Marina de Araujo Lopes, Advogada, Sócia da SiqueiraCastro Advogados, possui L.L.LM em Direito Empresarial no IBMEC e Pós Graduada em Processo Civil pela EBRADI.
A Emenda Constitucional 125, promulgada em 14 de julho de 2022, introduziu um novo requisito para o conhecimento do recurso especial pelo Superior Tribunal de Justiça: a demonstração da relevância das questões de direito federal debatidas no caso concreto.
Em termos práticos, a parte que tiver interesse em recorrer ao Superior Tribunal de Justiça deverá demonstrar a relevância das questões de direito federal infraconstitucional discutidas no seu processo, a fim de que seja viabilizada a admissão do recurso.
A relevância, segundo o texto aprovado será presumida nos seguintes casos: (i) ações penais; (ii) ações de improbidade; (iii) ações cujo valor da causa ultrapasse quinhentos salários-mínimos; (iv) ações que possam gerar inelegibilidade; (v) hipóteses em que o acórdão recorrido contrariar jurisprudência dominante do STJ; (vi) outras hipóteses previstas em lei.
A ideia da criação de filtros recursais para permitir o julgamento apenas das questões jurídicas que ultrapassam os interesses particulares das partes, não é uma novidade e está contida na criação do writ of certiorari1 na Suprema Corte dos Estados Unidos que possui o mesmo objetivo de se construir uma pré-seleção de casos.
Aqui no Brasil, esse critério teve início com o requisito da repercussão geral para interposição dos recursos extraordinários. Pela forma como tem se dado o assunto da nova Emenda Constitucional, ficam evidentes as semelhanças entre a repercussão geral para o recurso extraordinário e a relevância para o recurso especial, embora não tenha sido utilizada a mesma terminologia, assim como no caso do critério da transcendência para os recursos de revista para o Tribunal Superior do Trabalho.
O texto constitucional proposto como critério ao Superior Tribunal de Justiça, assim como aquele do Supremo Tribunal Federal, não especifica o que se entende, respectivamente, por uma matéria com relevância ou com repercussão geral, cabendo assim, à legislação infraconstitucional a regulamentação precisa do tema.
Ainda que se considere o que dispõe o art. 1035, §1º, do Código de Processo Civil, o texto é genérico no momento que direciona a matéria para aquilo que seja relevante do ponto de vista econômico, político, social ou jurídico que ultrapassem os interesses subjetivos do processo. Em que pese a Emenda Constitucional nº 125 trazer determinadas especificidades (conforme apontado acima), há dois dispositivos que nos levam a crer que terão o mesmo viés “vago” da legislação que detalhou o critério da repercussão geral, quais seja: “(v) hipóteses em que o acórdão recorrido contrariar jurisprudência dominante do STJ; (vi) outras hipóteses previstas em lei.”. Sendo este último o que impediu que o critério em questão não começasse a ser exigido desde a publicação da EC.
A repercussão geral do recurso extraordinário se dará quando o acórdão contrariar súmula ou jurisprudência dominante ou declarar inconstitucionalidade de tratado ou lei federal (art.1035, §3º, I e III, CPC). Conforme acima mencionado, as hipóteses de relevância da questão no recurso especial poderão ser mais amplas na medida que, até então, indicam apenas para a hipótese de acórdão contrário à jurisprudência dominante do STJ. Nesse sentido, uma ainda mais ampla gera certo receio, posto que a abrangência no conceito da relevância poder vir a ser extremamente prejudicial para a previsibilidade que se deve ter em relação ao cabimento ou não do recurso especial.
Neste espeque, há um importante precedente do STF em matéria de repercussão geral:
“A obrigação do recorrente em apresentar formal e motivadamente a preliminar de repercussão geral, que demonstre sob o ponto de vista econômico, político, social ou jurídico, a relevância da questão constitucional debatida que ultrapasse os interesses subjetivos da causa, conforme exigência constitucional e legal (art. 102, § 3º, da CF/88, c/c art. 1.035, § 2º, do CPC/2015), não se confunde com meras invocações desacompanhadas de sólidos fundamentos no sentido de que o tema controvertido é portador de ampla repercussão e de suma importância para o cenário econômico, político, social ou jurídico, ou que não interessa única e simplesmente às partes envolvidas na lide, muito menos ainda divagações de que a jurisprudência do STF é incontroversa no tocante à causa debatida, entre outras de igual patamar argumentativo”
(ARE 1.301.803 AgR, rel. min. Alexandre de Moraes, DJE de 14/04/2021)
A tendência é que o mesmo se dará com a exigência da demonstração do critério de relevância. Nesse sentido, já temos o posicionamento do Superior Tribunal de Justiça que encaminhou ao Senado Federal uma sugestão de anteprojeto para a regulamentação do critério.
No documento percebemos os seguintes pontos:
Portanto, o que se percebe é que a jurisprudência consolidada do Supremo Tribunal Federal sobre o seu próprio critério, será um bom campo de pesquisa para os advogados que ainda questionam como se dará a exigência do critério da relevância pelo Superior Tribunal de Justiça o que, na prática, já acontece. Os advogados mais atuantes nos Tribunais Superiores sabem que, apesar de não termos uma formalização do critério da relevância, há muitos anos o Superior Tribunal de Justiça tem tentado resgatar sua função constitucional e afastar a sua indevida utilização como terceira instância e assim, por meio de verbetes sumulares, consegue oferecer aos jurisdicionados um olhar de que somente será julgado aquele recurso que tiver impacto em demais processos, interesse social e que poderá ser um harmonizador de divergência jurisprudencial dentro do próprio Tribunal ou em relação aos demais Tribunais de Justiça.
Referências:
Código Civil Brasileiro. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406.htm> Acesso em: 07/03.2023.
Constituição Federal em: <www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao> Acesso em: 07/03/2023.
BRASIL. SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. ARE 1.301.803 AGR, REL. MIN. ALEXANDRE DE MORAES, DJE DE 14/04/2021
RULES OF SUPREME COURT OF THE UNITED STATES. Disponível em: https://www.supremecourt.gov/ctrules/2019RulesoftheCourt.pdf . Acesso em: 07.03.2023
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