Reforma Agrária: A Desapropriação de Imóveis Rurais por Interesse Social

Jenniffer Santos da Rocha, bacharel em Direito. E-mail: jenniffer21.sr@gmail.com

Resumo: A importância do trabalho com a terra para promover a economia do país e o exercício da função social ocorrem com a Reforma Agrária, que tem o escopo de eliminar os latifúndios, dividir essas terras e destiná-las às pessoas com interesse de exploração. O levantamento de pesquisas doutrinárias que albergam e defendem essa ideia são fontes que alicerçam o presente trabalho, que objetiva descortinar o direito agrário, no que se refere ao tema em estudo, pois a justificativa da existência da luta pela terra e da Reforma agrária, parte do intuito de alcançar com igualdade o direito de propriedade e de sua exploração por pessoas dispostas a serem privilegiadas no intento de contribuir para a economia da nação, especificando legalmente como deve ser a atuação do Estado para desfazer os latifúndios que congelam, ou barram a economia estatal, assim como o anseio e a necessidade que muitas famílias tem em adquirirem seu sustento através da exploração da terra, enquanto que grandes quantias encontram-se nas mãos de poucos que não as usufruem, não as exploram, e assim as tornam improdutivas.

Palavras chave: Função social. Reforma Agrária. Latifúndios. Luta pela terra. Direito de propriedade.

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Abstract: The importance of working with the land to promote the country’s economy and the exercise of the social function occur with genuine agrarian reform, which always aimed to eliminate large land, divide these lands and use them to people with an interest in exploration. The survey of doctrinal research are home and defend this idea are sources that underpin this research work, which aims to uncover the agrarian law, with regard to the topic under study, for the justification of the existence of the struggle for land and agrarian reform, part of the aim to achieve with equal right to property and its exploitation by people willing to be privileged to contribute to the nation’s economy, specifying legally it should be the State’s action to undo the large land that freeze the state economy as well as the desire and the need that many families have to gain their livelihood through the exploitation of the land, while large sums are in the hands of the few who do not enjoy, not exploit, and thus make them unproductive.

Key words: social function. Land reform. Landholdings. Struggle for land. Property right.

Sumário: Introdução. 1 Da propriedade. 1.1 Apontamento histórico. 1.2 Da propriedade em geral. 1.3 Das modalidades de aquisição da propriedade. 2 Desapropriação de imóveis rurais. 2.1 Conceito e linhas gerais. 2.2 Requisitos. 2.2.1 Necessidade ou utilidade pública. 2.2.2 A desapropriação por interesse social. 2.3 Procedimentos para desapropriação de imóveis rurais. 2.4 Da política agrícola. 2.5 Meios de defesa da propriedade. 2.6 Da perda da propriedade. 3 A reforfma agrária. 3.1 linhas gerais. Conclusão. Referências..

INTRODUÇÃO

A abordagem sobre a desapropriação de imóveis rurais para fins de Reforma Agrária no presente estudo tem o escopo de esclarecer que tal instituto existiu com a necessidade de desfazer a concentração de grandes quantidades de terras improdutivas, que se encontram sob a propriedade de poucas pessoas, e até os dias atuais os donos dos latifúndios fazem destes empecilhos para o desenvolvimento econômico do país.

Com o advento da Reforma Agrária, a busca pelo cumprimento da função social como o modo de realizar o interesse social tornou-se mais intenso, pois o seu surgimento foi motivado pela desfiguração dos latifúndios de uma maneira justa e legal.

Será esclarecido no presente trabalho, que a desapropriação de terras para sua melhor distribuição não significa tomar do proprietário o imóvel rural, mas previamente realizar o pagamento por títulos de dívida agrária de acordo com o que se entende justo, o que caracteriza uma troca de valores.

Entender-se-á que o fato de a propriedade ser considerada plena e exclusiva, sendo garantia Constitucional e albergada pelo Direito Civil vigente, não faz dela um bem intocável, pois o enfoque da desapropriação é justamente que o Estado transfira a propriedade de um imóvel rural improdutivo para outras pessoas que na posse da propriedade explorarão, de modo que incentive suas finalidades econômicas e sociais.

No decorrer dos tempos se fez necessário delimitar o absolutismo e a perpetuidade da propriedade, pois só é possível que assim seja, quando não exista o interesse social em tê-la para usufruí-la, pois caso contrário, diante da função social não é possível prevalecer a improdutividade da terra, competindo ao Estado promover a Reforma Agrária.

Para que a desapropriação fosse uma das maneiras de se adquirir a propriedade, não bastou que a função social da propriedade fosse consagrada por diversos normativos jurídicos, pois antes, existiu a luta pela propriedade, e a posse da terra é marcada por lutas inicialmente sangrentas, e com o passar dos tempos a proteção jurídica promoveu o respeito ao instituto da desapropriação dos latifúndios.

O Estatuto da Terra de 1964 foi o marco para regulamentar a proteção jurídica em todos os aspectos inerentes a relação do homem com a terra, e fortaleceu o entendimento de que é competência do Estado promover a função social com a melhor distribuição dos imóveis rurais improdutivos, no intuito de possibilitar ao camponês uma vida melhor diante das desigualdades econômicas que o latifúndio provoca, além de proporcionar a exploração e a utilidade da terra.

 

1 DA PROPRIEDADE

1.1 APONTAMENTO HISTÓRICO

Antes que o Brasil fosse habitado pelos portugueses, as terras pertenciam de modo exclusivo aos índios que exploravam suas riquezas de forma rudimentar e dela se sustentavam. Mas com a chegada do colonizador português isso não perdurou, pois em busca das riquezas colonizaram o Brasil, em síntese, escravizaram negros e índios, e Portugal tornou-se a exploradora do país, delimitou as terras e usufruiu de forma abundante das riquezas naturais.

A Coroa Portuguesa nas terras brasileiras era considerada a maior potência da época, pois aqui tudo estava sob seu domínio, e para se manter no controle aplicaram as sesmarias, que eram terras delimitadas e abandonadas, cedidas para pessoas que tinham o interesse de povoar e provocar a exploração das terras do Brasil.

Esse modelo de distribuição de terras foi a reprodução do que existia em Portugal, onde o rei D. Fernando I, com o objetivo de motivar o desenvolvimento da agricultura no país, estabeleceu a cobrança da sexta parte dos frutos advindos da exploração das terras cedidas.

“A maioria dos autores considera que a palavra “sesma” significa a sexta parte de alguma coisa, tal como o foro das terras férteis dadas a requerente por ficarem elas em abandono, representando em geral a sesta parte dos frutos. O verbo “sesmar” exprimia a concessão de terras sujeitas a tal pagamento de foro, daí surgindo a palavra “sesmaria”’. (FERREIRA, 1998, p. 110).

Surge assim a primeira forma agrária que existiu, e que no decorrer dos tempos tornou-se costume, de modo que provocou a existência da Lei das Sesmarias aprovada por D. Fernando I, rei de Portugal, em 26 de junho de 1375, embalada pela lei do Império Romano que normatizou a distribuição de terras.

O Rei D. João III foi quem trouxe para o Brasil esse modelo agrário, e para consolidar o regime das sesmarias criou as capitanias hereditárias, em que os sesmeiros representavam a figura do rei no tocante a administração dessas terras.

Conforme Ferreira (1998, p. 111) as capitanias eram privadas porque estavam sob a responsabilidade dos concessionários, e hereditárias, pois eram passadas para os sucessores legítimos como herança.

Foram implantadas no Brasil 15 capitanias, mas prevaleceram apenas, a de Pernambuco que fez existir Igaraçu e Olinda, situadas próximas ao Rio São Francisco, e a São Vicente, em São Paulo representada pelo cultivo de cana-de-açúcar.

Somente nestas regiões brasileiras ocorreram genuinamente o povoamento e a exploração da terra com suas divisões conforme era o intuito da Coroa Portuguesa ao implantar as sesmarias.

Em Portugal e em outras colônias as sesmarias resultaram na pequena propriedade agricultora, já no Brasil, provocou concentração de grandes quantidades de terras sob o domínio de poucos, resultado provocado pelo sistema feudal.

“Cabe mencionar, um traço feudal do sistema, o que levou a um resultado diferente daquele obtido em Portugal. No Brasil tal traço feudal encaminhou para uma estrutura fundiária baseada na grande propriedade rural, contrariando ao que historicamente aconteceu em Portugal, e outras colônias, onde o sistema originou a pequena propriedade agrícola” (FERREIRA, 1998, p. 112).

Nesse sentido, é possível observar os primórdios do latifúndio no Brasil, que desde a implantação do sistema das sesmarias provocou o domínio de poucas pessoas sobre grandes extensões de terras, e os povos que vieram para explorar as terras brasileiras, foram submetidos à intensa cobrança da proteção militar que seus “senhores” concediam, e endividados tornavam-se escravos.

“O Instituto da sesmaria surgiu em Portugal com a finalidade de aproveitamento de terra incultas por negligência de seus proprietários. No Brasil Colônia, contraditoriamente, ensejou a grande propriedade rural e a monocultura” (GRISCHKOW, 1988, p. 71-2).

O direito de propriedade no Brasil iniciou com a Constituição Imperial de 1824, que em seu art. 179, XXII, assegurava a sua plenitude, podendo ser considerada como absoluta, pois o proprietário tinha liberdade quase que sem limitações de dispor dela conforme lhe conviesse.

Essa disposição elevou o direito de propriedade ao aspecto individualista, e tal característica permaneceu com a Constituição Republicana de 1891.

No entanto, quando se fala de propriedade territorial lembra-se da lei nº 601 de 18 de dezembro de 1850, regulada pelo Decreto nº 1.318 de 30 de janeiro de 1854, que tratou de separar o que se considerava propriedade particular da propriedade pública.

Surge a emenda constitucional de 1926 que ao tratar das minas e jazidas de minério em seu art. 72, § 17, b, que limitou a possibilidade de disposição plena da propriedade, quando proibiu a mudança da propriedade que contivesse esses recursos para pessoas estrangeiras.

A Constituição de 1934 separou a propriedade do solo em si, da titularidade de domínio dos recursos do subsolo, logo, este não mais pertencia ao proprietário da terra. E mais, delimitou que o interesse social e coletivo não poderia ser inferior ao exercício da propriedade permitido aos brasileiros e estrangeiros. Tais preceitos permaneceram na Constituição de 1937.

Ocorreu na sequência, o condicionamento do exercício da propriedade ao bem-estar social e a justa distribuição da propriedade, promovendo a igualdade de oportunidade para todos. Foi a novidade trazida pela Constituição de 1946 quanto ao direito de propriedade.

Surge o Estatuto da Terra, lei nº 4.504 de 30 de novembro de 1964 que aflorou a Reforma Agrária e a Política Agrícola. Em suma, tal lei tutela a relação do homem com a terra, com proteção estendida a ambos.

De acordo com Borges (1998, p. 13), trata-se de lei fundamental, pois protege o homem por ser parte da relação jurídica e principal usufruidor das vantagens da lei, e tutela a terra, sendo esta o bem mais precioso para todas as gerações.

Em 1967 a Constituição, e a Emenda constitucional nº 1 de 1969, promoveram a função social como condição para o exercício da propriedade.

No entanto, foi a Constituição de 1988, que de forma categórica elencou o que se entende por cumprimento da função social da propriedade e estabeleceu seus requisitos no art. 186:

“Art. 186. A função social da propriedade é cumprida quando a propriedade rural atende, simultaneamente, segundo critérios e graus de exigência estabelecido em lei, aos seguintes requisitos:

I- aproveitamento racional e adequado;

II- utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e preservação do meio ambiente;

III- exploração que favoreça o bem-estar dos proprietários e dos trabalhadores”.

A Constituição de 1988 que perdura até os dias atuais assegura o direito de propriedade aos nacionais ou estrangeiros, porém, tal segurança não prevalece à luz da Magna Carta se não for cumprida a função social, conforme estabelece o “caput” do art. 5º e seus incisos XXII e XXIII.

 

1.2 DA PROPRIEDADE EM GERAL

A propriedade é um direito real conforme dispõe o artigo 1.225, I, do Código Civil, pois o proprietário tem o poder jurídico quanto ao bem, de forma direta, imediata, exclusiva e oponível contra todos.

Para Gonçalves (2012, p. 119) considerando os principais elementos da propriedade que constam no art. 1228 CC, é possível definir o direito de propriedade.

Logo, a propriedade não se confunde com a posse, pois esta se conceitua como o exercício que uma pessoa tem sobre uma coisa poderes de conservação, ostensividade e defesa.

De acordo com Gonçalves (2012, p. 47) o conceito de posse está implicitamente aparente no art. 1196 do CC por considerar possuidor “todo aquele que tem de fato o exercício, pleno ou não, de algum dos poderes inerentes da propriedade.”

O direito à propriedade é destinado à pessoa jurídica ou física, e seu exercício é pleno e exclusivo como regra do art. 1.231 do Código Civil. Tal norma não permite que esse direito seja exercido a bel prazer, pois a plenitude e a exclusividade da propriedade se esbarram nos limites legais, prevalecendo estes.

A propriedade é plena quando se reúnem em uma só pessoa os poderes de “usar, gozar e dispor da coisa, e o direito de reavê-la do poder de quem quer a possua ou detenha”, conforme o art. 1.228 do Código Civil.

Mas será considerada limitada se um ou alguns desses poderes for exercido por outra pessoa.

Os elementos que caracterizam o domínio são:

– Usar: quando o proprietário destina ou não o bem para o seu devido fim, ou aproveita ele conforme lhe convier, desde que respeitados os limites legais;

– Gozar/ fruir: possibilidade que o proprietário tem para conseguir com o bem vantagens econômicas, aproveitando dos seus benefícios;

– Dispor: a faculdade de transferir a propriedade da coisa, gravá-la de ônus, vendê-la para outrem ou modificá-la, conforme dispor a lei. No entanto, aqui não se permite, hipoteticamente, destruir o bem, caso essa atitude não seja à favor da sociedade, pois deve-se observar o bem-estar social assegurado pela Constituição Federal;

– Direito de reivindicar: pode o proprietário buscar ter novamente para si a coisa que foi possuída ou detida por terceiro em qualquer lugar que ela esteja, desde que seja esta situação injusta.

Nesse sentido, a propriedade tem como característica a perpetuidade, pois até que ocorra uma causa, ela continuará a existir, sendo também considerada um direito fundamental, pois é a base para todos os outros direitos reais. É a propriedade que justifica a existência deles.

Outro caráter da propriedade é a possibilidade de ser plena, limitada e voltar a ser plena novamente, conforme vontade do proprietário nos limites legais.

Os objetos da propriedade são os bens corpóreos e os incorpóreos, estes são os bens criados pelo intelecto humano, sendo propriedade a científica, artística ou literária, já os bens corpóreos são os materiais ou imateriais que no mundo físico ocupa espaço e é possível individualizá-los, e que o acessório, via de regra, o acompanha.

 

1.3 DAS MODALIDADES DE AQUISIÇÃO DA PROPRIEDADE

As modalidades de aquisição da propriedade ocorrem conforme o caso concreto de acordo com o tempo, a presença da exploração e o modo como o interessado se vinculou com a coisa.

A Usucapião é a modalidade de aquisição da propriedade delimitado pelo decurso do tempo e pela posse que demonstre o “animus domini”, ou seja, a intenção de ser dono da coisa, e que ocorra de forma mansa, pacífica e de boa-fé.

Deve a posse ser mansa e pacífica, pois o proprietário da coisa não pode contestar a intenção de dono daquele que a ocupa, até que se conclua o prazo para a caracterização da usucapião, pois se ocorrer a manifestação do proprietário antes que se complete o tempo necessário para a usucapião, esta não se configurará.

É necessário que exista a continuidade, ou seja, não pode ter intervalo de tempo. Neste caso é possível que ocorra a soma da posse dos antecessores conforme estabelece o art. 1.243 do Código Civil.

A usucapião pode ser extraordinária, disposta no art. 1.238 do Código Civil, que segundo GONÇALVES (2012, p.250), é a posse de quinze anos, podendo ser reduzida para dez, caso verifique que o possuidor estabeleceu moradia e explora economicamente a propriedade, tirando dela seu sustento.

Ocorre a usucapião ordinária quando exercida em dez anos de forma, mansa, pacífica, e de boa-fé.

Já a aquisição por acessão ocorre quando uma coisa adere ou se une à propriedade, tornando-se parte desta.

Segundo GONÇALVES (2012, p. 300) são necessários dois requisitos: a) a junção de duas coisas, que antes eram individuais; e b) o caráter acessório de uma das coisas em relação a outra.

A aquisição por registro do título da propriedade imóvel não ocorre somente com o término do contrato, mas é necessário ocorrer o lançamento do novo proprietário no título translativo no Registro de Imóveis.

O art. 1.245, § 1º do Código Civil diz que permanecerá o alienante como dono do imóvel, caso não ocorra o registro translativo.

Essa é uma modalidade em que há a presença do Estado representado pelo Cartório de Registro de Imóveis. Se o contrato é perfeito, somente neste momento da transferência em documento é possível observá-lo.

 

2 DESAPROPRIAÇÃO DE IMÓVEIS RURAIS

2.1 CONCEITO E LINHAS GERAIS

A desapropriação é um instituto jurídico que provoca entre os doutrinadores diversos entendimentos quanto a sua conceituação.

No entanto, prevalece incomum diante das variações das conceituações, que a desapropriação é a transferência do bem de um particular para o Poder Público ou com a intervenção deste para outros particulares com o objetivo de alcançar necessidade social ou a função social, em que previamente indeniza-se o expropriado conforme o que se considera justo.

“A desapropriação é um ato de direito público mediante o qual a administração, com base na necessidade pública, na utilidade pública ou no interesse social, desvincula um bem de seu legítimo proprietário para transferir sua propriedade a um ente estatal ou a particulares, com prévia e justa indenização” (FERREIRA, 1998, p 185).

“Desapropriação é o ato, em virtude do qual o Poder Público mediante prévia indenização e no interesse da coletividade, retira do patrimônio particular de alguma pessoa natural, ou jurídica certo bem para ser aplicado em obra reconhecida como útil ou necessária a coletividade” (BEVILAQUA, 2003, p 219).

“Em verdade, analisando-se os conceitos básicos dados ao instituto da desapropriação, extraiu-se a inarredável conclusão de que ela não passa de uma transferência forçada da propriedade do particular para o Poder Público, tendo por recompensa o direito à indenização, para atender a interesse de uma comunidade, que se sobrepõe ao interesse individual” (MARQUES, 2015, p 140).

A desapropriação é uma forma de expressar a concordância do Estado com o direito de propriedade, pois esse instituto desde o seu surgimento somente se realiza quando seu escopo de alcançar as grandes extensões de terras improdutivas ou indubitável necessidade pública.

O respeito ao direito de propriedade é a regra do ordenamento jurídico brasileiro, e a desapropriação a exceção. Visto que, o Poder Público intervém para melhor dividir a terra, de modo que provoque a produtividade da mesma para que reflita de modo positivo na economia do país, além da busca pela plenitude do bem-estar do homem na ocupação da propriedade.

“Este instituto vislumbra a garantia do significado econômico do imóvel, não sendo o foco principal manter integra a coisa em si” (PAULO TORMINN BORGES, 1998).

A desapropriação no Brasil tem influência do direito de Portugal e tal instituto é o pressuposto para a realização da Reforma Agrária, e aquela está intrínseca a esta.

“Em 1821 o príncipe regente D. Pedro normatizou defendendo que não se poderia tirar alguma coisa de alguém sem antecipada indenização. Na sequência a Constituição Imperial de 1824 traz em seu art. 179, nº 22 que “… Se o bem público, legalmente verificado, exigir o uso e emprego da propriedade do cidadão, será ele previamente indenizado pelo valor dela. […]”. (MARQUES, 2015).

Existentes outras Constituições, a de 1934 foi a que provocou significativa mudança ao tratar da função social da propriedade como fato existente limitador do direito de propriedade, além de albergar que a indenização deveria ser prévia conforme preceitos constitucionais anteriores, e inovou ao acrescentar na Magna Carta a indenização justa.

A desapropriação por necessidade ou utilidade pública surgiu em 1826 descrita em lei como requisito de transferência do imóvel improdutivo do expropriado para o Estado, mas a existência da função social como forma de expropriação caso não respeitada surgiu com a inovadora Constituição de 1946, que trouxe ainda a divisão igualitária das terras para todos, o exercício da propriedade inerente ao bem comum, e a indenização prévia, justa e em dinheiro.

O fato da Constituição de 1946 revolucionar quando trouxe em seu bojo a função social evidenciou inteligência impar do constituinte, visto que, foi a partir de sua existência e seus fins que surgiu a desapropriação com o escopo de Reforma Agrária, além de ser a motivadora da defesa dos interesses coletivo e econômico do país.

“Realmente, uma reflexão sobre essa nova modalidade de desapropriação conduzirá o observador à compreensão induvidosa de que ela difere, em essência, forma e objetivos, das demais espécies até então conhecidas, porque satisfaz aos pressupostos da ordem econômica e social de que aquela Carta foi apanágio.

E, para o objeto desse estudo, essa modalidade de desapropriação ganha contornos de extraordinária relevância, posto que foram os seus princípios que nortearam as regras, ainda vigentes, da expropriação para fins de reforma agrária” (MARQUES, 2015, p 138).

Dentre as diversas mudanças constitucionais e legais, a Constituição de 1988, em seu art. 184 “caput” consagrou a desapropriação de imóveis que não cumpram a função social através de prévia e justa indenização em títulos da dívida agrária.

A desapropriação não tem o enfoque de prejudicar o expropriado, por isso, o constituinte viu a necessidade em acrescer a indenização justa, o que prevalece até os dias atuais, dentre outros o intuito é beneficiar a coletividade e instigar a economia agrícola, conforme observa o art. 18 do Estatuto da Terra de 1964: “Art. 18. À desapropriação por interesse social tem por fim:

  1. a) condicionar o uso da terra à sua função social; b) promover a justa e adequada distribuição da propriedade; c) obrigar a exploração racional da terra; d) permitir a recuperação social e econômica de regiões; e) estimular pesquisas pioneiras, experimentação, demonstração e assistência técnica; f) efetuar obras de renovação, melhoria e valorização dos recursos naturais; g) incrementar a eletrificação e a industrialização no meio rural; h) facultar a criação de áreas de proteção à fauna, à flora ou a outros recursos naturais, a fim de preservá-los de atividades predatórias”.

A indenização será paga através de títulos da dívida agrária que poderão ser resgatados em até vinte anos segundo a Constituição, tal prazo conta-se dois anos após a emissão dos títulos, pois se trata de imóvel improdutivo, ou seja, que não estava sendo ocupado, logo se entende que o tempo para receber os títulos não deve ser imediato.

No entanto, o constituinte buscou um equilíbrio nos preceitos constitucionais, pois se para pagamento da indenização de imóvel improdutivo estabeleceu-se até vinte anos para os títulos serem resgatados, serão indenizadas em dinheiro as benfeitorias úteis e necessárias, conforme o § 1º do art. 184 a Magna Carta.

A desapropriação é um ato privativo da União conforme estabelece o art. 184 da Constituição Federal, por isso, se entende que por ser o exercício da função social o pressuposto para se expropriar um imóvel de alguém se entende que essa ação do Poder Público é algo compulsório, pois independe da anuência do expropriado, basta que a função social não seja cumprida, prevalecendo o bem estar comum sobre o bem estar particular.

“Em verdade, analisando-se os conceitos dados ao instituto da desapropriação, excluiu-se a inarredável conclusão de que ela não passa de uma transferência forçada da propriedade, do particular para o Poder Público, tendo por recompensa o direito à indenização, para atender o interesse de uma comunidade, que se sobrepõe ao interesse individual.

Qualquer que seja seu conceito, há que sempre estabelecer caráter forçado de impositivo do ato, gerando uma situação de debilidade de quem perde a coisa ou o direito, em face daquele que os adquire, que é o Poder Público, em nome de interesses maiores sobre os interesses individuais […]” (MARQUES, 2015, p 140).

A competência de desapropriar imóveis que não cumprem a função social é privativa da União, portanto, os Estados, Municípios e o Distrito Federal não tem essa autonomia.

“[…] Há a competência privativa da União para desapropriar por interesse social e com o fim de reforma agrária. Assim sendo, os Estados e os Municípios não podem usufruir de tal atribuição para os seus intentos reformistas agrários, nem mesmo por interesse social e mediante pagamento prévio e justo da indenização em dinheiro” (FERREIRA, 1998, p 192).

O Estatuto da Terra acrescenta na competência da União para desapropriação de imóveis rurais para fins de reforma agrária os do Distrito Federal em seu art. 22, parágrafo único: “A União poderá desapropriar, por interesse social, bens do domínio dos Estados, Municípios, Distrito Federal e Territórios, precedido o ato, em qualquer caso, de autorização legislativa.”

As propriedades que não serão desapropriadas para o fim de reforma agrária são as descritas no art. 185 da Magna Carta de 1988, sendo a pequena e média propriedade devendo ser bem imóvel único de seu proprietário, e a propriedade que produz, cumprindo os critérios da função social.

 

2.2 REQUISITOS

Atualmente firmados os requisitos necessários para a desapropriação de imóveis rurais é possível observá-los no art. 5º, inciso XXIV da Constituição Federal, quais sejam, a expropriação por necessidade ou utilidade pública, ou por interesse social.

2.2.1 Necessidade ou Utilidade Pública

Esses dois institutos nos dias atuais não são conceituados ou aplicados separadamente, pois com o advento da lei nº 3.365 de 1941 que tem o enfoque de normatizar a desapropriação por utilidade pública, ocorreu a unificação, visto que ambos estão intrinsecamente concatenados.

É clarividente a intenção do legislador em não fazer separação na aplicação dos requisitos da necessidade ou utilidade pública, pois o “caput” do art. 5º diz “Consideram-se casos de utilidade pública: […]”, e na sequência encontra-se as alíneas sem qualquer separação, o que evidência a intenção de não albergar diferença entre necessidade ou utilidade pública.

Segundo MARQUES (2015, p 138) o Decreto lei nº 3.365 de 1941 ampliou a legislação civil no que se refere aos casos de desapropriação por necessidade púbica, pois foram abrangidos pelas hipóteses de expropriação por utilidade pública.

Conforme a unicidade de que trata a lei de utilidade pública, esta ocorrerá com a sua declaração por decreto do Presidente da República, Governador, Interventor ou Prefeito, pois esta desapropriação poderá ser feita pela União, Estados, Distrito Federal e Territórios, que na sequência terá a liberdade de realizar um ou mais casos de utilidade pública descritos no rol do art. 5º lei nº 3.365 de 1941.

Conforme o § 6º do art. 5º, caso verifique que a expropriação foi inviável ou houve a perda do interesse público para manter a destinação do bem prevista no decreto, por ordem de preferência, o expropriante deverá, destinar a área não utilizada, para outro fim público, ou alienar o imóvel para qualquer pessoa que tenha interesse, conforme previsão em lei, observada a ordem de preferência da pessoa física ou jurídica expropriada.

2.2.2 A Desapropriação por Interesse Social

A importância do interesse social surgiu com a Constituição de 1934 que no item 17 do art. 113 assegurou o direito de propriedade, mas evidenciou que o interesse social prevalecia quanto aquele, sendo este considerado pelo constituinte como fato limitador do direito de propriedade.

Nesse contexto, se faziam presentes a necessidade e utilidade pública, sendo ambas situações diversas, mas até então as únicas capazes de provocar a desapropriação de imóveis rurais para o cumprimento dos seus fins.

No entanto, somente na Constituição de 1946 é que o interesse social foi considerado motivo para a desapropriação de imóveis rurais. Essa causa de desapropriação não se compara às outras que existiam, pois, o interesse social trouxe em seu bojo os escopos econômicos e sociais.

Segundo MARQUES (2015, p 138) esse motivo de desapropriação tem importância impar, pois os princípios do interesse social foram os direcionadores dos preceitos que promoveram a desapropriação para fins de Reforma Agrária.

“Cumpre registrar que a aplaudida novidade constitucional custou a ser regulamentada. Quase 16 anos se passaram, até que, a 10 de setembro de 1962, foi editada a Lei nº 4.132, definindo os casos em que a desapropriação por interesse social se aplicava. Mas, apesar de definir os casos, estes não se mostraram suficientes para atender os reclamos reformistas que já dominavam o país, desde o início da década de 1960, notadamente a Reforma Agrária, uma das principais bandeiras das lutas” (MARQUES, p 138).

No entanto, a busca pela consolidação da Reforma Agrária no ordenamento jurídico brasileiro não se limitou aos empecilhos, persistindo avante, e então, em 1964 o Movimento Militar auxiliou no progresso desse instituto.

A luta pela expropriação de terras era questão latente, e a cada ano se afunilava mais a necessidade do Estado enxergar e cooperar de forma técnica para tutelar a Reformar Agrária, bem como as pessoas envolvidas nessas lutas e instituir preceitos jurídicos definitivamente norteadores para o fim almejado desse instituto.

Motivada pelo Movimento Militar, surge em 1964 a Emenda Constitucional nº 10, que acrescentou na Constituição vigente a nova causa de desapropriação, a modalidade considerada mais relevante, qual seja, o interesse social para fins de Reforma Agrária.

E tal inovação mostrou-se firme diante da passagem dos tempos, tanto que alcançou a Constituição de 1988, especificamente no Título VII Da Ordem Econômica e Financeira, Capítulo III Da Política Agrícola e Fundiária e da Reforma Agrária, que no art. 184 diz, “Compete à União desapropriar por interesse social, para fins de reforma agrária, o imóvel rural que não esteja cumprindo sua função social, mediante prévia e justa indenização em títulos da dívida agrária, […].”

A busca pela desapropriação de imóveis rurais para fins de Reforma Agrária motivado por interesse social tem a intenção de solucionar os problemas sociais existentes, que por sua vez, estão presentes nas classes desprovidas de recursos econômicos que representam a maior parte da sociedade.

Expropriar quando não está presente o cumprimento da função social na propriedade é uma das maneiras que o Estado tem para dirimir a desigualdade social com a melhor distribuição e aproveitamento das terras, o que promove a economia e permite melhores condições de vida para aqueles que, através da luta pela Reforma Agrária buscam desfazer latifúndios e explorar terras.

“Diante disso, podemos afirmar que a nossa Carta Magna atual assegura, entre os direitos fundamentais, a propriedade como um direito subjetivo, que não poderá, no entanto, ser exercido de forma absoluta, violentando o interesse da sociedade, porque deverá ser compatibilizado à sua função social, conforme prevê o inc. XXIII, art. 5º da Carta Magna atual, e, nos princípios de ordem econômica, trata especificamente da propriedade dos bens de produção, a qual, pela finalidade social que lhe é inerente, além de se submeter ao princípio da função social assegurado como direito fundamental, deverá ser submetida ao princípio econômico que propõe assegurar a todos assistência digna conforme os ditames da justiça social. […]

Concluindo, a propriedade é um direito, mas não pode mais ser considerada como puro direito de usar, gozar e dispor egoisticamente, mas deve ser exercida de modo a satisfazer a sua destinação socioeconômica, sendo, sim, um direito que deve atender a sua função social. Logo, não merece proteção aquela propriedade que não cumpre a sua função social, ou seja, de acordo com a Carta Magna em vigor não há garantia constitucional à propriedade que descumpre sua função social” (Strozake, p 114).

A função social da propriedade, a redução das desigualdades regionais e sociais, e a busca pelo pleno emprego, são três dos demais princípios que regem a ordem econômica do Brasil, conforme art. 170 da Magna Carta de 1988.

Tais princípios impulsionam a desapropriação por interesse social, que busca proteger e beneficiar de forma igualitária a massa, visto que a ordem econômica, conforme o “caput” do citado art. 170 tem por fundamento reconhecer o trabalho humano, e o escopo de assegurar a dignidade de todos de acordo com a justiça social.

Esta justiça social se cumpre quando a tutela do Estado visa alcançar os economicamente vulneráveis, aplicando os princípios necessários para o tratamento compatível com o grau de desvalorização que essa parte da sociedade sofre, sem prejudicar aquele que se encontra do lado oposto.

A concentração de grandes quantidades de terras nas mãos daqueles que não realizam o aproveitamento racional e adequado, torna-se inviável, pois se contrapõe aos requisitos da função social descrita no art. 186 da Constituição Federal.

Assim a propriedade deve ser voltada a atingir os interesses coletivos, pois estes se sobressaem quanto ao interesse individual, visto que, a propriedade está de forma intrínseca ligada ao bem comum, sendo de suma importância para o desenvolvimento da sociedade, e amarrotada à função social.

 

2.3 PROCEDIMENTOS PARA DESAPROPRIAÇÃO DE IMÓVEIS RURAIS

A desapropriação de imóvel rural para fins de reforma agrária é um dos outros motivos expropriatórios como sanção por ausência da não realização da função social da propriedade.

Conforme MARIA SYVIA ZANELA DI PIETRO (p 165, 2011) o procedimento de desapropriação é dividido em duas fases, a declaratória e a executória, nesta inclui-se a fase administrativa e a judicial.

A fase declaratória é assim denominada, pois refere-se a declaração do Poder Público do interesse social como motivo de desapropriação.

Após isso, a União por intermédio do órgão competente terá a autorização para adentrar no imóvel para os devidos levantamentos da área, com o enfoque de realizar a vistoria e avaliação do imóvel, e se necessário através de força policial, conforme menciona o § 2º do art. 2º da Lei Complementar nº 76 de 6 de julho de 1993 que estabelece o procedimento para a desapropriação para fins de reforma agrária.

Na fase executória administrativa, ocorrerá apenas quando existir possibilidade de acordo entre as partes quanto a indenização devida.

Caso não aconteça o acordo referente a indenização, imediatamente o Poder Público segue o pleito de desapropriação no âmbito judicial. Nesta fase, o mérito do processo será a discussão no que tange ao preço do imóvel ou vício no processo.

Se no inicio do processo as partes concordarem com o preço, é necessário que primeiro ocorra o pagamento ou a consignação, para que a decisão judicial que terá fins homologatórios tenha valor como título para transcrição no Registro de imóveis, o mesmo procedimento de indenização para caracterizar a desapropriação quanto a sentença judicial no fim do processo, conforme art. 29 do Decreto-lei nº 3.365/41.

A sentença que delimitar o valor da indenização só será titulo para transcrição no Registro de Imóveis após o pagamento da indenização, pois firma-se o preceito constitucional descrito no art. 184 da Magna Carta no que se refere à indenização prévia e justa.

O proprietário pode contestar a ação de desapropriação em caso de desapropriação parcial do imóvel, pode o mesmo requerer a expropriação de todo o bem se o proprietário verificar que a parte que lhe tocar com a desapropriação parcial for imprópria se utilizada separadamente.

Nos imóveis que sofreram ação de desapropriação não cabe por força de lei ação reivindicatória, conforme art. 21 da lei complementar nº 76 de 1993.

 

2.4 DA POLÍTICA AGRÍCOLA

A política agrícola é o método que visa direcionar o trabalho na terra a fim de promover a economia, fazer existir o vínculo entre o explorador da terra com o desenvolvimento industrial e zela pelo pleno emprego, ou seja, cuida do bem-estar social.

O § 2º do art. 1º do Estatuto da Terra 4.504 de 1964 conceitua a política agrícola: “§ 2º Entende-se por Política Agrícola o conjunto de providências de amparo à propriedade da terra, que se destinem a orientar, no interesse da economia rural, as atividades agropecuárias, seja no sentido de garantir-lhes o pleno emprego, seja no de harmonizá-las com o processo de industrialização do país”.

Logo, vislumbra-se que o Estado ao promover o acesso à terra, através do fracionamento me pequenas de latifúndios por intermédio da desapropriação para fins de reforma agrária, tem com isso, a responsabilidade de auxiliar o parceleiro na exploração do imóvel, pois a ocupação de imóveis rurais ocorre pela massa da sociedade, pelos menos favorecidos de condições econômicas.

A política agrícola é o incentivo para que ocorra o cultivo da terra, e por consequência o desenvolvimento econômico, e a melhor utilização da terra desapropriada.

 

2.5 MEIOS DE DEFESA DA PROPRIEDADE

Os meios de defesa da propriedade tratam-se de ações judiciais com esse intuito, pois tais meios regulamentados judicialmente visam impedir a proteção da propriedade pela utilização arbitrária das “próprias razões”.

A ação negatória tem o intuito de que o proprietário proteja seu imóvel sempre que verificar a ocorrência de qualquer ato atentatório à sua liberdade de uso, gozo ou fruição.

Distingue-se da ação reivindicatória, pois esta visa a restituição da posse até então perdida pela ocupação do imóvel por outrem.

Com o objetivo de prevenir possível e visível dano a sua propriedade pela presença de outro imóvel, o proprietário pode intentar a ação de dano infecto, conforme dispõe o art. 1.280 do Código Civil.

 

2.6 DA PERDA DA PROPRIEDADE

Inicialmente, cabe esclarecer que no caso de propriedade imóvel a perda da propriedade ocorre efetivamente após o registro do título transmissivo no Registro de Imóveis, conforme o art. 1.275, parágrafo único do Código Civil.

Há como perda da propriedade da alienação em que através de negócio jurídico o proprietário transfere a propriedade do imóvel para outrem, seja através de contrato oneroso, por exemplo, compra e venda, ou gratuito como é o caso da doação.

A perda da propriedade por renúncia é ato unilateral do proprietário da coisa que deve fazê-lo através de escritura pública caso o imóvel tenha valor superior a trinta vezes o valor do salário mínimo vigente no país, conforme o art. 108 do Código Civil.

O abandono é outra forma de perda da propriedade e se caracteriza quando o proprietário demonstra o desinteresse de não ter mais a coisa para si. Torna-se durante três anos após a última arrecadação como coisa de ninguém, e caso não ocorra ocupação por terceiro interessado o bem acrescerá ao patrimônio do Município ou Distrito Federal, conforme dispositivo do art. 1.276 do Código Civil.

A perda por perecimento ocorre quando, devido a caso fortuito ou força maior não há como delimitar a propriedade de alguém.

Outro modo de perda de propriedade é a desapropriação, que se caracteriza quando é provocada por interesse ou utilidade pública e função social.

Neste caso há a intervenção do Poder Público com o intuito de provocar o exercício destes motivos quando verificada a necessidade pública ou não cumprimento da função social.

 

3 A REFORFMA AGRÁRIA

3.1 LINHAS GERAIS

A maneira de distribuição das terras no Brasil advém do sistema das sesmarias no período colonial, e também como resquícios do feudalismo, pois ambos os momentos ocasionaram o latifúndio, e a discrepância social se estabeleceu, onde poucos possuíam enormes extensões de terras e os camponeses, a grande maioria, pouco ou nada usufruíam da exploração rural.

Surge nesse contexto a Reforma Agrária. A etimologia reforma vem das palavras re e formare que significa mudar a estrutura anterior, refazer, corrigir, melhorar, transformar.

O escopo é o reajustamento das normas jurídicas e sociais, econômicas e financeiras que regulam o sistema agrário do Brasil, com a intenção de imputar o valor devido ao trabalhador do campo, oportunizando-lhe a possibilidade de agregar na produção do país.

Além de realizar a distribuição, utilização e exploração de forma racional em prol ao social da propriedade rural, e indubitavelmente possibilitar o incremento das condições de vida da população agrícola.

O Estatuto da Terra de 1964 em seu artigo 1º, § 1º conceitua Reforma Agrária: “Considera-se Reforma Agrária o conjunto de medidas que visem a promover melhor distribuição da terra, mediante modificações no regime de sua posse e uso, a fim de atender aos princípios de justiça social e ao aumento de produtividade”.

Esse conceito remete não só a melhor distribuição da terra, mas também a preservação dos princípios da justiça social e do aumento da produtividade, com o intuito de democratizar o acesso à terra.

A luta pela reforma agrária significa a busca pela libertação nacional, e reprime a separação entre os privilegiados, donos de enormes extensões improdutivas de terras, e os campesinos, humildes, esquecidos pelo Estado.

“A reforma agrária não significa evidentemente a fragmentação ou pulverização dos imóveis rurais para a distribuição à massa campesina. Sua finalidade é mais ampla e eficaz, para efeito de aumentar a produtividade mediante o aproveitamento racional do solo, permitir a recuperação econômica e sociocultural da região, cuidar para que se cumpra a função social da terra, bem como proporcionar meios ao engrandecimento do homem, para que alcance o status de uma verdadeira cidadania. É essa a razão pela qual a política de reforma agrária subtrai um núcleo intangível de imóvel rural, escapando a pretensões reformistas” (FERREIRA, p. 209).

Com o advento da reforma agrária, tornou-se evidente o combate ao latifúndio, e denota-se que a função social da terra é valorizar a produção agrícola, e assim alimentar a nação humana, além de buscar o elevado reconhecimento da exploração da terra como parte de fundamental importância para a economia do país.

Vislumbra-se com a reforma agrária um meio eficaz para desburocratizar o acesso a terra, e minimizar as desigualdades sócio-econômicas, pois a melhor distribuição da terra, realizando a justiça social, pois ao possibilitar que pessoas explorem terras, até então inúteis quando na posse de “grandes” fazendeiros, permite às suas famílias melhores condições de vida, pois oportuniza a exploração para o fim econômico.

A possibilidade de dar ao homem o meio de exploração para conquistar seu próprio sustento, e não mais apenas fornecer métodos que o impede de se desenvolver no país capitalista em que estamos, é a forma que deve ser incentivada pelo Estado, pois este não está para sustentar as pessoas, mas possibilitar a elas o meio de contribuir para o desenvolvimento próprio, e consequentemente, da nação onde vive.

 

CONCLUSÃO

O desenvolvimento de um país depende, principalmente das formas de incentivo do Estado, que deve preservar o bem comum em detrimento de vontades individuais e de pequenos grupos.

A desapropriação de imóveis rurais para fins de cumprimento da função social com o escopo de promover a reforma agrária possibilita o desenvolvimento social, e a diminuição da pobreza, pois coloca do homem na condição de explorar a terra, e mitiga a concentração de latifúndios sob a propriedade de poucos.

Os incentivos a políticas públicas que dispõe as pessoas os seus sustentos prontos, não é o objetivo da reforma agrária, que visa colocar o camponês na situação de explorador, parte do desenvolvimento econômico da nação.

Distribuir terras improdutivas de forma a erradicar os latifúndios e oportunizar melhor qualidade de vida para aquele que deseja explorá-la, demonstra uma política social eficiente, pois a grande massa, atualmente vive na linha da pobreza, da miséria, e são “tratados” pelo governo.

O Estado não pode ser negligente quanto aos cuidados com a sociedade, mas, por outro lado, cada indivíduo deve contribuir para a melhoria do lugar onde vive, e cabe ao Estado incentivar o desenvolvimento de cada pessoa é capaz de realizar no meio social.

A desapropriação de imóveis rurais para o cumprimento da função social é a plena característica de iniciativa governamental, que permitirá a cada um que explorar a terra, através disso, a continuidade de seu sustento e de sua família, e de modo abrangente, a melhoria na qualidade de vida, contribuirá para melhorar os índices de educação, saúde, desenvolvimento sociocultural, dentre outros.

O contato do homem com a terra, de modo geral, é a oportunidade de vislumbrar com eficiência a transformação do meio social. Isso é perceptível na qualidade de vida dos agricultores familiares, que exploram pequenas terras, mas estão inseridos como parte do crescimento da nação, desde sua presença no mercado de venda e consumo.

 

REFERÊNCIAS

BEVILÁQUA, Clóvis, 1859-1944. Direito das coisas. Prefácio de Francisco Cesar Asfor Rocha. Brasília: Senado Federal: Conselho Editorial, 2003.

BORGES, Paulo Torminn. Institutos básicos do direito agrário. 11. ed. rev. São Paulo: Saraiva, 1998.

DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. 24. ed. São Paulo: 2011.

FERREIRA, Pinto. Curso de direito agrário. 3. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 1998.

GISCHIKOW, Emílio Alberto Maya. Princípios do direito agrário. São Paulo: Saraiva, 1988.

GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: direito das coisas. vol. 5. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2012.

MARQUES, Benedito Ferreira. Direito agrário brasileiro. 11. ed. rev. e ampl. São Paulo: Atlas, 2015.

MARQUES, Nilson. Curso de direito agrário. Rio de Janeiro: Forense, 1986.

STROZAKE, Juvelino José (Org.). A Questão agrária e a justiça. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000.

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