Programa Nacional dos Direitos Humanos: Pretende o legislador instituir regime de democracia ditada?

Resumo: Pautado na necessidade de reforço do Estado Democrático de Direito, aliado à integração e ampliação de diversos setores, previstos na Constituição de 1988, principalmente quanto aos princípios e garantias fundamentais, o Poder Executivo baixou o Decreto nº. 7.037/2009, de 21 de dezembro de 2009, que aprova o Programa Nacional de Direitos Humanos – PNDH-3. Estão contidos em seu bojo, eixos orientadores e importantes diretrizes, que dependem da aprovação pelo Plenário. Tão importantes, que a força da aprovação das leis trará significantes mudanças na vida de todos os brasileiros. O legislador prima pela interação democrática em diversos setores, como ainda, pela ampliação dos princípios e garantias fundamentais. Quanto aos planos estratégicos, além da necessidade de aprovação de 27 leis, traz temas polêmicos, como a defesa da descriminalização do aborto, a união civil entre homossexuais, a revisão da Lei de Anistia, sem contar na modificação das r egras de reintegração da posse, em invasões de terras, alcançando meios até para o acompanhamento editorial dos recursos de comunicação (Lei de Imprensa). Mesmo com o aval de 17 (dezessete) ministérios, o Decreto vem suscitando duras críticas pelo Senado, através da oposição, entre militares, juristas, imprensa e igreja. Por abordar assuntos até então não muito explorados, posicionamentos antagônicos vem sendo presenciados pelos brasileiros, do Oiapoque ao Chuí. Diante disso, o que mudou e mudará com o advento dos Decretos, quais os assuntos principais e pontos polêmicos incluídos nas recentes discussões que a análise do texto vem provocando na vida de cada um de nós e como ficará a Constituição Republicana de 1988 com a aplicabilidade das metas traçadas pelos nossos governantes? 

Sumário: 1. Notas introdutórias. 2. Lineamento histórico do Decreto nº 7.037 e os objetivos traçados pelo legislador. 3. O outro lado da moeda: a placa levantada pela oposição, juristas, militares, igreja e por membros do próprio governo. a) “Comissão da Verdade”: O Direito à memória e o regime militar b) Revogação de qualquer lei retroativa, afrontosa aos direitos humanos c) Enfraquecimento das instituições com a mudança do regime d) Índios e quilombolas e) A flexibilização das regras com a suposta mediação de conflitos e a regulamentação de mandados de reintegração de posse em propriedades invadidas – O agronegócio f) Mecanismos de promoção à censura e o monitoramento do conteúdo editorial das empresas de comunicação g) Diálogo do governo com o povo prima o governo pela criação de um novo texto constitucional?


1. Notas introdutórias.


Pautado na necessidade de reforço do Estado Democrático de Direito, aliado à integração e ampliação de diversos setores, previstos na Constituição de 1988, principalmente quanto aos princípios e garantias fundamentais, o Poder Executivo baixou o Decreto nº. 7.037/2009, de 21 de dezembro de 2009, que aprova o Programa Nacional de Direitos Humanos – PNDH-3. Estão contidos em seu bojo, eixos orientadores e importantes diretrizes, que dependem da aprovação pelo Plenário. Tão importantes, que a força da aprovação das leis trará significantes mudanças na vida de todos os brasileiros. O legislador prima pela interação democrática em diversos setores, como ainda, pela ampliação dos princípios e garantias fundamentais. Quanto aos planos estratégicos, além da necessidade de aprovação de 27 leis, traz temas polêmicos, como a defesa da descriminalização do aborto, a união civil entre homossexuais, a revisão da Lei de Anistia, sem contar na modificação das regras de reintegração da posse, em invasões de terras, alcançando meios até para o acompanhamento editorial dos recursos de comunicação (Lei de Imprensa). Mesmo com o aval de 17 (dezessete) ministérios, o Decreto vem suscitando duras críticas pelo Senado, através da oposição, entre militares, juristas, imprensa e igreja. Por abordar assuntos até então não muito explorados,  posicionamentos antagônicos vem sendo presenciados pelos brasileiros, do Oiapoque ao Chuí. Diante disso, o que mudou e mudará com o advento dos Decretos, quais os assuntos principais e pontos polêmicos incluídos nas recentes discussões que a análise do texto vem provocando na vida de cada um de nós e como ficará a Constituição Republicana de 1988 com a aplicabilidade das metas traçadas pelos nossos governantes?


LINEAMENTO HISTÓRICO DO DECRETO Nº 7.037 E OS OBJETIVOS TRAÇADOS PELO LEGISLADOR


De acordo com o artigo 84, inciso VI, alínea a da Constituição Republicana de 1988 (redação determinada pela Emenda Constitucional nº 32, de 11 de setembro de 2001), o Chefe do Executivo tem competência privativa para dispor, mediante Decreto, pela organização e funcionamento da administração federal, quando tal fator não implicar aumento de despesa, nem criação ou extinção de órgãos públicos.


Em seu segundo mandato, o presidente Luis Inácio Lula da Silva, baixou o Decreto nº 7.037, de 21 de dezembro de 2009, reforçando os ideais contidos nos princípios e garantias constitucionais, previstos na Carta Magna, o que vem trazendo fortes mudanças no nosso País.


Com o apoio efetivo da Secretaria de Direitos Humanos, o texto prima pela interação democrática entre o Estado e a sociedade civil como instrumento de fortalecimento da democracia participativa, além da valorização dos direitos humanos e a integração e ampliação dos sistemas de informações. Além disso, a intenção do Executivo foi a de construir uma maior avaliação e monitoramento dessa efetivação.


O PNDH-3 representa a “continuidade” ao conteúdo apresentado em 1996, pelo Plano Nacional de Direitos Humanos 1. O texto se limitou a tratar assuntos entrelaçados a direitos civis e políticos. Só. Em seguida, o PNDH-2, apresentado no ano de 2002, incorporou novos temas. Direitos econômicos, sociais, culturais, e, principalmente, ambientais foram o foco o trabalho.


Com o passar dos anos, diante do acúmulo considerável de tratados internacionais, o Decreto nº. 7.037, tendo como base os princípios e garantias fundamentais, contidos na Constituição Federal, apenas ratifica o compromisso levantado desde o primeiro Programa, dando efetividade às garantias inerentes ao cidadão.


O respeito ao Estado Democrático de Direito, ao pacto federativo e suas competências também é mantido como objetivo central da legislação. Tal meta tem por trás uma gama de embates, até por membros do próprio governo.


O texto, segundo a Secretaria Nacional de Direitos Humanos, teve origem concreta após a realização da 11ª Conferência Nacional de Direitos Humanos, ocorrida Brasília, entre os dias 15 e 18 de dezembro de 2008. O PNDH-3 contém 6 (seis) eixos orientadores, subdivididos em 25 (vinte e cinco) diretrizes, 82 (oitenta e dois) objetivos estratégicos e 521 (quinhentas e vinte e uma) ações programáticas, incorporando algumas propostas vindas de aprovações em 50 (cinqüenta) conferências nacionais, realizadas em 2003. Igualdades raciais, direitos da mulher, segurança alimentar, cidades, meio ambiente, saúde, educação, juventude e cultura foram os assuntos mais discutidos.


A interação democrática entre Estado e sociedade civil é elencada como o primeiro Eixo Orientador, visando o fortalecimento da democracia participativa, ou seja, aquela na qual se vislumbra a gestão política pautada em consultas e no debate público. Quem comanda o espetáculo são os cidadãos, livres, e em igualdade de participação.


Dentro do eixo, é que vem a diretriz de fortalecimento dos direitos humanos, como instrumento transversal das políticas públicas e de interação democrática, além da ampliação do sistema de informações em Direitos Humanos, fortalecendo a sua efetividade, através da construção de mecanismos de avaliação e monitoramento (meios de comunicação), ampliando o controle externo entre os órgãos públicos.


Um dos mecanismos para o seu fortalecimento é a “comunicação democrática”, tornando esses direitos com arraigada força nos serviços de radiodifusão e elaboração dos critérios de acompanhamento editorial, formando uma forte arma de comunicação e valorização desses direitos a toda a sociedade, para que não vejam todos esses direitos apenas no texto constitucional.


O Eixo Orientador II trata da efetivação de modelo de desenvolvimento sustentável, com inclusão social e econômica, ambientalmente equilibrado e economicamente sustentável, cultural e regionalmente diverso, participativo e não discriminatório, valorizando a pessoa humana como o sujeito central do processo e protegendo os direitos ambientais como Direitos Humanos, levando em consideração as gerações futuras e de direitos.


Considera como essenciais para o desenvolvimento às liberdades e os direitos básicos como alimentação, saúde e educação. Também aborda o fortalecimento de modelos de agricultura familiar e agroecológica, garantindo em um dos seus objetivos, a participação e o controle social nas políticas públicas de desenvolvimento com grande impacto socioambiental.


Todos os objetivos estão envoltos pelos princípios constitucionais da dignidade humana e equidade, valorizando o ser humano como primordial ao desenvolvimento sustentável. Quanto ao direito fundamental da saúde, propõe o legislador desenvolver o marco regulatório de todos os planos, para que os custos ao maior de 60 (sessenta) anos, por exemplo, tenha custos menores, fortalecendo medidas de capitalização para custos futuros pelas empresas operadoras dessa área.


O fortalecimento dos direitos econômicos por meio de políticas públicas de defesa da concorrência e de proteção do consumidor também é o foco do Governo com o Programa, garantir o acesso universal a serviços públicos essenciais com a qualidade que merecem ser oferecido, coibindo condutas anticompetitivas e concentradoras de renda.


Os direitos ambientais serão considerados Direitos Humanos, incluindo as gerações futuras como sujeitos. Busca-se no texto promover a cidadania plena, preconizando os princípios contidos na Declaração Universal dos Direitos Humanos: Universalidade, indivisibilidade e interdependência, condições estas para sua efetivação integral e igualitária.


A transversalidade, aliada à efetiva implementação dos direitos civis e políticos atingirá, com igualdade, diversas dimensões dos direitos econômicos, sociais, culturais e ambientais, para que grupos que vivem com parcas posses, sendo “pobres”, na acepção jurídica da palavra, sejam tratados igualmente, sem qualquer discriminação, para que não permaneçam sendo afetados no dia-a-dia da sociedade, de “visão discriminatória”.


Os objetivos permitirão a universalização do registro civil de nascimento à população de parcas posses, além da ampliação ao acesso à documentação básica, moradia digna, participação na vida política, alimentação adequada, sistema de saúde, educação, lazer, esporte e trabalho decente, adequadamente remunerado e exercido em condições de igualdade e segurança.


Crianças e adolescentes também são alvos de preocupação pelo governo. Metas como o desenvolvimento integral, o fortalecimento dos Conselhos Tutelares e de Direitos, o enfrentamento da violência sexuais contra crianças e adolescentes, garantindo, ainda, atendimento especial a crianças que enfrentam sofrimento psíquico e dependência química. A erradicação da triste realidade enfrentada por crianças em condições de miséria, exercendo trabalho infantil, em todo o território nacional. Pretende o legislador ainda implementar o Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (SINASE).


O trabalho de revisão do Estatuto do Índio, adequando-o aos princípios e garantias fundamentais, também é abordado pelo texto. Por estar em vigor desde 1973, se encontra obsoleto em relação à Carta Magna, bem como, à Convenção 169, da Organização Internacional do Trabalho (OIT), precisando de adequação. É preciso resgatar e valorizar a identidade social e cultural.


Os direitos das mulheres, já tratado desde o primeiro Programa Nacional, combatendo desigualdades estruturais, também é o foco do texto, enquanto o objetivo estratégico V trata da polêmica e moderna união civil entre pessoas do mesmo sexo, e a adoção de crianças por casais homoafetivos. O assunto foi abertamente tratado pelo Decreto, com base no Princípio da Isonomia, previsto no caput do artigo 5º da CF/88.


É do conhecimento de todos que a jurisprudência dominante do tema em comento vem garantindo uma gama de direitos a pessoas que, por livre arbítrio, são responsáveis por suas escolhas e pelo modo de viver a sua vida. O entendimento jurisprudencial quanto ao tema da adoção também vem repercutindo de forma positiva, motivo pelo qual tem os olhos do legislador, adequando o tema à sociedade moderna.


Em seguida, o legislador aponta como preocupante a falta de medidas ostensivas à inclusão de símbolos religiosos em estabelecimentos públicos, exigindo o respeito a todas as crenças, com o sobrepeso na liberdade de culto, princípio constitucional.


O avanço da segurança pública também é bem visto no texto, com a alteração da política de execução penal e do papel das políticas militares, bem como os requisitos primordiais para a decretação de prisões preventivas.


O acesso à Justiça no campo e na cidade também é um dos objetivos estratégicos, além da mediação pacífica de conflitos agrários e urbanos, garantindo a igualdade na diversidade. Pretende-se ainda regulamentar o artigo 153, inciso VII da Constituição Republicana de 1988, que dispõe sobre a competência da União para instituir o imposto de grandes fortunas, por intermédio de Lei Complementar.


O Eixo Orientador VI é o foco central das discussões recentes. A busca de revelações passadas, que refresquem a memória e tragam a verdade, ocultada ao longo dos anos, mexem em fundamentais pontos, até então, ofuscados pelo Poder, ao longo dos anos.


O primeiro objetivo estratégico traz a necessidade de apuração e esclarecimento público de todas as violações de Direitos Humanos praticadas no contexto da repressão política ocorrida no Brasil no período fixado pelo artigo 8º do ADCT da Constituição, através da formação de um Grupo de Trabalho.


Tal Grupo será composto por representantes da Casa Civil, do Ministério da Justiça, do Ministério da Defesa e da Secretaria Especial, dos Direitos Humanos da Presidência da República, para elaborar, até abril de 2010, um projeto de lei que institua a Comissão Nacional da Verdade. Os ideais foram mantidos no Decreto, de 13 de janeiro de 2010.


Requisitar documentos públicos, com a colaboração das autoridades, requerendo ao Judiciário o acesso a documentos privados e colaborando com todas as instâncias para a apuração da verdade, tratando a Lei de Anistia como uma verdadeira “Constituição” são alguns dos objetivos da Comissão.


Com esse trabalho, reconstruirão a fase turbulenta que a sociedade viveu no período da Ditadura Militar, levantando os casos e dando máxima assistência às vítimas. O trabalho de investigação para a localização e identificação de mortos e restos mortais de desaparecidos políticos também é o objetivo da Comissão da Verdade, tornando o trabalho público à sociedade e esclarecendo todas as torturas, mortes e desaparecimentos.


A Comissão também visa promover a reconciliação nacional, prevenindo a não repetição de violações de Direitos Humanos. Cada trabalho desenvolvido deverá ser apresentado anualmente, através de relatório circunstanciado que exponha todas as atividades e conclusões.


Dentro do próprio Poder Executivo e em toda a sociedade, instaurou-se um verdadeiro cáos. O ministro da Defesa, Nelson Jobim, e três comandantes militares, entregaram cartas de demissão a Lula, não restando outra forma senão a de negar tais documentos, prometendo a amenização no radicalismo imposto pelo texto para a aplicação da responsabilidade contra os militares.


Isso porque o Programa, realizando com seriedade uma investigação séria das barbáries cometidas por agentes do Estado, abrirá espaço para a revisão da Lei de Anistia, o que consequentemente, levará à condenação de oficiais da época, pela tortura, estupro, assassinato, e sumiço de ativistas de esquerdas, pessoas ligadas à cultura e revolucionários.


Assim, reviu parte do texto que trata dos abusos da época e gerou o descontentamento pela revisão parcial, não sendo um fato suficientemente satisfatório para jogar uma pá de cal a várias diretrizes, eixos e temas polêmicos.


Mantendo a Comissão da Verdade em seu bojo, a revisão pelo presidente dos rigores contidos no texto causou alívio aos militares. Restou nítido para eles a “desigualdade dos dois lados”, pois, em nenhum momento, o Programa Nacional tratou da apuração dos atos que foram cometidos pelos guerrilheiros e ativistas políticos.


O limite e a impunidade aos torturadores foram à intenção. Contudo, as críticas permanecem crescentes em razão do Decreto, de forma criativa, tocar em temas modernos, tais como os acima elencados, pretendendo aprovar mais 27 (vinte e sete) leis.


O OUTRO LADO DA MOEDA: A PLACA LEVANTADA PELA OPOSIÇÃO, JURISTAS, MILITARES, IGREJA E POR MEMBROS DO PRÓPRIO GOVERNO.


Diante da publicação do Decreto nº. 7.037/2009, e considerando pontos reconhecidos de suma importância para a sua efetividade, parte do texto vem causando tensão na esfera do Judiciário, pela oposição, igrejas e juristas. Vejamos os principais pontos levantados no início de 2010:


– “Comissão da Verdade”: O Direito à memória e o regime militar


Tema de maior polêmica do Decreto nº. 7.307/2009, a Comissão da Verdade, prevista no Eixo Orientador VI do texto legal, propõe medidas efetivas sobre o “Direito da Memória e Verdade”, no que concerne ao período da ditadura militar.


O interesse do Executivo em implantar o Grupo de Trabalho nasceu em razão de 140 (cento e quarenta) pessoas que ainda não encontraram seus parentes desaparecidos, tendo as mesmas o direito de ter o paradeiro, encontrar os restos mortais de seus entes queridos e enterrá-los, com o mínimo de dignidade.


Entretanto, a tensão se iniciou com a Diretriz 23, que possui o objetivo de promover a apuração e o esclarecimento públicos das violações de Direitos Humanos praticadas no contexto de repressão política, por agentes de Estado, ora militares.


A proposta propõe a criação de um Grupo de Trabalho, que irá, através da elaboração de relatórios que serão enviados anualmente, deflagrar detalhes sobre o sumiço de agentes políticos, revolucionários e membros da esquerda, e mostrar a coletividade, que é hora de fazer “as máscaras caírem”. Os autores das cenas de terror, e pelo sumiço de revolucionários, são Generais e agentes das Forças Armadas. Envolvidos em torturas (DOPS), estupros, lesões corporais e homicídios triplamente qualificados, aguardaram a “poeira baixar”, seguindo suas vidas, como se nada tivesse acontecido.


A pretensão não é a responsabilidade civil e criminal dos responsáveis, e sim, a colaboração efetiva ao Poder Judiciário, em todas as instâncias, com base na Lei de Anistia (Lei nº. 6.683/79), que sofrerá uma revisão. Pretende o Grupo ainda, revogar todas as leis anteriores que violam os Direitos Humanos e representam afronta ao texto constitucional.


Entretanto, os elogios à Comissão partem apenas da Secretaria de Direitos Humanos, OAB e representantes das vítimas de abusos. A revolta por parte de membros das Forças Armadas envolveu o seguinte questionamento: – Por que o Executivo não avalia as seqüelas deixadas por ambos os lados? Vislumbram que assassinatos, assaltos, seqüestros, justiçamentos, torturas e outros crimes também foram cometidos por membros da esquerda que estiveram e estão no poder?


Sustentando ser o texto de conteúdo “insultoso, agressivo e revanchista”, o ministro da Defesa, Nelson Jobim, elaborou uma carta com pedido de demissão. O comandante do Exército, Enzo Martins Peri, e o comandante da Aeronáutica, Juniti Saito, ameaçaram o mesmo impulso de Jobim, se o teor da Diretriz 23 não fosse revogado.


Os setores militares revoltaram-se ainda com o plano de proibir que locais públicos levem nomes de agentes do Estado, envolvidos com o regime, além da identificação dos locais onde teriam ocorrido os abusos (DOPS). Argumentam ainda que as novas medidas comprometam o ambiente de conciliação nacional instituído pela Lei da Anistia.


Além dos militares, cidadãos que conviveram na Ditadura Militar, e viram, com “olhos de ver”, os efeitos do Ato Institucional nº. 5 sustentam com naturalidade que o Ato, perto do Programa Nacional, é “brincadeira de criança”, passando o texto a controlar a vida dos brasileiros, assumindo a tese de que só o Governo Federal sabe o que é melhor para a vida de cada um, tutelando, assim, a vida e escolhas de cada cidadão.


Há quem diga ainda, com imponência e coragem, que o Programa Nacional é uma tentativa de antecipação de passos, implantando, com o nome e propósitos invejáveis, os primeiros dispositivos legais para uma “transição de regime”.


O revanchismo e a necessidade em manter a barbárie cometida nos crimes militares não teriam sido meras coincidências. Isso porque inexiste, para eles, qualquer clamor, entre lamentos e hipérboles, de cidadãos, que tem a memória muito fraca, enterrando o passado facilmente.


Diante de tanta polêmica, o presidente Lula sancionou um novo Decreto, desconsiderando a Diretriz 23. Contudo, manteve a Comissão, atendendo em parte a revolta das Forças Armadas.


– Revogação de qualquer lei retroativa, afrontosa aos direitos humanos


Segundo juristas, dentro do tema doutrinário de processo penal, que versa sobre o princípio da irretroatividade da lei penal e da retroatividade da lei mais benéfica ao agente do crime, uma lei não poderá ser revogada para prejudicar o Réu. O tema tem fulcro no artigo 5º, incisos XXXVI e XI, da Constituição Republicana de 1988, e é claro quando prevê que a lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o agente do crime.


Para a Secretaria Nacional de Direitos Humanos, a Lei de Anistia, como vem repetidamente informando a mídia de todo o país, não será revogada. A Comissão de Anistia a tratará como uma verdadeira Constituição realizando toda a investigação, aliada à leitura dela, para revisão, de forma que fique adequada aos princípios e garantias fundamentais.


Entretanto, peca o novo Decreto em afirmar que todas as leis anteriores, contrárias aos direitos humanos, serão revogadas, já que o objetivo central do Grupo de Trabalho seria o de identificar as causas de crimes contra revolucionários a 140 (cento e quarenta) famílias, desolados por não saberem o paradeiro de seus entes, envolvidos na ditadura.


Estudiosos e juristas sustentam, portanto, a afronta ao texto constitucional pátrio, no objetivo da revogação de leis, com o fulcro de colaborar com o Judiciário na verdade dos fatos e na punição dos causadores dos eventos.


– Enfraquecimento das instituições com a mudança do regime


Sustenta a oposição que o Programa Nacional surgiu como uma espécie de um “golpe branco”, enfraquecendo instituições, e aproximando o país do sistema político venezuelano, com menos liberdade e a democracia fragilizada. A tendência com essa medida, para líderes do Senado, é a restrição da propriedade, somada a promoção da censura, estando o Presidente, em muito pouco tempo, fazendo discursos carismáticos, semelhantes ao do presidente Hugo Chavéz.


Seria o que vem chamando a população, de um “AI-5 do lulu-petismo”, tendo a sua institucionalização considerada, acima dos Direitos Humanos, um novo “Estado Novo Lulista”, com uma pitada de um suposto “esbulho constitucional”. Uma boa parte dos brasileiros, ao lerem o texto, sustenta que é cristalina a tentativa do Executivo em enfraquecer a democracia, com a mudança do regime, criando um “poder controlador”.


– Índios e quilombolas


A questão acima estaria sendo levada pelo Poder Executivo como uma semelhança à política preconizada pela Organização das Nações Unidas que aprovou a Declaração Universal dos Direitos dos Povos Indígenas. A intenção é dar aos índios – sendo estes proprietários de áreas maiores que países, gozando de privilégios que ferem a soberania do País-, a oportunidade de gritarem a sua independência com base em conceitos de “povos” e “autodeterminação”.


Assim, há que diga que o propulsor do Programa Nacional dos Direitos Humanos vem articulando planos para nos conduzir, tratando de assuntos de importância ao nosso País, a um regime totalitário, com o discurso de valorização ao povo indígena, assim como no fortalecimento dos ideais democráticos, aliado à igualdade e, de forma espantosa, aos ideais republicanos (!!!).


– A flexibilização das regras com a suposta mediação de conflitos e a regulamentação de mandados de reintegração de posse em propriedades invadidas – O agronegócio


Membros do ministério da Agricultura veem o PNDH-3, em seu objetivo estratégico VI, com teor de preconceito. Isso porque a flexibilização com a mediação de conflitos traz uma insegurança incomensurável aos proprietários das terras, face ao aumento da violência pelos líderes do MST – Movimento dos Sem Terra, pela conquista de terras.


Mais um enfraquecimento se dará também ao setor de agronegócios, bem como, ao cumprimento dos mandados de reintegração de posse e correlatos. O texto traz a implantação de uma Câmara de Conciliação, formada para casos de invasão da propriedade, ou seja, antes da concessão da liminar de reintegração, o Grupo tentará mediar conflitos.


Para alguns entendedores, mediar seria uma espécie de concordância expressa, estimulando-se a violência no campo, tolhendo a prerrogativa de se determinar à reintegração. Assim, torna sem efeito o artigo 5º XXII e caput da Constituição Republicana de 1988, por mais que tentem fundamentar no inciso seguinte, que trate dos direitos à propriedade. Isso porque o fundamento legal jamais permite que o MST faça o que sempre vem fazendo.


Ressalta-se que já existe um Projeto (PDC nº. 2.399/2010), de autoria do deputado Antonio Carlos Mendes Thame (PSDB-SP), que susta a previsão dessa tal mediação como ato inicial na solução de conflitos agrários e urbanos, preposição sujeita, nesse momento, a apreciação do Plenário. [1]


– Mecanismos de promoção à censura e o monitoramento do conteúdo editorial das empresas de comunicação


O Projeto visa criar mecanismos de poder para promover a censura com a ampliação na propagação dos Direitos Humanos por intermédio da imprensa, contendo o texto item que trata, inclusive, de um acompanhamento e monitoramento de conteúdos editoriais da mídia, trazendo restrições à liberdade de imprensa. Para a oposição, estabelecer regras com o tal monitoramento, é voltar aos tempos da censura, o que faz o Brasil caminhar para um regime não democrático e diametralmente ao previsto na Carta Constitucional.


Propagar os Direitos Humanos seria através de medidas governamentais, não invadindo a esfera que envolve o árduo trabalho da imprensa, que se atualiza e desenvolve meios para informar notícias aos brasileiros. Tal objetivo afronta os princípios e garantias fundamentais.


– Diálogo do governo com o povo


Outra crítica levantada com a leitura do Projeto é o que vem sendo propagado pelo Executivo no que concerne à tentativa desenfreada de um maior diálogo com a população. Informa a Secretaria Nacional de Direitos Humanos que o texto ficou disponível ao longo de 2008, no Portal, aos brasileiros e que Conferências ocorreram com portas abertas a toda a coletividade, como se nenhum membro da oposição estivesse lá, apontando os pontos negativos do Projeto aos brasileiros.


A presença da oposição, além da própria renúncia coletiva de todo o Comando Militar, sem contar os pedidos de demissão de ministro e comandantes refletem que os anseios de boa parte da população foram negados.


PRIMA O GOVERNO PELA CRIAÇÃO DE UM NOVO TEXTO CONSTITUCIONAL?


Com a leitura detalhada dos objetivos estratégicos e eixos orientadores do Decreto, comparado ao texto constitucional, percebe-se um conteúdo parcialmente brilhante, e outra parte, alvo de polêmica, por afrontar princípios e garantias constitucionais, imbuídos na Constituição Republicana de 1988.


O artigo 3º da Carta Magna, por exemplo, traz os objetivos estratégicos, visualizados pela Assembléia Constituinte ao promulgar o texto (sociedade livre, justa e solidária; desenvolvimento nacional; erradicação da pobreza; e promoção do bem a todos sem preconceitos de origem, raça, cor, sexo, idade, etc), que não vieram a se concretizar ao longo de 21 (vinte e um) anos de vigência.


Observando o conteúdo do Decreto nº. 7.037/2009 vê-se claramente a efetivação desses objetivos, ainda mais floreados. Tão floreados, que pecou o Executivo pelo excesso, o que se conclui pela tentativa em se criar não só um novo regime, como o afastamento da força da norma constitucional vigente, por um novo texto, da forma ditada pelo Chefe do Executivo e pela ministra, Dilma Roussef. A democracia ditada em sua plenitude traz uma grande preocupação aos constitucionalistas, à oposição, a membros do governo, igreja e juristas de todo o Brasil.


O que não se pode esquecer nesse momento, é que a maioria dos objetivos ou minoria, poderá ou não ser transformados em lei. O que não for aprovado pelo Senado permanecerá apenas no corpo do Projeto, sendo esquecido pela sociedade e pelo próprio Governo, com o passar do tempo.


Por mais que o Executivo e a Secretaria de Direitos Humanos sustentem que as Conferências Nacionais envolveram todas as áreas do Governo e parte da sociedade (sem teto, índios, negros e aposentados), boa parte “não leu com olhos de ver” os preceitos constitucionais.


Caminha-se para um novo regime, e caberá, nesse momento, o Plenário analisar as questões com bom senso, pautadas a certeza de que a norma superior é a Constituição Federal. Ela instituiu o Estado Democrático de Direito, assegurando as garantias constitucionais a todos, e que não poderá ser tratada como um “bloco de papel” pelos membros.


O que restará à população nesse momento é acompanhar as votações, extravasando o pensamento, e não sofrer por antecipação, apenas aguardando o caminho do meio, que é o que sempre acaba prevalecendo nesse País.


 


Nota:


Informações Sobre o Autor

Amanda de Abreu Cerqueira Carneiro

Advogada – Pós-Graduada em Direito Público pela Universidade Estácio de Sá – Redatora responsável pelos impressos jurídicos de uma grande editora à nível nacional (COAD) – Membro da Equipe Técnica ADV dessa empresa – Consultora jurídica.


Equipe Âmbito Jurídico

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