Resumo: O presente trabalho acadêmico visa analisar o elemento subordinação como caracterizador da relação de emprego no cenário atual, ratificando a crise conceitual pela qual vem passando, tendo em vista o implemento da tecnologia nos meios de produção, o que acabou por alterar o panorama social e econômico vigentes. Frisa-se que tal obra não terá o intuito de esgotar toda a matéria, tendo em vista a ausência de sedimentação acerca do tema abordado. Inclusive, não havendo posicionamento dominante. O que revela a importância do estudo feito, tendo em vista a necessidade de debate acerca da matéria. Para tanto será empregado o método dedutivo, a fim de comprovar que a dinamicidade do cenário social influencia diretamente o Direito do Trabalho, e, com isso, há extrema necessidade de um repensar no conceito clássico de Subordinação como elemento caracterizador da relação de emprego.
Palavras-chave: Objeto do Direito do Trabalho; Relação de Trabalho subordinado; Relação de emprego; subordinação; novas perspectivas da subordinação jurídica; flexibilização.
Abstract: This academic work aims to analyze the subordination element as employment link characterizes the current scenario, confirming the conceptual crisis that has been going, with a view to implement the technology in the means of production, which eventually change the social landscape and prevailing economic. It stresses that this work will not have a view of the whole field in view of the absence of sedimentation on the relevant topic. Including, without dominant position. This reveals the importance of the study, in view of the need for debate on the subject. For that will be used the deductive method in order to prove that the dynamics of the social scene directly influences labor law, and, therefore, there is dire need of a rethink on the classic concept of subordination as defining characteristic of the employment relationship.
Keywords: Object of labor law; Subordinate working relationship; Employment relationship; subordination; new perspectives of legal subordination; easing.
Sumário: Introdução. 1. Escorço Histórico do Direito do Trabalho. 1.1 Introdução. 1.2. Escorço da evolução histórica do Direito do Trabalho – Influência do contexto sociocultural e político para a consolidação do Direito do Trabalho enquanto Ciência. 1.3. Origem do Direito do Trabalho – Influência do Capitalismo para o panorama protecionista atual do Direito do Trabalho. 1.4. Escorço evolutivo do Direito do Trabalho – A era pós-industrial e a tendência à flexibilização das normas trabalhistas. 2. A Subordinação como elemento caracterizador da Relação de Emprego. 2.1. Introdução. 2.2. Conceito. 2.3. Teorias Doutrinárias da Subordinação – Adequação aos aspectos temporais e socioeconômicos. 2.4. Natureza Jurídica. 2.5. Subordinação. Trabalho. Poder. 2.5.1. A Subordinação diante das alterações no mercado de trabalho referentes à mão de obra. 2.5.2. As formas de poder, segundo Max Weber, como elemento subjetivo presente nas Relações de Emprego. Consequências. 2.5.3. Limitações ao Poder Empregatício. 2.6. A crise do Conceito Tradicional de Subordinação. 3. Novas perspectivas da Subordinação. 3.1. Introdução. 3.2. Diferenciação entre Trabalho Autônomo e Trabalho Subordinado. 3.3. As Novas Perspectivas Doutrinárias para a Subordinação como elemento caracterizador da Relação de Emprego. 3.3.1. Reconstrução da Doutrina da Teoria da Subordinação – Métodos para explicação do fenômeno da Subordinação. 3.3.2. Principais Teorias de reconstrução do Conceito de Subordinação. 3.4. Parassubordinação. 3.5. Flexibilização das Normas Trabalhistas. Considerações finais. Referências Bibliográficas.
Introdução
Indiscutivelmente, o que se verifica é que, o tempo tem sido um importante agente modificador da Ciência do Direito. Não sendo diferente com o seu subramo laboral. Tal fato deriva, necessariamente, de ser o Direito um fenômeno social criado a partir da necessidade da própria sociedade de regular as situações de conflito que surgiam.
Em razão disso, o Direito do Trabalho origina-se para regulamentar e traçar contornos expressivos acerca das relações de emprego, erigindo como seu núcleo central o trabalho subordinado, e, elevando o trabalho autônomo como seu antônimo necessário. A partir disso foram delimitados elementos, institutos, definidos princípios e normas que serviriam para tutelar as relações de trabalho subordinado.
No presente trabalho, especificamente no ponto 1, será analisada a importância da evolução histórica do Direito do Trabalho para a mudança de paradigma do conceito de subordinação clássica. Pois, verifica-se que, com as mudanças no cenário social, econômico e político, especialmente a partir do incremento da tecnologia nos meios de produção, tal conceito não se mostra mais suficientemente adequado a resguardar todos os trabalhadores, especialmente aqueles situados na “zona grise”, que, a depender do enfoque, facilmente poderão ser enquadrados como empregados ou autônomos.
No ponto 2, será pormenorizado o que se entende por subordinação. E, em razão da crise pela qual passa este conceito como elemento caracterizador da relação de emprego, várias teorias surgem a fim de evidenciar o problema e buscar soluções para o mesmo. A maioria, visando repensar a subordinação jurídica sob diversos aspectos, como econômico, técnico, e estrutural, por exemplo, vez que acreditam ser esta, mesmo com o desgaste que vem sentindo, o núcleo central da relação de emprego; outras, porém, tentando alterar o objeto do Direito do Trabalho por afirmar não ser mais a subordinação jurídica apta a explicar este fenômeno.
Por fim, no ponto 3 serão abordadas as novas perspectivas para o elemento subordinação, ressaltando a imaturidade da produção científica sobre o tema, e buscando apresentar a nova tendência à flexibilização das normas trabalhistas, concluindo com o destaque que deve ser dado a necessidade de um repensar dos institutos que regem o Direito do Trabalho, sem, contudo, perder a essência protecionista que esta Ciência possui e revela-se necessária.
1. Escorço histórico do direito do trabalho
1.1 Introdução
Com o presente capítulo visa-se apresentar os momentos históricos de maior destaque à formação e surgimento do Direito do Trabalho enquanto Ciência. Bem como, suscitar os eventos sociais, políticos e econômicos de maior relevância e propensão a sua origem e desenvolvimento.
É cediço na doutrina mais acertada que a origem do Direito do Trabalho encontra-se intimamente atrelada ao surgimento do capitalismo. Foi a partir desta fase do desenvolvimento econômico, que remota ao final do século XVII e início do século XVIII, maturando-se no século XIX, que as relações interpessoais entre empregados e empregadores começaram a tomar proporções contratuais, uma vez à consideração daquele como ser livre.
Compreender as premissas sociais, culturais e políticas aptas ao florescimento do capitalismo mostra-se condição sine qua non ao entendimento da necessidade do surgimento do Direito do Trabalho e do aspecto que sobreleva atualmente. É a partir do contexto histórico-social da época que se formaram esboços protecionistas essenciais ao trabalhador e ao ramo científico juslaboral.
A influência dos acontecimentos sociais à atual condição de Direito do Trabalho enquanto Ciência justifica as variantes que vem sofrendo ao longo do tempo. É o que se pretende compreender a seguir, inclusive, justificando a tendência vigente deste ramo do Direito à flexibilização das suas normas, uma vez o surgimento de novos modelos de trabalho que fogem ao tradicional conceito típico de relação de emprego, como o teletrabalho.
1.2. Escorço da evolução histórica do Direito do Trabalho – Influência do contexto sociocultural e político para a consolidação do Direito do Trabalho enquanto Ciência
Inicialmente, vale ressaltar a total ausência de propensão ao surgimento do Direito do Trabalho, como Ciência, anteriormente ao final da Idade Média e início da Idade Moderna, tendo em vista as condições em que o labor era desenvolvido. Esclareça-se, não havia contexto sociocultural e político propenso ao surgimento de uma estrutura científica organizada e voltada à tutela dos direitos trabalhistas, tendo em vista a condição peculiar de coisa a qual se submetiam os obreiros. Tanto à época da escravidão quando à época dos senhores feudais o empregado ligava-se ao seu empregador por meio de relação direta de sujeição, analogicamente vinculados a preceitos hoje pertencentes aos Direitos reais. Muito embora, em tais períodos, pudesse haver esboços de tutelas voltadas à seara laboral, nenhuma demonstrou ter o condão de fazer florescer tal ramo do Direito.
Somente a partir da Revolução Industrial, em meados do século XVIII, o contexto sociocultural e político tornou-se propenso ao surgimento do Direito do Trabalho. Isso é verificado tendo em vista as posições jusfilosóficas protecionistas e humanitárias da época voltadas à especial tutela da dignidade do obreiro, pois, os abusos sofridos, especialmente no setor industrial, não conseguiam passar despercebidos.
Foi neste contexto, no cerne do desenvolvimento do capitalismo, no qual a alteração de paradigmas sociais, econômicos, culturais e políticos tendia a absorver a mão-de-obra vinda do campo que se fez necessário o aparecimento do Direito do Trabalho.
Aclara-se que o Direito do Trabalho, como subramo do Direito que é, surgiu das mesmas necessidades deste, uma vez ser Ciência do campo das ideias. Ou seja, existente com base em fatos sociais relevantes e repetidos ao longo dos tempos. É a necessidade social de regulamentação que faz surgir o Direito, não sendo diferente com o Direito do Trabalho. Observe-se a lição do inigualável Professor Miguel Reale (2012, p. 02): “O direito é, por conseguinte, um fato ou fenômeno social; não existe senão na sociedade e não pode ser concebido fora dela. Uma das características da realidade jurídica é, como se vê, a sua sociabilidade, a sua qualidade de ser social.”
Amauri Mascaro Nascimento, influenciado pelas lições do citado Mestre, informa que:
“O direito não é um fenômeno estático. É dinâmico. Desenvolve-se no movimento de um processo que obedece a uma forma especial de dialética na qual se implica, sem que se fundam, os polos de que se compõe. Esses polos mantêm-se irredutíveis. Conservam-se em suas normais dimensões, mas correlacionam-se. De um lado, os fatos que ocorrem na vida social, portanto a dimensão fática do direito. De outro, os valores que presidem a evolução das ideias, portanto a dimensão axiológica do direito. Fatos e valores exigem-se mutuamente, envolvendo-se num procedimento de intensa atividade que dá origem à formação das estruturas normativas, portanto a terceira dimensão do direito”. [sic] (NASCIMENTO, 2007, p. 3-4)
Afirma-se, com amparo na doutrina supracitada, ser o Direito do Trabalho fato social. Isso explica o seu surgimento apenas com o estabelecimento do capitalismo.
Com a decadência do sistema feudal na Idade Moderna, consequentemente, os servos abandonando as glebas, e, mais a frente, com a Revolução Industrial, iniciada no século XVII e intensificada no século XVIII, houve uma alteração social de grande monta, e, o empregado, um dos elementos subjetivos da relação de emprego, passou a ser encarado sob outro enfoque, comoo trabalhador livre, ao menos juridicamente.
Foi a partir desta relevante alteração de paradigmas (exclusão da sujeição pessoal do servo e subordinação do empregado livre) que o Direito do Trabalho intensificou o seu processo de surgimento enquanto Ciência, tendo em vista a estruturação da sua categoria central, qual seja, o trabalho subordinado.
Maurício Godinho Delgado traz relevante contribuição para o quanto exposto:
“O elemento nuclear da relação empregatícia (trabalho subordinado) somente surgiria, entretanto, séculos após a crescente destruição das relações servis. De fato, apenas já no período da Revolução Industrial é que esse trabalhador seria reconectado, de modo permanente, ao sistema produtivo, através de uma relação de produção inovadora, hábil a combinar liberdade (ou melhor, separação em face dos meios de produção e seu titular) e subordinação. Trabalhador separado dos meios de produção (portanto juridicamente livre), mas subordinado no âmbito da relação empregatícia ao proprietário (ou possuidor, a qualquer título) desses mesmos meios produtivos – eis a nova equação jurídica do sistema produtivo dos últimos dois séculos.
A relação empregatícia como categoria socioeconômica e jurídica, tem seus pressupostos despontados com o processo de ruptura do sistema produtivo feudal, ao longo do desenrolar da Idade Média Moderna. Contudo, apenas mais à frente, no desenrolar do processo da Revolução Industrial, é que irá efetivamente se estruturar como categoria específica, passando a responder pelo modelo principal de vinculação do trabalhador livre ao sistema produtivo emergente. Somente a partir desse último momento, situado desde a Revolução Industrial do século XVII (e principalmente século XVIII) é que a relação empregatícia (com a subordinação que lhe é inerente) começará seu roteiro de construção de hegemonia no conjunto das relações de produção fundamentais da sociedade industrial contemporânea. Apenas a partir do instante em que a relação de emprego se torna categoria dominante como modelo de vinculação do trabalhador ao sistema produtivo, é que se pode iniciar a pesquisa sobre o ramo jurídico especializado que se gestou em torno da relação empregatícia. Esse instante de hegemonia – de generalização e massificação da relação de emprego no universo societário – somente se afirma com a generalização do sistema industrial na Europa e Estados Unidos da América, somente se afirma, portanto, ao longo do século XIX”. (DELGADO, 2007, p. 85-86)
Portanto, apenas pode-se afirmar que o Direito do Trabalho, enquanto Ciência, fundamentalmente estruturou-se no século XIX. Pautado, essencialmente, na relação empregatícia, ou seja, no trabalho subordinado. Detendo, por conseguinte, a subordinação papel salutar e importantíssimo para a noção estrutural de Direito do Trabalho.
A subordinação entendida como “conceito que traduz a situação jurídica derivada do contrato de trabalho mediante a qual o empregado se obriga a acolher a direção do empregado sobre o modo de realização da prestação de serviços” (DELGADO, 2007, p. 84) representa evolução, pois, tomou o lugar da antiga sujeição pessoal do empregado. A Ciência do Direito passou a encarar a subordinação sob um prisma estritamente objetivo, sendo considera apenas com relação ao modo de realização do serviço.
As alterações de paradigmas sociais, culturais e políticos foram preponderantes para o surgimento do Direito do Trabalho e sua consolidação no decorrer da era capitalista. Sendo estas mesmas alterações sentidas ao longo dos séculos seguintes, nas eras pós-capitalista e contemporânea aptas a fazer florescer novas tendências ao ramo juslaboral da Ciência do Direito.
1.3. Origem do Direito do Trabalho – Influência do capitalismo para o panorama protecionista atual do Direito do Trabalho
A Revolução Industrial ocorrida especialmente na Inglaterra, intensificada no século XVIII, foi responsável por uma mudança salutar na estrutura das sociedades até então estabelecidas sob prismas rudimentares no setor manufatureiro. As alterações no setor econômico trouxeram reflexos diretos em todos os demais. Essencialmente, nos aspectos sociais.
Com o surgimento das fábricas e, consequentemente, procura por mão-de-obra, as pessoas, marginalizadas, tendo em vista o declínio do sistema feudal, foram absorvidas em massa pelo novo sistema de produção. Segundo Amauri Mascaro Nascimento:
“O advento da máquina a vapor permitiu a instalação de uma indústria onde houvesse carvão, e a Inglaterra foi especialmente favorecida. A indústria têxtil-algodoeira instalou-se no condado de Lancaster, perto de Liverpool, e das suas necessidades surgiram inventos como a flying-shuttle (lançadeira volante), devida a jhon Kay, em 1733, a máquina de fiar, patenteada em 1738 por Jhon Watt e Lewis Paul, a mule-jenny, de Samuel Crompton, que é uma modalidade de máquina de fiar, o tear mecânico, de Edmund Catweight, em 1784 e etc.
Para que se avalie o significa desses fatos em relação ao nosso problema, basta dizer que todos eles modificaram as condições de trabalhistas. (…)” [sic]. (NASCIMENTO, 2007, p. 11)
Contudo, em decorrência do acelerado desenvolvimento das indústrias e da ausência de preparo técnico dos empregados, é evidente que problemas surgiram, problemas de ordem interna, como por exemplo, acidentes de trabalho, sobrecarga de serviço, jornada de trabalho exacerbada, ausência de mínimas condições de higiene, saúde e segurança no ambiente laboral e pagamento de salários muito baixos.
Salienta-se que, a partir da recorrência de tais problemas, que se repetiam em todas as fábricas instaladas tal qual como um costume, houve a necessidade de regulamentação especializada. Surgindo, portanto, o Direito do Trabalho.
As condições de trabalho eram precárias, houve intensa contratação de mulheres e crianças, o relato de Claude Fohlen demonstra com clareza a situação pela qual passavam os trabalhadores:
“1.Pergunta: ¿Qué hora será la más pequeña a la fábrica? Respuesta: Durante seis semanas a tres de la mañana y volvimos a las diez de la noche. 2. Pregunta: ¿Cuáles son los intervalos concedidos durante la década de horas, para descansar o comer? Respuesta: Quince minutos para el desayuno, a media hora para el almuerzo y quince minutos para beber. 3. Pregunta: Me costó despertar a sus hijas? Respuesta: Sí, al principio tuvimos que sacudirlos para despertarlos y levantarse y vestirse antes de ir a trabajar. 4. Pregunta: ¿Por cuánto tiempo durmieron? Respuesta: Yo nunca fui a la cama antes de las 11 horas, después de darles algo de comer y luego mi esposa pasé toda la noche en vela ante el temor de no despertar a tiempo. 5. Pregunta: ¿A qué hora se despierta? Respuesta: Por lo general, mi esposa y yo nos levantamos a las dos de la mañana para llevarlos. 6. Pregunta: ¿Por lo tanto, sólo tenía cuatro horas de sueño? Respuesta: Apenas cuatro. 7. Pregunta: ¿Por cuánto tiempo fue eso? Respuesta: Unas seis semanas. 8. Pregunta: Se trabajó a partir de las seis de la mañana hasta las ocho y media? Respuesta: Sí, lo es. 9. Pregunta: El más pequeño estaban cansados con esa disposición? Respuesta: Sí, mucho. 10. Pregunta: Sus hijas han resultado heridas? Respuesta: Sí, la más grande, la primera vez que fui a trabajar, perdió un dedo en un engranaje y pasó cinco semanas en el hospital de Leeds. 11. Pregunta: ¿Ha recibido su salario durante ese tiempo? Respuesta: No, ya que el momento del accidente se detuvo el sueldo. 12. Pregunta: ¿Se han pagado sus hijas? Respuesta: Sí, los dos. 13. Pregunta: ¿Cuál era el salario de una semana normal? Respuesta: Tres chelines a la semana cada uno. 14. P. ¿Y cuando lo hizo horas extras? Respuesta: Tres chelines y siete peniques y medio.”[1] [Sic] (FOHLEN, 1965, 38)
É preciso ressaltar que, com o advento da Revolução Francesa e a eleição do pensamento Individualista como dominador nas relações intersubjetivas, as relações entre empregado e empregador sofriam sérios prejuízo (daí justificar os problemas acima narrados) pois, aquele, polo mais fraco da relação, necessariamente tinha as suas condições de trabalho determinadas de acordo com os princípios norteadores das relações civis, sendo a autonomia da vontade basilar nas contratações dos empregados pelos empregadores. Somente verificando-se a aplicação de uma das vontades, a do empregador. E mais, com a aplicação do princípio pacta sunt servanda, os empregados se obrigavam ao estipulado unilateralmente sendo alvo de arbitrariedades.
Uma vez verificado que os preceitos civilistas não deveriam ser aplicados às relações entre empregados e empregados, pois, aptos a privilegiar a vontade de apenas um dos seres da relação (o empregador), pensadores humanistas, como Recasens Siches, juntamente com manifestações de movimentos sindicais dos empregados (precursores dos sindicatos atuais) voltaram-se a construção teórica de um ramo especializadamente apto a tutelar os interesses dessa classe. A partir da pressão social e filosófica surgiram os primeiros regramentos do Direito do Trabalho.
A partir da alteração do pensamento, da luta por melhores condições de trabalho, além de alterações nas acepções políticas e sociais, gradativamente foi-se abandoando o Liberalismo (influência do pensamento individualista, base do Direito Civil), passando-se a estabelecer-se o Intervencionismo.
Não se pode negar a influência e importância do Liberalismo, essencialmente para o subramo Civil do Direito. Pois, erigiu o indivíduo em sua acepção mais fundamental, resguardando a autonomia da vontade em termos extremados. Todavia, para o Direito do Trabalho mostrou-se suplantador de direitos, um verdadeiro algoz. Não favorecendo para que contornos mais diplomáticos fizessem parte da construção normativa deste ramo. Ao contrário, favoreceu para que o Direito do Trabalho surgisse voltado à tutelar os interesses do trabalhador face aos desmandos do empregador. Surgiu, com o essencial intuito de desnivelar uma desigualdade social e histórica. Razão de pressões e lutas constantes.
Com a implantação do Estado do Bem Estar Social, focado na Constitucionalização dos Direitos Trabalhistas e Sociais, essencialmente comprometido com a eficácia destes direitos o Direito do Trabalho encontrou campo propício para o seu amadurecimento.
Segundo Recaséns Siches,
“Es intervencionismo humanista que considera la intervención considerándola absolutamente esencial, con carácter excepcional, manteniendo como regla general el principio de la libertad. Puede adoptar como criterio habitual, un régimen mixto de la empresa privada en diversas actividades y la intervención del Estado en los demás. También puede tomar la forma de una dirección de toda la vida económica, sin embargo, el sector de la supresión, privado. También puede planificar una parte o toda la vida econômica”.[2] (SICHES, 1965, 527)
O pensamento Intervencionista representou outra alteração histórica, social e política, sedimentado na era pós-capitalista, e verificado na produção legislativa de diversos países, como na Constituição Mexicana, de 1917, na qual previa, especificadamente no seu artigo 23, diversos regramentos específicos de Direito do Trabalho, como, por exemplo, jornada diária de 8 (oito) horas, proibição de trabalho de menores de 12 (doze) anos, direito de sindicalização, direito de greve, entre outros. Além da Constituição de Wieimar, em 1919, também contendo diversos regramentos trabalhistas, constituindo base das novas democracias sociais, a Carta Del Lavoro, de 1927, entre outros diplomas.
Percebe-se que o Direito do Trabalho, por ser oriundo da sedimentação de fenômenos sociais, tende a mudar a fim de alcançar as novas realidades. Hoje, percebe-se nítida diferença quando comparado com o Direito do Trabalho do século XIX. Por conseguinte, é facilmente perceptível o seu caráter dinâmico, responsável pelas novas nuances sentidas, essencialmente, com o desenvolvimento da robótica, meios de comunicação e informática, que tem feito com que o ambiente de trabalho sofra mudanças salutares, inclusive, aptas a dar vazão ao surgimento de outros tipos de trabalho, como o teletrabalho.
1.3. Escorço evolutivo do Direito Do Trabalho – A era Pós-Industrial e a Tendência à Flexibilização das Normas Trabalhistas
É cediço que o objetivo precípuo do capitalismo repousa no lucro. Foi com base na estruturação deste modelo pautado, essencialmente no consumo, que o ramo juslaboral do Direito surgiu e desenvolveu-se rapidamente.
Com bastante brevidade, a partir do uso de novos combustíveis, como petróleo e luz elétrica, na denominada Segunda Revolução Industrial, já no século XIX, as empresas buscaram implementar novas formas de aceleração de produção com menores custos a fim de obterem maiores lucros, expandindo, principalmente, o mercado consumidor para além das fronteiras dos países de suas sedes. Propensões suficientes para o surgimento do Fordismo e Taylorismo, modelos de produção em massa. É o que se pormenoriza abaixo:
“O termo "fordismo" faz referência a Henry Ford (1863-1947), introdutor da linha de montagem na indústria automobilística. Nas fábricas da Ford Motor Company, fundada por ele, o automóvel a ser montado se deslocava por uma esteira rolante, enquanto os operários, dispostos junto à esteira, realizavam operações padronizadas. Característicos do fordismo, os gestos repetitivos na produção industrial correspondiam à sincronização de movimentos estudada pelo engenheiro James Taylor (1856-1915), que acelerava ao máximo a produção e obrigava o trabalhador a operar no ritmo febril das máquinas. Por essa razão, esse método de trabalho também costuma ser designado como fordista-taylorista. O filme Tempos modernos (EUA, 1936), dirigido e estrelado por Charles Chaplin, pode fornecer aos estudantes uma boa imagem desse processo produtivo.
Em termos de mercado, o fordismo assegurou uma enorme redução no preço dos automóveis. O famoso Modelo T, lançado em 1908, custava 850 dólares, bem menos que os carros das concorrentes, de fabricação artesanal. A produção crescente reduziu o preço para menos de 300 dólares em 1927. Com isso, o automóvel assumiu o status de bem de consumo de massa, que mantém até hoje.
Paralelamente, Ford percebeu a vantagem de pagar salários razoáveis aos operários, para que pudessem adquirir os veículos que fabricavam. Dos Estados Unidos, o binômio produção em massa – consumo de massa se difundiu pelo mundo, compensando a retração decorrente da crise mundial de 1929 com uma vertiginosa expansão no pós-guerra, que se estendeu até o final da década de 1960. No tocante à organização sindical, as fábricas fordistas, que reuniam milhares de operários, foram o celeiro ideal para o preenchimento das fileiras dos grandes sindicatos. Os gestos mecânicos, repetidos à exaustão, não favoreciam uma reflexão dos trabalhadores sobre o trabalho e a organização social; o trabalhador fordista, alheio às tradições de luta operária, apoiou direções sindicais basicamente interessadas em obter vantagens materiais pela negociação com os patrões. Em A ideologia da sociedade industrial, Herbert Marcuse observa que essa tendência atingiu o auge nos Estados Unidos, com a transformação do proletariado em aliado do capitalismo.” (Disponível em:http://revistaescola.abril.com.br/ensino-medio/fordismo-toyotismo-546155.shtml”. acesso em 25 de abril de 2013, às 15:00)
Mais a frente, após a Segunda Guerra Mundial, verificando as falhas dos modelos anteriores (Fordismo e Taylorismo), como, por exemplo, desperdício de matéria prima e defeitos nos produtos, surgiu uma nova forma de produção denominada Toyotismo que reestruturou a sua linha de montagem pautado na qualidade do produto, numa produção mais enxuta, com investimento em tecnologia, emprego de novas máquinas, o que reduziu a contratação de mão-de-obra, fazendo com que o Direito do Trabalho já passasse por alterações, tendo em vista a dinamicidade das relações de emprego. Observe-se:
“A Toyota, ao adotar a concepção "enxuta" e rompendo com a produção em série, possibilitou oferecer um produto personalizado ao consumidor. As ferramentas utilizadas eram de acordo com cada proposta demandada pelo cliente. Inclusive, passou a produzir automóveis com larga escala de cores, sem gerar custos adicionais.
Os operários japoneses utilizam uma cartela (kaban, sinal) para indicar ao colega antecedente qual a peça deveria ser produzida e entregue. Dessa forma, conseguem eliminar o estoque e o desperdício, produzindo somente o que for necessário, JIT – "just in time".
A fábrica centralizada da Ford, que ocupava um enorme espaço, deixa de existir. As fábricas da Toyota, sem necessitar de grande área para estoque, são descentralizadas em menores proporções, interligadas por sistemas de informação, com sofisticadas tecnologias de informação e comunicação.
Dois conceitos inovadores que surgiram na Toyota merecem destaque: equipe de trabalho (team work) e qualidade total. Em uma fábrica "enxuta" todo o trabalho é feito por equipes. Quando um problema aparece, toda a equipe é responsável. Quando ocorre um defeito na montagem de uma peça, a equipe de montagem se organiza na busca de maneiras de resolver o problema. Há uma cobrança entre os pares para que cada membro atue de uma maneira que não prejudique os companheiros. Algumas fábricas delegam à equipe a função de demitir ou aceitar novos funcionários.
Junto com a qualidade total também foram inseridas novas máquinas para o interior das indústrias, com maior precisão e produtividade. A substituição da mão-operária pelas máquinas fez com que aumentasse o desemprego em escala mundial, inclusive nos países desenvolvidos economicamente. Contudo, a concepção "enxuta" passou a exigir maior autonomia tanto do trabalhador para expor as suas habilidades, quanto do consumidor para dar vez à sua vontade. É nesse modelo que o sujeito tem a chance de escolher, tomar decisões, propor soluções e gerar novas idéias. [sic] (DOURADOS. Disponível em:< http://www.geomundo.com.br/geografia-30108.htm> acesso em 25 de abril de 2013, às 15:05).”
Importante contribuição no mesmo sentido traz o grande mestre Amauri César Alves,
“Nesse contexto histórico de desenvolvimento da economia e das tecnologias surgem novas formas de organização da produção. Com o advento de crises e o crescimento da concorrência, o mercado deixa de absorver como outrora, a produção em larga escala, fruto da fábrica característica do modelo de produção fordista. Assim se tornou necessário diminuir os custos para não perder o lucro e esta diminuição acontece justamente nos gastos de natureza trabalhista, desse modo os salários e os empregos sofreram redução considerável. Como não havia um mercado tão receptivo como antes da globalização, pois este se tornou mais exigente, era necessária, também, uma reengenharia para adaptar a grande fábrica ao mercado em retração, possibilitando que ela concorresse até mesmo em nível mundial no mercado globalizado. Dessa maneira, tornou-se a fábrica mais “enxuta” sem acarretar perda de mercado e de lucro.” (CORIAT apud ALVES, 2005, p. 27).
Atualmente, o que se percebe é uma constante adaptação do Direito do Trabalho às mudanças que vem ocorrendo nos demais setores da sociedade, frutos, especialmente, dos modelos de produção implementados, como o toyotismo, que fez com que surgissem novas formas de emprego, como o teletrabalhador, o trabalhador em domicílio, além de novas profissões fundadas na especialização de determinados setores, como designers gráficos, por exemplo.
Busca o Direito do Trabalho adaptar-se a fim de que suas regras não se tornem obsoletas e atinjam o escopo de equilibrar as contratações de trabalho. A globalização e o desenvolvimento de novas tecnologias são responsáveis pela crise no tradicional modelo de emprego baseado num conceito estático e clássico de subordinação, essencialmente pautado numa subordinação técnica, intelectual, econômica e jurídica do empregado face ao empregador considerado como detentor de todo o conhecimento e meios de produção.
O que se observa na atualidade é uma verdadeira crise nas relações de emprego, tendente a agravar-se, tendo em vista o implemento, cada vez maior, da tecnologia como ferramenta de trabalho e meio de produção. Não por outra razão percebe-se o desenvolvimento exponencial de atividades autônomas, contratações por meio de terceirização e o desenvolvimento da parassubordinação.
É fato que a subordinação como elemento caracterizador da relação de emprego, elemento essencial, diga-se de passagem, tem sofrido mutações salutares em decorrência das necessidades que o próprio mercado produtor tem criado. Em muitos casos o empregado detém o conhecimento técnico da atividade desenvolvida, sendo encarado como colaborador na empresa, e, em muitos destes casos, o poder diretivo do empregador, necessariamente, sofre mitigação, uma vez existir total correlação de dependência entre os seres sociais da relação de emprego. O que se leva a seguinte indagação? Nestes casos há a hipossuficiência e vulnerabilidade do empregado em face do empregador? A resposta tende a não ser tão pacífica quanto se gostaria, pois, os aspectos considerados a fim de alcançar-se a resposta tendem a serem outros, como por exemplo, hipossuficiência e vulnerabilidade em relação a quê?
Pensando nesta nova tendência do Direito do Trabalho que vem sendo produzidas reflexões, por parte da doutrina, a fim de buscarem soluções para estas indagações e novos problemas que emergiram. Uma das alternativas tem sido a consideração da flexibilização das normas trabalhistas. Tal flexibilização visaria à mitigação, como o próprio nome já informa, de direitos trabalhistas no intuito de equilibrar o atual contexto das contratações. Representa, em grande escala, compreender que a posição de superioridade existente para o empregador perdeu a razão de ser, devendo ser encarado empregado e empregador como em um mesmo nível para contratar.
Todavia, é de ressaltar, ainda bastante tormentosa a discussão, tendo em vista que, essencialmente em países subdesenvolvidos ou em desenvolvimento, há bastante discrepância social nos mais variados setores de produção, o que faz com que haja maior cautela e resistência no abandono do pensamento essencialmente protecionista do obreiro.
2. A subordinação como elemento caracterizador da relação de emprego
2.1 Introdução
Buscar-se-á, no presente momento da construção lógico-científica, pormenorizar o que vem a ser a subordinação como elemento caracterizador da relação de emprego, tendo em vista o disposto no artigo 3º da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) no qual "Considera-se empregado toda pessoa física que presta serviços de natureza não eventual a empregador, sob a dependência deste mediante salário". Bem como, no previsto no caput do art. 2º do mesmo Diploma Legal, que dispõe que "Considera-se empregador a empresa, individual ou coletiva, que, assumindo os riscos da atividade econômica, admite, assalaria e dirige a prestação pessoal de serviços". Para tanto, necessária se faz uma análise acurada dos aspectos que diretamente influem neste conceito, como por exemplo, a semântica entre dependência e subordinação, sendo utilizada esta expressão em detrimento daquela pelos estudiosos, o que restou amplamente difundida, tendo em vista que a dependência remonta a ideia de sujeição pessoal, concepção subjetiva, enquanto que subordinação traz a noção exata de hierarquia, ligação, vinculação almejando um fim baseada em uma concepção objetiva.
Da mesma forma, importantíssima à pormenorização da relação imediata que possui a subordinação com o poder e o trabalho enquanto fatores preponderantes dos contratos laborais. A partir de então, tornar-se-á nítida a crise pela qual o conceito tradicional de subordinação vem sofrendo, tendo em vista a criação de novos tipos de relação de trabalho, não mais se encaixando com fidelidade a anacrônica dicotomia outrora suficiente de enquadramento em trabalho autônomo x relação de emprego subordinado.
Por fim, também se faz necessária à pormenorização das espécies, posições encontradas na doutrina acerca da subordinação, natureza jurídica e os reflexos da crise nas relações de emprego fazendo com que surjam novas perspectivas acerca da subordinação face às alterações sociais e econômicas.
2.2. Conceito
É preciso ressaltar que não há conceito legal no Direito pátrio do que vem a ser a subordinação, cabendo a mais brilhante doutrina esta incumbência. Frisa-se que o Direito Italiano foi o precursor em definir o que vem a ser a subordinação nas relações de emprego, servindo de exemplo e influência para os demais países como importante fonte do Direito Comparado.
O Código Civil Italiano, datado de 1942, no seu artigo 2.094[3], traz regra conceitual expressa do que vem a ser a subordinação dispondo ser “prestador de trabalho subordinado aquele que se obriga mediante retribuição a colaborar na empresa, prestando o próprio trabalho manual ou intelectual com dependência e sob a direção do empreendedor.”
A fim de corroborar com o exposto, citando a doutrina estrangeira, transcreve-se conceito salutar de Ludovico Barassi (1949, p.242) acerca do trabalho subordinado: “aquele que pressupõe o trabalho juridicamente dependente do empreendedor, ou, seja como for, do fornecedor do trabalho.”
Também, no pensamento de Giuseppi Pera,
“No contrato de trabalho subordinado, o empregado se obriga a colocar à disposição do empregador a própria energia laborativa, a fim de desenvolver a atividade estabelecida no contrato por certo e determinado dever, segundo a diretiva imposta pelo empregador ou de alguém por ele, na ordem e no modo concreto desta atividade”. (PERA, 2000, p. 108).
Para Domenico Napoletano (apud SILVA, 2004, p. 15), “a subordinação é um status do trabalhador, característico de sua condição de empregado”. Segundo Gerard Coutourier (apud SILVA, 2004, p. 16), a subordinação “é a dependência jurídica em nome da qual o empregador exerce o poder de direção.”
No que tange à doutrina nacional, muitas colaborações importantes foram concedidas, originadas de obras de sumidades no ramo do Direito do Trabalho. Necessária se faz a transcrição dos conceitos, tendo em vista o enriquecedor conteúdo destes.
Para Octavio Bueno Magano (1993, p. 50) “a subordinação constitui o poder de direção visto do lado do trabalhador. Por isso que o empregador organiza e controla os fatores da produção, advém-lhe o poder de dirigir seus empregados.”
Nelson Mannrich entende que
“A subordinação consiste no dever do empregado de submeter-se às ordens emanadas do poder diretivo do empregador, no limite do contrato. Entende, ainda, haver uma relação de dever e poder, onde o dever de obediência submete-se a um poder de comando: eis a essência da dependência jurídica, ou seja, da subordinação”. (MANNRICH, 1998, p. 120)
No mesmo raciocínio segue Oliveira Vianna e Paul Colin, asseverando que
“O que caracteriza a relação de subordinação é o poder que tem alguém, por força do contrato, de dar ordens, de comandar, de dirigir a atividade de outrem” e que “entende-se por subordinação jurídica um estado de dependência real, produzido por um direito, o direito do empregador de comandar, de dar ordens, e donde decorre a obrigação correspondente para o empregado de se submeter a estas ordens”. (apud MANNRICH, 1998, p. 120-121)
Paulo Emílio Ribeiro de Vilhena (1999, p. 478) “tem-se, conceitualmente, a subordinação como a participação integrativa da atividade do trabalhador na atividade do credor de trabalho.”
Já Margareth de Freitas Bacellar (2003, p. 38) afirma que subordinação “nada mais é que o poder hierárquico do empregador em relação às atividades do empregado”. (BACELLAR, 2003, p. 38)
O ilustre doutrinador Amauri Mascaro Nascimento (2004, p. 407) informa que “o trabalho subordinado é aquele no qual o trabalhador transfere a terceiro o poder de direção sobre o seu trabalho, sujeitando-se como conseqüência ao poder de organização, ao poder de controle e ao poder disciplinar deste.” [sic]
Sergio Pinto Martins (2006, p. 167), respeitável jurista, conceitua a subordinação como sendo “a obrigação que o empregado tem de cumprir as ordens determinadas pelo empregador em decorrência do contrato de trabalho”.
Para o inigualável Desembargador Maurício Godinho Delgado
“A subordinação classifica-se, inquestionavelmente, como um fenômeno jurídico, derivado do contrato estabelecido entre trabalhador e tomador de serviços, pelo qual o primeiro acolhe o direcionamento objetivo do segundo sobre a forma de efetuação da prestação do trabalho”. (DELGADO, 2007, p. 303)
Dos conceitos supramencionados resta latente a ideia de vinculação, oriunda da própria semântica da palavra, o que denuncia ser o conceito tradicional de subordinação pautado em critérios objetivos, ou seja, um conceito estruturado tomando como base a ideia central de “sub-ordenar”. Ao contrário do cerne do pensamento anteriormente dominante, pautado em concepções subjetivistas, nas quais, a vinculação era baseada na sujeição pessoal do indivíduo, de dependência. Daí o rechaço predominante da Doutrina ao termo “dependência” previsto no artigo 3º da CLT. Sendo pacificado que onde há na nesta norma o termo “dependência” deve-se ler “subordinação”. Observe-se:
“O verbo “subordinar” tem origem latina e significa “estabelecer uma ordem de relação entre dois seres vinculados, em que um passa a ser inferior, e o outro, superior; dominar, submeter, rejeitar”. Já o substantivo “subordinação”, também de origem latina, significa “ato ou efeito de subordinar”; “ordem estabelecida entre as pessoas e segundo a qual umas dependem das outras, das quais recebem ordens ou incumbências”. [sic] (HOUAISS; VILLAR, 2001, p. 26).
Para o ramo juslaboral o que se verifica é que a subordinação, classicamente considerada em seu conceito, esculpido com base na própria evolução histórica do Direito do Trabalho, tem premissas solidificadas, quais sejam, a vinculação do empregado ao empregador, por meio de um acordo de vontades. Sendo que, a partir deste, surgem direitos e obrigações para ambos. Por óbvio, por força do contrato de trabalho, por ser o detentor dos meios de produção e pela vinculação econômica, ao empregador surge o direito de dirigir a atividade do obreiro. Logo, por via de consequência, o poder diretivo seria a exteriorização da subordinação jurídica do empregador face ao empregado.
Contudo, o que se percebe é que, repita-se, em face das alterações no cenário global oriundas da era pós-industrial, na qual os serviços tem tomado o lugar da industrialização por diversos fatores, como exposto no capítulo anterior, tem havido, cada vez com maior urgência, a necessidade de repensar o conceito de subordinação tal qual como instituído. Isso se deve, essencialmente, pelo fato deste não ser mais eficaz, o que vem a por em xeque a própria estabilidade e escopo do Direito do Trabalho enquanto Ciência apta a tutelar o empregado nas suas relações com o empregador.
Desta forma, alguns juristas já tem pensado numa nova configuração do conceito de subordinação. Um conceito essencialmente dilatado, apto a tentar resguardar os direitos dos trabalhadores frente ao novo cenário social que fez surgir outras formas de emprego, como o teletrabalho, o trabalho terceirizado e o trabalho em domicílio.
Observe-se:
“Baseado na doutrina alemã, e no direito italiano, Paulo Emilio Ribeiro de Vilhena busca uma imagem a que os juristas venham a afeiçoar a subordinação atenuando a rigidez divisória, e que representaria uma validade maior e mais constante na esfera das relações trabalhistas, para o que considera: "uma relação de coordenação ou de participação integrativa ou colaborativa, através da qual a atividade do trabalhador como que segue, em linhas harmônicas, a atividade da empresa, dela recebendo o influxo próximo ou remoto de seus movimentos."
O vínculo subordinativo teria como suposto conformador, como atividade coordenada "a atitude harmônica do prestador de serviços, rente com a regular manutenção daquela parcela da dinâmica empresária e de seu processo produtivo, que lhe cabe dar seguimento". (GUNTHER; ZOMIG. Disponível em: <http://www.apej.com.br/artigos_doutrina_va_53.asp>. acesso em 26 de abril às 11:49)
Da mesma forma é possível extrair conceitos estruturados sob critérios objetivos mais abrangentes. Também originados com o intuito de dar maior eficácia ao conceito da subordinação. Inclusive, havendo aplicação no campo prático, o que é exemplificado pelas jurisprudências que se seguem, tendo em vista ser o contrato de trabalho um contrato-realidade, ou seja, apto a tutelar o que de fato se desenvolve na relação laboral, e não, friamente a um acordo de vontades típico do ramo civilista do Direito.
“Arion Sayão Romita afirma, com veemência: "A subordinação não significa sujeição ou submissão pessoal. Este conceito corresponde a etapa histórica já ultrapassada e faz lembrar lutas políticas que remontam à condição do trabalhador como objeto de locatio, portanto equiparado a coisa (res). O trabalhador, como pessoa, não pode ser confundido com a atividade, este sim, objeto de relação jurídica."
Para verificar-se a existência de subordinação não seria exigida "a efetiva e constante atuação da vontade do empregador. Basta a possibilidade jurídica dessa atuação. Por isso, a subordinação não deve ser confundida com submissão a horário, controle direto do cumprimento de ordens, etc. O que importa é a possibilidade, que assiste ao empregador, de intervir na atividade do empregado".
Recorda esse autor exemplos jurisprudenciais pelos quais já foram proferidas decisões no sentido de que a prestação de serviços gera a presunção iuris tantum da existência de contrato de trabalho; e, também, aplicando analogicamente o art. 455 da CLT, pressupõe o conceito puramente objetivo da subordinação que vincula os empregados do empreiteiro ao empresário, em cujo estabelecimento eles trabalham, se os serviços podiam ser executados, normalmente, pelos empregados do empregador.
Seguindo esta tendência progressista, o E. TRT da 9ª Região, por sua 2ª Turma, já se manifestou a respeito: "VÍNCULO DE EMPREGO. REQUISITOS LEGAIS. NOVA INTERPRETAÇÃO. CONTRATO-REALIDADE. ALTERIDADE. O contratualismo do direito civil não se presta a explicar a verdadeira concepção de contrato, no direito do trabalho. O contrato de trabalho é denominado contrato-realidade porque existe, não no acordo abstrato de vontades, mas na realidade da prestação do serviço, independente do que foi pactuado entre empregado e empregador. A subordinação, com as características impressas pelo moderno mercado de trabalho, e a alteridade, requisito de construção doutrinária que significa a prestação de serviços por conta alheia, devem ser conjugados para aferir se existe efetiva autonomia ou se a relação é de emprego, apesar de formalmente constituída como contrato de índole civil. Recurso provido para reconhecer a relação de emprego e determinar o retorno dos autos à origem para análise dos demais pedidos."
No Acórdão nº 9257/02 também reconheceu a existência de vínculo de emprego entre médico plantonista e hospital, salientando, igualmente, o critério objetivo da subordinação jurídica, em referência às obras de José Augusto Rodrigues Pinto e Paulo Emílio Ribeiro de Vilhena: "Por outro lado, o trabalho desempenhado pela autora representa um contrato de atividade, no qual há dispensa de energia pessoal de um contratante em proveito de outro (JOSÉ AUGUSTO RODRIGUES PINTO – in 'O Direito do Trabalho e as questões do nosso tempo' – Ltr). É aí que reside, a meu ver, o ponto nevrálgico da questão: há no caso a presença de alteridade, eis que a energia pessoal e intelectual do trabalhador é direcionada em proveito econômico para o empresário da atividade, que assume os riscos do empreendimento.
Sobre o caso concreto em exame, assim explicou a Exma. Juíza Relatora: "Não se pode deixar de cogitar que a autora, estando investida em função de alto grau intelectual e de especialização (médica obstetra e ginecologista), não possuía aquela subordinação comumente presente nas relações de emprego que envolvem trabalho braçal, onde há um poder diretivo de grande importância, mas uma subordinação diáfana. É do conhecimento comum que os médicos que laboram em hospitais, não possuem a subordinação jurídica, tal como ocorre com a grande maioria dos trabalhadores. O médico é profissional altamente qualificado e especializado: após passar por seis anos de curso de graduação, mais a residência (geralmente dois anos ou mais), posteriormente a especialização e ainda, a realização de prova junto à entidade na qual procura admissão e inscrição como especialista, é colocado no mercado do trabalho, na qualidade de trabalhador ímpar, eis que os conhecimentos adquiridos durante o longo caminho percorrido (cerca de dez anos), concede-lhe a liberdade de atuação na sua atividade, vale dizer, a sua opinião e atuação como médico não é dirigida por outrem, como a força do prestimoso operário o é. Mas, de forma muito tênue, quase que inexistente, – processo de diluição a que se refere De Ferrari – em que pese a existência do vínculo de emprego, identificado à luz de outros elementos, sobretudo na análise da dinâmica da empresa, e a sua importância na organização desta".
Lembrou-se, neste julgamento, o sustentado por De Ferrari (in Derecho del Trabajo. Buenos Aires. Ed. Depalma), no sentido de que devemos defender-nos de outro conceito que confunde a subordinação com o cumprimento de horário e convivência de empregado e empregador, porque este modo de ver concederia a uma das partes a possibilidade material de dar ordens e controlar diretamente seu cumprimento, o que, em rigor, não tem importância, concluindo, brilhantemente, que na dinâmica e na estrutura da empresa, que pressupõe integração e coordenação de atividades, a exteriorização da subordinação em atos de comando é fenômeno da ocorrência irregular, variável, muitas vezes imperceptível e esses atos sofrem um processo de diluição, até quase desaparecerem, a medida em que o trabalho se tecniza e se intelectualiza.
Com efeito, consoante as disposições dos artigos 2º e 3º da CLT, é empregado quem presta, pessoalmente, serviços não eventuais, de forma subordinada, a quem, assumindo os riscos do empreendimento, fiscaliza e remunera a prestação destes serviços.
A relação de emprego se estabelece independentemente da vontade das partes, submetida apenas à existência concomitante dos elementos que a informam.
Nesta esteira, é comum dizer que, na expressão permanente de La Cueva, o contrato de trabalho é um contrato-realidade, sobrepujando-se a prestação de trabalho efetiva, na prática, sobre qualquer estipulação formal que venha a reconhecer outra forma de vínculo.
Importante recordar, também, que sendo pacífica a prestação de serviços, emerge a presunção juris tantum de existência de relação de emprego, enquanto consectário lógico daquela situação fática.
Transcrevemos, ainda, neste sentido, ementa do Acórdão nº 2.058/97: "VINCULO DE EMPREGO. MÉDICO PLANTONISTA. É inconcebível a contratação de médicos autônomos em Setor de Pronto Socorro, onde a própria natureza da atividade determina a permanência desses profissionais em tempo integral, de tal forma que sofrem permanente vigilância da instituição onde trabalham. Destarte, a condição de profissional liberal não desnatura a relação empregatícia, desde que o obreiro preste serviços subordinados juridicamente, conforme leciona o mestre Délio Maranhão. No caso concreto, o vínculo de emprego se impõe ante a presença dos pressupostos do artigo 3º, 'caput', da CLT." Por fim, lembramos outra decisão importante, do E. TRT da 17ª Região: "Dispõe o art. 249, § 2º, do CPC, que não será declarada nulidade quando o juiz puder decidir no mérito em favor da parte. Tal regra, decorrente dos princípios processuais da instrumentalidade e da economia, tem plena aplicação no processo trabalhista (art. 769, da CLT). Em sede de vínculo empregatício, incumbe ao obreiro somente provar o labor em prol de outrem (subordinação objetiva); aquele que usufrui do trabalho e empresta-lhe outra conotação jurídica que não a de emprego, seja pela eventualidade, ou ainda, pela inocorrência de subordinação subjetiva (direito de comando de fiscalização), em suma, direção dos trabalhos deve demonstrar tais fatos prejudiciais ao direito do trabalhador (arts. 818 da CLT e 333, II, do CPC) sob pena de sucumbir na demanda. De qualquer modo, havendo contradição no conjunto probatório sobre a existência da relação de emprego, impõe-se decisão em favor desta (aplicação do princípio in dubio pro operario)." [sic] (GUNTHER; ZOMIG. Disponível em: <http://www.apej.com.br/artigos_doutrina_va_53.asp>. acesso em 26 de abril às 12:33)
Outra alternativa que tem sido difundida entre os estudiosos seria a conceituação por meio de um critério mais acurado de especificidade. O que se quer dizer com isso é que, partindo das diversas classificações doutrinárias para as espécies de subordinação, como jurídica, econômica, técnica e estrutural, seria possível extrair um novo conceito para subordinação apto a devolver a segurança nas relações estabelecidas entre os seres sociais do contrato de trabalho. Pois, a conceituação essencialmente tradicional pautada num conceito clássico de subordinação jurídica não tem sido tão eficiente quanto alhures.
Diante de todo o exposto, a conclusão lógica que se obtém é a de que ainda não há uma produção doutrinária assentadamente apta a formar uma ideia concisa do que seria a subordinação na atualidade. Por óbvio, mantém-se a essência do conceito clássico na formação dessa nova conceituação. Contudo, ainda pendente de sedimentação e delineamento mais preciso, substancialmente, frente às novas formas de trabalho que vem surgindo, fazendo com que essa dependência do empregado em face ao empregador tome feições de colaboração.
Enfim, acredita-se que, num futuro não tão distante, tendo em vista a mutabilidade do Direito, será possível adequar o conceito de subordinação a fim de não excluir da sua tutela situações que não se enquadram nem como autônomas nem como relações típicas de emprego.
2.3. Teorias doutrinárias da subordinação – Adequação aos aspectos temporais e socioeconômicos
Como relatado no tópico anterior, a doutrina, como forma de dar suporte ao Direito do Trabalho para que passasse a regular o fenômeno da subordinação que já ocorria no campo fático, veio a classificá-la (ou teorizá-la). Muitos são os enfoques dados para a subordinação. Especialmente, quando se raciocina que foi a subordinação o traço distintivo e apto a propiciar o surgimento do Direito do Trabalho sob os pilares do princípio da proteção e do princípio da irrenunciabilidade.
A fim de oferecer uma construção de raciocínio apta ao entendimento do momento atual no qual se encontra o Direito do Trabalho, necessário apontar a superação das teorias/classificações pretéritas, ressaltando as suas contribuições históricas e sociológicas. Bem como, apresentar os novos parâmetros de classificação visando à ampliação interpretativa afim de que passe a dar maior aplicabilidade aos preceitos contidos na Consolidação das Leis do Trabalho – CLT às atuais relações laborais que se encontram numa “zona grise” de classificação, como por exemplo, os teletrabalhadores. É o que se pormenoriza a seguir.
Ab initio, ainda quando este subramo do Direito fixava suas premissas, era possível encontrar correntes doutrinárias que buscavam explicar o fenômeno da subordinação sob enfoques diversos, como por exemplo, os que informavam ser a subordinação do obreiro face ao empregador uma subordinação econômica, ou seja, derivada da dependência e sujeição oriunda do contrato de emprego que, essencialmente, limitava a autonomia da vontade do empregado, tendo em vista a submissão econômica e necessidade de vinculação às ordens do empregador, uma vez ser economicamente inferior e depender do labor para sustentar-se dignamente.
Dennis Veloso Amanthéa informa que
“A dependência ou subordinação Econômica tenta explicar que o traço característico do contrato de trabalho é a dependência da remuneração em relação àquele para quem desforça-se. Assim, aquele trabalho em que se insere o trabalhador subordinado há de ser seu meio de subsistência preponderante. De imediato, surge um problema: se a condição econômica do laboralista for melhor que a do empregador, ou se aquele trabalho não for seu principal ou único meio de sobreviver, tal elemento caracterizador restaria prejudicado.” (AMANTHÉA, 2008 , p. 29)
No mesmo enfoque, Maurício Godinho Delgado acrescenta que
“A teoria justrabalhista registra, contudo, antigas posições doutrinárias que não enxergavam, ainda, esse caráter eminentemente jurídico do fenômeno da subordinação. Acentuando a ideia de dependência (que tem matiz pessoal e não objetiva), já se considerou a subordinação ora como sendo uma dependência econômica, ora como sendo uma dependência técnica (ou tecnológica).
No primeiro caso (dependência econômica), a concepção fundava-se na hierarquia rígida e simétrica que tanto marca a estrutura socioeconômica de qualquer organização empresarial, colocando n vértice da pirâmide econômica o empregador e seus representantes. A relação empregatícia, em particular, seria uma projeção enfática dessa assimetria econômica que separa o empregador do empregado.” [sic] (DELGADO, 2007, p. 304).
Ressalta-se que a concepção da subordinação como de caráter econômico trouxe importante contribuição para o entendimento do poder social nas relações de emprego. Revelando a eleição do princípio protetor como premissa básica das relações de trabalho e justificando a intervenção do Estado na regulamentação destas relações. Observe-se:
Essa absoluta ausência de simetria permite que aquele que detenha um poder social, então, condicione a manifestação de vontade dos que ocupem uma posição de inferioridade, pois, a fundo, o poder social aflora abruptamente nas situações de disparidade social.” (SOMBRA, 2011, 50)
“Em seu significado mais geral, a palavra “poder” designa “a capacidade ou a possibilidade de agir, de produzir efeitos”. Pode se referir a indivíduos e a grupos humanos ou a fenômenos naturais (como o vento, o calor, a tempestade). No sentido especificamente social, ou seja, no que se refere a vida do homem em sociedade, o poder pode ser definido como “a capacidade do homem em determinar o comportamento do homem: Poder do homem sobre o homem. O homem é não só o sujeito, mas também o objeto do poder social.” (BOBBIO; METTEUCCI; PASQUINO apud PORTO, 2009, p. 37)
Embora muito importante sob o prisma histórico e social, a subordinação encarada sob o aspecto econômico foi alvo de inúmeras críticas pelos doutrinadores, tendo em vista mostrar-se insuficiente para explicar o fenômeno da subordinação. Daí a sua superação. Maurício Godinho Delgado informa que,
“Há problemas, entretanto, nesta formulação teórica. Inegavelmente, o critério que ela incorpora origina-se de uma reflexão acerca do padrão genético típico à relação trabalhador/empregador na moderna sociedade industrial. Contudo, ainda que o critério econômico acima consignado tenha irrefutável validade sociológica, ele atua na relação jurídica específica como elemento externo, incapaz, portanto, de explicar, satisfatoriamente, o nexo preciso da assimetria poder de direção/subordinação. De par com isso, a assincronia econômica-social maior ou menor entre os dois sujeitos da relação de emprego não necessariamente altera, em igual proporção, o feixe jurídico de prerrogativas e deveres inerentes ao poder empregatício (com sua dimensão de direção e subordinação).” [sic] (DELGADO, 2007, p. 304).
Da mesma forma, há críticas relacionadas ao tempo de disponibilizado ao labor, tendo em vista haver serviços que não são de dedicação exclusiva. Valendo ressaltar que a exclusividade não é elemento caracterizador da relação de emprego, podendo haver vinculação de um mesmo obreiro a mais de um contrato de emprego sem que haja desnaturação desta relação, apenas exigindo-se para tanto, adequação dos horários, o que tem se verificado com muita frequência no cenário atual. Demonstrando a fragilidade do conceito de subordinação sob o prisma econômico. Esta é a essência da crítica de Orlando Gomes e Elson Gottschalk. Leia-se:
“Ora, a natureza de um contrato não pode ficar a mercê da quantidade de tempo gasto no cumprimento das obrigações, que engendra, com ficaria em face da irreversível identificação entre a dependência econômica e a exclusividade de trabalho. O mesmo contrato não pode ser e deixar de ser de trabalho, conforme as circunstâncias”. (GOMES; GOTTSCHALK apud AMANTHÉA, 2008, p. 30).
Também, visando conceituar o fenômeno da subordinação nas relações de emprego, buscando trazer-lhe um liame distintivo e que trouxesse segurança às relações jurídicas advindas desta modalidade de contrato, alguma parte da doutrina se pautou na subordinação sob o prisma técnico. Todavia, alvo de críticas tais como a teoria acima mencionada, tendo em vista não ser, necessariamente, o empregador o detentor do conhecimento técnico de como se operam os meios de produção.
Dennis Veloso Amanthéa, brilhantemente conceitua a subordinação técnica como:
“Outro critério que já foi estabelecido como traço dominante do contrato de trabalho é a dependência técnica. O empregado não tem a liberdade técnica para executar o trabalho, e cabe ao empregador estabelecer os critérios norteadores da execução da atividade, detentor da orientação técnica do serviço.” (AMANTHÉA, 2008, p.30)
Já Maurício Godinho Delgado conceitua a subordinação técnica (ou tecnológica) como sendo:
“(…) o empregador monopolizaria, naturalmente, o conhecimento necessário ao processo de produção em que se encontrava inserido o empregado, assegurando-se, em consequência, de um poder específico sobre o trabalhador. A assimetria do conhecimento técnico daria fundamento à assimetria na relação jurídica de emprego.” (DELGADO, 2007, p. 304)
Tal aspecto da subordinação tem razão de ter sido discutida quando se toma por base um modelo de produção típico do século XIX. Contudo, no atual panorama, no qual se funda na era pós-industrial neoliberal, tendo destaque os serviços em detrimento das produções em massa, no qual o desenvolvimento intelectual tem se firmado, não havendo que se falar em desequilíbrio técnico ou tecnológico entre empregado e empregador perdeu a razão de ser. Ao contrário, especialmente nas atividades intelectuais, tal critério mostra-se, inclusive, invertido, sendo considerada a existência de uma subordinação técnica invertida. Neste aspecto, importante contribuição se revela os ensinamentos de Alice Monteiro de Barros,
“Tradicionalmente, o empregador, no contrato de trabalho, denominado por alguns contrato de emprego, controla as atribuições inerentes à função a ser realizada como também o modo de realizá-la. Esse critério tradicional da subordinação jurídica, que realça a submissão funcional do empregado às ordens do empregador, mostrou-se suficiente em determinado momento histórico, ou seja, quando predominava o trabalho agrícola ou numa sociedade industrial primitiva, em que empregado e empregador possuíam o mesmo grau de conhecimento e experiência profissionais.
Sucede que, em uma sociedade como a atual, caracterizada pela racionalização do trabalho, com a consequente especialização da Mao de obra, o empregador nem sempre possui superioridade ou igualdade de conhecimentos profissionais em relação ao empregado, mesmo porque, cada vez mais, as contratações recaem sobe pessoas que possuem um grau de conhecimento em determinada profissão (know-how) do qual o empregador não é detento. Nasce daí o que se chama de “subordinação técnica invertida”, frequentemente presente nas relações de trabalho intelectual.
A debilidade do critério da subordinação funcional do emprego em relação ao empregador não supõe a eliminação da relação de emprego, mas mera insuficiência desse critério em certas situações, principalmente quando envolve trabalhos intelectuais”. (BARROS, 2013, p. 223)
Também, importante contribuição se revela os dizeres de Maurício Godinho Delgado informando a ineficiência do critério da subordinação técnica:
“A fragilidade da noção de dependência técnica é flagrante. Ela não corresponde, sequer, a uma correta visualização do processo organizativo da moderna empresa, em que a tecnologia é adquirida e controlada pelo empresário mediante instrumentos jurídicos, sem necessidade de seu precioso descortinamento intelectual acerca do objeto controlado. O empregador contrata o saber (e seus agentes) exatamente por não possuir controle individual sobre ele, como organizador dos meios de produção, capta a tecnologia através de empregados especializados que arregimenta – subordinando-os, sem ter a pretensão de absorver, individualmente, seus conhecimentos”. (DELGADO, 2007, p. 304)
Logo, o que se percebe é que a tentativa de teorizar a subordinação acabou por fazer surgir teorias classificatórias inaptas a justificar tal fenômeno jurídico. Todavia, tal esforço doutrinário não foi em vão, a fim de fomentar o pilar estrutural do Direito do Trabalho, qual seja, o trabalho subordinado, a doutrina acabou por produzir a teoria da subordinação jurídica, no século XX, aceita de modo pacificado e predominante por um longo período, no qual ainda não era possível sentir a pressão das alterações socioeconômicas, para considerar a subordinação do empregado ao poder diretivo e disciplinar do empregador como uma criação jurídica. Ou seja, seria a vinculação das partes na relação de emprego derivada de premissas legais, do contrato de trabalho. Seria uma vinculação sob prismas objetivamente considerados, afastando absolutamente o critério da sujeição pessoal do obreiro.
O empregado se vincula ao labor, sendo dirigido pelo empregador, sofrendo a incidência do seu poder diretivo e disciplinar, como forma de exteriorização da própria relação jurídica firmada na qual surgem direitos e obrigações para ambos os contratantes. Seria uma subordinação pautada na hierarquia.
Para Alice Monteiro de Barros,
“A subordinação jurídica na qual o homem livre subordina-se a outro deriva da relação que existe entre trabalho e propriedade. A propriedade atrai a força de trabalho e permite que seu titular a dirija, pois os frutos dessa atividade lhe pertencem, como também os riscos do empreendimento econômico”. (BARROS, 2012, p. 253)
O que se verifica é que a subordinação jurídica surgiu em um contexto histórico no qual a proteção ao obreiro era algo extremamente necessário a fim de tutelar o empregado frente às atrocidades ocorridas nas indústrias no sistema capitalista. Não por outra razão do Direito do Trabalho haver se firmado sob a égide do princípio protetivo.
Frisa-se que por muito tempo a teoria da subordinação jurídica foi eficiente para definir o conceito de subordinação como elemento caracterizador da relação de emprego. Contudo, em razão da dinamicidade do Direito, das inovações tecnológicas, do desenvolvimento do setor de serviços, o que desencadeou maior qualificação dos profissionais, a subordinação jurídica tem perdido a eficiência de outrora, não abarcando todos os casos. E, por conseguinte, insuficiente para servir como critério diferenciador da clássica dicotomia relação de emprego e trabalho autônomo. Em razão disso, outras classificações/teorias tem surgido na atualidade a fim de explicar o fenômeno da subordinação nas relações de emprego, visando com isso, ampliar a proteção concedida aos empregados pela CLT. Como por exemplo, as teorias que vem ganhando força e adeptos conhecidas como subordinação objetiva, subordinação integrativa e subordinação estrutural.
Para a primeira, subordinação objetiva, tal teoria entende que a subordinação é oriunda da integração do trabalho do empregado na atividade do empregador. É um conceito que deve ser encarado estritamente sob o prisma objetivo. Possui adeptos na doutrina atual, como por exemplo, Paulo Emílio Ribeiro de Vilhena, que afirma que,
“A subordinação objetiva se revela na integração da atividade do trabalhador na atividade as empresa: “o conceito de subordinação deve extrair-se objetivamente e objetivamente ser fixado”, devendo ser definido “como a participação integrativa da atividade do trabalhador na atividade do credor de trabalho.” (VILHENA apud PORTO, 2009, p.69)
Da mesma forma anuncia Lorena Vasconcelos Porto,
“A subordinação se faz presente quando o objeto do contrato de trabalho, isto é, a função á ser exercida pelo empregado, as tarefas que ele deve executar, se integram e se incorporam na atividade empresarial, compondo a dinâmica geral da empresa, em seu processo produtivo ou de fornecimento de bens e serviços. Assim, a atividade obreira é crucial para a consecução dos objetivos empresariais, sejam eles econômicos, técnicos, operacionais ou administrativos”. (PORTO, 2009, p.69)
O que se verifica é que a noção de subordinação objetiva, na qual o empregado acabar por integrar e se incorporar à atividade empresarial, alarga sobremaneira o conceito de subordinação. Com isso, vem abarcar situações que não se encontram compreendidas na descrição do que vem a ser relação de emprego, englobando diversas espécies de trabalho autônomo.
Alice Monteiro de Barros, repetindo os dizeres de Luisa Galantino, assim preconiza a fragilidade da classificação da subordinação objetiva:
“Também predomina na jurisprudência e na doutrina italiana moderna, o entendimento segundo o qual não é suficiente a inserção ou integração da atividade laboral do trabalhador na organização empresarial, exatamente porque isso poderia ocorrer também no trabalho autônomo. (…)
Será, portanto, necessário que essa participação integrativa do trabalhador no processo produtivo implique consequentemente observância às diretivas do empregador acerca da prestação e ao seu poder disciplinar.
A sujeição ao poder diretivo e disciplinar poderá apresentar-se atenuada, como no caso do serviço de caráter intelectual, havendo a intenção de rotulá-lo como trabalho autônomo. Em tais hipóteses, a doutrina italiana assevera que deverá o Juiz recorrer a critérios complementares considerados idôneos para aferir os elementos essenciais da subordinação, entre eles: se a atividade laboral poderá ser objeto do contrato de trabalho, independentemente do resultado dela consequente; se a atividade prevalente pessoal é executada com instrumentos de trabalho e matéria-prima da empresa; se a empresa assume substancialmente os riscos do negócio; se a retribuição é fixada em razão do tempo de trabalho subordinado, pois, se ela é comensurada em função do resultado da atividade produtiva, tende à subsistência de um trabalho autônomo, embora essa forma de retribuição seja compatível com o trabalho a domicílio subordinado, o mesmo ocorrendo se a prestação de serviço é de caráter contínuo”. (GALANTINO apud BARROS, 2013, p. 225)
O que se percebe é que, diante das críticas a teoria atual que preconiza ser a subordinação objetiva, esta não se mostrou apta a delinear os contornos, de modo satisfatório, do que vem a ser o conceito de subordinação jurídica na acepção atual.
Por conseguinte, tendo em vista ausência de estruturação concisa e solidificada de um conceito moderno de subordinação, uma vez que a sua acepção clássica não possui a eficácia de outrora, a doutrina tem firmado outras classificações, como a da subordinação estrutural, tendo como defensor, entre outros, o eminente jurista, Maurício Godinho Delgado. Para este,
“Estrutural é, pois, a subordinação que se manifesta pela inserção do trabalhador na dinâmica do tomador de seus serviços, independentemente de receber (ou não) suas ordens diretas, mas acolhendo estruturalmente, sua dinâmica de organização e funcionamento”. (DELGADO apud PORTO, 2009, p. 250).
Tal classificação tem tido aplicação na jurisprudência nacional, especialmente, para justificar situações que envolvam terceirização. É o que se depreende abaixo:
“TERCEIRIZAÇÃO. A terceirização é o ato pelo qual a empresa produtora, mediante contrato entrega a outra empresa certa tarefa não incluída nos seus fins sociais para que esta a realize habitualmente com empregados desta. Transporte, limpeza e restaurante são exemplos típicos. Quando não fraudulenta é manifestação de modernas técnicas competitivas. A terceirização não é uma prática ilegal por si só; é hoje uma necessidade de sobrevivência no mercado, com a qual a Justiça precisa estar atenta para conviver. Contudo, a sua utilização de forma a impedir a formação correta do vínculo empregatício não pode ser prestigiada. O reconhecimento da responsabilidade solidária e a correção da titularidade empresarial da relação empregatícia são as formas judiciárias de sanar o defeito. Além disso, a responsabilidade do tomador dos serviços contemplada pela Súmula n. 331/TST não é excluída na hipótese de uma terceirização de serviços tolerada e encontra amparo na lei (art. 927 do Código Civil), contudo, para captar a hipótese de subsidiariedade, na qual se atribui ao tomador dos serviços a culpa in eligendo e a culpa in vigilando. No estudo da terceirização, importa lembrar que o Direito do Trabalho contemporâneo evoluiu o conceito da subordinação objetiva para o conceito de subordinação estrutural como caracterizador do elemento previsto no art. 3o. da CLT, que caracteriza o contrato de trabalho. A subordinação estrutural é aquela que se manifesta pela inserção do trabalhador na dinâmica da atividade econômica do tomador de seus serviços, pouco importando se receba ou não ordens diretas deste, mas, sim se a empresa o acolhe, estruturalmente, em sua dinâmica de organização e funcionamento, caso em que se terá por configurada a relação de emprego”. Grifo nosso (TRT – 3ª R. – RO 545/2009-048-03-00-6 – Rel. Des. Marcio Flavio Salem Vidigal – Dje 10.12.2009 – p.215). (grifos acrescidos)”
A subordinação estrutural pressupõe uma ampliação do conceito clássico de subordinação apto a considerar (juntamente com a análise dos demais elementos que compõem a definição legal de empregado – artigo 2º da CLT) como empregado aquele trabalhador que se insere na dinâmica estrutural da empresa, vinculando-se a esta, sendo indiferente se as ordens são dadas diretamente ou não pelo empregador.
Deste conceito é possível perceber a intenção da doutrina em ampliar o espectro protetivo das normas de Direito do Trabalho. Tudo isso com o escopo de ofertar proteção a trabalhadores que, atualmente, encontram-se numa “zona grise” de classificação, tendo em vista as alterações socioeconômicas e dos meios de produção.
Ainda, partindo deste pressuposto ampliativo do conceito clássico de subordinação, tem-se a recente teoria da subordinação integrativa, defendida pela doutrinadora Lorena Vasconcelos Porto. Esta informa que
“A subordinação, em sua dimensão integrativa, faz-se presente quando a prestação de trabalho integra as atividades exercidas pelo empregador e o trabalhador não possui uma organização empresarial própria, não assume verdadeiramente os riscos de perdas ou de ganhos e não é o proprietário dos frutos de seu trabalho, que pertencem, originariamente, á organização produtiva alheia para a qual presta sua atividade.” (PORTO, 2009, p. 253).
Percebe-se, da simples leitura do conceito supra, que este tipo de subordinação, embora mais restritivo que o conceito de subordinação estrutural, ainda visa à ampliação do conceito tradicional de subordinação. Afirma-se a sua restrição em relação à subordinação estrutural, tendo em vista a sua construção teórica ser baseada num conglobamento da teoria estrutural com a teoria de bases espanholas no alheamento nos frutos, mercados e nos riscos.
É preciso salientar que há doutrinadores que consideram serem sinônimos as expressões subordinação objetiva, integrativa ou estrutural, considerando que a teoria seria extremamente ampliativa, não fazendo distinção qualquer entre os termos, tendo em vista levar em consideração apenas a integração do empregado na organização empresarial do empregador, sendo a sua vinculação ao modo de execução do labor e não uma vinculação existente em razão do contrato de trabalho.
Contudo, merece menção o fato de que, para outros doutrinadores, como Maurício Godinho Delgado, Alice Monteiro de Barros e Lorena Vasconcelos Porto, há distinção entre as teorias. Ou seja, embora oriundas de uma mesma linha de raciocínio não se confundem, sendo a subordinação estrutural derivação da teoria da subordinação integrativa,
“Cumpre observar que o fato de o trabalhador acolher, estruturalmente, a dinâmica de organização e funcionamento do empregador, como observa Maurício Godinho Delgado, é uma decorrência do fato de ele não possuir uma organização produtiva própria e de sua prestação estar integrada em uma organização produtiva alheia, a qual assume os riscos de ganho e de perda. Todavia, em razão de esse fator estrutural ser uma consequência e não uma característica da subordinação integrativa, preferimos não incluir na definição proposta.” (PORTO, 2009, p. 254)
Também, é possível elencar teorias de menor expressão no cenário doutrinário pátrio, inclusive com reduzido destaque e adeptos, essencialmente pela ausência de maturação científica e de serem ainda mais ampliativas. É o que ocorre com a teoria da subordinação reticular, mais direcionada ao fenômeno atual da terceirização, produzida por José Eduardo Resende Chaves Junior e Marcus Menezes Barberino Mendes, que informa que,
“Chaves Junior explica que a organização produtiva concebeu a empresa-rede, que se irradia por meio de um processo de expansão e fragmentação, que, por seu turno, tem necessidade de desenvolver uma nova forma correlata de subordinação: a reticular. Ou seja, o modelo atual apresenta empresas interligadas em rede, que no final dessa cadeia irão beneficiar uma empregadora. A partir daí, tem-se que, havendo subordinação econômica entre a empresa prestadora de serviços e a tomadora, esta seria diretamente responsável pelos empregados daquela, configurando a subordinação estrutural reticular.” (RENAULT; MEDEIROS apud CHAVES JUNIOR, 2011, p. 189-190).
E ainda, a teoria da subordinação potencial, exposta por Danilo Gaspar em sua tese de mestrado na qual sustenta que a simples potencialidade de direção do empregador já é apta a caracterizar a subordinação nas relações de emprego. Observe:
“A noção de subordinação potencial perpassa, portanto, pela potencialidade do poder diretivo destacada no item anterior. Assim, podendo o poder diretivo gravitar de um grau mínimo a um grau máximo, a sua existência é real, sendo, entretanto, o seu exercício potencial”. (GASPAR, 2011, p. 233).
Logo, a conclusão que se obtém é a de que a doutrina tem voltado a sua atenção para a peculiar situação que vem passando a Ciência do Direito do Trabalho. A preocupação tem feito surgir diversas teorias que buscam equalizar o cenário social com o escopo desta Ciência e os seus regramentos e normas vigentes. Todavia, a construção tende a ser lenta e gradual, os primeiros esboços tem sido importantíssimos para uma sedimentação e construção mais aprofundada. Natural que as teorias apresentem falhas. Somente o tempo será apto a sedimentar e adequar o Direito do Trabalho aos novos paradigmas das relações de emprego.
2.4. Natureza Jurídica
Inicialmente, convém informar que a natureza jurídica é uma produção doutrinária na qual visa à adequação de determinado instituto ao seu gênero na Ciência do Direito. É um conceito pertencente à Teoria Geral do Direito, do qual o Direito do Trabalho é um ramo.
A brilhante Maria Helena Diniz explica o que vem a ser a natureza jurídica:
“Natureza jurídica é a "afinidade que um instituto tem em diversos pontos, com uma grande categoria jurídica, podendo nela ser incluído o título de classificação". Portanto, determinar a natureza jurídica de um instituto consiste em determinar sua essência para classificá-lo dentro do universo de figuras existentes no Direito. Seria como uma forma de localizar tal instituto topograficamente. É como se um instituto quisesse saber a qual gênero ele pertence, é a espécie procurando o gênero, é a subespécie procurando a espécie. Ex: qual a natureza jurídica da Caixa Econômica Federal, o que ela é, qual a sua essência? Ela é uma sociedade de economia mista! Muitas vezes, o instituto não é espécie de nada, pelo fato dele ser o gênero, daí se dizer que ele é sui generis, ex.: a natureza jurídica da OAB é sui generis. (único em seu gênero)”. (DINIZ, 2001, p. 35)
Alexandre Freitas Câmara (2003, p. 142) discorre sobre o tema informando que: “Quando se perquire a natureza jurídica de um instituto, o que se pretende é fixar em que categoria jurídica o mesmo se integra, ou seja, de que gênero aquele instituto é espécie.”
Já Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho informam que quando
“Indagado a respeito da natureza jurídica de determinada figura, deve o estudioso do direito cuidar de apontar em que categoria se enquadra, ressaltando as teorias explicativas de sua existência.
Assim, fica claro concluir que a natureza jurídica do contrato, por exemplo, é a de negócio jurídico, uma vez que nesta última categoria subsume-se a referifa figura, encontrando, também aí, a sua explicação teórica existencial (a teoria do negócio jurídico explica a natureza do contrato).” (GAGLIANO; PAMPLONA FILHO, 2002, p. 191-192)
Partindo das definições supra é possível verificar que a natureza jurídica da subordinação encontra respaldo na doutrina que a aponta como fenômeno jurídico. Isso porque, é sabido que o elemento subordinação surgiu como caracterizador da relação de emprego que deu azo ao nascimento do Direito do Trabalho. O que se quer informar é que foi a partir da construção da relação de trabalho subordinado que se tornou possível construir o subramo laboral do Direito.
Resta pormenorizar a natureza da subordinação, ou seja, o seu posicionamento classificatório inserido dentro do Direito do Trabalho.
Conforme amplamente discutido em tópico anterior, muitas teorias surgiram tentando condensar e regulamentar uma ideia que se tornasse dominante acerca da subordinação. Apesar do desgaste natural do conceito, pode-se afirmar que a natureza da subordinação ainda é jurídica.
Conforme leciona Maurício Godinho Delgado,
“O debate sobre a natureza (posicionamento classificatório) do fenômeno da subordinação já se pacificou, hoje, na teoria justrabalhista. A subordinação classifica-se, inquestionavelmente, como um fenômeno jurídico, derivado do contrato estabelecido entre trabalhador e tomador dos serviços, pelo qual o primeiro acolhe o direcionamento objetivo do segundo sobre a forma de efetuação da prestação do trabalho.
A natureza jurídica do fenômeno subordinação, é hoje, portanto, entendimento hegemônico entre os estudiosos do Direito do Trabalho. A subordinação que deriva do contrato de trabalho é de caráter jurídico, ainda que tendo por suporte e fundamento originário a assimetria social característica da moderna sociedade capitalista. A subordinação jurídica é o pólo reflexo e combinado do poder de direção empresarial, também de matriz jurídica.
Ambos resultam da natureza da relação de emprego, da qualidade que lhe é ínsita e distintiva perante as demais formas de utilização do trabalho humano que já foram hegemônicas em períodos anteriores da história da humanidade: a escravidão e a servidão.” [sic] (DELGADO, 2007, p. 304)
Para tal doutrinador não restam dúvidas de que a natureza da subordinação é jurídica derivada do contrato de emprego firmado entre as partes. O que faz surgir uma vinculação objetiva do obreiro em detrimento de sua anterior sujeição pessoal.
Todavia, conforme amplamente pormenorizado no tópico anterior, não se pode deixar de mencionar a crise pela qual vem passando o conceito de subordinação pautado na subordinação clássica (jurídica ou hierárquica). Isso em razão das alterações salutares na economia, na política e na sociedade. Fazendo com que sejam sentidos os reflexos diretos da nova conjectura social no Direito do Trabalho.
É em razão dessas alterações, essencialmente aceleradas pelo processo de globalização e avanços na tecnologia e automação que surgiram novos tipos de trabalho, como os teletrabalhadores, nos quais o liame descritivo da subordinação ganha contornos diversos da posição solidificada em sua natureza jurídica.
O que se constata é que, em decorrência da juventude de tais alterações, ainda não sedimentadas, vindo a misturarem-se com o tipo tradicional de emprego e de trabalho autônomo, ainda não foram aptas a alterar a natureza jurídica do instituto da subordinação. Todavia, sendo a pedra de toque para um repensamento do instituto, o que já vem ocorrendo, inclusive, sendo dada especial atenção à questão por parte dos doutrinadores, uma vez ser a premissa básica para uma total reestruturação no modo de pensar da Ciência do Direito do Trabalho.
2.5 Subordinação. Trabalho. Poder
Inevitavelmente, toda relação contratual de trabalho sofre a interligação da subordinação, do trabalho e do poder. Estes aspectos juntos configuram o tripé estrutural das relações laborais justificados por fatores históricos, sociais e econômicos.
A interdisciplinaridade que impera não pode passar despercebida, pois, os contornos pretéritos, atuais e futuros da Ciência do Direito do Trabalho estão intimamente ligados à predominância de um desses conceitos em detrimento dos outros. O que se informa é que, anteriormente, no auge do capitalismo, o que se verificava era a predominância do poder em detrimento do trabalho, fazendo com que a subordinação se desenvolvesse em contornos que informavam a necessidade do princípio protetivo ser o pilar estrutural do Direito do Trabalho. A posição atual mostra-se mais afrouxada, ou seja, o neoliberalismo, consequente da globalização, tem feito com que esse poder tome feições mais amenas, mais flexíveis, havendo uma natural dilação do conceito de subordinação. Para o futuro as projeções tem se mostrado cada vez mais no intuito de flexibilização das normas trabalhistas e mutação do conceito de subordinação apto a abarcar as novas modalidades de trabalho e emprego. Inevitavelmente, a confirmação somente virá com o tempo.
2.5.1. A subordinação diante das alterações no mercado de trabalho referentes à mão de obra
No final do século XIX, início do século XX, culminou a 3ª Revolução Industrial, configurada pela mudança no pensamento de produção então predominante trazendo consequências salutares para o mercado de trabalho, tendo em vista o rompimento de fronteiras e a intensificação da globalização.
A era pós-industrial foi marcada pela intensificação da pesquisa científica, o desenvolvimento da robótica, telemática e informática. Enfim, pelo implemento da tecnologia e telecomunicações nos meios de produção. Tal fato ocasionou imensa crise no modelo então predominante de produção em massa, exemplificados pelo fordismo, taylorismo, e, mais a frente, o toyotismo.
Tal fato acabou por gerar, inevitavelmente, uma crise também no setor de mão de obra. As máquinas retiravam o emprego de diversos trabalhadores. Estes, por sua vez, perceberam a necessidade de maior qualificação a fim de atender as alterações do mercado de trabalho. Com isso, houve um maior desenvolvimento do setor de serviços, dos profissionais autônomos, por consequência, o desenvolvimento de áreas como medicina, direito, enfermagem, informática e engenharia. Daí a afirmação que o neoliberalismo favoreceu o desenvolvimento do setor de serviços.
Contudo, no ramo das indústrias o que se percebeu e vem se intensificando ao passar do tempo é a necessidade de qualificação dos seus empregados, uma mudança na forma como se desenvolve o labor. Não mais suprem as necessidades das indústrias o trabalho como simples repetição das atividades. A globalização tem sido responsável por uma reestruturação empresarial na qual os empregados passaram a desenvolver atividades mais complexas que envolvem conhecimento apurado das novas tecnologias empregadas.
As mulheres também se encontram mais absorvidas pelo mercado de trabalho, buscando qualificarem-se. É o que apontam as pesquisas feitas pelo IBGE,
“Em 2009, entre o 1,057 milhão de mulheres desocupadas e procurando por trabalho, 8,1% tinha nível superior. Houve aumento na escolaridade dessas mulheres, visto que em 2003, em média, 5,0% tinham nível superior. Esse crescimento resulta do aumento da escolaridade de uma forma geral. O aumento da escolaridade também pode ser verificado em outros níveis. Em 2003, em média, 44,7% das mulheres desocupadas tinham 11 anos ou mais de estudo. Em 2009, essa proporção ultrapassou significativamente a metade da população (59,8%). Verificou-se que a população feminina desocupada é proporcionalmente mais escolarizada que a população feminina acima de 10 anos. Enquanto, em média, 81,2% da população feminina desocupada tinham oito anos ou mais de escolaridade, na população em idade ativa este percentual era de 61,1%. (Disponível em: <http://saladeimprensa.ibge.gov.br/noticias?view=noticia&id=1&busca=1&idnoticia=1567> acesso em 20 de maio de 2013 às 17:58)”
Essa reestruturação criou novas formas de prestação de serviços, pautadas no implemento da tecnologia. Essas novas formas de realização de trabalho permitem que o trabalhador preste seus serviços, inclusive, fora do âmbito da empresa, o que geram novas formas de organização empresarial e de controle pelo empregador. Alterando-se, por consequência, a forma de apresentação do poder diretivo, regulamentar, fiscalizatório e disciplinar do empregador.
Os novos modelos de prestação de serviços tem sido responsáveis pela alteração do conceito tradicional de subordinação, fazendo com que, em muitos casos, esta tome feições de colaboração ou coordenação. Pois, o que se leva em consideração é a obrigação do resultado e não a obrigação da prestação de serviço de acordo com os meios de produção.
Todavia, vale ressaltar que, muito embora seja uma tendência natural, não há generalização dessa integração de novos modelos, como o teletrabalho, em todo o mundo e em todos os setores. Inclusive, por terem setores de produção que não podem absorver tal tipo de mão de obra pela própria essência das atividades desenvolvidas pela empresa que necessitam de prestação pessoal e continuada de trabalho na sua estrutura física. Além da crise pela qual vem passando o conceito tradicional de subordinação.
O que se percebe é que características que anteriormente se faziam presentes apenas nos empregados ocupantes de cargos de confiança e gerência, como autonomia funcional, a responsabilidade e o compartilhamento dos objetivos empresariais, passaram a ser exigidas de todos os trabalhadores inseridos nesse sistema produtivo atual.
Pode-se afirmar que o aumento da qualificação profissional gera maior autonomia operacional, e essa autonomia gera maior responsabilidade pelos riscos. È preciso estar atento para a caracterização nessa relação de emprego, situada nesse novo sistema produtivo, para que o trabalhador não reste prejudicado com a responsabilidade com os riscos assumidos.
O traço comum do novo sistema produtivo, no qual o homem é um prestador de serviços, e não mais apenas mão de obra desqualificada, é a aposta na capacidade pessoal desse homem, como fator de produtividade e de geração de riquezas para o empregador. Assim, este confere ao empregado uma autonomia que lhe permite exprimir o seu talento, sem, contudo, deixar de exercer o seu poder de empregador, salvaguardando o essencial, ou seja, o domínio do empregador sobre os frutos do trabalho do empregado.
Assim, o que se percebe é uma alteração salutar na configuração de outrora no que tange à mão de obra. Na atualidade há a predominância da qualificação, há a busca por empregados expertos em áreas específicas do conhecimento. Tendência que tende a se intensificar, ainda mais, com o passar dos anos.
2.5.2. As formas de poder segundo Max Weber como elemento subjetivo presente nas relações de emprego. Consequências
Percebe-se que, na maioria dos sistemas jurídicos há a discussão doutrinária e tentativa de delimitação dos contornos informativos do que vem a ser uma relação empregatícia. Isso é verificado, por exemplo, na Itália, na Espanha e em Portugal.
O Codice Civile italiano, em seu art. 2.094 prevê: “E prestatore di lavoro subordinato chi si obbliga mediante retribuzione a collaborare nell'impresa, prestando il proprio lavoro intellettuale o manuale alle dipendenze e sotto la direzione dell'imprenditore (2239)[4].”
Na Espanha no Real Decreto Legislativo 1/1995, conhecido como Estatuto de los Trabajadores, prevê que: “1. La presente Ley será de aplicación a los trabajadores que voluntariamente presten sus servicios retribuidos por cuenta ajena y dentro del ámbito de organización y dirección de otra persona, física o jurídica, denominada empleador o empresario[5].”
Em Portugal, no seu Código do Trabalho artigo 11º, a definição tende a ser bastante semelhante: “Contrato de trabalho é aquele pelo qual uma pessoa singular se obriga, mediante retribuição, a prestar a sua actividade a outra ou outras pessoas, no âmbito de organização e sob a autoridade destas.”
O que se verifica, da leitura das letras de Lei supra, é que, alteram-se os aspectos jurídicos, sociais e culturais de cada país, responsáveis pela suave alteração nos conceitos definidores. Contudo, a noção de subordinação é imprescindível a qualquer sistema. E, dentro dela, quase que em simbiose, encontra-se integrado o elemento poder.
O poder é estudado pelas mais variadas Ciências. Seja na Política, na Filosófica, na Sociologia ou no Direito, o que se verifica é um traço característico e similar dado a este elemento, mesmo que seja explorado com enfoques diferentes em cada Ciência. O que se percebe é que o poder é sempre empregado como autorização para dar ordens, mandar, deliberar. Tal fato justifica-se pelo fato de o poder ser derivado das relações sociais e por elas explorado.
Para que haja a exteriorização do poder necessário se faz a presença de uma relação bilateral, ou seja, surge da/numa relação de vontades, na qual, uma prevalece. Daí a interligação direta com o Direito do Trabalho, tendo em vista ser a relação de emprego, e, mais especificamente a subordinação jurídica, criados sob o prisma da bilateralidade, do acordo de vontades. É o que afirma Gabriel Chalita:
“Por ocorrer em circunstâncias que variam quase ao infinito, o poder não é um fenômeno que se preste facilmente a classificações ou regras explicativas. Contudo, há duas características comuns a qualquer tipo de poder:
1. O poder é sempre um fenômeno social.
2. O poder é sempre bilateral: surge da relação entre vontades, na qual uma prevalece.
O poder jamais é explicado através de simples considerações de fatores individuais. Ele não é concebido senão no âmbito social, e isso evidencia sua primeira característica apontada, a sociabilidade.
Outra característica é a bilateralidade, da qual é interessante expor mais detalhes. O poder é sempre a correlação entre duas ou mais vontades. Para existir, necessita de vontades submetidas. O poder não é uma coisa, e sim uma relação; não existe senão na medida em que há dominação e influencia. Não se pode afirmar que alguém “tem poder” sem relacioná-lo com uma situação, sem confrontá-lo com algo.” (CHALITA, 20025, pg. 22)
No ramo da Sociologia, diversos estudiosos se prestaram a analisar o fenômeno do poder sob diversos enfoques, dentre eles, Max Weber (1991, p. 33), que conceitua o poder como “toda probabilidade de impor a vontade numa relação social, mesmo contra resistências, seja qual for o fundamento dessa probabilidade.”
Para este sociólogo, há a existência de três tipos puros ou ideais de poder: o poder legal, o poder tradicional e o poder carismático. Todos, ao serem aplicados corretamente, e, às vezes, de modo concomitante, seriam aptos à dominação.
O poder legal seria resumido como:
“Dominação Legal (onde qualquer direito pode ser criado e modificado através de um estatuto sancionado corretamente), tendo a “burocracia” como sendo o tipo mais puro desta dominação. Os princípios fundamentais da burocracia, segundo o autor são a Hierarquia Funcional, a Administração baseada em Documentos, a Demanda pela Aprendizagem Profissional, as Atribuições são oficializadas e há uma Exigência de todo o Rendimento do Profissional. A obediência se presta não à pessoa, em virtude de direito próprio, mas à regra, que se conhece competente para designar a quem e em que extensão se há de obedecer. Weber classifica este tipo de dominação como sendo estável, uma vez que é baseada em normas que, como foi dito anteriormente, são criadas e modificadas através de um estatuto sancionado corretamente. Ou seja, o poder de autoridade é legalmente assegurado.” (WILD, Bianca. Disponível em: <http://meuartigo.brasilescola.com/sociologia/os-tipos-dominacao-segundo-max-weber.htm>. acesso em 05 de maio de 2013, às 19:21)
Já a dominação pautada no poder tradicional, como o próprio título enuncia, representa a sujeição com bases nos contextos culturais e sucessórios de poder, um traço de tradicionalismo típico da Idade Média. Observe:
“Dominação Tradicional (onde a autoridade é, pura e simplesmente, suportada pela existência de uma fidelidade tradicional); o governante é o patriarca ou senhor, os dominados são os súditos e o funcionário é o servidor. O patriarcalismo é o tipo mais puro desta dominação. Presta-se obediência à pessoa por respeito, em virtude da tradição de uma dignidade pessoal que se julga sagrada. Todo o comando se prende intrinsecamente a normas tradicionais (não legais) ao meu ver seria um tipo de “lei moral”. A criação de um novo direito é, em princípio, impossível, em virtude das normas oriundas da tradição. Também é classificado, por Weber, como sendo uma dominação estável, devido à solidez e estabilidade do meio social, que se acha sob a dependência direta e imediata do aprofundamento da tradição na consciência coletiva.” (WILD, Bianca. Disponível em: <http://meuartigo.brasilescola.com/sociologia/os-tipos-dominacao-segundo-max-weber.htm>. acesso em 05 de maio de 2013, às 19:21)
No que tange ao poder carismático,
“Dominação Carismática (onde a autoridade é suportada, graças a uma devoção afetiva por parte dos dominados). Ela assenta sobre as “crenças” transmitidas por profetas, sobre o “reconhecimento” que pessoalmente alcançam os heróis e os demagogos, durante as guerras e revoluções, nas ruas e nas tribunas, convertendo a fé e o reconhecimento em deveres invioláveis que lhes são devidos pelos governados. A obediência a uma pessoa se dá devido às suas qualidades pessoais. Não apresenta nenhum procedimento ordenado para a nomeação e substituição. Não há carreiras e não é requerida formação profissional por parte do “portador” do carisma e de seus ajudantes. Weber coloca que a forma mais pura de dominação carismática é o caráter autoritário e imperativo. Contudo, Weber classifica a Dominação Carismática como sendo instável, pois nada há que assegure a perpetuidade da devoção afetiva ao dominador, por parte dos dominados.” (WILD, Bianca. Disponível em: <http://meuartigo.brasilescola.com/sociologia/os-tipos-dominacao-segundo-max-weber.htm>. acesso em 05 de maio de 2013, às 19:21)
Salienta-se que os tipos de poder apresentados por Max Weber sempre existiram na sociedade, e, tranquilamente, sempre existirão. Contudo, para as relações laborais, essencialmente, no que diz respeito ao contrato de trabalho, verifica-se que no curso da história tais relações já permearam os diversos tipos de poder elencados por Max Weber. Hoje, sabidamente o predominante seria o poder legal, vez que o obreiro se sujeita ao poder empregatício[6] do empregador por uma relação pautada na Lei. Muito embora, também, venha sofrendo alterações salutares frente à flexibilização das normas trabalhistas.
Maurício Godinho Delgado traz importante contribuição quando afirma que,
“No contexto empregatício manifesta-se uma das dimensões mais importantes do fenômeno do poder no mundo contemporâneo. De fato, ao se saber que a relação de emprego constitui a relação de trabalho mais significativa do sistema econômico ocidental inaugurado há pouco mais de duzentos anos, depreende-se a relevância que tem, para a própria compreensão da atual sociedade, o conhecimento acerca do fenômeno do poder empregatício. Na verdade, essa dimensão específica do poder sofre os efeitos da configuração global do fenômeno no conjunto da sociedade (o contexto democrático ou autoritário mais amplo da sociedade influi na estrutura e na dinâmica do poder internas ao estabelecimento e à empresa). Do mesmo modo, o tipo de configuração do poder empregatício também cumpre importante papel no avanço e solidificação do processo democrático (ou autoritário) no conjunto mais amplo da sociedade envolvida.” (GODINHO, 2007, p. 630-631)
Na atualidade, os conceitos de liberdade e de voluntariedade são vistos sobre diferentes aspectos. Numa relação de emprego o elemento voluntariedade pode estar configurado, já que o trabalhador tem a “possibilidade” de aceitar, ou não, os termos do contrato. No entanto, na prática, por existir uma dependência econômica, muitas vezes o mesmo trabalhador se encontra em situação de crise, e não tem a “real possibilidade” de ajustar, nos termos mais justos, o contrato de emprego do qual será sujeito. Observa-se nesses casos, a “voluntariedade”, mas não a “liberdade real” de escolha.
Vale registrar que, antigamente, a forma mais comum de exteriorização do poder era a força, era por meio da violência que se firmavam as bases do poder. O poder era opressor e agressivo. Atualmente, esse mesmo poder, transmutou-se para a noção de disciplina, hierarquia[7], sendo visto como uma das modalidades de controle do empregador em face do empregado. É o que se entende por poder empregatício. Traço característico das atuais relações de emprego, tendo em vista a subordinação legal do empregado ao seu patrão.
A legislação, inclusive, cuida de estabelecer premissas para o poder empregatício do empregador, como por exemplo, no artigo 482 da CLT, que prevê os casos em que o empregador poderá ver por rescindido o contrato de trabalho por falta grave cometida pelo obreiro, bem como, criações costumeiras e válidas, tendo em vista ser o costume fonte do Direito do Trabalho, como por exemplo, as advertências.
2.5.4. Limitações ao poder empregatício
Da mesma forma, a Lei busca limitar o poder empregatício trazendo regramentos que brequem possíveis excessos do empregador. Isso tudo em razão de ser o princípio da proteção o pilar estrutural do Direito do Trabalho, justificado em razão do contexto histórico do seu surgimento, que, diga-se de passagem, comumente revela-se de uso atual.
Entre as proteções concedidas ao obreiro citam-se os princípios que “traduzem, de maneira geral, a noção de proposições fundamentais que se formam na consciência das pessoas e grupos sociais, a partir de certa realidade, e que, após formadas, direcionam-se à compreensão, reprodução ou recriação dessa realidade.” (DELGADO, 2007, p. 184).
O princípio da proteção, segundo Roberto Saraiva, é resumido como,
“(…) sem dúvida, o de maior amplitude e importância no Direito do Trabalho, consistente em conferir ao pólo mais fraco da relação laboral, o empregado, uma superioridade jurídica capaz de lhe garantir mecanismos destinados a tutelar os direitos mínimos estampados na legislação laboral vigente.
O princípio protetivo desmembra-se em outros três, a saber:
–Princípio do in dúbio pro operário – induz o intérprete, ao analisar um preceito que disponha regra trabalhista, a optar, dentre duas ou mais interpretações possíveis, pela mais favorável ao empregado.(…)
–Princípio da aplicação da norma mais favorável – aplica-se a norma mais favorável ao trabalhador, independentemente de sua posição na escala hierárquica.(…)
-Princípio da condição mais benéfica – determina que as condições mais vantajosas estipuladas no contrato de trabalho do obreiro ou mesmo as constantes no regulamento da empresa prevalecerão, independentemente da edição de norma superveniente dispondo sobre a mesma matéria, estabelecendo nível protetivo menor.
A nova regra jurídica criada somente produzirá efeitos para os novos contratos de trabalho a serem firmados.” (SARAIVA, 2009, p. 19)
Para Maurício Godinho Delgado,
“Informa este princípio que o Direito do Trabalho estrutura seu interior, com suas regras, institutos, princípios e presunções próprias, uma teia de proteção à parte hipossuficiente na relação empregatícia – o obreiro -, visando retificar (ou atenuar), no plano jurídico, o desequilíbrio inerente ao plano fático do contrato de trabalho.” (DELGADO, 2007, p. 197)
Alice Monteiro de Barros (2003, p. 141) informa que há princípios que são peculiares ao Direito do Trabalho e que se demonstram salutares ao seu regular desenvolvimento, especialmente para efetivar o escopo fundamental desta Ciência que é assegurar a aplicação da justiça às relações laborais. São eles, princípio da proteção, da primazia da realidade, da irrenunciabilidade, da boa-fé e da razoabilidade.
Salienta-se que tais princípios representam limitações ao poder empregatício ou intra-empresarial do empregador. Sendo importantíssimos para dar efetividade ao Direito do Trabalho.
Além dos princípios, que são verdadeiras regras jurídicas, a limitação ao poder exercido pelo obreiro encontra fundamento na Constituição Federal de 1988, nas normas elaboras pela Organização Internacional do Trabalho (OIT), nas normas previstas na Consolidação das Leis do Trabalho – CLT (como, por exemplo, o artigo 483 que dá direito ao empregado de ver rescindido o contrato de trabalho por culpa exclusiva do empregador), em leis esparsas, bem como, nos costumes, regulamentos de empresa, convenções e acordos coletivos.
Alice Monteiro de Barros coaduna do pensamento informado:
“Sob o pretexto de dirigir a empresa, e, em consequência, de impor sanções ao trabalhador, o empregador não poderá desconhecer direitos básicos do empregado previstos na legislação trabalhista e previdenciária, nas normas coletivas, no regulamento interno das empresas, no contrato individual de trabalho, e, principalmente, na Constituição, onde estão inseridos os direitos fundamentais, cerne do ordenamento jurídico e cuja existência está calcada na dignidade humana, vista como “um ente da razão que basta-se a si mesma”. A dignidade humana é um valor superior que deverá presidir as relações humanas, entre as quais as relações jurídico-trabalhistas”. (BARROS, 2013, p. 487-488)
Não por outro motivo, cada vez com maior frequência, a Justiça do Trabalho tem sido acionada no intuito de coibir os abusos cometidos pelos empregadores. O que se verifica é que, muito embora seja necessária a presença do poder empregatício para regular a relação laboral, diametralmente em situação oposta, e não menos necessária, encontram-se os direitos mínimos assegurados ao empregado. Essencial a existência do binômio a fim de que as relações laborais fluam de acordo com os preceitos normativos vigentes.
2.6. A crise do conceito tradicional de subordinação
De tudo quanto exposto até o momento, é possível verificar que a crise do conceito clássico (ou tradicional) de subordinação deriva, inevitavelmente, da interdisciplinaridade de diversos aspectos, como social, político e econômico. Aspectos relevantes, tendo em vista ser o Direito fato social.
A eminente jurista Lorena Vasconcelos Porto contribui informando que tal crise tem sido sentida e objeto de estudo da maior parte da doutrina, afirmando que:
“Vários autores afirmam a crise da subordinação como categoria jurídica, argumentando que ela perdeu seu valor qualificador, pois que, frente á complexa e diversificada realidade do mundo do trabalho na atualidade, esse conceito mostra-se incapaz de desempenhar o papel de inclusão e exclusão do campo de aplicação do Direito do Trabalho”. (PORTO, 2009, p. 86)
Amauri Mascaro Nascimento, tomando como premissas de estudo o Direito Italiano, traz importante contribuição para o fenômeno da crise da subordinação como elemento caracterizador da relação de emprego:
“Deparam-se, os juristas italianos, e principalmente a jurisprudência, com dificuldade para saber, em diversos casos, concretamente, em que consiste a subordinação, a tal ponto que as diversas concepções surgiram, tomando por base um determinado aspecto, a ponto de Luisa Galantino dizer que a noção de subordinação é múltipla, confusa e contraditória, exigindo um trabalho de reconstrução que não é fácil para o intérprete, no direito italiano, a pluridirecional da multiplicidade de definições diferentes”. (NASCIMENTO, 2007, p. 465)
É latente a verificação de que o conceito clássico de subordinação, pautado na teoria da vinculação jurídica, não se mostra suficiente, como alhures, para delimitar o fenômeno da relação de emprego, dissociando-o de outras relações não amparadas pelo Direito do Trabalho.
Os avanços tecnológicos, a busca pela qualificação e especialização, a alteração nas estruturas empresariais, o uso da telemática, informática e meios avançados de telecomunicação foram importantes para que ocorressem os avanços sociais que culminaram no surgimento de novas formas de prestação de serviço, como por exemplo, a valorização do trabalho em domicílio sob novos contornos, o desenvolvimento do teletrabalho, a contratação por meio de terceirização, a contratação de profissionais liberais, artísticos e vendedores.
De fato, e isso se encontra pacificado na doutrina, o elemento subordinação jurídica não tem sido apto a tutelar todas as relações laborais como outrora, os empregos situados na “zona grise” tem crescido cada vez mais. Todavia, é de ressaltar que tais formas de contratação ainda não são dominantes no mercado de trabalho. O elemento caracterizador da relação de emprego não pode ser abandonado, pois, é suficiente na em muitos casos, daí a necessidade de uma reconstrução doutrinária dos seus contornos.
É em razão dessa preocupação que surgem diversos estudos voltados a atualizar e trazer segurança às relações de trabalho. A doutrina, em sua posição majoritária, tem pacificado a ideia central de que o conceito de subordinação deve sofrer modificações tendentes a ampliar o seu alcance. Visam, com isso, evitar que a subordinação como elemento caracterizador da relação de emprego perca o seu valor e essência. Daí surgirem teorias como da subordinação objetiva, estrutural, integrativa, reticular e potencial, pormenorizadas neste mesmo capítulo.
Ademias, também merecendo menção a parassubordinção, criação doutrinária de origem italiana, que preconiza uma mutação do conceito de subordinação, erigindo-a a feições de coordenação.
Contudo, há de ressaltar a existência de posições minoritárias da doutrina que buscam erigir critério diverso da subordinação como elemento caracterizador da relação de emprego, informando que o atual panorama do mercado de trabalho, bem como a sua tendência futura apontam para que as novas formas de trabalho tornem dominantes entre os tipos de contratação. Em razão disso, voltam suas análises para outros elementos acreditando serem suficientes a informar os atuais contornos da relação de emprego. Tudo no intuito de ofertar segurança aos empregados e efetivar a aplicação das normas de Direito do Trabalho.
Exemplo disso é o trabalho científico do jurista Murilo Carvalho Sampaio Oliveira, intitulado de “A RESSIGNIFICAÇÃO DA DEPENDÊNCIA ECONÔMICA”, no qual propõe que seja a dependência econômica o traço característico da relação de emprego abandonando-se o posicionamento consolidado de ser a subordinação jurídica o elemento caracterizador desta. Pois, informa, que, no cenário atual, quanto maior a dependência e vinculação econômica do empregado para com o empregador, mais caracterizado estaria o vínculo de emprego. Logo, por óbvio, quando menor esta dependência, maior autonomia haveria nas relações laborais, o que desvincularia a tutela desse trabalhador do Direito do Trabalho.
Como repisado, a situação tente a culminar numa alteração salutar do modo de pensar da dicotomia tradicional de trabalho subordinado e trabalho autônomo. Contudo, somente o tempo, com o excelente trabalho da jurisprudência pátria e dos doutrinadores será responsável pela sedimentação e orientação do que, de fato, predominará.
3. Novas perspectivas da subordinação
3.1. Introdução
A crise do conceito tradicional de subordinação jurídica. Essencialmente fundada nas alterações sociais e econômicas. De fato, respaldam um repensar nas relações de emprego tais quais como estabelecidas classicamente.
O surgimento de novas formas de emprego, situadas numa “zona grise” de classificação fizeram com que os doutrinadores voltassem-se para o estudo de tal fenômeno. Importantíssimo, tendo em vista ser a subordinação o atual objeto do Direito do Trabalho.
No presente capítulo buscar-se-á apresentar as principais tendências doutrinárias e jurisprudenciais que estão surgindo tentando reestruturar o fenômeno da subordinação. Para tanto, inicialmente se faz necessário apresentar a distinção clássica, originalmente proposta pelo Direito Italiano, de trabalho autônomo e trabalho subordinado. Para, a posteriori, aprofundar acerca das principais teorias existentes e seus adeptos.
3.1Diferenciação entre trabalho autônomo e trabalho subordinado[8]
É de ressaltar que a tradicional divisão em trabalho autônomo e trabalho subordinado é de origem italiana, tendo suas premissas instauradas sob os contornos do Direito do Trabalho italiano. Contudo, sendo adotada pelas mais diversas legislações trabalhistas ao redor do mundo, inclusive no Brasil. Atualmente, sendo a macrodivisão mais comum de aferição para se verificar se determinado trabalhador encontra-se tutelado pelo manto protetivo do Direito do Trabalho ou por norma diversa.
Classicamente, o trabalho autônomo é conceituado como aquele pelo qual o trabalhador explora a própria força de trabalho, exercendo a atividade por conta própria.
Délio Maranhão coaduna do mesmo entendimento, informando que
“Trabalhador autônomo é o que exerce, habitualmente e por conta própria, atividade profissional remunerada. Não é empregado. A autonomia da prestação de serviço confere-lhe uma posição de empregador em potencial: explora, em proveito próprio, a própria força de trabalho.” (MARANHÃO, 1992, p. 51)
Para Paulo Emílio Ribeiro de Vilhena (2005, p. 531), “autônomo é o trabalhador que desenvolve sua atividade com organização própria, iniciativa e discricionariedade, além da escolha do lugar, do modo, do tempo e da forma de execução.”
Em artigo publicado na Revista Âmbito Jurídico, intitulado de “Trabalho Autônomo”, verifica-se que,
“Antonio Palermo, citado por Paulo Emílio Ribeiro Vilhena, qualifica o trabalho autônomo sob a suposição da individualidade, que no seu pensar se desdobra pelos seguintes fundamentos:
a) liberdade de organização e de execução do próprio trabalho, ou seja, o trabalhador autônomo pode utilizar-se de substitutos ou ainda de auxiliares;
b) liberdade de disposição do resultado do próprio trabalho, sobre a livre base do contrato de troca, vale dizer: não aliena a sua atividade, na medida em que ele labora por conta própria, podendo se assim estiver acordado, alienar o próprio resultado trabalho, ao contrário do trabalho subordinado em que o prestador exerce uma atividade para outrem, alienando a força de trabalho, ou seja, pondo à disposição de outra pessoa a sua atividade sem assumir os riscos tendo assim que se sujeitar às sanções que o credor entenda que devam ser aplicadas, sempre que venha violar os deveres impostos pela relação laboral submetendo-se, portanto, ao poder de direção empresarial, inclusive no aspecto disciplinar;
c) autonomia do prestador da obra no duplo sentido: liberdade de vínculo de subordinação técnica, na medida em que a prestação de trabalho é fruto de uma manifestação da capacidade profissional ou artística individual e econômica, considerando que o trabalhador assume o risco do próprio trabalho, sofrendo eventualmente seus riscos”. (Trabalho Autônomo. Disponível em; <https://www.ambito-juridico.com.br/pdfsGerados/artigos/4755.pdf>. acesso em 05 de maio de 2013, às 18:35)
Já para Alice Monteiro de Barros,
“O trabalho autônomo, por faltar-lhe o pressuposto da subordinação jurídica, está fora da égide do Direito do Trabalho. No trabalho autônomo, o prestador de serviços atua como patrão de si mesmo, sem submissão aos poderes de comando do empregador, e, portanto, não está inserido no círculo diretivo e disciplinar de uma organização empresarial. O trabalhador autônomo conserva a liberdade de iniciativa, competindo-lhe gerir sua própria atividade e, em consequência, suportar os riscos daí advindos”. (BARROS, 2013, p. 173)
A mesma Autora, citando aplicação prática do conceito doutrinário de trabalhador autônomo, cita jurisprudência do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região, informando que:
É trabalhador autônomo aquele que, contratado por tarefa, presta serviço de motoqueiro entregador, com liberdade para definir quando e onde trabalhar. Autodeterminação que repele a noção de subordinação própria e indispensável a configuração do vínculo de emprego com o tomador do serviço. TRT 4ª Região – RO-00395.001/97-8 – AC. 6ª T. – 6.12.01 ´Rel.: Juiz Milton Varela Dutra – Revista LTr 66-08/994. (BARROS, 2013. p. 173)
O magistrado Sergio Pinto Martins (2005, p. 345), acentua que “o prestador de serviços será necessariamente uma pessoa física e o tomador dos serviços uma pessoa física ou jurídica", pondera, com razão, que a subordinação, que existe na relação de emprego, "não existe na relação do trabalhador autônomo com o tomador dos serviços".
É de mencionar que a influência da macrodivisão apresentada pelo Direito Italiano influenciou a Lei Federal de nº 8.212 de 1991, que dispõe sobre a organização da Seguridade Social, informando no seu artigo 12, III, “a”, ser autônomo “a pessoa física que exerce, por conta própria, atividade econômica de natureza urbana, com fins lucrativos ou não.”
Todavia, é de registrar a crítica feita por parte de diversos doutrinadores para o sobredito conceito, tendo em vista o trabalho autônomo não ser somente exercido no âmbito urbano. Pacificamente é conhecido o exercício de trabalhadores autônomos em ambiente rural, como por exemplo, engenheiros agrônomos, veterinários e treinadores de animais.
Dos conceitos supramencionados constata-se que o traço característico do trabalho autônomo é, justamente, a ausência de subordinação ao credor do labor. Por sua vez, diametralmente oposto ao conceito de trabalho subordinado, vez que este, traz consigo enraizada a ideia de subordinação ao empregador.
O requisito da subordinação, inclusive, tem escopo na própria legislação trabalhista vigente. Vez que, no art. 3º da CLT[9] há expressa menção à necessidade de “dependência”, e, neste tocante leia-se subordinação, do empregado ao empregador.
Para Amauri Mascaro Nascimento (2007, p. 464), o trabalho subordinado “é aquele no qual o trabalhador volitivamente transfere a terceiro o poder de direção sobre o seu trabalho, sujeitando-se como consequência ao poder de organização, ao poder e controle e ao poder disciplinar deste.”
Continua o estudioso (2007, p. 460), informando que “o trabalho subordinado pode ser típico e atípico. Subordinado típico é o empregado, definido pelo nosso direito como pessoa física que presta serviços de natureza não-enventual a empregador, sob a dependência deste e mediante salário.”
Frisa-se que o que caracteriza a relação de emprego é a subordinação, mas, esta também se encontra presente em outras formas de relação de trabalho, como o eventual, por exemplo. Em razão disso, nota-se que o que caracteriza essa subordinação é o “modo como o trabalho é prestado e não a forma como é denominada a atividade profissional.” (NASCIMENTO, 2007, p. 460)
Desse modo, o que se conclui é que o conjunto no qual se manifesta a relação de trabalho ou emprego, tomando como espeque o modo como o labor é prestado é que determinará a subsunção ao conteúdo normativo de uma ou outra relação. E, a partir de então, será possível enquadrar o obreiro em uma ou outra categoria.
Informa-se que, muito embora a macrodivisão em trabalho autônomo e subordinado tenha suas origens no Direito Italiano, é preciso mencionar que suas reminiscências históricas são de origem romana, com as figuras da locatio operum e da locatio operaris. Sendo que este corresponderia ao contrato de trabalho autônomo, enquanto aquele ao trabalho subordinado. (NASCIMENTO, 2007, p. 461)
Por locatio operarium, o que se leva em consideração é a prestação de serviço. É o colocar-se a disposição de uma outra pessoa, por certo período e mediante remuneração. É de relevância apenas a prestação de serviços propriamente dita. Para a locatio operaris, o resultado pronto é o que interessa, não havendo relevância o modo como foi feito.
A fim de fundamentar a macrodivisão existente (entre trabalho autônomo e subordinado), a doutrina, tanto pátria como estrangeira, produziu diversas teorias explicativas. Todas no intuito de ofertar maior segurança aos operadores do Direito, e, especialmente, aos sujeitos da relação jurídica laboral, pois, alvo direto da mencionada macrodivisão. Diante disso, serão destacadas no decorrer do trabalho as de maior relevância.
Como salientado, a Lei Federal nº. 8.212/1991 – Lei de Organização da Seguridade Social – recebeu influência direta da dicotomia que ora se pormenoriza. Essencialmente influenciada, diga-se de passagem, pela doutrina espanhola, representada por Manuel Alonso Olea e Manuel Alonso Garcia que informam que o trabalho produtivo livre divide-se em trabalho por conta própria e trabalho por conta alheia. Sendo que o primeiro considera a subordinação “não definidora do contrato de trabalho” porque aparece em outros tipos de contrato bastando haver uma hierarquia organizada. Acentua que somente o trabalho por conta alheia seria interessante para o estudo, por importar-se com a disposição dos produtos ou resultados. (NASCIMENTO, 2007, p. 461)
De importante menção, também, encontra-se a Teoria do Risco, na qual aponta como traço distintivo entre o trabalho autônomo e o subordinado a assunção pelos riscos do negócio. Logo, aquele que, prestando o serviço, assume os riscos de sua atividade seria enquadrado como autônomo. Do contrário, seria empregado subordinado.
Contudo, a crítica que se faz a mencionada teoria repousa no fato de que, atualmente, verifica-se a tendência à flexibilização das normas trabalhistas verificadas em situações peculiares autorizadas pela lei ou produzidas em decorrência do Direito Coletivo do Trabalho. Assim, em muitos casos, tem-se verificado que, mesmo claramente caracterizado o vínculo laboral, o empregado tem se responsabilizado pelos riscos do empreendimento, como por exemplo, redução do trabalho e do salário em razão da conjuntura econômica, muito embora seja expresso no artigo 2º da CLT[10] que o empregador é o responsável pela álea do negócio.
Em função da fragilidade das teorias mencionadas surgiram outras, também tentando explicar a diferenciação entre trabalho autônomo e subordinado, como é o caso da Teoria do Resultado do Trabalho e da Determinação e Indeterminação Prévia. Pela primeira:
“(…) se imediato, isto é, se o trabalhador tem o resultado primeiro e fica com o que produz, será autônomo, se mediato, ou seja, se o trabalhador aliena o que faz apenas recebendo um preço ou pagamento, será subordinado, critério que, se apresenta alguma correspondência com a divisão dos contratos férias de atividade e de resultado, não é suficiente para explicar todo o quadro do nosso problema, no qual encontramos empregados “por obra certa” etc. [sic] (NASCIMENTO, 2007, p. 462)
Já pela segunda: “Da teoria da determinação ou indeterminação prévia das prestações singulares, sendo autônomo aquele e subordinado este, segundo o tipo de trabalho.” (NASCIMENTO, 2007, p. 463)
Também é de ressaltar a Teoria da Relação entre o Trabalho e a Remuneração. Pela qual se o labor for o alvo da remuneração tem-se trabalho subordinado. Caso seja o resultado o alvo da remuneração tem-se trabalho autônomo.
O que se conclui, a partir da análise das teorias supramencionadas, é que, conforme preconizou Amauri Mascaro Nascimento, o que seria de salutar importância para uma diferenciação próspera entre trabalho autônomo e subordinado seria o modo como a prestação de serviço se desenvolve. Tal critério é o unicamente apto a tutelar os diferentes casos concretos submetidos à jurisdição trabalhista, eis que impregnados de indícios fáticos de subordinação somente aferidos a partir de uma análise individualizada. Trazendo, consequentemente, segurança jurídica ao trabalhador, evitando com isso, divergência em julgados, nos quais, matéria idêntica seria analisada.
3.2. As novas perspectivas doutrinárias para a subordinação como elemento caracterizador da relação de emprego
Não há como afastar o elemento subordinação para a caracterização da relação de emprego. Pois, não há nada que substitua a noção de subordinação como objeto da Ciência do Direito do Trabalho. Inclusive, pela eficácia que tal elemento demonstrou e demonstra ao longo do tempo.
Inegavelmente, é sentida a crise que pela qual o conceito vem passando. Contudo, pelo menos por enquanto, o que se percebe é que as construções doutrinárias, em sua grande maioria, apontam para uma reestruturação do conceito de subordinação como núcleo central da relação de emprego, em sua maioria considerando os conceitos de coordenação e parassubordinação. De veras que se encontrem posições minoritárias, direcionadas à substituição da subordinação como elemento caracterizador da relação de emprego. Todavia, ainda não gozam da necessária aceitação apta a gerar uma mudança de paradigmas.
Às principais Teorias acerca do repensamento da subordinação como elemento caracterizador da relação de emprego que se dedicam nos tópico seguinte.
3.2.1. Reconstrução da doutrina da Teoria da Subordinação – métodos para explicação do fenômeno da subordinação
É de salientar que os doutrinadores da seara trabalhista italiana tem sido os mais preocupados com o fenômeno da crise da subordinação clássica. Em razão disso, tem se utilizado, predominantemente, de dois métodos para estruturarem suas teorias. São eles:
“(…) método silogístico, pelo qual tentam construir um conceito abstrato de trabalho subordinado e de trabalho autônomo, nem sempre adaptável à variedade de situações reais, próximo, portanto, da noção tradicional de subordinação como um conceito unitário compreensivo de todas as situações reais, o que hoje é rejeitado pela doutrina e deixa a jurisprudência em dificuldade. O citado método parte da norma na qual procura, porém com dificuldade, encontrar justificativa para enquadrar na subordinação todas as realidades concretas do mundo multiforme da relação de emprego. A premissa é um conceito de subordinação aplicável a todas as relações de emprego, da qual, dedutivamente, chegar-se-ia à realidade. Esse método, para Perone, é um retardamento na compreensão dos fenômenos evolutivos que se manifestam e um freio às tendências expansionistas das relações de trabalho.
Outros seguem o método substantivo ou tipológico ou o raciocínio por aproximação, diante dos tipos sociológicos diversificados de relação de trabalho que gravitam dentro ou em torno da relação de emprego. Esse método reconhece que há elementos de caracterização presentes em um tipo e ausentes em outro tipo de trabalho, como no trabalho na empresa, no trabalho em domicílio, no trabalho doméstico, no trabalho desportivo, cujos traços distintivos impedem uma conceituação abrangente, renuncia a uma qualificação típica e genérica de trabalho subordinado e admite que as situações fáticas não são idênticas, no que é mais sincero que o método genérico e silogístico; tem em conta que algumas características do tipo legal, em cada caso concreto, podem estar presentes de modo mais ou menos intenso e relevante. Esse método, todavia, não é, para Perone, isento de crítica, “a começar pela arbitrariedade do critério com o qual o tipo resultante da definição legal é sustituído por outro resultante da realidade social”, advertindo que os conceitos de autonomia e subordinação deem ter uma configuração jurídica definida e certa”. [sic] (NASCIMENTO, 2007, p. 466)
O que se observa é que o método silogístico foi utilizado, essencialmente, para a estruturação do conceito clássico de subordinação. Ou seja, verificou-se a inserção de um conceito subjetivo e abstrato, nos quais os casos concretos deveriam se adequar. Contudo, na atual crise pela qual passa a Teoria da Subordinação Jurídica, predomina, no esforço doutrinário que vem sendo feito, a aplicação do método tipológico em razão das alterações sociológicas das condições e modo de prestação do trabalho e do próprio ambiente laboral.
3.2.2. Principais teorias de reconstrução do conceito de subordinação
Tomando por base os métodos apresentados, os doutrinadores, especialmente os italianos, buscaram procurar soluções eficazes para a crise da subordinação jurídica. Assim, desenvolveram teorias que apontam a nova direção que a Ciência do Direito do trabalho deve seguir. Pois, indiscutivelmente, a tendência que se observa é a de ampliação de trabalhadores que se situam em numa “zona grise” diante da clássica macrodivisão existente entre trabalho autônomo e subordinado.
O que se verifica é a preocupação em oferecer tutela aos trabalhadores. Sem, contudo, deixar de levar em consideração as atuais alterações sociais. Estas, de salutar importância, tendo em vistas as necessidades de mercado que surgem, e que, muitas vezes, entram em confronto com os regramentos trabalhistas. Daí ser apontada, por muitos estudiosos, a tendência à flexibilização das normas trabalhistas.
É de ressaltar que a flexibilização leva em consideração uma alteração social necessária entre a noção cultural e jurídica de empregado e empregador. Não se admitindo disparidade entre estes, tendo em vista serem o aspecto subjetivo das relações de trabalho. Com a possibilidade de flexibilização, as partes do contrato poderiam alterá-lo, tudo no intuito do progresso e do desenvolvimento do mercado, sem, contudo, desrespeitarem o mínimo essencial e apto a resguardar a dignidade do obreiro previsto nas regras de Direito do Trabalho.
Amauri Mascaro Nascimento, em sua obra “Curso de Direito do Trabalho” referenciada, preconiza a existência de quatro propostas atuais a fim de reexplicarem a subordinação jurídica. São elas: heterodireção; coordenação; trabalho sem adjetivação; e, parassubordinação.
Na heterodireção tem-se como elemento central da relação de emprego o poder de direção do empregador. Informa o mencionado autor que Vallebona, eminente doutrinador italiano,
“(…) elege a heterodireção da atividade como característica essencial do trabalho subordinado, no sentido de a prestação do trabalho deve ser desenvolvida pelo modo imposto pelo empregador, mediante ordens que o empregado é obrigado a respeitar, advertindo, no entanto, que a heterodireção muda de aspecto na conformidade do tipo de função, não sendo igual a que está sujeito um médico empregado e um operário empregado, mostrando, também, que não é esse dado o único ou essencial para distinguir o trabalho subordinado do autônomo, diante da subsidiariedade de outros critérios elaborados pela doutrina e pela jurisprudência, dentre os quais, a inserção numa organização, o cumprimento de horário, a sujeição ao poder disciplinar, a exclusividade, a intensidade da prestação do trabalho, a inerência desta ao ciclo produtivo, a alienação dos meios de produção, a retribuição fixa sem riscos de resultado, alguns deles que, embora não sendo incompatíveis com algum tipo de trabalho autônomo, concorrem para o convencimento do juiz para distinguir hipóteses.” (NASCIMENTO, 2007, p. 467)
A segunda proposta, também oriunda do direito italiano é a coordenação. Para esta, os empregados e empregadores tornam-se colaboradores da empresa. É uma alteração do conceito clássico de subordinação. Ou seja, há a transformação de um dos elementos fundamentais da caracterização da relação de emprego, a subordinação, sendo que a coordenação “denota o intento de utilizar organicamente a prestação do trabalho no âmbito da empresa, como pode ocorrer na representação comercial que caracteriza atividade autônoma, perspectiva organizativa da atividade de trabalho não desvinculada da programação empresarial, mas que se distingue da subordinação quanto ao tipo de determinação do referido programa.” (NASCIMENTO, 2007, p. 468)
Ainda, citando Perone, o mesmo autor informa que
“No trabalho coordenado, ainda que sob o prisma econômico possa o prestador situar-se numa posição econômica de inferioridade perante o destinatário daquele, as partes estão postas, ao menos no plano jurídico, em posição paritária, resultante da própria modalidade e exercício da atividade, enquanto no trabalho subordinado o trabalhador, ao contrário, é submetido ao comando de outrem, ao qual deve obediência, em nada alterando a autonomia do trabalho coordenado o fator da continuidade e pessoalidade, uma vez que estão presentes, também, nessa situação, diversa da que fundamenta a existência do vinculo de emprego”. (NASCIMENTO, 2007, p. 469)
A terceira proposta seria a do trabalho sem adjetivação, ou seja, o trabalho subordinado passa a ser visto, apenas, como trabalho “centralizado não só na subordinação, mas sobre a conexão funcional, continuativa e pessoal para uma organização como contraparte, modelo no qual o rigor da tutela viria modulado na inserção do trabalhador e na sua sujeição a determinações de outrem.” (NASCIMENTO, 2007, p. 470)
Por fim, dentre as propostas apresentadas por Amauri Mascaro Nascimento (2007, p. 469), tem-se a parassubordinação. Considerada a de maior relevância, tendo em vista a implementação de sua aplicação no Direito italiano e a tentativa de implementação, por alguns estudiosos, no Direito pátrio, tendo, inclusive, repercussões na jurisprudência nacional.
Salienta-se que, em razão de ser a principal teoria criada a partir da crise do conceito tradicional de subordinação, e, levando em consideração o destaque que possui no Direito Comparado (essencialmente o Direito Italiano), necessária se faz uma análise mais pormenorizada acerca dos contornos deste instituto, o que será feito no tópico seguinte.
Por fim, tentando apresentar diferenciação eficiente para a dicotomia trabalho subordinado e trabalho autônomo, cita-se a teoria de acepção minoritária, na qual centraliza o objeto do Direito do Trabalho como sendo à noção de poder econômico do empregador face ao empregado. Conforme pormenorizado no capítulo II, há quem teorize a subordinação sob o prisma econômico. Todavia, sendo alvo de inúmeras críticas, tendo em vista não ser hábil a explicar o fenômeno das relações de trabalho subordinado, pois, em dadas situações demonstra-se essencialmente amplo, englobando relações de trabalho não sujeitas as normas trabalhistas.
Todavia, no campo prático, o poder econômico foi de grande valia, inclusive, sendo o incentivador para que o Direito do Trabalho firmasse suas premissas tomando como base o princípio da proteção. Infelizmente, é sabido que, com grande frequência, o obreiro vincula-se e sente-se acuado ao empregador em razão da dependência ao recebimento do salário para que sobreviva dignamente.
Tal situação faz com que haja um maior distanciamento entre os entes subjetivos da relação de emprego. Contribuindo negativamente para o avanço do Direito do Trabalho.
O emprego, na atual Carta Cidadã, é considerado como objeto de dignidade e valorização social, devendo ser compelida qualquer forma de ingerência negativa ao regular deslinde da relação, que, necessariamente, deve pautar-se sob premissas legais.
Ao pautar-se por uma concepção clássica de vinculação econômica, o que de fato há é um vínculo de dependência[11] do empregado ao empregador. O que se quer informar é que, ao ligar-se, essencialmente por critérios de dependência econômica, o que se constata é a sujeição pessoal do obreiro, tendo em vista a redução da sua dignidade.
Brilhantemente, Immanuel Kant, citado por José Afonso da Silva, informa que:
“(…) Pessoa humana – a filosofia Kantiana mostra que o homem, como se racional, existe como fim em si, e não simplesmente como meio, enquanto os seres desprovidos de razão têm um valor relativo e condicionado, o de meios, eis por que se lhes chamam “coisas”, ao contrário, os seres racionais são chamados de pessoas, porque sua natureza já os designa como fim em si, ou seja, como algo que não pode ser empregado simplesmente como meio e que, por conseguinte, limita na mesma proporção o nosso arbítrio, por ser um objeto de respeito (…) de onde Kant deduz o seguinte imperativo prático: “Age de tal sorte que consideres a Humanidade, tanto na tua pessoa como na pessoa de qualquer outro, sempre e simultaneamente como fim e nunca simplesmente como meio”. (…) Isso, em suma, quer dizer que só o ser humano, o ser racional, é pessoa.
(…) Dignidade – voltemos, assim, a filosofia de Kant, segundo a qual no reino dos fins tudo tem um preço ou uma dignidade. Aquilo que tem um preço pode muito bem ser substituído por qualquer outra coisa equivalente. Daí a idéia de valor relativo, valor condicionado, porque existe simplesmente como meio o que se relaciona com as inclinações e necessidades gerais do homem e tem um preço de mercado; enquanto aquilo que não é um valor relativo, e é superior a qualquer preço, é um valor interno e não admite substituto equivalente, é uma dignidade, é o que tem uma dignidade.
(…) a dignidade da pessoa humana é um valor supremo que atrai o conteúdo de todos os direitos fundamentais do homem, desde o direito à vida (…) o conceito de dignidade da pessoa humana obriga a uma densificação valorativa que tenha em conta o seu amplo sentido normativo-constitucional e não uma qualquer idéia apriorística do homem, não podendo reduzir-se o sentido da dignidade da pessoa humana à defesa dos direitos pessoais tradicionais (…).” (apud, SILVA, 2006, 37-38)
Por conseguinte, é possível concluir que, a subordinação econômica, engessada em seus contornos clássicos, acaba por produzir lesão séria e severa aos princípios constitucionais aplicados ao Direito do Trabalho, como por exemplo, a dignidade da pessoa humana. Não se concebendo a incidência de tal critério diante dos contornos atuais pelos quais caminha a sociedade.
Todavia, há quem defenda uma ressignificação da dependência econômica, como por exemplo, o magistrado e estudioso Murilo Carvalho Sampaio Oliveira. Este jurista preconiza que em razão das alterações no cenário social o conceito clássico de subordinação vem sofrendo abalo nítido. Logo, necessário se faz um repensamento acerca da matéria, pois, o Direito do Trabalho não tem sido apto a tutelar todas as relações de emprego da atualidade. Assim, informa que
“Nesta contextualidade, a dependência econômica apresenta-se como um critério distintivo da relação de emprego capaz de comportar as diversas manifestações atuais de trabalho assalariado, inclusive hábil a desvendar criticamente a atipicidade de certas formas de trabalhar e elucidar algumas ocultações do assalariamento disfarçado. Em outras palavras, a questão cinge-se a tentar rearticular a sinonímia entre empregado e assalariado, a qual, atualmente, não se realiza adequadamente pelo critério da subordinação jurídica. Defende-se que a tradução jurídica da noção de assalariado corresponde a ideia de dependência econômica. [sic]” (OLIVEIRA. Disponível em: <http://www.lex.com.br/doutrina_23774695_A_RESSIGNIFICACAO_DA_DEPENDENCIA_ECONOMICA.aspx> acesso em 04 de maio de 2013 às 21:00)
Continua o Autor informando que
“O diagnóstico, conforme visão oriunda da política, economia e sociologia, é que a atipicidade flexível e suas inovações modistas no mundo do trabalho são veiculadoras de mais precariedade no lugar de um status de proteção advindo do contrato de trabalho e sua tutela jurídica. Sem o medo da possibilidade de um outro regime político-social, não há mais razão econômica para o capitalismo manter, de maneira irresignada, um sistema de proteção (custoso) em favor do assalariado, bem típico de um Estado Social. Na mesma política, os dilemas estão postos: cumprir o programa constitucional de uma sociedade estruturada na dignidade humana, que dialoga com o valor social do trabalho e a livre iniciativa, na conciliação destes pela ideia de justiça social; ou, no plano do economicus, implementar uma sociedade baseada na busca da eficiência e riqueza que qualifica as tutelas jurídicas como obstáculos (onerosamente) desnecessários.
Como compromissária da primeira opção de justiça social, a dependência econômica se apresenta como a caracterização do trabalhador como o sujeito despossuído, coagido e expropriado. Por não possuir propriedade substancial – o que não significa pobreza individual -, é conduzido a vender de sua força de trabalho como simples valor de uso, quando poderia, caso tivesse propriedade, vendê-la como valor de troca. Sendo obrigado a se vender, assume socialmente uma posição de assujeitado ao poder daquele que pode lhe comprar, inclusive dirigindo-o ou não. Por fim, a riqueza que se produz neste trabalho – o valor agregado – não lhe pertence, eis que, juridicamente, é a propriedade originária do empregador, apesar de pressupor uma propriedade prévia.
Na operacionalização desta ideia ressignificada de dependência, articula-se uma racionalidade de abertura e amplitude conceitual, que transfere para o conceito de trabalho autônomo o padrão fechado da tipicidade. Na ruptura com o positivismo, afasta-se, igualmente, da pretensão de completude dos conceitos jurídicos, inclusive reconhecendo a inadequação de um conceito milimétrico que tende a ineficácia e obsolência pela inovação, complexidade e pela processualidade histórica. Como contraposição à ideia de dependência econômica, a autonomia é, então, advinda da titularidade sobre uma organização produtiva, ainda que seja diminuta, isto é, a existência de propriedade suficiente (e trabalho humano) para a constituição da ideia (ampla) de empresa é que caracteriza a autonomia. Infere-se que é justamente a propriedade que cria as condições para o exercício do poder de direção ou mesmo propicia sua delegação para os chefes, gerentes, entre outros.
Afirmar a dependência como econômica demarca o aspecto econômico da relação, oriundo do poder que a propriedade confere ao seu titular. Destina-se a frisar que o Direito do Trabalho é, essencialmente, o Direito capitalista do Trabalho, o qual ao mesmo tempo que confere uma civilidade à expropriação do trabalho dos não proprietários prossegue mantendo esta relação estruturalmente de expropriação. Neste desiderato, a dependência econômica proposta, quando comparada à subordinação jurídica, tem muito mais a oferecer, seja na identificação da essência (e não da consequência) do assalariamento, inclusive a par das singularidades brasileiras, seja pela delimitação conceitual aberta perante as realidades formalmente disfarçadas ou pela aptidão a desfazer as ocultações capitalistas, a dependência econômica incorpora melhor as tarefas do Direito do Trabalho na busca por dignidade humana e justiça social.” (OLIVEIRA. Disponível em: <http://www.lex.com.br/doutrina_23774695_A_RESSIGNIFICACAO_DA_DEPENDENCIA_ECONOMICA.aspx> acesso em 04 de maio de 2013 às 21:00)
Inegável a contribuição doutrinária do ilustre jurista, tendo em vista a experiência e vivência prática que possui. Contudo, conforme repisado nesta produção, os estudiosos tem buscado estudar os novos contornos da Ciência do Direito do Trabalho tentando adequá-lo, e, necessariamente, dar-lhe eficácia. Somente a apuração das criações doutrinárias será apta a revelar um caminho pacificado a ser seguido. Pois, o que se vê hoje é a amenização do atuar do empregador como sujeito de poder frente ao empregado numa relação de emprego. Todavia, muito caminho ainda deverá ser percorrido. E, nesse contexto, o que se verifica é o empregado conquistando uma posição de poder, ou de “possibilidade de poder”, por meio de organização com outros empregados, formando um ser coletivo capaz de discutir seus direitos frente ao empregador. Parte da ideia dos sindicatos como sendo a única forma de poder dos trabalhadores, o poder sindical, único apto a contrabalançar a posição de desigualdade social em que o trabalhador se encontra em face do empregador.
3.4. Parassubordinação
Para Amauri Mascaro Nascimento,
“O trabalho parassubordinado é uma categoria intermediária entre o autônomo e o subordinado, abrangendo tipos de trabalho que não se enquadram exatamente em uma das duas modalidades tradicionais, entre as quais se situam, como a representação comercial, o trabalho dos profissionais liberais e outras atividades atípicas, nas quais o trabalho é prestado com pessoalidade, continuidade e coordenação. Seria a hipótese, se cabível, do trabalho autônomo com características assimiláveis ao trabalho subordinado.” (NASCIMENTO, 2007, p. 470)
É de ressaltar que a parassubordinação, como fenômeno jurídico, foi pensada muito antes ao recente enfrentamento da crise da subordinação como elemento caracterizador da relação de emprego. Entretanto, as alterações no modo de produção capitalista, em capítulo anterior pormenorizadas, fizeram com que houvesse uma mudança significativa no pensamento jurídico acerca da tutela concedida ao trabalhador, levando os estudiosos e a própria jurisprudência a difundirem e utilizarem cada vez mais esse conceito.
É pacífico apontar como sendo no Direito italiano onde se originou a tutela ao trabalho parassubordinado tendo fulcro na Constituição Italiana, que, em seu art. 4º, garante a todos os cidadãos o direito ao trabalho. E, no seu artigo 35 protege o trabalho e todas suas formas e aplicações.
A primeira norma a mencionar a relação de trabalho por meio da parassubordinção foi a Lei italiana nº 741 de 1959, ou “Lei Vigorelli”, que informou ser competência do governo o estabelecimento de normas jurídicas com forma lei com o escopo de assegurar garantias mínimas aos trabalhadores contratados que prestariam o serviço com colaboração em prestações de obra continuativa e coordenada. É o que se observa na transcrição da mencionada Lei abaixo:
“Art. 1
Il Governo è delegato ad emanare norme giuridiche, aventi forza di legge, al fine di assicurare minimiinderogabili di trattamento economico e normativo nei confronti di tutti gli appartenenti ad una medesimacategoria. (…)
Art. 2.
Le norme di cui all'art. 1 dovranno essere emanate per tutte le categorie per le quali risultino stipulatiaccordi economici e contratti collettivi riguardanti una o più categorie per la disciplina dei rapporti di lavoro,dei rapporti di associazione agraria, di affitto a coltivatore diretto e dei rapporti di collaborazione che siconcretino in prestazione d'opera continuativa e coordinata”[12].
A partir da “Lei Vigorelli”, considerada o embrião do trabalho parassubordinado italiano, outras produções legislativas acabaram por se preocupar com o fenômeno da parassubordinação. Sendo que a Doutrina Italiana tem o entendimento pacificado de que o marco do surgimento da parassubordinação na Ciência do Direito do Trabalho deste país somente se deu com a alteração do artigo 409, item 3, do Código de Processo Civil italiano pela Lei nº 533 de 1973 expandiu a competência do juízo trabalhista para nela incluir “relações de agência, de representação comercial e outras relações de colaboração que se expressam numa prestação de serviços continuada e coordenada, preferencialmente pessoal, ainda que sem caráter subordinado.”
Segundo a estudiosa Flavia Guimarães Pessoa (2009, p. 81), Também a Lei nº 533/73 que alterou o art. 2.113 do Código Civil italiano, informa que: “A renúncia e a transação que tenham, como objeto, direitos do prestador do trabalho derivados das disposições inderrogáveis da lei e do contrato ou acordo coletivo concernentes às relações das quais trata o art. 409 do código de processo civil, não são válidas.”
É de ressaltar que no ano de 1999, foi aprovado pelo Senado italiano o Projeto de Lei “Smuraglia”, que tinha como escopo ampliar o conceito legal de trabalhador parassubordinado. Contudo, enquanto o mencionado Projeto de Lei ainda tramitava, foi promulgado o Decreto Legislativo nº 276, de 10 de setembro de 2003, conhecido como “Reforma Biagi”, alterando sobremaneira o tratamento legal concedido ao trabalhador parassubordinado. Tudo no intuito de coibir possíveis fraudes que viessem a mascarar verdadeiras relações de emprego típico.
Para muitos doutrinadores, a parassubordinação acabaria por representar uma solução para o impasse socioeconômico instaurado, pois, de um lado encontram-se os empregadores, ávidos por uma flexibilização nas normas de Direito do Trabalho, e, com isso, aliviarem-se do enorme encargo, para, em última análise, obterem maiores lucros, e, do outro, os empregados, que, com o implemento da tecnologia nos meios de produção, muitas vezes não mais enquadram-se na engessada dicotomia empregado subordinado – trabalhador autônomo necessitando de uma reformulação das normas para uma tutela jurisdicional mais realista e efetiva. O que Atesta a necessidade de um repensar no núcleo central do Direito do Trabalho enquanto Ciência. Esse pensamento é comungando por Ana Paula Kotlinsky Severino (2009, p. 102) que afirma que “a parassubordinação havia se tornado a hipótese mais recorrente de flexibilização do direito do trabalho.”
Para outros doutrinadores, o que se percebe é que, diante da crise do conceito clássico de subordinação instaurada, devem-se buscar soluções que tragam solidez à Ciência do Direito do Trabalho, bem como, façam ressurgir a confiança indiscutível neste ramo. Com base neste pensamento Flávia Moreira Guimarães Pessoa (2009, p. 83) afirma que a “Reforma Biagi” introduziu no ordenamento jurídico “tipologias contratuais úteis à causa do surgimento do trabalho informal, mas que desenvolvam também a preocupação de “estimular” a empresa no sentido de um crescimento ocupacional e a criação de novos postos de trabalho.”
De fato, a tendência à busca de soluções para a crise instaurada, fez com que o Direito Italiano estruturasse a figura do contrato de trabalho a projeto. Segundo o art. 61 do Decreto Legislativo nº 276 de 2003, salvo casos excetuados em lei, o contrato de trabalho que tiver por objeto relação de colaboração coordenada e continuativa deverá conter um projeto, sem o qual, presume-se que há subordinação jurídica, ou seja, relação de emprego.
Para alguns autores, o trabalho parassubordinado possui “algumas semelhanças com o trabalho subordinado típico, sem se confundir com este, e indo além do conceito tradicional de trabalho autônomo” (FREITAS, 2009, p. 1248). Consiste, essencialmente, de uma “colaboração coordenada e continuativa (co.co.co)” (PEDREIRA, 2007, p. 1), características extraídas do art. 409, item 3, do Código Processual Civil italiano.
Salienta-se que, mesmo entre os doutrinadores italianos não há consenso sobre os contornos do instituto da parassubordinação. Por situar-se na já mencionada “zona grise”, a relação de trabalho parassubordinado possuiria elementos semelhantes aos necessários para a configuração de relação de emprego, bem como elementos que o aproximariam do trabalho autônomo. Daí Luis Pinho Pedreira (2007, p. 3) apontar como requisitos: coordenação, continuidade, pessoalidade e autonomia. A coordenação denota participação na atividade da empresa, embora em intensidade e quantidade inferior àquela presente no trabalhado subordinado, daí falar-se em autonomia, embora não haja plena liberdade negocial.
Ana Paula Kotlinsky Severino assim distingue este requisito:
“Enquanto nas relações subordinadas, o empregador, no exercício do poder diretivo, estabelece e altera, unilateralmente, as diretrizes do trabalho, no trabalho parassubordinado as diretivas são estabelecidas contratualmente e qualquer alteração não prescinde do consenso de ambas as partes”. (SEVERINO, 2009, p. 104).
Chega-se mesmo ao entendimento que, Flávia Moreira Guimarães Pessoa (2009, p. 80), informando que, ainda que o trabalho seja dirigido pelo contratante, não há que se pensar na subordinação clássica, mas sim mero exercício da “atividade empresarial de coordenar o trabalho sem subordinar o trabalhador, ou ainda, a conexão funcional entre a atividade do prestador do trabalho e a organização do contratante”, sem limitar a liberdade do trabalhador.
Ruth Lopes Gomes de Siqueira (2009, p. 272), fazendo analogia com as novas relações de trabalho, entende que o trabalhador é “um membro participativo do processo produtivo, que emite opiniões, dá ideias, que decide conjuntamente com o contratante sobre os caminhos a serem tomados na execução do trabalho.”
Parte da doutrina defende a utilização do critério quantitativo para aferição da intensidade da direção do trabalho. Porém, como observa Alice Monteiro de Barros (2004, p. 154), “esse requisito carece de objetividade e só poderia ser aplicado se o legislador especificasse o escopo dessa expressão.”
Contudo, é de ressaltar que o ponto de maior [aimportância para o aspecto prático do instituto refere-se ao tratamento jurídico dispensado parassubordinação e o à relação de emprego. Alice Monteiro de Barros (2004, p. 153-154) aponta duas correntes doutrinárias opostas: uma delas defende que o trabalhador parassubordinado deve ser objeto de tutela similar ou idêntica àquela conferida ao trabalhador subordinado, enquanto a outra ressalta sua forma e incontestável autonomia.
Claudio Vitor de Castro Freitas propõe como solução que a análise seja pautada na gradação, ou seja, quanto menos inserido na atividade da empresa menor a tutela, quanto maior a inserção, consequentemente, maior a proteção:
“Quanto menos inserido, menor a proteção, partindo-se do mínimo de tutela – direitos relativos a normas sobre limitação de jornadas de trabalho, à proteção ao trabalho da mulher e do adolescente, à garantia do salário mínimo e irredutibilidade salarial – a uma proteção mais ampliada – repouso semanal remunerado, limitação da jornada de trabalho, adicional de trabalho noturno, FGTS facultativo, seguro-desemprego e proteção contra dispensa arbitrária, além dos anteriormente elencados. (FREITAS, 2009, p. 1256).
O referido Autor sustenta que cabe ao legislador estabelecer essa gradação. Tudo no intuito de evitar injustiças e insegurança jurídica. Pois, sanaria o problema da aplicação exacerbada das normas Celetistas, bem como, impossibilitaria lesão aos direitos trabalhistas dos obreiros por meio de uma flexibilização desenfreada para esses trabalhadores situados na “zona grise”.
Importante ressaltar que no Direito Brasileiro não há tratamento legal destinado à parassubordinação. Embora haja diversos estudos voltados a trazer soluções para a crise pela qual vem passando o conceito clássico de subordinação, a maioria dos estudiosos não acreditam na aplicação do referido instituto no Direito pátrio.
Em razão disso, Luiz de Pinho Pedreira (2001, p. 181) informa que o ordenamento brasileiro está carente de uma norma que regule a parassubordinação, bem como defina os direitos e a sua tutela. Para o autor, não se entende possível, no Brasil, a aplicação da figura do trabalhador parassubordinado, por ser imperativo reconhecer a configuração da relação de emprego, quando cabível.
Mister salientar que o Direito Italiano constantemente, juntamente com os seus importantíssimos estudiosos, tem se preocupado constantemente em evoluir o conceito e aplicação da parassubordinação. Isso é facilmente perceptível quando analisa-se as reformulações legislativas e doutrinárias acerca do tema.
Importante ressaltar que a tendência atual e majoritária da doutrina aponta para considerar a parassubordinação como uma espécie do gênero trabalho autônomo. Isso se deve pela enorme divergência instaurada em decorrência da necessidade de afastamento do conceito dos tradicionais contornos do trabalho subordinado e autônomo. Este é o posicionamento do doutrinador italiano Mauro Sferrazza, segundo o qual se trata tão somente de um tipo específico de trabalho autônomo, e não um terceiro gênero (PESSOA, 2009, p. 80-81).
O Egrégio Tribunal Superior do Trabalho possui julgados em que reconhece o tipo jurídico do trabalho parassubordinado e o admite como “terceiro gênero”, mas aplica-lhe tratamento jurídico idêntico ao trabalho autônomo. Observe-se, por exemplo, o seguinte trecho de acórdão:
“Atualmente, é possível identificarmos três tipos de trabalhadores: os subordinados, que trabalham pessoalmente, de forma não eventual e assalariada, cumprindo ordens emanadas do empregador; os autônomos, assim entendidos os que prestam serviço com ampla autodeterminação. Além da liberdade de organização da atividade, estes estabelecem o preço e não sofrem ingerência sobre o modo, o tempo e lugar da execução, e, por fim, os parassubordinados, que atuam na prestação de serviço de natureza continuada e coordenada, de caráter exclusivamente pessoal, para o atendimento de necessidade ligada à atividade-fim do tomador, não atuando de forma subordinada, mas necessitando observar certas diretrizes.
Para estes últimos, o que descaracteriza o vínculo é a ausência de subordinação. Ela é substituída pela de coordenação. Embora siga certas diretrizes do tomador de serviços, o trabalhador parassubordinado conserva a liberdade de organização da própria atividade e assim a autonomia sobre a modalidade, o tempo e o local da execução, podendo trabalhar com ou sem exclusividade. (…) A representação comercial, o agenciamento e a distribuição civis, quando o serviço é executado pessoalmente, são hipóteses de trabalhado parassubordinado.” (Processo nº TST-AIRR-8109-05.2010.5.01.0000, Agravante: José Caetano da Cruz Correia de Sousa, Agravado: Semp Toshiba S.A., 4ª Turma do TST, Relator Ministro Milton de Moura França) (grifos acrescidos).
Também vem aplicando o Egrégio Tribunal Superior do Trabalho o conceito de parassubordinação aos profissionais liberais, como os médicos, quando trabalham sob grau mínimo de subordinação, insuficiente para caracterizar a relação de emprego.
Verifica-se que a tendência jurisprudencial do Tribunal Superior do Trabalho coaduna do posicionamento majoritário da doutrina italiana, ou seja, identificando-o como uma espécie de trabalho autônomo, restringindo a incidência de normas e direitos laborais concedidos de modo indiscutível ao empregados subordinados.
Também merece menção a existência de corrente jurisprudencial mais restritiva, encabeçada pelo Ilustríssimo Ministro Maurício Godinho Delgado, na qual rechaça a aplicação da parassubordinação no ordenamento pátrio, em decorrência da necessidade de efetivação dos princípios justrabalhistas e objetivos fundamentais previstos na Atual Carta Magna insculpidos em seu art. 3º[13]. Para tal vertente, a parassubordinação seria uma modalidade de burla ao Direito do Trabalho, especialmente aos direitos assegurados aos trabalhadores. É o que conclui brilhantemente o referido Ministro no acórdão abaixo transcrito:
“RECURSO DE REVISTA. RECONHECIMENTO DE VÍNCULO DE EMPREGO.SUBORDINAÇÃO OBJETIVA E SUBORDINAÇÃO ESTRUTURAL. TRABALHO INTELECTUAL, QUE SE CARACTERIZA POR SUBORDINAÇÃO SUBJETIVA MENOS INTENSA, PORÉM ENQUADRANDO-SE NO MODERNO E ATUALIZADO CONCEITO DE SUBORDINAÇÃO. Afastamento das noções de parassubordinação e de informalidade. O Direito do Trabalho, classicamente e em sua matriz constitucional de 1988, é ramo jurídico de inclusão social e econômica, concretizador de direitos sociais e individuais fundamentais do ser humano (art. 7º,CF). Volta-se a construir uma sociedade livre, justa e solidária (art. 3º, I, CF), erradicando a pobreza e a marginalização e reduzindo as desigualdades sociais e regionais (art. 3º, IV, CF). Instrumento maior de valorização do trabalho e especialmente do emprego (art. 1º, IV, art 170, caput e VIII, CF) e veículo mais pronunciado de garantia de segurança, bem estar, desenvolvimento, igualdade e justiça às pessoas na sociedade econômica (Preâmbulo da Constituição), o Direito do Trabalho não absorve fórmulas diversas de precarização do labor, como a parassubordinação e a informalidade. Registre-se que a subordinação enfatizada pela CLT (arts. 2º e 3º) não se circunscreve à dimensão tradicional, subjetiva, com profundas, intensas e irreprimíveis ordens do tomador ao obreiro. Pode a subordinação ser do tipo objetivo, em face da realização pelo trabalhador dos objetivos sociais da empresa. Ou pode ser simplesmente do tipo estrutural, harmonizando-se o obreiro à organização, dinâmica e cultura do empreendimento que lhe capta os serviços. Presente qualquer das dimensões da subordinação (subjetiva, objetiva ou estrutural), considera-se configurado esse elemento fático-jurídico da relação de emprego. No caso concreto, a Reclamante demonstrou o trabalho não eventual (até mesmo diário), oneroso, pessoal e subordinado às Reclamadas, por um período superior a quatro anos e em atividade-fim das empresas. Por outro lado, as Reclamadas não se desincumbiram do encargo de comprovar que a relação jurídica se desenvolveu sob forma diversa daquela estabelecida no art. 3º da CLT, incidindo a presunção (e a prova) de reconhecimento do vínculo empregatício, por serem os fatos modificativos ônus probatório do tomador de serviços (Súmula 212,TST; art. 818,CLT; art. 333,II,CPC). Ressalte-se que circunstancial flexibilidade de horário, em trabalho diário de segunda a sábado, não traduz autonomia e ausência de subordinação, principalmente a subordinação objetiva, além da estrutural. Em face desses dados, deve o vínculo de emprego ser reconhecido. Recurso de revista conhecido e provido”. (Processo nº TST-RR-528100-67.2006.5.02.0081)
Conforme alertado pelo brilhante Ministro, deve-se cuidar para que sejam aplicados os princípios norteadores do ramo do Direito do Trabalho, não por acaso existentes e necessários a dar efetividade e segurança a este ramo do Direito. É o entendimento que tem-se encontrado em Julgados de Tribunais Regionais espalhados pelo país como se depreende do seguinte acórdão:
‘Com a crescente e contínua horizontalização da empresa, que se movimenta para fora de diversas maneiras, inclusive via terceirização, via parassubordinação, via micro ateliers satélites, adveio o denominado fenômeno da desverticalização da subordinação, que continua a ser o mesmo instituto, mas com traços modernos, com roupagem diferente, caracterizada por um sistema de coordenação, de amarração da prestação de serviços ao empreendimento por fios menos visíveis, por cordões menos densos. (…)
Neste contexto social moderno, é preciso muito cuidado para que os valores jurídicos do trabalho não se curvem indistintamente aos fatores econômicos, devendo ambos serem avaliados à luz da formação histórica e dos princípios informadores do Direito do Trabalho, de onde nasce e para onde volta todo o sistema justrabalhista. O veio da integração objetiva do trabalhador num sistema de trocas coordenadas de necessidades, não descaracteriza a subordinação.
Se a região é de densa nebulosidade, isto é, de verdadeiro fog jurídico, a atração da relação jurídica realiza-se para dentro da CLT e não para dentro do Código Civil, que pouco valoriza e dignifica o trabalho do homem, que é muito livre para contratar, mas muito pouco livre para ajustar de maneira justa as cláusulas deste contrato. (Processo nº 00073-2005-103-03-00-5 RO, Recorrente: Sempre Editora Ltda., Recorrido: Wanderson Flávio da Cunha, 4ª turma do TRT da 3ª Região, Relator Desembargador Luiz Otávio Linhares Renault.)”
Souto Maior, há alguns anos, já alertara para a tendência expansionista dos sujeitos das relações de emprego e trabalho, campo propício ao surgimento da parassubordinação:
“Em termos de reconhecimento da relação de emprego, o Direito do Trabalho, tradicionalmente, seguia um caminho expansivo. Vários foram os doutrinadores a tratar do movimento expansivo do Direito do Trabalho a partir da integração ao conceito de relação de emprego de várias relações de trabalho antes alheias a esse direito, que, inicialmente, lembre-se, era apenas de um “direito operário” (…) (SOUTO MAIOR, 2008, p. 162)
O que se verifica, ao analisar a história é que a flexibilização tem sido encarada de modo efetivo. Isso tem sido visto no campo prático, legal e jurídico com cada vez mais força. Não por outra razão recebeu especial atenção do Direito Italiano.
Contudo, merece cautela e atenção especial a aplicabilidade do instituto da parassubordinação. Essencialmente por estar-se diante de uma relação jurídica com aspecto subjetivo desnivelado. Como alerta Souto Maior (2008 p. 164), “É mais conveniente a essas empresas criar controvérsias acerca da existência ou não de subordinação, uma vez que, durante tais discussões, continuarão a inadimplir os valores devidos como retribuição digna ao trabalho.”
Assim, diante da necessidade de ponderação e maturação do próprio instituto, resta claro concluir que, tanto no aspecto filosófico, como prático e legislativo, o Brasil não se encontra apto a receber o instituto italiano da parassubordinação com todos os seus contornos, essencialmente pelo estrago que tal aplicação traria no campo prático. Infelizmente, os casos julgados e as histórias nos Tribunais mostram que o malefício da efetivação da parassubordinação seria muito superior a suas benesses. Pois, serviria, em última análise, como sucedâneo para fraudes aos direitos dos trabalhadores, desnaturando o escopo último do ramo laboral do Direito.
O que se verifica é que a aplicação da parassubordinação como alternativa para a crise do objeto central do Direito do Trabalho, qual seja, a subordinação jurídica como elemento caracterizador da relação de emprego, necessita ser repensada, principalmente, tomando como base o ordenamento jurídico pátrio. Pois, as alterações socioculturais e econômicas do Brasil tem se tornado cada vez mais significativas, e, uma resposta deve ser dada de acordo com tal realidade.
3.5. Flexibilização das Normas trabalhistas
Observe que o presente trabalho acadêmico repetidas vezes fundamentou a alteração de paradigmas da Ciência do Direito do Trabalho nas alterações sociais, econômicas e políticas. Indiscutivelmente tal fato é o maior responsável pela busca e implemento de novos contornos eficientes a tutelar o direito dos empregados e empregadores.
O que se verifica no cenário atual é que a globalização e a produção com escopo nos mercados internacionais, com os mesmos padrões de qualidade e a busca pelo lucro, tem servido de instrumentos de pressão aos três poderes que compõem a República Federativa do Brasil, quais sejam, Executivo, Legislativo e Judiciário. O que se quer dizer com tal afirmação é simples: Especialmente os empregadores tem se firmado no posicionamento de que o Direito do Trabalho tem servido como entrave ao desenvolvimento da economia.
As consequências advindas de tal afirmação têm sido sentidas em todo o cenário econômico, não por outra razão os níveis de desemprego encontram-se alarmantes, as demissões em massa são cada vez mais comuns.
Foi em decorrência do contexto social relatado que os Poderes da Nação, juntamente com a produção doutrinária, tem buscado equilibrar as relações, informando a importância da flexibilização das normas trabalhistas em determinadas circunstâncias, como por exemplo, o implemento do “banco de horas”, que representa um sistema de compensação de horas-extras, evitando a obrigatoriedade do empregador em pagar as horas extraordinariamente laboradas e a contratação por tempo determinado com redução de encargos.
Atenta a realidade que se configura, a flexibilização já tem sido analisada pela Presidente Dilma Rousseff, é o que se verifica da matéria veiculada no jornal “O Estadão”,
“BRASÍLIA – Como parte da agenda para aumentar a competitividade da economia, a presidente Dilma Rousseff ensaia entrar num terreno pantanoso para um governo do PT: a flexibilização das normas trabalhistas. A Casa Civil analisa proposta de projeto de lei pelo qual trabalhadores e empresas poderão firmar acordos com normas diferentes das atuais, baseadas na Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT), em vigor há 69 anos.
Na prática, o projeto permite que os salários e a jornada de trabalho sejam reduzidos de forma temporária em caso de dificuldades econômicas. Ele abre caminho também para a utilização mais ampla do banco de horas, pelo qual os trabalhadores cumprem horas extras sem receber adicional, e compensam o tempo trabalhado a mais com folgas.
Os acordos entre empregados e empresas seriam firmados por meio do Comitê Sindical de Empresa (CSE), segundo prevê o projeto de lei. As normas à margem da CLT comporiam um acordo coletivo de trabalho.
Empresas que concordarem em reconhecer no CSE seu interlocutor e os sindicatos que aceitarem transferir ao comitê o poder sindical terão de obter uma certificação do governo.
O papel dos sindicatos, nesse sistema, seria o de atuar nas empresas que optarem por continuar sob o "modelo CLT". Eles também selariam com as entidades patronais as convenções coletivas – por meio das quais empregados e patrões definem, anualmente, aumentos salariais. Todos os membros do CSE terão de ser sindicalizados.
A proposta em análise foi elaborada pelo Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, baseada no modelo alemão. O texto foi entregue ao ministro-chefe da Secretaria-Geral da Presidência, Gilberto Carvalho. Recentemente, a Casa Civil, que auxilia Dilma na elaboração de normas legais, pediu para analisar o projeto.
Ainda não está certo se o governo adotará o projeto como seu e o enviará ao Congresso. A presidente costuma pedir análises detalhadas dos projetos que considera interessantes, para depois decidir se os levará adiante ou não. Para colher mais subsídios, um grupo deverá ir à Alemanha nas próximas semanas.
Na Alemanha, boa parte da indústria e dos sindicatos concordaram em reduzir a jornada de trabalho e os salários, em caráter excepcional e com prazo de validade, para permitir que a economia atravessasse a crise sem falências ou demissões. "Formaram um pacto nacional, que só foi possível do ponto de vista legal porque as leis lá são flexíveis", diz uma fonte graduada da equipe econômica do governo.
O projeto é visto com simpatia no Palácio do Planalto e, principalmente, no Ministério da Fazenda. Chegou a ser citado pelo secretário executivo do Ministério da Fazenda, Nelson Barbosa, em palestra na Fundação Getúlio Vargas de São Paulo, como parte da agenda do governo.” (OTTA; VILLAVERDE, de O Estado de S. Paulo. GOVERNO ESTUDA FLEXIBILIZAR LEIS TRABALHISTAS. Disponível em: <http://economia.estadao.com.br/noticias/economia-brasil,governo-estuda-flexibilizar-leis-trabalhistas,127863,0.htm>. acesso em 13 de maio de 2013, às 16:56)
Contudo, é de ressaltar que, num país como o Brasil, de proporções continentais e marcado por desigualdades socioeconômicas regionais tão fortemente sentidas, todo o cuidado é necessário. Pensando nisso, a tendência à flexibilização, tem sido encarada pelos estudiosos sob um prisma interpretativo restritivo, ou seja, visa-se a implementação da flexibilização, mas, apenas em situações que sejam autorizadas pela Carta Magna ou por leis esparsas e que não seja totalmente lesionadoras aos direitos dos obreiros.
Tal proteção mostra-se extremamente necessária, tendo em vista a existência de desigualdade entre a figura do empregado e empregador. Ressalta-se que, mesmo sendo verificada a crise do conceito de subordinação clássico pelo surgimento de novas formas de trabalho e emprego, essencialmente desenvolvidas com o implemento da tecnologia, não é possível afirmar um nivelamento majoritário entre as figuras do empregado e empregador.
Percebe-se que o empregado ainda necessita da figura do sindicato para equiparar-se ao empregador. Exercendo papel salutar no desenvolvimento da teoria da flexibilização das normas trabalhistas. Pois, somente com a presença deste ente, seria possível uma discussão equânime entre os polos da relação de trabalho.
Deve-se ter em mente que o que se pretende com a flexibilização, em última análise, é a busca da prevalência do “negociado sobre o legislado”. Daí surge a indagação salutar: Os obreiro realmente está preparado para tal negociação?
A resposta ainda é fácil de ser obtida. Não. Os empregados brasileiros ainda não se encontram aptos a flexibilizar os seus direitos em prol do crescimento da economia. E a razão é simples: o empregador ainda mantém, na maioria dos casos, superioridade em face do empregado. As alterações sociais e nos meios de produção ainda não foram suficientemente aptas a equiparar os dois sujeitos. É em razão do exposto que se ressalta a importância do sindicato como ser social e coletivo.
Conforme citado, a hermenêutica restritiva que impera tem justificativas necessárias. Pensando nisso que se informa a impossibilidade de flexibilização não autorizada em lei. Este é o posicionamento do Supremo Tribunal Federal:
“Estabilidade provisória da empregada gestante (ADCT, art. 10, II, b): inconstitucionalidade de cláusula de convenção coletiva do trabalho que impõe como requisito para o gozo do benefício a comunicação da gravidez ao empregador.
1. O art. 10 do ADCT foi editado para suprir a ausência temporária de regulamentação da matéria por lei. Se carecesse ele mesmo de complementação, só a lei a poderia dar: não a convenção coletiva, à falta de disposição constitucional que o admitisse.
2. Aos acordos e convenções coletivos de trabalho, assim como às sentenças normativas, não é lícito estabelecer limitações a direito constitucional dos trabalhadores, que nem à lei se permite." (RE n. 234.186-3 SP, Re. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE – 1ª. Turma – Em.2041-4 – DJ 31.08.01).
A Atual Constituição Federal de 1988, traz regras expressas autorizadoras da flexibilização, como por exemplo, no artigo 7º, incisos VI, XII, XIV, que informam, respectivamente, a possibilidade de redução de salário, redução de jornada de oito horas diárias ou da jornada de seus horas para o trabalho realizado em turnos ininterruptos de revezamento. Nestes casos há a discricionariedade das partes em delimitar os contornos de tais flexibilizações.
Assim, o que se verifica é a tendência natural à flexibilização das normas trabalhistas, especialmente em decorrência das alterações no cenário social e econômico a partir da inserção da tecnologia. Por ser uma tendência que tende a alargar-se com o tempo, não poderia passar despercebida no presente trabalho.
Contudo, não se pode deixar de ressaltar que, a consciência das partes envolvidas na relação de emprego, especialmente a do empregador, não se mostra suficientemente evoluída a fim de expandir-se à flexibilização das normas trabalhistas de modo indiscriminado, privilegiando a negociação sobre a norma. Pois, infelizmente, o que se verificaria, caso tal situação passasse a vigorar, seria um massacre aos direitos dos trabalhadores. Somente as próximas alterações no cenário social pátrio serão suficientes a indicar a direção que o Direito do Trabalho seguirá.
Considerações finais
Indubitavelmente, a conclusão que se chega é a de que a doutrina e a jurisprudência exercerão papel fundamental para a sedimentação do que será aplicado de modo dominante acerca dos novos contornos da subordinação como elemento caracterizador da relação de emprego.
As alterações sociais e econômicas, bem como, o acelerado processo de globalização tem feito com que o Direito do Trabalho, enquanto Ciência regulamentado de condutas sociais, não mostre-se tão eficiente quanto outrora. Contudo, as atenções tem sido voltadas para este fenômeno e a importância de produzir nunca se mostrou tão necessária.
Percebe-se que a evolução histórica pela qual passou o Direito do Trabalho foi importante para que fosse eleita a subordinação jurídica como elemento caracterizador da relação de emprego, abandonando-se a ideia arcaica de sujeição pessoal. O que fez com que o Princípio Protetivo fosse erigido à categoria de norma primária deste ramo do Direito. Mais a frente, novas circunstâncias sociais mostraram a necessidade de surgimento de novas tutelas, extinção destas mesmas em outros momentos históricos, como é o caso da especial proteção que era dada à mulher como empregada, não mais se justificando tendo em vista a isonomia estabelecida pela atual Carta Política.
A partir de tudo que fora exposto no presente trabalho, não restam dúvidas da simbiose existente entre o Direito do Trabalho e os fatos sociais. As alterações que ocorrem no cenário social influenciam diretamente aquele ramo do Direito, e isso se deve, não por outra razão, pelo fato desta Ciência ser do “mundo das ideias”, dinâmica por excelência.
Contudo, é de ressaltar que tal dinamicidade respeita limites salutares, como por exemplo, a necessidade de expressividade e sedimentação no tempo. Os fatos sociais, para que recebam tutela legal e coerção jurídica, necessariamente, precisam se tornar redundantes no tempo e no espaço. Somente estes, alcançarão o espectro protetor da norma. Tal situação deriva da necessidade de observância da liberdade do individuo.
Atualmente verifica-se o surgimento de novas categorias de empregados, o que tende a dilatar-se com o implemento da tecnologia, que se situam numa chamada “zona grise” de classificação, ou seja, não havendo enquadramento perfeito na antiga dicotomia clássica que outrora se mostrava satisfatória em trabalho subordinado e trabalho autônomo.
Tal situação tem ocasionado o que os estudiosos tem chamado de “crise do conceito clássico de subordinação”, pois, aponta-se que a insatisfação na classificação deriva do elemento central, objeto do Direito do Trabalho, que não mais mostra-se eficiente.
As produções doutrinárias na tentativa de apresentar solução à crise do conceito de subordinação jurídica como elemento caracterizador da relação de emprego tem sido salutares e mostram o esforço dos estudiosos em apresentar soluções ao problema que tende a alargar-se com o tempo.
As principais teorias apresentadas, como por exemplo, as teorias da subordinação estrutural, objetiva, reticular, integrativa e potencial tem o traço comum de apresentarem perspectivas ampliativas do conceito de subordinação. Tudo no intuito de abarcarem as novas realidades que inundam o cenário social atual.
Infelizmente, nenhum estudioso conseguiu conceituar a subordinação, sob os novos parâmetros, de modo eficiente e livre de críticas coerentes. Razão pela qual necessitaremos de uma maior sedimentação acerca dos trabalhos valorosos apresentados, bem como, de esforços doutrinários para que possamos alcançar a tão almejada segurança às novas relações de trabalho e emprego.
A parassubordinação e a flexibilização tem se mostrado como novos caminhos seguidos no Direito Comparado, em especial, no Direito Italiano, influenciando o nosso ordenamento, especialmente em alguns trabalhos de doutrinadores valorosos. Contudo, mostrando o traço de personalidade do nosso Direito do Trabalho, tem apresentado rechaço aos contornos até então predominantes dos institutos por grande parte dos estudiosos.
Assim, a conclusão que se chega e que se buscou com o presente trabalho foi demonstrar a importância da discussão, da análise da situação pela qual vem passando a subordinação como elemento caracterizador da relação de emprego. Tudo no intuito de não deixar a margem situações que merecem proteção especial, como o caso dos teletrabalhadores e dos trabalhadores intelectuais. Ratifica-se que muito deverá ser produzido e sedimentado, contudo, os passos iniciais já estão sendo dados e demonstrando a salutar importância destes.
Graduada em Direito pela Faculdade de Tecnologia e Ciências no Estado da Bahia. Advogada. Especialista em Direito e Processo do Trabalho pela Universidade Federal da Bahia – UFBA
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