Resumo: Nos termos da Constituição Federal do Brasil, toda atividade potencialmente poluidora deverá ser precedida de Licenciamento Ambiental. Esta concessão é de competência da Administração Pública. O presente artigo pretende aferir a responsabilidade da Administração por esta concessão de licenciamento ambiental ao empreendedor poluidor.
Palavras- chave: responsabilidade, administração pública, poluição, licenciamento ambiental.
Introdução.
No Brasil existem vários processos de Avaliação de Impacto Ambiental. Inserido nestes, há o Licenciamento Ambiental que deverá ser requerido junto a um Órgão Ambiental licenciador.
O IBAMA- Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis, é a entidade condutora do processo de licenciamento ambiental de atividades que envolvam a participação de mais de um Estado, ou que por lei, sejam de competência federal. Contudo, é possível a delegação desta competência para órgãos municipais ou estaduais nos termos da resolução 237/97 do CONAMA, Conselho Nacional do Meio Ambiente, através de lei ou convênio.
Nos termos da Lei federal 6.803/80 e das resoluções do CONAMA 001/86, 011/85, 009/90 e 010/90 e 237/97, compete ao IBAMA licenciar as atividades consideradas modificadoras do meio ambiente.
No caso do empreendedor desempenhar uma atividade potencialmente poluidora ainda não cadastrada junto aos órgãos licenciadores, o mesmo deverá preencher obrigatoriamente a Ficha de Cadastro Técnico Federal do IBAMA.
A já citada resolução 237/97 do CONAMA estabelece as etapas do licenciamento ambiental composto dos seguintes procedimentos:
Inicialmente, o órgão ambiental competente define quais são os documentos, projetos e estudos ambientais necessários ao processo de licenciamento. Posteriormente, o órgão licenciador irá analisar os documentos apresentados e se necessário encaminhará as vistorias técnicas. Após esta análise, ocorrerá a emissão de um parecer técnico conclusivo. Por fim, o órgão competente deferirá ou não o pedido de licença ambiental, dando-se a devida publicidade.
Desenvolvimento.
Muitas vezes, o poluidor se escora em uma licença ambiental concedida pela Administração Pública para sua atividade, como se a mesma fosse um álibi para poder poluir. Em outros casos, a Administração é condenada solidariamente ao poluidor somente pelo fato de ter concedido a licença ambiental ao poluidor.
O conceito de poluidor pode ser encontrado na legislação federal brasileira. Segundo o artigo 3º da lei 6.938/81, poluidor é a pessoa física ou jurídica de direito público ou privado, que direta ou indiretamente, desenvolve atividade causadora de degradação ambiental.
Nos dizeres de Sirvinskas:
“Toda pessoa física ou jurídica é responsável pelos danos causados ao meio ambiente. Não é diferente em relação à pessoa jurídica de direito publico interno. Esta, com maior razão, deve ser responsabilizada pelos danos causados ao ambiente por omissão na fiscalização ou pela concessão irregular de licenciamento ambiental. Tal fato, no entanto, não exime a responsabilidade do verdadeiro causador dos danos.” (SIRVINKAS, 2002, P 97)
O Licenciamento ambiental é um fundamental mecanismo de administração dos recursos ambientais, sendo considerado como uma das bases da política ambiental. O Conselho Nacional do Meio Ambiente, CONAMA, define o que é licenciamento ambiental na resolução 237/97, in verbis:
“Licenciamento ambiental é o procedimento administrativo pelo qual o órgão ambiental competente licencia a localização, instalação, ampliação e a operação de empreendimentos e atividades utilizadoras de recursos ambientais ambientais, consideradas efetiva ou potencialmente poluidoras ou daquelas que, sob qualquer forma, possam causar degradação ambiental, considerando as disposições legais e regulamentares e as normas técnicas aplicáveis ao caso.”
A Constituição Federal do Brasil determinou de forma objetiva que deveria haver no Brasil o Licenciamento Ambiental. Nos dizeres da carta maior, para qualquer atividade capaz de causar significativa degradação do meio ambiente, deve ser exigido estudo prévio de impacto ambiental.
Nesta mesma toada, a lei federal 6.938 de 1981, recepcionada pela Constituição determina que “Além dos estudos normalmente exigíveis para o estabelecimento de zoneamento urbano, a aprovação das zonas a que se refere o parágrafo anterior será precedida de estudos especiais de alternativas e avaliações de impactos, que permitam a confiabilidade da solução a ser adotada.”
É certo que o órgão público competente para concessão da licença é responsável pela definição dos prazos de validade do instrumento e das condicionantes especificas de cada caso verificando-se sempre as especificidades da atividade licenciada.
Sob a ótica operacional, administração pública é o desempenho constante e sistemático, legal e técnico dos serviços típicos do Estado, em prol da coletividade.
A administração pública, segundo Celso Antonio Bandeira de Mello (MELLO, 2005), pode ser conceituada objetivamente como a atividade concreta e imediata que o Estado exerce para assegurar os interesses coletivos e subjetivamente como o conjunto de órgãos e de pessoas jurídicas aos quais a Lei atribui o exercício da função administrativa do Estado.
Pois bem, no caso de uma atividade que foi devidamente licenciada vir a causar um dano ambiental, a Administração deveria ser responsabilizada solidariamente?
Na lição de CELSO ANTONIO BANDEIRA DE MELLO:
“Constituiria verdadeiro absurdo imputar ao estado responsabilidade por um dano que não causou, pois isto equivaleria a extraí-la do nada; significaria pretender instaurá-la prescindindo de qualquer fundamento racional ou jurídico. Cumpre que haja algo mais, a culpa por negligência, imprudência ou imperícia no serviço, ensejadoras do dano ou então o dolo, intenção de omitir-se, quando era obrigatório para o estado atuar e fazê-lo segundo um certo padrão de eficiência capaz de obstar o evento lesivo. Em uma palavra: é necessário que o Estado haja incorrido em ilicitude, por não ter acorrido para impedir o dano ou por haver sido insuficiente nesse mister, em razão de comportamento inferior ao padrão legal exigível.” (Mello, 2005, p. 145)
Neste caso, deveria ser aplicada a teoria subjetiva, onde se buscaria a culpa. E mais, o simples fato da ocorrência do dano, não significa que houve omissão do estado. Exemplo citado na doutrina é a atividade industrial que, regularmente licenciada e fiscalizada, tem vazamento causado por danos nos equipamentos, lançando efluentes em cursos d’água próximos. A responsabilidade do particular existirá sem que haja responsabilidade da administração. Para que a Administração seja responsabilizada deve-se buscar os elementos identificadores da culpa na conduta da Administração.
Não é o caso da culpa presumida, pois, ainda que esta possa ser acatada no questionamento de responsabilidade civil do estado em caso de omissão, não pode ser confundida com a responsabilidade objetiva traduzida na Constituição Federal, artigo 37, parágrafo 6º. Ainda que se admita por uma construção pretoriana, em determinados casos deve sobrepor a culpa presumida em favor de umas das partes. Esta construção determina apenas uma presunção relativa, o que vale dizer que admite prova em contrário. Quando se trata de responsabilidade objetiva, não se busca a existência ou não da culpa; esta apresenta uma presunção absoluta de existência. Isto significa que de fronte a tal presunção absoluta, a discussão jurídica se vincula a existência ou não do nexo de causalidade. Por suposto, tratando-se de responsabilidade por omissão, não seria pertinente a admissão da teoria objetiva da responsabilidade; o máximo que se permite é a presunção relativa da culpa da administração, o que leva o debate sempre para o âmbito da culpa. Em muitos casos, é permitida a admissão da culpa presumida, onde, após análise de princípios jurídicos, se localiza a fragilidade de uma das partes diante da outra. Isto se justifica em respeito a igualdade substancial das partes e de um processo mais eficaz. Neste sentido, diz Celso Antônio Bandeira de Mello: “Tal presunção, entretanto, não elide o caráter subjetivo desta responsabilidade, pois, se o Poder Público demonstrar que se comportou com diligência, perícia e prudência – antítese da culpa-, estará isento da obrigação de indenizar, o que jamais ocorreria se fosse objetiva a responsabilidade.”(MELLO, 2005, p 887)
Conclusão.
É certo que o Estado Brasileiro se obrigou constitucionalmente a prestar diversos serviços de interesse coletivo. Dentre estas atividades e obrigações estatais, encontra-se a proteção ao meio ambiente, que, conforme já dito, é bem comum de todos. Quando o Estado, através de sua Administração e seus órgãos fiscalizadores falha na sua obrigação de conter as práticas poluidoras, toda a sociedade é prejudicada.
Para que haja segurança jurídica, isto é, certeza de que não haverá no nosso ordenamento jurídico lesão ou ameaça de direito sem a devida reparação, nenhum ente, pessoa física ou jurídica, pública ou privada deverá ficar isento de ser responsabilizado pelo dano ambiental.
Neste sentido é que se perquire a responsabilidade civil extracontratual da Administração Pública pelo dano ambiental coletivo. A medida correta da responsabilidade do Estado é de difícil apuração. Contudo, estes percalços não podem obstacularizar a busca contínua de conter as atividades poluidoras.
A idéia cada vez mais determinante de que o bem jurídico protegido, ou seja, o meio ambiente, já sobrepõe em muito o âmbito do interesse individual, atingiu a categoria de interesse coletivo e, portanto, já alcança o status de interesse da humanidade. Este é o percurso menor para a equalização da adoção da teoria do risco administrativo para se apurar a responsabilidade da Administração Pública por dano ambiental derivado ao ato material seu, quando causador da degradação seja por ato administrativo que foi realizado de forma irregular no momento em que concede licença sem respeitar os requisitos da lei e ocorre o dano ambiental; seja no caso de omissão na obrigação de fiscalizar as atividades potencialmente poluidoras, concorrendo para o dano ambiental.
Uma vez comprovada a degradação, é justo que os poluidores sejam compelidos a indenizar os danos causados ao patrimônio público e social.
Verificando-se que o Estado tolerou as atividades poluidoras irregulares, há, na hipótese, cuidados e atos administrativos relativos ao Poder de Polícia que, se observados pela Administração Pública, em atuação diligente e a tempo e modo, poderiam ter evitado a lesão. Demonstrada a culpa do serviço público, consistente na omissão quanto ao seu dever de fiscalização, aplica-se a teoria da responsabilidade subjetiva do Estado, responsabilizando-se pelo evento danoso.
Advogado; Mestre em Gestão Ambiental; Professor Universitário; Consultor em Licitação
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