe foram garantidos os direitos previstos nos incisos IV, VI, VIII, XV, XVII, XVIII, XIX, XXI E XXIV, a saber, respectivamente: salário mínimo; irredutibilidade salarial; décimo terceiro salário; repouso semanal remunerado, preferencialmente aos domingos; férias remuneradas; licença à gestante; licença-paternidade; aviso prévio; aposentadoria. Ficam de fora deste rol importantes conquistas da classe trabalhadora, em geral, como por exemplo, o controle da Jornada de Trabalho e o pagamento por Horas extraordinárias, inscrição no Fundo de Garantia por Tempo de Serviço, dentre outros”.
Antes da Emenda Constitucional 72/2013, dos trinta e quatro direitos elencados no art. 7º, da Constituição Federal, apenas nove desses direitos estariam garantidos à classe trabalhadora em análise, além da sua integração à previdência social, de acordo com seu parágrafo único. Não sendo necessária grande análise para se entender que há poucos direitos positivados aos domésticos, em vista dos trinta e quatro dos trabalhadores urbanos e rurais.
Porém, ainda há direitos que dependem de regulamentação para entrarem em vigor, sendo alguns deles: o piso salarial proporcional à extensão e à complexidade do trabalho; jornada de seis horas para o trabalho realizado em turnos ininterruptos de revezamento, salvo negociação coletiva; proteção do mercado de trabalho da mulher, mediante incentivos específicos, nos termos da lei.
Exemplificando sobre turnos ininterruptos, o Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região[xvi] já julgou sobre o vínculo empregatício e tal jornada de trabalho com os empregados domésticos:
“EMPREGADO DOMÉSTICO. FOLGUISTA. VÍNCULO EMPREGATÍCIO. O trabalho como folguista em finais de semana é de caráter intermitente, estando à margem da proteção da Lei nº 5.859/72, que define como empregados domésticos os que prestam serviços de natureza contínua no âmbito residencial. (TRT-1 – RO: 6007120125010026 RJ, Relator: Mirian Lippi Pacheco, Data de Julgamento: 15/01/2013, Quinta Turma, Data de Publicação: 29-01-2013)”. (GRIFO NOSSO)
Já o inciso XI, do art. 7º, da Constituição Federal,trata da participação nos lucros, ou resultados, desvinculada da remuneração e excepcionalmente, participação na gestão da empresa, conforme definido em lei, é notável que sua regulamentação nem aconteça, pois a natureza do serviço do empregado doméstico não é lucrativa. Por isso não teria embasamento legal colocar o doméstico na participação dos lucros ou resultados, vez que eles não existem. Bem como na participação na gestão da empresa, já que a casa de seu empregador dificilmente pode ser considerada uma empresa.
Conforme o previsto na Lei das Domésticas, não há participação nos lucros, vez que tal atividade não tem caráter lucrativo, sem lucro direto:
“Do ponto de vista econômico, pode-se afirmar que o doméstico produz, exclusivamente, valor de uso, jamais valor de troca: trata-se de uma atividade de mero consumo, não produtiva, por isso sem intuito ou conteúdo econômicos para o tomador de serviços. Nessa linha será doméstico o caseiro de sítio de lazer do empregador, desde que não se realize produção, na propriedade, com o concurso do caseiro, para fins de colocação no mercado. Existindo sistema de produção para venda habitual de bens a terceiros, descaracteriza-se a natureza doméstica do vínculo estabelecido com o trabalhador no local.(DELGADO, 2014).” (GRIFO NOSSO)
Assim sendo, o lucro é indireto, significando que há recompensa. Em outras palavras, o trabalhador doméstico realiza serviços direcionados à pessoa ou família, no âmbito residencial e sem a finalidade lucrativa, isto é, sua mão-de-obra não gera lucros financeiros. O salário é então suficiente para suprir as necessidades básicas, tais como alimentação, vestuário, saúde.
No entanto, nesta relação empregatícia há recompensas para ambos os polos: a família ou à pessoa recebe os serviços domésticos, enquanto o trabalhador percebe remuneração adequada.
A Carta Magna, na realidade, apesar de garantir alguns direitos, se limitou a reproduzir o ideal dominante de épocas anteriores, relegando à categoria de trabalhadores domésticos, uma situação de subemprego, na medida em que não reconheceu a plenitude de seus direitos, uma situação estável e uma condição digna.
4. Os Direitos Conquistados com a EC n° 72/2013
Em 2012, os domésticos já possuíam o direito ao salário mínimo, a irredutibilidade salarial, o décimo terceiro salário, o repouso semanalmente remunerado, as férias com um terço a mais de remuneração, as licenças maternidade e paternidade, aviso prévio e aposentadoria, bem como sua integração à Previdência Social.
Após a Emenda Constitucional 72/2013 houve grande melhoria no parágrafo único do artigo 7º, da CF, assim passou a assegurar aos domésticos novos direitos. Eis o que foi acrescentado a tal classe de trabalhadores:
“Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social: (…) VII – garantia de salário, nunca inferior ao mínimo, para os que percebem remuneração variável; (…) X – proteção do salário na forma da lei, constituindo crime sua retenção dolosa; (…) XIII – duração do trabalho normal não superior a oito horas diárias e quarenta e quatro semanais, facultada a compensação de horários e a redução da jornada, mediante acordo ou convenção coletiva de trabalho; (…) XVI – remuneração do serviço extraordinário superior, no mínimo, em cinqüenta(sic) por cento à do normal; (…) XXII – redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança; (…) XXVI – reconhecimento das convenções e acordos coletivos de trabalho; (…) XXX – proibição de diferença de salários, de exercício de funções e de critério de admissão por motivo de sexo, idade, cor ou estado civil; XXXI – proibição de qualquer discriminação no tocante a salário e critérios de admissão do trabalhador portador de deficiência; (…) XXXIII – proibição de trabalho noturno, perigoso ou insalubre a menores de dezoito e de qualquer trabalho a menores de dezesseis anos, salvo na condição de aprendiz, a partir de quatorze anos.”
Esses direitos são importantes para que o trabalho doméstico seja digno e lícito.
4.1. Garantia e Proteção do Salário (art. 7º, VII e X, da CF)
A garantia de salário nunca inferior ao mínimo e a proteção deste, de forma que sua retenção constitui crime doloso – é uma norma básica que reflete a dignidade humana, de forma que trabalhar por menos pode fazer com que o trabalhador não consiga suprir suas necessidades básicas (alimentação, saúde, vestuário).Atualmente, há a aplicação imediata de tais direitos
Já havendo julgados, um exemplo é o Habeas Corpus que foi julgado pelo Supremo Tribunal de Justiça, HC 177508 PB 2010/0118366-6, cuja relatora foi a ministra Maria Thereza de Assis Moura, da sexta turma[xvii]:
“Ementa: HABEAS CORPUS. IMPETRAÇÃO SUBSTITUTIVA DE RECURSO ORDINÁRIO. IMPROPRIEDADE DA VIA ELEITA. APROPRIAÇÃO INDÉBITA. RETENÇÃO DE SALÁRIOS PELO EMPREGADOR. ATIPICIDADE RECONHECIDA. TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL ACOLHIDO. NÃO CONHECIMENTO DA IMPETRAÇÃO MAIS CONCESSÃO DA ORDEM DE OFÍCIO. 1. É imperiosa a necessidade de racionalização do emprego do habeas corpus, em prestígio ao âmbito de cognição da garantia constitucional, e, em louvor à lógica do sistema recursal. In casu, foi impetrada indevidamente a ordem como substitutiva de recurso ordinário. 2. A retenção dolosa de salário, conquanto tenha sido prevista no art. 7º , X da Constituição Federal como crime, ainda ressente-se da necessária lei, criando o tipo penal respectivo. 3. Também não há como subsumir a conduta à apropriação indébita (art. 168 do Código Penal ), porque o numerário ao qual o empregado tem direito, até que lhe seja entregue, em espécie ou por depósito, é de propriedade da empresa (empregador), não havendo se falar, então, em inversão da posse, necessária para a tipicidade do crime. 4. O administrador da empresa, ao assim agir, não pratica fato típico previsto no art. 168 do Código Penal. Talvez por isso tenha o legislador constituinte feito a previsão mencionada, mas ainda sem eficácia, ante a omissão legislativa. 5. Writ não conhecido, mas concedida a ordem, exofficio, para trancar a ação penal por atipicidade, ficando prejudicada a inépcia da denúncia e a alegação de que a paciente não seria administradora da pessoa jurídica (GRIFO NOSSO).”
É notável que reter dolosamente o salário, independente de ser resultado de acordo ou convenção coletiva, ainda que seja o salário mínimo (previsto no art. 7º, IV, da C.F.) ou o não inferior ao mínimo para os que percebem remuneração variável (art. 7, VII, da CF), constitui crime.
Imperiosa análise de destacar que o salário tem como razão manter a dignidade da pessoa humana, assim sendo, ser capaz de atender às necessidades vitais básicas do empregado e às de sua família com moradia, alimentação, educação, saúde, lazer, vestuário, higiene, transporte e previdência social, com reajustes periódicos que lhe preservem o poder aquisitivo (art. 7º, IV, da Constituição Federal).
4.2. Duração da Jornada de Trabalho (art. 7, XIII, da CF)
Ainda, há a duração do trabalho nunca superior a oito horas diárias – tal regulamentação está de acordo com o artigo 58, da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT)[xviii] – sendo 44h semanais.
A compensação de horário e a redução da jornada, mediante acordo ou convenção coletiva de trabalho estão em conformidade com o art. 59, § 2º, da CLT que enuncia estender a jornada de trabalho por até mais duas horas, no intuito de que o empregado possa sair mais cedo em outro dia. Observe a decisão do Tribunal Regional do Trabalho[xix]:
“TRABALHO DOMÉSTICO. HORAS EXTRAS. ainda que não seja previsto pela Constituição Federal para os empregados domésticos os direitos à jornada de 44 horas semanais e o pagamento de adicional de horas extras no percentual de 50%, havendo a prestação de serviço em jornada semanal significativamente superior à jornada normal, devido o pagamento das horas trabalhadas em excesso, sem qualquer adicional, a fim de se evitar condições abusivas de trabalho, bem como a prestação de serviço sem a devida contraprestação. (TRT 4ª R.; Ro n. 1.254-04.2010.5.04.0751; terceira turma; Rel. Des. Cláudio Antônio Cassou Barbosa; Julg. 19.9.2012; DEJTRS 28.9.2012; p. 33).”
Lembrando que a remuneração do serviço extraordinário superior tem que ser de no mínimo, cinquenta por cento à do normal, com redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança.
Ilustra-se tal afirmação na Consolidação de Leis do Trabalho, em seu art. 59, §§ 1º e 2º:
“Art. 59 – A duração normal do trabalho poderá ser acrescida de horas suplementares, em número não excedente de 2 (duas), mediante acordo escrito entre empregador e empregado, ou mediante contrato coletivo de trabalho. § 1º – Do acordo ou do contrato coletivo de trabalho deverá constar, obrigatoriamente, a importância da remuneração da hora suplementar, que será, pelo menos, 20% (vinte por cento) superior à da hora normal. § 2º – Poderá ser dispensado o acréscimo de salário se, por força de acordo ou convenção coletiva de trabalho, o excesso de horas em um dia for compensado pela correspondente diminuição em outro dia, de maneira que não exceda, no período máximo de um ano, à soma das jornadas semanais de trabalho previstas, nem seja ultrapassado o limite máximo de dez horas diárias.”
A CLT trata sobre a hora extra em seu artigo 59, vez que a jornada de trabalho pode ter horas suplementares e será legal desde que não exceda duas horas diárias, além do reconhecimento das convenções e acordos coletivos de trabalho.
4.3. Redução dos Riscos de Acidente no Trabalho (art. 7º, XXII)
Para os domésticos essa redução ocorrerá conforme o previsto neste inciso, por meio de normas de saúde, higiene e segurança. Isso deve ser observado no local de trabalho, ou melhor, dentro das casas onde o serviço seja prestado.
Lembrando que a casa é asilo inviolável, local em que ninguém pode penetrar sem consentimento do morador ou possuidor, conforme art. 5º, XI, da CF, como se daria tal redução de riscos?
Eraldo Aurélio Rodrigues Franzese[xx] dispôs (2014, s/p):
“(…)que as normas a serem editadas devem dar maior ênfase a imposição de equipamentos de proteção individual a serem utilizados pela doméstica (luvas, calçados antiderrapantes, avental, proibição de manipulação de produtos químicos sem o selo do controle sanitário, entre outros) do que propriamente por modificações relacionadas ao ambiente doméstico já que seria inconstitucional fiscalizar as casas sem o consentimento dos proprietários. A utilização desses equipamentos deve ser obrigatória e o seu fornecimento e fiscalização de uso caberá ao empregador(…).” (GRIFO NOSSO)
Como a relação de trabalho ocorre entre o empregado e o empregador, nada como um ajuste de interesses para que ambos acordem na redução dos riscos inerentes ao trabalho. Pois o patrão não tem interesse que seu empregado se machuque durante o período de trabalho, vez que isso importa em fardo grave ao empregador, além de ficar sem o serviço prestado. E para o doméstico a segurança é sempre bem vinda para lhe preservar a saúde e a disposição de seu corpo para o trabalho.
Dessa forma, uma relação de emprego equilibrada ocorre quando o empregado doméstico está protegido durante a execução de seus serviços no ambiente de trabalho, enquanto o empregador está tranquilo ao saber que tal ambiente é seguro e benéfico o suficiente para que possa receber os serviços prestados com qualidade.
4.4.Proibição de Diferença Salarial e Discriminação Salarial ou sobre Critério de Admissão( Art. 7º, XXX e XXI, CF)
Garantindo a proibição de diferença de salários, de exercício de funções e de critério de admissão por motivo de sexo, idade, cor ou estado civil – no art. 5º da CLT está previsto que a todo trabalho de igual valor corresponderá salário igual, sem distinção de sexo. Incluindo ainda no art. 461, do mesmo Código, sendo idêntica a função, a todo trabalho de mesmo valor, ao mesmo empregado e de mesma localidade, corresponderá igual salário, sem distinção de sexo, nacionalidade ou idade.
Discorre sobre o assunto Heloísa Macedo[xxi] (s/p, 2007): "no intuito de garantir a isonomia salarial, o art. 461 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) prevê o instituto da "Equiparação Salarial", que disciplina a igualdade de salário para empregados que desempenham a mesma função".
Se alguns empregados desempenham mesma função não teria lógica a diferença de salários, ou seja, se fazem o mesmo serviço/trabalho, recebem a mesma remuneração.
Na mesma linha de raciocínio, também foi previsto a garantia de nenhuma discriminação no tocante a salário e critérios de admissão do trabalhador portador de deficiência (art. 7º, XXXI, CF) – aqui cabe a mesma consideração do parágrafo anterior: independente da pessoa ser deficiente, não haverá nenhum tipo de discriminação, desde a admissão, até o pagamento de salário, uma vez que seja exercida a mesma função dos outros empregados.
4.5.Proibição de Trabalho Noturno, Perigoso e Insalubre (art. 7º, XXXIII, CF)
O trabalho noturno, perigoso ou insalubre é vedado aos menores de dezoito. Para os menores de dezesseis anos é vedado qualquer trabalho, salvo na condição de aprendiz, a partir de quatorze anos.
Lembrando sempre que, empregado doméstico é aquela pessoa maior de 18 anos, então é vedado esse tipo de trabalho ao menor, porém, é sabido que tal emprego não engloba a condição de aprendizagem, vez que não se relaciona com a disciplina ou estudos.
De acordo com Talita Beltrão[xxii]: "ao tratar da regulamentação dos direitos dos trabalhadores domésticos (garantidos pela Emenda Constitucional 72, promulgada pelo Congresso em abril), o PLS 224/2013 explicita, já no artigo 1º, que é vedada a contratação de menor de 18 anos para desempenho de trabalho doméstico”.
Ainda Igor Cardoso Garcia[xxiii] comenta (ano 2014, pág. 304):
“No Brasil, a idade mínima para o trabalho é de 16 anos, salvo na condição de aprendiz, a partir dos 14 anos (CF, art. 7º, XXXIII), aspecto último esse que, a nosso ver, não pode ser aplicado ao trabalhador doméstico, eis que a aprendizagem é destinada à "formação técnico profissional metódica", nos termos do art. 428, da CLT, o que não se coaduna com o labor doméstico.”
Apresentados os direitos conquistados com a EC nº 72/2013, fez-se um parâmetro dos direitos aumentados como garantia do empregado doméstico. A partir disso, passa-se a tratar da relação entre empregador e empregado, ou seja, sobre o contrato de trabalho.
6.Contrato de Trabalho: Relação entre Empregador e Empregado
É considerado empregador a empresa, individual ou coletiva, que, assumindo os riscos da atividade econômica, admite, assalaria e dirige a prestação pessoal de serviço, conforme o artigo 2º, caput, da Consolidação das Leis do Trabalho.
A relação é caracterizada pela boa-fé do empregado em entrar e sair nos horários estipulados quando de sua contratação e pela confiança do empregador que, quase na totalidade dos horários, não permanece em casa para fiscalizar o serviço, muito menos o tempo de serviço.
Ainda, Delgado preconiza sobre a relação empregatícia entre familiares (ano 2011, p. 386):
“Em outras situações familiares, é evidente que o inquestionável ânimo benevolente do trabalho prestado pode também descaracterizar a relação empregatícia doméstica. Na lei trabalhista da Argentina tem-se por configurado esse ânimo benevolente verificando-se relação de parentesco entre as partes, razão pela qual não se considera, naquele sistema jurídico, empregados no serviço doméstico as pessoas aparentadas com o dono da casa. À luz da lei brasileira, semelhante presunção excludente é incabível, já que é viável relação de emprego (inclusive doméstica) entre meros parentes. Entretanto, é necessário ao aplicador do Direito verificar, detidamente, se a prestação de trabalho doméstico configurou-se com intuito oneroso empregatício, ou se, ao contrário, consolidou-se em decorrência de outro tipo de ânimo, preponderantemente de caráter familiar (grifo nosso).”
Uma vez que a relação entre empregado e empregador pela confiança e boa-fé, cria-se a necessidade de entender como a jornada de trabalho funciona, o intervalo intrajornada, bem como se dá seu controle.
7. Jornada de Trabalho, o Intervalo Intrajornada e seu Controle
Como já visto, dentre os direitos que passaram a ser assegurados, incluiu-se a jornada de trabalho, não superior a 8 horas diárias e 44 horas semanais, com direito a horário de almoço, facultada a compensação de horários e a redução da jornada, mediante acordo ou convenção coletiva de trabalho, conforme o art. 7º, XIII, da Constituição Federal.
Porém tal jornada de trabalho não é respeitada na realidade. Uma vez que o horário de almoço não está incluído nas 8h diárias e 44 semanais, percebe-se que os empregados domésticos passam muito tempo a mais na casa de seus empregadores, seja para almoçar e/ou jantar, seja para cumprir serviços extras. Lorena Colnago[xxiv]prediz sobre o mesmo assunto (s/a, p. 314):
“O art. 10 disciplina a limitação da jornada em igualdade de tratamento aos empregados das outras categorias, com adicional de hora extra, compensação de horas e intervalos, enquanto o art. 11 fixa a obrigatoriedade de uma remuneração mínima – já existente no brasil desde a Constituição de 1988 (art.7, inc. iv), com pagamento em dinheiro em intervalos regulares de um mês (art. 12 da Convenção n. 189 da OIT).”
Como já descrito, trabalhando horas a mais, é devido o pagamento da hora extra, com valor em 50% superior ao da hora normal (art. 7º, XVI, da CF). Porém, isso pode ser dispensado, caso haja acordo escrito para compensação do excesso de horas em outro dia dentro do próprio mês. A compensação ocorre no caso do art. 59, § 2º, da Consolidação das Leis de Trabalho (CLT), desde que a hora superior ao serviço doméstico executado não ultrapasse duas horas a mais, ou seja, 10 horas diárias (art. 59, da CLT).
Igor Cardoso Garcia comenta sobre tal garantia (ano 2014, p. 12):
“O art. 10 da Convenção n. 189 provoca acirrados debates, já que prevê a limitação da jornada de trabalho do doméstico, com a adoção, pelo estado membro, de medidas que assegurem igual jornada entre os trabalhadores domésticos e os não domésticos, bem como a compensação de horas, períodos diários e semanais de descanso, estes não inferiores a 24 horas e férias anuais remuneradas, em conformidade com as leis nacionais ou com os instrumentos coletivos aplicados à categoria, tendo em conta, por certo, as características especiais desse tipo de trabalho. Garante aos domésticos, também, que o período em que estejam à disposição do empregador seja considerado como trabalhado.”
Ainda, os intervalos de descanso, salvo previsão legal expressa, não estão computados na jornada de trabalho, um exemplo é o intervalo intrajornada (art. 71, § 4º, da CLT), o qual seja para alimentação ou repouso. Eles são devidos e sua não concessão ou a concessão parcial implica no pagamento total do período correspondente, com acréscimo de 50% sobre o valor da hora normal de trabalho, conforme a Súmula 437, inciso I, do TST. É notável que tal intervalo constitui natureza salarial e, quando não é concedido e/ou reduzido repercute no cálculo de outras parcelas salariais (Súmula 437, inciso III, do TST).
Jorge Cavalcanti Boucinhas Filho e Rúbia Zanotelli de Alvarenga [xxv]traduzem o que seria tempo livre para o intervalo intrajornada (2014, p. 267):
“Após o cumprimento de sua jornada de trabalho, o trabalhador doméstico passa a ter tempo livre, que corresponde ao seu tempo de descanso e de lazer. O tempo livre é aquele não produtivo, em que outros aspectos da vida humana como os encontros sociais, os cuidados com a família, os estudos e os momentos de lazer deverão ser levados em consideração para fins de descanso, de lazer e de recuperação de suas energias físicas e mentais. Se tal tempo não for respeitado, e o empregador exigir trabalho extraordinário, o empregado doméstico fará jus às horas extras, conforme preceitua o art. 7º, incisos xIII e xVI da nova Emenda Constitucional n. 72 de 2013. Poderá, eventualmente, caracterizar regime de prontidão, como oportunamente se demonstrará. Sob este aspecto, o trabalhador doméstico também faz jus ao intervalo intrajornada, nos moldes do art. 71 e seguintes da CLT. (grifo nosso).”
Ultrapassada a jornada de seis horas de trabalho, é devido o gozo do intervalo intrajornada mínimo de uma hora, sendo remunerado tal período para descanso e alimentação, mas não pode ser considerado como hora extra (art. 71, caput, da CLT).
É um direito garantido pela CF/88, em seu art. 7º, XXII, por isso, independente da cláusula de acordo ou convenção coletiva de trabalho, a supressão ou redução deste intervalo não pode ocorrer, por ser medida de segurança do trabalho, higiene e saúde, conforme Súmula 437, inc. II, do TST.
Mas para qualquer análise, é necessário destacar que a entrada e saída do doméstico no serviço, na maioria dos casos não são controladas. Ainda, Jorge Cavalcanti Boucinhas Filho comenta (ano 2014, p. 266):
“A única forma, portanto, de assegurar alguma efetividade ao novo preceito constitucional, cuja eficácia é imediata, é exigindo que o empregador doméstico controle a jornada de seus empregado doméstico, independentemente do número de pessoas que estejam lhe prestando serviços. Alguns edifícios residenciais possuem mecanismos que possibilitam esse controle na própria portaria prestando-se o horário de ingresso e de saída dos domésticos para esse fim. Não se verificando a hipótese, aludido controle poderá ser realizado pelo empregador de forma manual – como o livro ou a folha de ponto ou o quadro de horário, no qual o trabalhador doméstico registra diariamente o início e o término de seu trabalho – ou também de forma mecânica ou eletrônica, que pode ocorrer por meio de cartão ou relógio de ponto (GRIFO NOSSO)."
A relação é caracterizada pela boa fé e pela confiança. O empregador geralmente não cria nem uma folha de ponto, assim sendo, os horários a serem cumpridos é de pura responsabilidade do empregado doméstico.
A CLT enuncia em seu artigo 74, § 2º, que é obrigatório o controle de jornada para os estabelecimentos que possuam mais de dez empregados. Não sendo tal medida adotada na relação empregatícia, que figura com apenas dois polos: o patrão e o empregado doméstico.
O Dr. José Soares Filho[xxvi], Juiz do Trabalho aposentado, enunciou em seu artigo sobre Direitos Trabalhistas e Previdenciários do Empregado Doméstico (2014, s/p):
“Aplicando-se a aludida regra para os domésticos, somente quem empregue mais de 10 (dez) empregados em sua residência, hipótese de difícil verificação na prática, será obrigado a registrar o controle da jornada de trabalho do trabalhador doméstico. E o número de empregadores domésticos que dispõe de mais de dez empregados domésticos prestando-lhe serviços é seguramente bastante diminuto."
Se houver indícios de que o empregado doméstico está reduzindo as horas trabalhadas, naturalmente pode ser descontado o valor do respectivo salário, caracterizando falta disciplinar punível pelo empregador. Para provar tal falta, a simples constatação no caderno de ponto seria cabível e, quando não for possível ou havendo uniformidade nos horários (art.896, da CLT), será válida a inversão do ônus da prova. Abaixo um exemplo de julgado pelo Tribunal Superior de Trabalho[xxvii]:
“RECURSOS DE REVISTA DA EMPRESA E DO TRABALHADOR. INTERVALO INTRAJORNADA. REDUÇÃO. CONVENÇÃO COLETIVA. IMPOSSIBILIDADE . REMUNERAÇÃO (MATÉRIA COMUM). Recursos calcados em ofensa a dispositivo de lei e da Constituição Federal e divergência jurisprudencial. No caso, o e. Tribunal Regional considerou inválida a redução do intervalo intrajornada por norma coletiva, mas concluiu que é devida a remuneração apenas do tempo não usufruído como extra. Sobre o tema, a jurisprudência do TST pacificou-se no sentido de que é inválida cláusula de acordo ou convenção coletiva que reduza ou suprima o intervalo intrajornada, uma vez que os períodos de descanso regulamentados na CLT constituem normas de ordem pública, que não se submetem a negociação coletiva porquanto visam a resguardar a saúde do trabalhador, conforme Súmula 437, item II, do TST. Da mesma forma, também é pacífico o entendimento de que a concessão parcial do intervalo intrajornada gera ao empregado o direito ao pagamento integral do período correspondente, e não apenas daquele suprimido, com acréscimo de, no mínimo, 50% sobre o valor da remuneração da hora normal de trabalho, observados os devidos reflexos sobre as parcelas de natureza remuneratória conforme Súmula 437, item I, do TST.(…) HORAS EXTRAS. REGISTRO DE JORNADA POR EXCEÇÃO. ACORDO COLETIVO CUJA VIGÊNCIA É ANTERIOR À NOVA REDAÇÃO DA SÚMULA 277 DO TST. REGISTROS DE HORÁRIO INVARIÁVEIS. SÚMULA 338, III, DO TST (RECURSO DA EMPRESA). (…) Para se concluir de forma diversa da e. Corte Regional, seria necessário o reexame de fatos e provas, inadmissível em sede extraordinária conforme Súmula 126/TST. A uniformidade dos horários registrados nos controles de jornada ocasiona a inversão do ônus da prova em relação às horas extras, que passa a ser do empregador, nos termos da Súmula 338, item III, do TST. Recurso de revista não conhecido.Recurso de revista não conhecido. CONCLUSÃO: RECURSOS DE REVISTA DA EMPRESA E DO TRABALHADOR PARCIALMENTE CONHECIDOS E PROVIDOS. TST – RR: 870005820075040292 87000-58.2007.5.04.0292, Relator: Alexandre de Souza Agra Belmonte, Data de Julgamento: 08/05/2013, 3ª Turma, Data de Publicação: DEJT 10/05/2013 (grifo nosso).”
Sobre a jornada de trabalho, para que haja comprovação dos horários de entrada de saída do empregador doméstico é necessária exata veracidade, uma vez que os cartões de ponto que demonstram horários de entrada e saída uniformes são inválidos como meio de prova (Súmula 338, inciso III, do TST[xxviii]). Para tanto, caso isso ocorra, inverte-se o ônus da prova, cabendo ao empregador provar às horas extras prestadas pelo seu empregado doméstico.
Diante de todo o exposto, é notável que o empregado doméstico conquistou mais garantias e novos direitos com a PEC nº 72/2013. Dentre eles: o intervalo intrajornada, a compensação de horas, trazendo uma jornada de trabalho melhor adequada e regulada.
Conclusão
Durante muito tempo os empregados domésticos viveram à mercê de éticas abusivas, sem qualquer meio de tutela legal, foram necessárias diversas lutas para que alguns direitos lhes fossem assegurados e mesmo assim manteve-se ausente uma proteção ampla e eficaz a estes trabalhadores.
Atualmente a se tenta reparar todo o erro cometido ao longo deste histórico, a sociedade e seus dirigentes mostram o desejo de eliminar a discriminação legal que permeia a relação empregatícia doméstica.
A exigência que os trabalhadores domésticos possuam os mesmos direitos que os demais empregados, busca-se a extirpação de uma subespécie ou segunda categoria de trabalhadores, o Direito do Trabalho deve avançar e promover a equidade seguida pelo Princípio da Isonomia, tratando, de fato e de direito, igualmente todos os trabalhadores reconhecendo lhes os mesmos direitos independentemente do âmbito em que suas funções são exercidas.
Assume-se que equiparação dos direitos dos empregados domésticos deve trazer consigo alguns pontos negativos, tais como o aumento de custo para manter um empregado doméstico, fato que possivelmente refletirá no aumento de demissões dessa categoria e diminuição da oferta para esse tipo de emprego o que poderia ocasionar o aumento do trabalho doméstico informal, exatamente o que se visa evitar.
Entretanto, é de suma importância que essa classe de trabalhadores seja protegida, e para os efeitos negativos, ressalta reflexos positivos resultantes desta mudança, tais como a maior proteção ao trabalhador propiciando-lhe melhores condições de trabalho, valorizando o labor desenvolvido pelo empregado doméstico e pondo fim a discriminação e marginalização em que estes se encontram.
Mesmo que, em uma primeira visão, haja em um primeiro momento haja um prejuízo na situação vivenciada pelos empregados, restringindo-lhes o mercado de trabalho, a equiparação dos direitos trabalhistas se mostra como a medida mais acertada em prol dos interesses não só dos empregados, mas, também dos empregadores.
Uma vez que os ofertantes deste emprego passaram a contar com pessoas realmente qualificadas para o exercício de uma função tão importante e remota que é zelar pelo bem-estar da família e do lar de outro indivíduo. Enquanto aos empregados, foram assegurados direitos para uma condição digna e condizente com a realidade atual do mercado de trabalho.
acadêmica de Direito da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul UFMS Campus II de Três Lagoas/MS – CPTL
Bacharel em Direito formada pela Universidade Federal de Mato Grosso do Sul – UFMS-CPTL Campus de Três Lagoas/MS
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