Direito Constitucional

Tecnologia Social on line destinada ao exercício do direito de resposta: a utilização do território virtual como espaço centralizado para a defesa de direitos fundamentais

Thales Ferri Schoedl

 

Resumo: Partindo-se do pressuposto de que as tutelas legais voltadas à defesa dos direitos da personalidade atingidos pelo abuso do direito de informar são ineficazes, o presente artigo, mediante uma abordagem interdisciplinar envolvendo as ciências do Direito, da Gestão Social e do Jornalismo, propõe a utilização do território virtual para a defesa desses direitos, através da criação de uma tecnologia social on line destinada ao exercício do direito de resposta. Para se chegar a essa proposta, foram utilizados os métodos dialético e qualitativo, através das técnicas de pesquisa documental, revisão bibliográfica e pesquisa de campo, tendo por objeto o exame da legislação, da jurisprudência e da literatura relacionadas ao tema, bem como dos dados colhidos através de entrevistas semiestruturadas realizadas com pessoas que responderam a investigações ou processos judiciais, e que, nestas condições, foram vítimas de ofensas ou pré-condenações proferidas por veículos de comunicação. A tecnologia social proposta, que deverá ser gerida por um mediador-gestor com conhecimento nas áreas jurídica e de gestão social, amparou-se nas inovações trazidas pelas mídias sociais, as quais deverão nortear o seu funcionamento, apresentando-se o layout estrutural ao final.

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Palavras-chave: Território virtual. Interdisciplinaridade. Direito, Gestão Social e Jornalismo. Direito de Resposta. Tecnologia social on line.

 

Abstract: On the assumption that the legal guardianship in defense of the personality affected by the abuse of rights to inform are ineffective, the present article through an interdisciplinary approach concerns the Legal Sciences, social management and journalism propose the use of the virtual territory in defense of these rights through the creation of a social technology on line intended to the exercise of the right of reply. To reach on this proposal were used the dialectical and qualitative methods through the document search techniques, biographic review and field research having as purpose the legislation scrutiny, the jurisprudence and literature related to the theme as well as the information through interviews semi-structured made with people that respond the investigations or lawsuit and in these situations were victims of offenses or judgments made by communication vehicles. The social technology proposed which should be managed by a manager as mediator with knowledge in legal and social management fields were supported by innovations brought by the social medias that should guide its operation submitting the structural layout at the end.

Key Words: Virtual territory. Interdisciplinary. Law. Social management. Journalism. Right of reply. Social technology.

 

Sumário: Introdução. 1. Metodologia 2. As concepções do território 3. Por uma necessária interdisciplinaridade entre Direito e Gestão Social: otimizando a resolução de conflitos 4. Tecnologia social on line e extrajudicial (características) 4.1. Dinamismo 4.2. Efetividade 4.3. Centralização 5. O princípio da inafastabilidade da jurisdição como legitimador da tecnologia social on line (CF, art. 5º, XXXV) e a cultura no meio forense 6. Outros exemplos de tecnologias sociais on line e extrajudiciais destinadas à defesa de direitos 7. Funcionamento da tecnologia social on line destinada ao exercício do direito de resposta 8. Impactos em relação a cada um dos atores sociais relacionados à problemática enfrentada. Considerações finais. Referências. Anexo I: Layout estrutural da tecnologia social.

 

Introdução

Enquanto os direitos humanos são aqueles ligados ao direito natural, relacionados à liberdade, à vida e à igualdade dos indivíduos, os direitos fundamentais referem-se aos próprios direitos humanos positivados por uma norma constitucional (SCHOEDL; LAMANAUSKAS, 2017, p. 291),[1] entre os quais se incluem os direitos da personalidade, que, na lição de Telles Junior (1977, p. 316), são aqueles “comuns da existência, porque são simples permissões dadas pela norma jurídica, a cada pessoa, de defender um bem que a natureza lhe deu, de maneira primordial e direta”.[2] Há duas tutelas legais destinadas à defesa dos direitos da personalidade violados pelo abuso do direito de informar: ações reparatórias e direito de resposta (CF, art. 5º, V; CC, arts. 186, 187 e 927, caput; e Lei 13.188/15).

Por outro lado, os próprios veículos de comunicação são titulares do direito de informar – ou da liberdade de imprensa –, também classificado como direito fundamental pela Constituição Federal (CF, art. 5º, art. 5º, IV e IX, e art. 220, §§ 1º a 6º), cabendo ao aplicador da lei verificar, diante das circunstâncias do caso concreto, qual desses direitos deverá prevalecer nas hipóteses de conflito, através da teoria da ponderação (método de sopesamento).[3]

Contudo, o Poder Judiciário, via de regra, não tem atuado de maneira eficiente para preservar os direitos das pessoas ofendidas por veículos de comunicação, seja no tocante à variável “tempo”, por conta da morosidade da prestação jurisdicional, seja quanto à variável “valor”, diante das irrisórias quantias fixadas a título de indenização, quando comparadas ao elevado aporte de capital proveniente de anúncios publicitários, o que torna a produção de danos morais uma atividade compensatória.[4]  Este cenário pode justificar a criação de mecanismos extrajudiciais destinados ao exercício do direito de resposta.

O que se propõe no presente artigo, extraído de Dissertação de Mestrado produzida junto ao Programa de Desenvolvimento e Gestão Social da Escola de Administração da UFBA (PDGS),[5] é a utilização do território virtual como espaço estratégico para o exercício do direito de resposta, viabilizando assim a defesa pública do ofendido e a preservação dos seus direitos da personalidade. Foi exatamente a concepção do território virtual –  instituto proveniente da Gestão Social – que possibilitou fazer a intersecção dessa disciplina com o Direito, constituindo assim o ponto de partida de uma pesquisa interdisciplinar que também agregou princípios e institutos do Jornalismo, procurando-se exceder o aspecto teórico e propor uma solução concreta para a defesa dos direitos da personalidade violados pelo abuso do direito de informar, através da criação de uma tecnologia social on line destinada ao exercício do direito de resposta.

O direito de resposta pode ser definido como a “possibilidade conferida à pessoa ofendida por veículo de comunicação de se defender publicamente, de maneira dinâmica e proporcional, corrigindo inverdades ou distorções contidas na matéria jornalística” (SCHOEDL, 2019), direito fundamental assegurado pelo art. 5º, inciso V, da Constituição Federal, regulamentado pela Lei 13.188, de 11 de novembro de 2015, possuindo, conforme entendimento aqui adotado, natureza jurídica de corolário da liberdade de imprensa,[6] e não de um instrumento limitador desse direito.[7]

Embora o novo marco regulatório do direito de resposta reconheça a existência de duas modalidades para o seu exercício (judicial e extrajudicial – Lei 13.188/15, arts. 3º e 5º), nada impede que o ofendido também utilize a tecnologia social on line ora proposta,[8] de tal sorte que o território virtual funcione como um espaço centralizado, dinâmico e efetivo para a defesa de direitos fundamentais,[9] servindo também para apontar as distorções e inverdades contidas em matérias jornalísticas.

 

  1. Metodologia

O presente artigo foi elaborado a partir de Dissertação de Mestrado produzida junto ao Programa de Desenvolvimento e Gestão Social da Escola de Administração da UFBA (PDGS), denominada “Tecnologia social destinada ao exercício do direito de resposta: uma abordagem interdisciplinar do conflito entre a liberdade de imprensa e os direitos da personalidade”, aprovada em 29 de abril de 2017.[10] Foram utilizados os métodos dialético e qualitativo, mediante uma abordagem interdisciplinar envolvendo as ciências do Direito, da Gestão Social e do Jornalismo, partindo-se do pressuposto de que as tutelas legais destinadas à defesa dos direitos da personalidade, atingidos pelo abuso do direito de informar, são ineficazes.

Da referida dissertação foram extraídos dois trabalhos autônomos: a) uma obra dedicada a estudantes e profissionais do Direito, mantendo-se sua natureza interdisciplinar, onde o problema da ineficácia da prestação jurisdicional foi enfrentado com maior profundidade, porém, excluindo-se os capítulos relacionados à tecnologia social on line destinada ao exercício do direito de resposta;[11] b) o presente artigo, formado a partir desses capítulos.

No desenvolvimento do trabalho, foram utilizadas as seguintes técnicas: a) pesquisa documental, pela qual se identificaram os marcos regulatórios da liberdade de imprensa, dos direitos da personalidade e do direito de resposta, além das decisões judiciais relacionadas ao tema; b) revisão bibliográfica, compreendendo a exposição e análise crítica da literatura sobre direitos fundamentais, direito de resposta, tecnologias sociais e mídias sociais; e c) pesquisa de campo, realizando-se entrevistas semiestruturadas com vítimas de ofensas ou pré-condenações proferidas por veículos de comunicação e com profissionais do Direito que atuam na defesa extrajudicial dos direitos da personalidade.[12] Realizou-se ainda uma busca na rede mundial de computadores para identificar outras tecnologias sociais on line voltadas à defesa de direitos.

 

  1. As concepções do território

O território é definido como a “área ou região ocupada por um país, província, cidade, vila”, ou ainda, como o “circuito que abrange a jurisdição de uma autoridade” (AULETE, 1962, p. 3946). Conforme Haesbaert, “desde a origem, o território nasce com uma dupla conotação, material e simbólica, pois etimologicamente aparece tão próximo de terra – territorium quanto de terreo-territor (terror, aterrorizar), ou seja, tem a ver com dominação (jurídico-política) da terra e com a inspiração do terror, do medo – especialmente para aqueles que, com esta dominação, ficam alijados da terra, ou no ‘territorium’ são impedidos de entrar. Ao mesmo tempo, por extensão, podemos dizer que, para aqueles que têm o privilégio de usufruí-lo, o território inspira a identificação (positiva) e a efetiva ‘apropriação’” (2005).

Segundo o mesmo autor (HAESBAERT, 2005), amparado nas lições de Lefebvre (1974), o território, enquanto “espaço-tempo vivido”, não deve ser concebido de maneira unifuncional, mas sim multifuncional, envolvendo uma complexidade de relações sociais baseadas no poder; todavia, a influência exagerada do capitalismo acaba contaminando o território, tornando-o unifuncional, ou seja, representativo de relações sociais que se constroem, basicamente, pelo e para o poder econômico.

No que se refere ao exercício da liberdade de imprensa, referida contaminação é responsável pelo fenômeno do “pensamento único”, referido por Milton Santos (2015, p. 35), impondo padrões de comportamentos justamente para manter a dominação e inibir a formação de pessoas com visão crítica da realidade social. Para o autor, “tirania do dinheiro e tirania da informação são os pilares da produção da história atual do capitalismo globalizado […] A associação entre a tirania do dinheiro e a tirania da informação conduz, desse modo, à aceleração dos processos hegemônicos, legitimados pelo ‘pensamento único’, enquanto os demais processos acabam por ser deglutidos ou se adaptam passiva ou ativamente, tornando-se hegemonizados” (2015, p. 35).

O Estado, por sua vez, exerce sua soberania num determinado território, e uma das formas desse domínio é a jurisdição, ou seja, a função pela qual o Estado “se substitui aos titulares dos interesses em conflito para, imparcialmente, buscar a pacificação do conflito que os envolve, com justiça” (CINTRA; GRINOVER; DINAMARCO, 1998, p. 129). É exatamente neste espaço que se identifica o problema, uma vez que os provimentos jurisdicionais previstos em Lei não se revelam eficazes para reparar devidamente as lesões a direitos da personalidade produzidas por veículos de comunicação, o que exige uma ação estratégica, de natureza extrajudicial, sem excluir-se a tutela jurisdicional, diante do que determina o art. 5º, inciso XXXV, da Constituição Federal, dispositivo que consagra o princípio da inafastabilidade da jurisdição: “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”.[13]

Entre os atores sociais envolvidos em tal problemática, ou seja, a vítima da ofensa, os veículos de comunicação e o Poder Judiciário, uma grande parte do problema pode ser identificada neste último, na medida em que os magistrados, via de regra, não proferem decisões céleres e que sirvam de contraestímulo àquelas ofensas, fomentando assim a perpetuação do ato ilícito, o qual se revela uma atividade altamente compensatória para os veículos de comunicação, que contam com elevado aporte de capital proveniente de seus anunciantes e patrocinadores – [14] os veículos de comunicação acabam, pois, representando apenas os interesses econômicos destas organizações, viciando o espaço dedicado à informação, os quais se tornam unifuncionais, como alertam Haesbaert e Lefebvre (2005).

Este quadro exige a criação de uma tecnologia social on line destinada ao exercício do direito de resposta, que deverá ser pautada pela ética e imparcialidade da informação, e não pelo poder econômico de grandes organizações, viabilizando o acesso à informação verdadeira pela população. O território deve assim ser compreendido em sua acepção mais ampla, incluindo o território virtual, de suma importância no mundo contemporâneo. Como ressaltado por Fischer, “para discutir a gestão de espaços territoriais e virtuais onde ocorrem ações orientadas para o desenvolvimento, recorremos aos conceitos de poderes espacialmente localizados, com sua fragmentação e reconfiguração multiescalares em cidades, regiões e outros recortes interorganizacionais. Os poderes são exercidos em diferentes escalas, na construção de utopias comprometidas com o desenvolvimento local, definindo formas inovadoras de gestão social do desenvolvimento social” (2002, p. 12-13).

A utilização de uma tecnologia social on line destinada ao exercício do direito de resposta poderá agir de maneira mais efetiva sobre a realidade sociojurídica acima descrita, combatendo a inefetividade do Poder Judiciário, com potencial para, ao menos em tese, contribuir para que os veículos de comunicação sejam mais prudentes em suas investigações e afirmações, agindo com a civilidade que deles se espera, na medida em que a população deposita sua confiança nas notícias divulgadas, titularizando um direito difuso à informação verdadeira (CARVALHO, 2003, p. 105). Referida tecnologia, instrumento da Gestão Social, vai exatamente ao encontro das ponderações de Tenório (2001, apud FISCHER; MELO, 2006, p. 18), no sentido de contribuir para o desenvolvimento macro a partir de experiências implantadas no âmbito micro.

Oportuno ressaltar que a criação da mencionada tecnologia social está perfeitamente alinhada ao marco regulatório da internet, diploma que estabelece diversos fundamentos e princípios, entre os quais cumpre destacar: a) desenvolvimento da personalidade; b) exercício da cidadania em meios digitais; c) pluralidade; d) diversidade; e) abertura; f) colaboração; g) finalidade social da rede; h) garantia da liberdade de expressão, comunicação e manifestação de pensamento; i) preservação e garantia da neutralidade de rede; e j) preservação da natureza participativa da rede (arts. 2º, II, III, IV e VI, e 3º, I, IV e VII, Lei 12.965/14).

 

  1. Por uma necessária interdisciplinaridade entre Direito e Gestão Social: otimizando a resolução de conflitos

No desenvolvimento da pesquisa que originou o presente artigo, procurou-se conciliar as ciências do Direito, da Gestão Social e do Jornalismo, através de uma abordagem interdisciplinar, como forma de otimizar a defesa de direitos fundamentais previstos na Constituição Federal. Há uma evidente escassez de estudos multi e interdisciplinares no âmbito jurídico, cujas pesquisas, em sua grande maioria, acabam esgotando-se no plano teórico, não produzindo impactos sociais, daí por que Tavares e Bezerra, citando os ensinamentos de Colaço, lecionam que o curso de Direito “deve proporcionar uma formação diferenciada e direcionada à inovação, em que os conhecimentos adquiram consistência como processo de construção associado aos interesses e necessidades da sociedade, criando-se assim um novo modelo educacional. Também, entendemos que a Ciência do Direito carece de assumir sua posição de ciência crítica da realidade social, e não de mero instrumento formal das realidades (2006, p. 238)”.

Nessa mesma esteira, Leister e Wang (2012, p. 194-198) alertam sobre os desafios decorrentes da interdisciplinaridade, pois cada área do conhecimento possui o seu próprio método de abordagem e uma linguagem específica, trazendo o exemplo do que em Direito se chama de “instituição” (Congresso Nacional, Poder Judiciário, Ministério Público, Polícias, etc.), o que na Economia se denomina “organização”, expressão que, no âmbito jurídico, está mais ligada às ideias de “organização social” ou “organização da sociedade civil”, integrantes do Terceiro Setor (Leis 9.637/98, 9.790/99 e 13.019/14), ou, ainda, de organização criminosa (Lei 12.850/13).

Porém, uma vez superadas estas questões terminológicas, pode-se afirmar que, agregar a interdisciplinaridade nas pesquisas jurídicas, utilizando-se outras ciências para uma melhor compreensão do fenômeno social, e, principalmente, apresentar soluções mais efetivas para cada problema enfrentado, é o caminho correto para a construção de uma sociedade mais livre, justa e solidária, como declarado pelo art. 3º, inciso I, da Constituição Federal.

A tecnologia social on line destinada ao exercício do direito de resposta deverá ser administrada por um gestor – ou melhor, por um mediador-gestor, utilizando-se uma nomenclatura formada pela união entre as duas disciplinas –, sendo imprescindível que ele incorpore as seguintes capacitações enumeradas por Fischer e Melo: “(1) atuar num contexto de desafios e tensões entre a eficiência (busca de resultados) e a democracia (busca da participação social), entre o individual e o coletivo, o político e o técnico; (2) considerar as questões de forma integral, não fragmentada (aspectos sociais, culturais, ambientais, políticos e econômicos); (3) ultrapassar as tensões dicotômicas entre teoria e prática, local e global, disciplinar e inter/transdisciplinar; (4) ter a capacidade de migrar entre esferas e de atuar em rede, o que requer formação generalista e habilidade de comunicação e articulação; (5) trabalhar com a diversidade, respeitando cultura e linguagem de cada local; (6) criar referências próprias do local e, assim, contribuir para a construção de sujeitos sociais em cada processo em que atua; (7) validar criticamente contextos e ações, para selecionar tecnologias sociais apropriadas; (8) ser um gestor de conflitos, um mediador de interesses diferenciados; (9) ser um avaliador” (2006, p. 23-24).

Estas capacitações do mediador-gestor deverão ser somadas ao conhecimento nas áreas jurídica e de gestão, justamente porque o referido profissional deverá avaliar o cabimento ou não dos pedidos de direito de resposta formulados por possíveis vítimas de ofensas ou distorções proferidas por veículos de comunicação, lidando assim com múltiplos e complexos interesses em conflito.

No que se refere à aceitação da tecnologia social pelo público-alvo, as entrevistas semiestruturadas realizadas com vítimas e profissionais do Direito deixaram claro dois pontos centrais: a insatisfação com a prestação jurisdicional e a receptividade à tecnologia social on line destinada ao exercício do direito de resposta.[15] Neste sentido, uma das vítimas entrevistadas afirmou que os meios legais são eficazes, mas isso, segundo ela, depende de quem se encontra no polo passivo da demanda, pois, quando este é ocupado por organizações com forte poder econômico, tais mecanismos, na prática, tendem a ser menos eficazes, afirmando ser “necessária a criação de mecanismos extrajudiciais, especialmente por meio de blogs na internet, pois através das mídias sociais o cidadão pode exercer o seu direito de resposta contra os gigantes da imprensa”, e que “só quem passou por uma situação de violação de direitos sabe o que isso significa”.

Outro entrevistado afirmou ter promovido uma ação de reparação de danos contra uma mídia social que o ofendeu através de um site, totalizando 7 anos de tramitação, considerando a prestação jurisdicional extremamente morosa e o valor da indenização desproporcional (para menos), em comparação ao dano sofrido por conta da publicação da notícia reconhecida como inverídica na sentença – nas palavras do entrevistado, “houve morosidade no meu processo, mesmo em se tratando de Juizado Especial Cível. Além disso, o valor da indenização não foi proporcional ao mal que me fora causado pela matéria ofensiva”. Ao final, o entrevistado afirmou que deveriam ser criados mecanismos extrajudiciais mais céleres para o exercício do direito de resposta, pois, ele mesmo, na época das ofensas, não teve tal oportunidade, concluindo que certamente teria utilizado uma tecnologia social on line com esta finalidade, pois, segundo ele, “providências na esfera extrajudicial ajudam a melhorar a situação de demora na prestação jurisdicional”.

Essa mesma insatisfação com a prestação jurisdicional, seja quanto à variável “tempo”, seja em relação à variável “valor”, foi corroborada por dois profissionais do Direito entrevistados durante a Residência Social, com reconhecida atuação na defesa extrajudicial dos direitos da personalidade, justificando-se assim a criação da tecnologia social on line ora proposta, ressaltando-se, todavia, a natureza qualitativa do presente trabalho.

 

  1. Tecnologia social on line e extrajudicial (características)

A partir da referida abordagem interdisciplinar, a pesquisa originária teve como objetivo geral propor uma tecnologia social on line, de natureza extrajudicial, destinada ao exercício do direito de resposta. Referida tecnologia de gestão social possui evidente caráter democrático, podendo ser acessada e utilizada por qualquer pessoa pré-condenada ou ofendida por veículo de comunicação, buscando-se assim colocar a tecnologia em defesa dos direitos fundamentais e da própria cidadania, independentemente da prestação jurisdicional.

Dentre as características apontadas por Dagnino (2014, p. 23-24), destacam-se a necessidade de que a tecnologia social seja “liberadora do potencial e da criatividade do produtor direto, não discriminatória, orientada para um mercado interno de massa e adaptada ao reduzido tamanho físico e financeiro”, enquanto sua implantação deverá orientar-se pelos seguintes conjuntos: a) descrição; b) conhecimento; c) sustentabilidade econômica, ambiental, cultural e política; d) alternativas tecnológicas; e) entorno sociotécnico; e f) dinâmica sociotécnica (DAGNINO, 2014, p. 194-195).

A tecnologia social on line destinada ao exercício do direito de resposta também apoia-se no “movimento contra-hegemônico” capitaneado pelas mídias sociais, exatamente porque estas são constituídas por iniciativas individuais e multifacetadas, propondo novas agendas políticas, éticas e morais (GAJANIGO; FERREIRA de SOUZA, 2014); segundo os mesmo autores, “o que se busca destacar é o tipo de ação que o ciberespaço proporcionou aos indivíduos, tenham eles ideais de esquerda ou conservadores. A fala do sujeito enunciador e o lugar do enunciado deslocaram-se, provocando mudanças significativas. O lugar ocupado pelo enunciado – político, intelectual, ambientalista ou econômico -, com o advento do ciberespaço e com a cibercultura, passou a ser tensionado por sujeitos heterogêneos e múltiplos, dissonantes e multifacetados, portadores de mecanismos de mobilização também múltiplos, proporcionados pelas novas tecnologias de informação e comunicação” (2014).

Além dessas características gerais, a tecnologia social ora proposta deverá apresentar as seguintes especificidades:

 

4.1. Dinamismo

A utilização do território virtual para o exercício do direito de resposta, que é uma via extrajudicial, confere maior dinamismo ao instituto, com potencial para preservar os direitos da personalidade da vítima de maneira mais célere, sem excluir o pedido judicial, o qual não fica prejudicado;[16] aliás, não foi por acaso que se agregou a palavra “dinâmica” ao próprio conceito do direito de resposta, acima estabelecido.[17]

A tecnologia social on line poderá funcionar como um “meio alternativo de pacificação social” (CINTRA; GRINOVER; DINAMARCO, 1998, p. 25-26), encontrando fundamento na ineficácia da prestação jurisdicional.[18] Entre estes meios alternativos costumam ser citados: a) autotutela ou autodefesa, definida como a “imposição do direito por uma das partes, sem a intervenção do Estado-juiz” (SCHOEDL, 2015b, p. 725), e.g., legítima defesa (CP, art. 25), desforço imediato da posse (CC, art. 1.210, § 1º) e direito de retenção (CC, art. 1.219); b) autocomposição, quando uma ou ambas as partes abrem mão de seu direito, total ou parcialmente,  admitida apenas quando tiver por objeto direitos disponíveis, dividindo-se em desistência (renúncia à pretensão), submissão (concordância com a pretensão do autor) e transação (concessões recíprocas) (CINTRA; GRINOVER; DINAMARCO, p. 21).[19]

Pode-se afirmar que o exercício do direito de resposta através de uma tecnologia social on line constitui uma modalidade de autotutela mitigada, pois, embora ele dependa unicamente da iniciativa do ofendido, o deferimento ou não do pedido será avaliado por um mediador-gestor, equidistante das partes.[20] Referido procedimento não possui natureza genuína de mediação ou arbitragem, uma vez que o veículo ofensor somente será informado após a concessão do direito de resposta, podendo ou não se retratar, conforme entenda ou não que o desmascaramento da informação anteriormente divulgada poderá trazer prejuízo à sua reputação e credibilidade, valores que, agregados à confiabilidade, constituem o tripé da atividade jornalística (CHRISTOFOLETTI; LAUX, 2008).

Sob o aspecto tecnológico, o dinamismo proposto está intimamente relacionado ao conceito de “e-democracia”,[21] inerente à Tecnologia da Informação e Comunicação (TIC), definida por Soares Junior e Marques dos Santos como a “capacidade do novo ambiente organizacional, tecnológico e de comunicações de promover o aumento do grau e da qualidade da participação pública no governo” (2007, p. 3). Com efeito, a tecnologia social on line destinada ao exercício do direito de resposta poderá contribuir, efetivamente, para a maior informação e politização da população, exatamente por conta do seu potencial de fazer emergir fatos anteriormente omitidos ou deturpados, viabilizando assim a chamada democratização da informação, uma vez que a divulgação de notícias, a cada dia, deixa de ser apenas um privilégio dos grandes veículos de comunicação social.

Nessa esteira, uma importante transformação nos meios de comunicação adveio com os blogs, em 1990, possibilitando que outros atores sociais não vinculados aos grandes veículos divulgassem notícias de maneira independente (CHRISTOFOLETTI; LAUX, 2008, p. 32) e dinâmica, e é nessa perspectiva que a tecnologia social proposta se apoiará, facilitando o exercício do direito de resposta e ao mesmo tempo trazendo à tona os fatos propositadamente omitidos ou deturpados pelos veículos de comunicação.

Christofoletti e Laux relatam algumas pesquisas realizadas nos Estados Unidos, apontando o crescimento da aceitação dos blogs pelo público, e, consequentemente, do próprio nível de credibilidade dessa modalidade de mídia,[22] afirmando que “boa parte dessa aceitação estaria ligada ao fato de que os blogs absorvem e dão vazão a discussões que são ignoradas pela grande mídia. Os leitores até reconheceriam suas falibilidades, mas isso seria contrabalançado pela abertura, interatividade e disposição a dar mais relevo aos relatos honestos […] Os blogs ajudam a questionar a objetividade jornalística, o equilíbrio do noticiário, a qualidade e apuração das informações” (2008, p. 39-40).

Sob o aspecto jurídico, este dinamismo vai ao encontro da chamada “democratização da interpretação constitucional”, almejada por Häberle (2002, p. 14), partindo-se “de uma sociedade fechada dos intérpretes da Constituição para uma interpretação constitucional pela e para uma sociedade aberta” (HÄBERLE 2002, p. 12-13), justamente por permitir que diversos atores sociais – e não apenas o Poder Judiciário – promovam a interpretação da Constituição Federal quando verificado o conflito entre a liberdade de imprensa e os direitos da personalidade, trazendo-se o debate para o território virtual.

Segundo Häberle (2002, p.14), o círculo de intérpretes da Constituição deve ser ampliado, não se restringindo aos magistrados, de modo a envolver cidadãos, órgãos públicos, entidades de classe, entre outros atores sociais, os quais integram os denominados “intérpretes constitucionais em sentido lato”; para o autor, “todo aquele que vive no contexto regulado por uma norma e que vive com este contexto é, indireta ou, até mesmo diretamente, um intérprete dessa norma. O destinatário da norma é participante ativo, muito mais ativo do que se pode supor tradicionalmente, do processo hermenêutico. Como não são apenas os intérpretes jurídicos da Constituição que vivem a norma, não detêm eles o monopólio da interpretação da Constituição […] a democracia não se desenvolve apenas no contexto de delegação da responsabilidade formal do Povo para os órgãos estatais (legitimação mediante eleições), até o último intérprete formalmente ‘competente’, a Corte Constitucional. Numa sociedade aberta, ela se desenvolve também por meio de formas refinadas de mediação do processo público e pluralista da política e da práxis cotidiana, especialmente mediante a realização dos Direitos Fundamentais (Grundrechtsverwirklichung), tema muitas vezes referido sob a epígrafe do ‘aspecto democrático’ dos Direitos Fundamentais” (2002, p. 15 e 36).

É certo que a figura romântica do magistrado próximo ao jurisdicionado e pronto para atender com eficiência e celeridade os seus reclamos raramente consolidou-se como realidade social, daí a crescente necessidade de ampliar-se o espectro de atores sociais envolvidos na interpretação constitucional e na defesa de direitos fundamentais, contribuindo-se para o fenômeno da “desjudicialização”.[23]

 

4.2. Efetividade

A Constituição Federal não só assegura o direito de resposta, mas também exige que ele seja “proporcional ao agravo” (art. 5º, V), exatamente para que se obtenha uma proteção efetiva aos direitos da personalidade do ofendido. A proporcionalidade referida pela Constituição Federal repousa no princípio da igualdade e na própria Justiça corretiva, concebida por Aristóteles (1973, p. 323-329), cujo escopo é reparar lesões e restabelecer o status quo ante (igualdade aritmética),[24] exigindo-se, portanto, que a resposta da pessoa ofendida por notícias inverídicas seja efetivamente proporcional, tanto no tempo como no espaço, pois, “há de se dotar o ofendido dos mesmos meios usados pelo ofensor, para que o leitor ou espectador possa fazer um juízo mais isento sobre a matéria jornalística” (CARVALHO, 2003, p. 118).

De acordo com Godoy, “é preciso que os órgãos de imprensa tenham sempre presente a desigualdade e a sobrepujança de seus meios em relação ao homem. Insta que os veículos próprios atentem para as consequências de sua atividade, que, por vezes, culmina no que alguns autores convencionam chamar de ‘efeito do pelourinho’, de que são vítimas pessoas em favor de quem o direito de resposta garantido nem sempre é plenamente eficaz” (2015, p. 69).

O grande desafio dos tempos atuais já não é a ausência de normatização dos direitos fundamentais, mas sim possibilitar que tais direitos sejam observados no plano concreto, devendo a discussão exceder o plano dogmático. Como adverte Bobbio (2004, p. 23).[25], “o problema fundamental em relação aos direitos do homem, hoje, não é tanto o de justificá-los, mas o de protegê-los. Trata-se de um problema não filosófico, mas político”.

Neste ponto é que as novas tecnologias da informação cumprem um relevante papel social, devendo ser incluída em tal cenário a defesa de direitos fundamentais por intermédio do território virtual. Lima ressalta que “a Revolução da tecnologia é considerada o ponto de partida das mudanças da nova economia. Com o surgimento da Internet e o conceito de sociedade em rede (Castells), a dinâmica social passa a ter uma nova centralidade. Muda a geografia da rede (todo o mundo pode se conectar); a concentração está nos provedores de acesso; há uma divisória digital, com separação entre os que possuem acesso à rede e os que não o têm; há também modificações nas sociabilidades entre as pessoas e transformações nos meios de comunicação” (2015, p. 68).

Contudo, se a Era da Informação, consolidada na segunda metade do século XX, já produziu significativos avanços nos mais diversos campos do conhecimento, o Direito ainda caminha a passos lentos, pois a defesa de direitos e da própria cidadania, via de regra, continua sendo exercitada apenas pela via tradicional e morosa do processo judicial, sendo raros os exemplos de tecnologias sociais on line direcionadas a esta finalidade.

Por outro lado, apesar do reconhecimento da grande utilidade e importância das mídias sociais no mundo contemporâneo – que, segundo Castells (2013, apud LIMA, 2015, p. 90), “são espaços de autonomia, muito além do controle de governos e empresas” –, elas ainda não são suficientes para substituir a força massificadora dos meios de comunicação tradicionais (rádio, TV, jornais e periódicos), de modo que a tendência é no sentido de uma convivência paralela entre as diversas modalidades de mídia.

Consequência inevitável dessa força massificadora dos meios de comunicação tradicionais é o desvirtuamento do direito de informar, violando-se os direitos da personalidade daqueles que são alvos de matérias jornalísticas e gerando um elevado número de ações judiciais, fenômeno que consolida um Poder Judiciário cada vez mais anacrônico e ineficiente.

Na Justiça Estadual, competente, em regra, para julgar as ações de direito de resposta, o tempo médio de tramitação do processo é o seguinte:[26] a) 1 ano e 11 meses para que seja proferida a sentença em 1ª instância, acima da média geral do Poder Judiciário, de 1 ano e 6 meses (processos de conhecimento); b) 4 anos e 4 meses, para os processos de execução, exatamente a mesma média geral do Poder Judiciário; c) 6 meses na segunda instância (Tribunais de Justiça); e d) 10 meses no Superior Tribunal de Justiça, consideradas aqui todas as competências deste Tribunal, e não apenas as ações provenientes da Justiça Estadual.

No próprio “caso da Escola Base”, anteriormente referido,[27] o tempo de tramitação do processo foi muito maior: a ação foi proposta em 8 de janeiro de 2003,[28] ingressando no Superior Tribunal de Justiça em 8 de novembro de 2010, sendo que a baixa definitiva ocorreu em 28 de janeiro de 2015, completando, somente no Superior Tribunal de Justiça, 4 anos, 2 meses e 20 dias de tramitação,[29] perdurando o total de 12 anos e 20 dias, isso computando-se apenas o processo de conhecimento.

Tal conjuntura exige a criação de novas tecnologias voltadas à defesa dos direitos da personalidade atingidos por notícias inverídicas – no caso, uma tecnologia social on line destinada ao exercício do direito de resposta –, sejam as notícias veiculadas pelos meios de comunicação tradicionais, sejam pelas próprias mídias sociais. Há, inclusive, um certo paradoxo envolvendo a tecnologia social on line aqui proposta, mas ele é apenas aparente: se, de um lado, referida tecnologia apoia-se nos benefícios trazidos pelas mídias sociais em prol da democratização da informação, por outro, ela também funciona como instrumento de defesa da vítima ofendida pelas próprias mídias sociais.

Em artigo publicado no Jornal Folha de São Paulo, Demétrio Magnoli adverte que o Google e o Facebook já desenvolvem projetos com a finalidade de bloquear anúncios de sites destinados à divulgação de inverdades publicadas nos meios de comunicação, sejam nos tradicionais, sejam nas  mídias sociais, afirmando que “estava errada a associação entre a emergência das redes sociais e a democratização da informação”.[30] Este tema certamente merece um estudo específico, mas vale o alerta do articulista sobre eventuais dificuldades que poderão ser encontradas no momento da implantação da tecnologia social proposta.[31]

O próprio “direito ao esquecimento” (right to be forgotten)[32] ganha outros contornos quando se ingressa no território virtual, onde qualquer pesquisa em sites de busca costuma associar o nome de pessoas já absolvidas ou cujas investigações foram arquivadas aos fatos que foram objeto de persecução penal, daí a importância da normativa europeia (Regulamento 2016/679, UE), relacionada à proteção das pessoas quanto aos seus dados pessoais, que procurou conferir um tratamento adequado aos interesses em conflito, podendo ser utilizada como referência pela jurisprudência brasileira.[33]

 

4.3. Centralização

Partindo de uma visão pessimista sobre o amplo uso das mídias sociais, Gajanigo e Ferrreira de Souza (2014) argumentam que os movimentos organizados por elas “são inócuos, pois estariam fadados à fragmentação e ao espontaneísmo, o que constitui um obstáculo à luta política de fato”; porém, mais adiante, os mesmos autores reconhecem os aspectos positivos resultantes do uso das mídias sociais nos últimos anos, especialmente quanto à construção do movimento político.

Ao se criar um espaço centralizado no território virtual, pretende-se justamente que o exercício do direito de resposta não se dê apenas de forma individual, esparsa e “fragmentada”, a fim de que produza maior impacto social, procurando-se atenuar o domínio da informação pelos grandes agentes econômicos, na esteira do que propõe o citado “movimento contra-hegemônico”, conduzido pelas mídias sociais.

A tecnologia social on line deverá apoiar-se nesta perspectiva, aliada à premissa de que o direito de resposta possui também um viés coletivo,[34] considerando não apenas os interesses da pessoa ofendida, mas também o direito fundamental de toda coletividade a ter acesso à informação verdadeira, atuando como um instrumento de defesa de direitos fundamentais e como uma espécie de mídia social, ao divulgar informações que foram omitidas ou deturpadas pelos meios de comunicação, inclusive pelas próprias mídias sociais, como ressaltado no item anterior.

Segundo Carvalho (2003, p. 89-90), ao lado do direito de informar, reconhece-se aos veículos de comunicação a faculdade de não informar. Não seria exagero afirmar que houve uma substituição da censura estatal por uma censura imposta pelos próprios agentes econômicos que patrocinam os veículos de informação, mas com a construção de um site centralizado para o exercício do direito de resposta, as informações omitidas poderão vir à tona num local específico, e não fragmentado.

Pretende-se, portanto, que a tecnologia social on line funcione não apenas como meio alternativo de pacificação de conflitos, mas que, por via reflexa, atue como uma autêntica mídia social, divulgando-se os fatos omitidos ou deturpados pelos veículos de comunicação.

 

  1. O princípio da inafastabilidade da jurisdição como legitimador da tecnologia social on line (CF, art. 5º, XXXV) e a cultura no meio forense

O art. 5º, inciso XXXV, da Constituição Federal consagra o princípio da inafastabilidade da jurisdição, dispondo que “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”. Em nível infraconstitucional, diversas normas asseguram o acesso universal à prestação jurisdicional, inclusive sem a necessidade de advogado, como nas ações propostas nos Juizados Especiais Cíveis, até o valor de 20 salários-mínimos (art. 9º, Lei 9.099/95).

Mas estas garantias previstas no plano normativo, em verdade, colidem com a realidade e até mesmo com a cultura do meio forense, pois, o que se observa é um grande distanciamento entre magistrados e jurisdicionados, e até mesmo entre estes últimos e o próprio Ministério Público, muito embora referido órgão seja o guardião constitucional dos interesses sociais e individuais indisponíveis (CF, art. 127, caput), – ou, na feliz expressão de Mazzilli (2013, p. 366), “o tutor natural dos interesses transindividuais”.[35]

Tal distanciamento começa pela própria linguagem forense, muitas vezes de difícil compreensão para as pessoas não militantes na área, ainda que eruditas em outras esferas do conhecimento. As decisões judiciais, que deveriam servir para esclarecer a sociedade a respeito das soluções adotadas em determinadas matérias, com sua linguagem rebuscada acabam produzindo aversão ao seu conteúdo.

Com a facilitação da consulta aos processos judiciais pela internet, se a linguagem dos articulados e das decisões fosse mais compreensível, o jurisdicionado poderia obter, neste espaço virtual, relevantes informações sobre uma determinada controvérsia, construindo-se assim uma verdadeira ferramenta de civilidade. No entanto, infelizmente a realidade não é essa, uma vez que a maior parte da população não consegue assimilar o conteúdo das decisões judiciais.

Outro grande empecilho para a aproximação entre magistrados, promotores, procuradores e a população é o ambiente forense, os quais, principalmente nas cidades menores, mais se assemelham a pequenos feudos, onde o senhor feudal (juiz de direito) reina soberano e distante da população, em total descompasso com o dispositivo constitucional que assegura a inafastabilidade da jurisdição (CF, art. 5º, XXXV). As próprias vestes forenses, especialmente o uso de togas, e toda formalidade inerente aos tribunais acaba afastando a população, que, receosa, sente-se intimidada, chegando ao ponto de muitas vezes abrir mão de seus direitos, especialmente quando informada sobre o tempo de tramitação dos processos. Carnelutti, assim já se manifestou sobre este tema: “A primeira coisa que se nota e impressiona, quando entramos pela primeira vez em uma Corte em que se discute Processo Penal, é a solenidade das roupas, evidenciando a autoridade de umas pessoas sobre as outras durante o transcurso dos trabalhos. Esta foi a primeira impressão que eu tive da Justiça e a que ficou para sempre entre as minhas lembranças do dia em que, ainda menino, fui levado até a Corte de Apelação, nas proximidades da Rua Carour, em Florença, para assistir a uma das suas sessões e, de uma das janelas do que a abrigava, vi um magistrado, vestido de toga, saindo de uma das suas salas, Fiquei encantado! Aquela visão me impressionou sobremaneira […] A toga, como já dissemos, é uma vestimenta que evidencia a autoridade de quem a usa, do mesmo modo que a divisa dos militares, mas com uma diferença: os magistrados e os advogados somente a utilizam durante os atos, particularmente, considerados solenes, muito embora na França e, principalmente, na Inglaterra, onde os costumes são observados mais rigidamente, o uso da toga é obrigatório até mesmo para os advogados adentrarem as dependências do Judiciário” (2010, p. 19-20).

Decerto que todo este aparato formal, característico do Poder Judiciário, produz um efeito inibidor sobre a população, receosa em procurar o serviço público fornecido por este Poder (prestação jurisdicional), tudo isso aliado ao elevado valor das custas para ajuizar ações reparatórias, quando não deferida a gratuidade da justiça – o que, infelizmente, vem sendo a regra –, fatores que igualmente contribuem para tornar as ofensas produzidas por veículos de comunicação uma atividade compensatória.

Apesar dessas considerações a respeito da deficiência do acesso à prestação jurisdicional, o princípio da inafastabilidade da jurisdição deve funcionar como legitimador da tecnologia social on line destinada ao exercício do direito de resposta, pois, uma vez verificada a ofensa proferida pelo veículo de comunicação, a vítima poderá optar pelo direito de resposta extrajudicial (junto ao veículo ofensor), pela ação judicial de direito de resposta ou por se defender no território virtual, ou por todas as medidas conjuntamente, pois a utilização da ação judicial não impede que o ofendido exerça o seu direito de resposta por intermédio da tecnologia social proposta – apenas não se admite tal ação quando o ofendido já houver exercitado o direito de resposta pela via extrajudicial, junto ao veículo de comunicação, pois neste caso lhe faltaria interesse de agir.

 

  1. Outros exemplos de tecnologias sociais on line e extrajudiciais destinadas à defesa de direitos

Foram realizadas buscas na internet de tecnologias sociais on line e extrajudiciais voltadas à defesa de direitos, além de uma busca mais específica sobre sites e blogs dedicados ao exercício do direito de resposta no território virtual. Foram excluídos os sites e blogs de natureza meramente informativa sobre os direitos da população e a forma de seu exercício, sendo a busca centrada naqueles que forneciam um serviço de efetiva defesa de direitos ou de mediação, com a finalidade de solucionar conflitos.

Nenhuma tecnologia social on line e extrajudicial destinada ao exercício do direito de resposta foi encontrada, mas foram identificados dois sites com escopo de proteção aos direitos do consumidor através da mediação.

No Brasil, a principal tecnologia social on line e extrajudicial destinada à defesa de direitos é o “Reclame aqui” (www.reclameaqui.com.br),[36] cuja finalidade é promover a mediação entre consumidores e fornecedores, quando verificado o defeito no produto ou serviço. Após fazer o login, o consumidor posta no referido site a sua reclamação, cabendo aos mediadores comunicá-la ao fornecedor, o qual poderá ou não entrar em contato com o consumidor para solucionar o problema, cabendo a este postar no site o resultado alcançado. A postagem da reclamação no território virtual funciona como instrumento de coerção contra o fornecedor, o qual se vê compelido a solucionar o problema o mais rapidamente possível, caso realmente tenha fornecido um produto ou serviço defeituoso, mesmo porque a publicidade negativa pode trazer prejuízos à sua atividade empresarial.

Referido site tem contribuído para a efetiva proteção dos direitos do consumidor pela via extrajudicial, proporcionando uma solução mais célere e menos onerosa do que a propositura de ações judiciais, o que contribui para o desafogo do Poder Judiciário, ainda que na maioria das vezes os casos sejam afetos aos Juizados Especiais Cíveis. Além disso, há informes no site sobre os direitos do consumidor e os mecanismos de proteção.

Tais características do site “Reclame aqui” certamente poderão servir como norte para a tecnologia social on line proposta no presente trabalho.

 

  1. Funcionamento da tecnologia social on line destinada ao exercício do direito de resposta

A tecnologia social on line proposta, desenvolvida em conjunto com a organização Criahauz Comunicação Integrada (www.criahauz.com.br), não apresenta maiores complexidades para o seu manejo pelo usuário, cujo acesso será gratuito, compreendendo, basicamente, uma página inicial e cinco páginas internas, cada uma com os seguintes assuntos:

  1. a) Informações sobre o direito de resposta: em linguagem clara e acessível, pois o público-alvo não se resume a estudantes e operadores do Direito, contendo também os dispositivos constitucionais e legais relacionados ao tema;
  2. b) Direitos de resposta concedidos: o texto do direito de resposta deverá ser enviado pela vítima por e-mail, acompanhado da matéria ofensiva e de documentos que comprovem a distorção ou ofensa proferida pelo veículo de comunicação, com um tamanho limite para não prejudicar o dinamismo norteador da tecnologia, mas sem cercear o direito de defesa do ofendido; o material será analisado pelo mediador-gestor, a quem caberá decidir pela publicação ou não do direito de resposta; a atuação deste profissional visa justamente impedir que a tecnologia proposta se transforme num local de intermináveis discussões, daí a necessidade de que ele tenha conhecimento nas áreas jurídica e de gestão social, atuando com a sensibilidade devida; aliás, como bem ressaltado por Fischer e Melo, “o gestor do desenvolvimento social é um mediador multiqualificado, situando-se em um contínuo que vai da capacidade de dar respostas eficazes e eficientes às situações cotidianas à capacidade de enfrentar problemas de alta complexidade” (2006, p. 22).

Neste ponto, é oportuno trazer à colação a advertência do Prof. Lucas Barelli Del Guércio, ao conceder entrevista durante a Residência Social desenvolvida na pesquisa originária, respondendo sobre os benefícios da referida tecnologia social: “Eu penso que seria muito bom, desde que ela não se transforme num local de discussões intermináveis entre as partes ou de acusações recíprocas, constituindo um círculo vicioso. Se a plataforma for utilizada de forma respeitosa, fornecendo à resposta a mesma velocidade da ofensa, seria muito positivo”;[37]

 

  1. c) Artigos sobre direito de resposta: espaço para a publicação de artigos sobre o tema, de no máximo 10.000 caracteres, elaborados tanto por estudantes e operadores do Direito, como de outras ciências;

 

  1. d) Jurisprudência relacionada ao direito de resposta: espaço contendo a íntegra de decisões judiciais sobre pedidos de direito de resposta, além de súmulas de Tribunais, de caráter vinculante ou não;

 

  1. e) Contato.

 

  1. Impactos em relação a cada um dos atores sociais relacionados à problemática enfrentada

A tecnologia social on line proposta poderá apresentar o seguinte impacto em relação a cada um dos três atores sociais envolvidos na problemática:

  1. a) Pessoa ofendida: poderá exercitar a sua defesa pública num espaço centralizado, com velocidade proporcional à das ofensas e sem depender da prestação jurisdicional ou da boa vontade do veículo de comunicação;
  2. b) Veículos de comunicação: terão ciência de que existe um espaço centralizado no território virtual, onde as pessoas possam se informar e verificar se as notícias divulgadas são verdadeiras ou não, e à semelhança do que se observou em relação aos blogs, buscar-se-á promover uma maior “interpenetração e contágio entre esses dois mundos” (CHRISTOFOLETTI; LAUX, 2008, p. 47), o que pode contribuir para uma maior qualidade das notícias sobre fatos objeto de procedimentos investigatórios ou judiciais;
  3. c) Poder Judiciário: espera-se que, ao tomarem conhecimento da tecnologia social on line, seus magistrados possam se encorajar e proferir decisões que, efetivamente, sirvam de contraestímulo à produção de danos morais e materiais por veículos de comunicação, seja nas ações de reparação de danos, seja nas ações de direito de resposta.

Como já afirmado, adota-se neste trabalho a premissa de que a informação verdadeira constitui um direito difuso, e, portanto, pertencente à coletividade (CARVALHO, 2003, p. 105). O próprio Rousseau (1978, p. 35), referindo-se ao pacto social como instrumento político de proteção do estado de natureza, já advertia que, “desde o momento em que essa multidão se encontra assim reunida em um corpo, não se pode ofender um dos membros sem atacar o corpo, nem, ainda menos, ofender o corpo sem que os membros se ressintam”.

Portanto, a tecnologia social on line destinada ao exercício do direito de resposta deve apoiar-se em tal perspectiva, não considerando somente os interesses subjetivos da pessoa diretamente atingida pela ofensa, buscando, além de protegê-la, criar as condições necessárias para que os veículos de comunicação sejam mais éticos e imparciais nas suas investigações e afirmações,[38] o que exige uma atuação precisa do mediador-gestor.

Importante desafio será criar as condições necessárias para a implantação da referida tecnologia social, fazendo com que a mesma chegue ao conhecimento do maior número possível de pessoas; após a implantação, caberá ao mediador-gestor adotar as providências necessárias para sua publicidade, sendo que o público-alvo compreende estudantes e operadores do Direito, jornalistas, repórteres e pessoas que já foram ofendidas ou pré-condenadas por veículos de comunicação.

 

Considerações finais

A partir de uma abordagem interdisciplinar, envolvendo as ciências do Direito, da Gestão Social e do Jornalismo, é possível reconhecer a eficácia do território virtual para a defesa pública dos direitos da personalidade de pessoas ofendidas ou pré-condenadas por veículos de comunicação, legitimando-se a criação de uma tecnologia social on line destinada ao exercício do direito de resposta, de modo a otimizar a resolução de conflitos.

Referida tecnologia deverá ser administrada por um profissional com conhecimento tanto na área jurídica como na de gestão social – o mediador-gestor –, o que lhe possibilitará apreciar de forma técnica e imparcial os pedidos de direito de resposta formulados por possíveis vítimas, pautando-se pela imparcialidade e pela ética, e não pelo poder econômico de grandes organizações, viabilizando-se o acesso à informação verdadeira pela população.

Importantes lições podem ser extraídas dos blogs, os quais têm desempenhado a relevante função de democratizar a informação, permitindo que outros atores sociais não vinculados aos meios de comunicação tradicionais exercitem o direito de informar de maneira independente. Seguindo este caminho, a tecnologia social on line proposta visa não apenas facilitar o exercício do direito de resposta pela vítima, mas também trazer à tona a veracidade sobre fatos propositadamente omitidos ou deturpados pelos meios de comunicação, incluindo-se as próprias mídias sociais.

No que se refere ao funcionamento da tecnologia social proposta, procurou-se configurá-la de modo a proporcionar um fácil manejo pelo usuário, com linguagem simples e acessível, pois o público-alvo não se resume a operadores e estudantes de Direito, cabendo ao mediador-gestor examinar os pedidos. Para exercitar o seu direito de resposta, bastará que a vítima envie por e-mail a matéria ofensiva (vídeo, áudio, texto ou página da internet), a documentação que comprove a ofensa ou distorção dos fatos noticiados, e o texto com o seu direito de resposta, tudo com um tamanho limite para que não haja prejuízo ao dinamismo norteador da tecnologia social.

Espera-se que a tecnologia social on line destinada ao exercício do direito de resposta produza impactos efetivos sobre cada um dos atores sociais relacionados à problemática enfrentada, fazendo com que: a) os veículos de comunicação tenham ciência da existência de um espaço centralizado no qual sejam apontadas distorções, ofensas e pré-condenações, e assim passem a adotar maior cautela nas suas investigações e afirmações, conferindo maior qualidade à notícia; b) os magistrados profiram decisões mais céleres e efetivas para a proteção das vítimas, tanto nas ações de reparação de danos como nos pedidos de direito de resposta; e c) as vítimas tenham pleno conhecimento de que poderão exercitar o seu direito de resposta num espaço dinâmico e centralizado, possibilitando-lhes uma defesa efetiva dos seus direitos da personalidade.

 

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SOARES JUNIOR, Jair Sampaio; MARQUES dos SANTOS; Ernani. Governança Eletrônica: Uma Perspectiva Sociotécnica das Organizações Públicas a partir da Padronização e Interoperabilidade. Disponível em <<http://www.anpad.org.br/admin/pdf/APS-A3005.pdf>>. Acesso em 22.05.2017.

 

SUIAMA, Sergio Gardenghi. A voz do povo e o dono da voz: o direito de resposta coletiva nos meios de comunicação social. In: Boletim Científico da Escola Superior do Ministério Público da União. Brasília: ESMPU, v. 11, n. 37. Ed. esp, 2011, p. 107-120.

 

TELLES JÚNIOR, Goffredo. Direito subjetivo. In: FRANÇA, R. Limongi (coord.). Enciclopédia Saraiva do Direito. São Paulo: Saraiva, 1977, v. 28, p. 298-330.

 

 

Anexo I: Layout estrutural da tecnologia social[39]

[1] Como ressaltado por Afonso da Silva (2001, p. 412), direitos e garantias fundamentais não se confundem: enquanto aqueles são bens e vantagens conferidos pela norma, as garantias são os meios destinados a fazer valer os direitos.

[2] Tratam-se, pois, de direitos inerentes ao ser humano, de natureza extrapatrimonial e que decorrem do simples fato dele existir, coexistindo com seus direitos patrimoniais, mas que com estes não se confundem, muito embora sua violação também possa ser resolvida em perdas e danos (SCHOEDL, 2015, p. 225-226).

[3] A respeito da teoria da ponderação, confira-se: DWORKIN, Ronald. Levando os direitos a sério. 3ª ed. trad. Nelson Boeira. São Paulo: Editora WMF Martins Fontes, 2010; ALEXY, Robert. Teoria dos Direitos Fundamentais. Trad. de Virgílio Afonso da Silva. São Paulo: Malheiros, 2008; e CANOTILHO, J. J. Gomes. Direito Constitucional. 5ª ed. Coimbra: Livraria Almedina, 1991.

[4] Sobre este último aspecto, confira-se: SCHOEDL, Thales Ferri. A compensatória produção de danos morais por veículos de comunicação. In: PAGLIARINI, Alexandre Coutinho (org.); TOLENTIMO, Zelma Tomaz (org.). Direitos Fundamentais e Relações Jurídicas. Rio de Janeiro: LMJ Mundo Jurídico, 2015, p. 225-243.

[5] Vide item nº 1.

[6] Confira-se, neste sentido: NOGUEIRA, Paulo Lúcio. Em defesa da honra (Doutrina, legislação e jurisprudência). Calúnia – Difamação – Injúria – Outras ofensas, direito de resposta, dano moral. São Paulo: Saraiva, 1995, p. 33; CARVALHO, Luiz Gustavo Gardinetti Castanho de. Liberdade de informação e o direito difuso à informação verdadeira. Rio de Janeiro: Renovar, 2003, p. 117; e SUIAMA, Sergio Gardenghi. A voz do povo e o dono da voz: o direito de resposta coletiva nos meios de comunicação social. In: Boletim Científico da Escola Superior do Ministério Público da União. Brasília: ESMPU, v. 11, n. 37. Ed. esp, 2011, p. 113.

[7] Neste sentido: SANKIEVICZ, Alexandre. Concretização do Direito Fundamental à Resposta: quando é devido o direito de resposta? In: Revista de Direito Público (DPU). Ano VIII, n. 38, Mar-abr, 2011, p. 28.

[8] Sobre a possibilidade do convívio harmônico da tecnologia social proposta com as modalidades de direito resposta, confira-se o item nº 5.

[9] A respeito dessas características, vide item nº 4.

[10] Disponível em <<http://www.pergamum.bib.ufba.br/pergamum/biblioteca/index.php>>. Acesso em 6.11.2017.

[11] SCHOEDL, Thales Ferri. Liberdade de imprensa e direitos da personalidade: uma abordagem interdisciplinar. São Paulo: Letras Jurídicas, 2019.

[12] Optou-se pela entrevista semiestruturada para evitar o acúmulo indevido de informações, prejudicando a análise (ROESCH, 1996, p. 150; FLICK, 2009, p. 56). Sobre a possibilidade de realização de entrevistas em pesquisas qualitativas, Barral ressalta que “vem crescendo nos últimos anos as pesquisas jurídicas que envolvem trabalho de campo, que podem se materializar em entrevistas, pesquisas de mercado, aplicação de questionário e estudo de caso. O pesquisador deve atentar, entretanto, para as regras e técnicas aplicáveis a cada um desses procedimentos” (2010, p. 63).

[13] Confira-se ainda o item nº 5, que trata do princípio da inafastabilidade da jurisdição como legitimador da tecnologia social on line proposta neste trabalho.

[14] Tomando-se como exemplo o conhecido “caso da Escola Base” (São Paulo, 1994), em que os diretores da referida instituição de ensino foram investigados e presos preventivamente pela prática de atos libidinosos contra os respectivos alunos (supostas orgias), com base nas declarações de duas crianças de 04 anos, provando-se, posteriormente, que a notícia divulgada não correspondia à realidade, uma das emissoras de TV (SBT) foi condenada ao pagamento de apenas R$ 100.000,00 para cada vítima, valor totalmente desproporcional em comparação à gravidade e repercussão das ofensas, o qual pôde ser ressarcido em poucos segundos através da receita decorrente de anúncios publicitários. Informações extraídas do REsp nº 1215294/SP, interposto junto ao Superior Tribunal de Justiça, de relatoria do Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, da Terceira Turma, julgado no dia 17 de dezembro de 2013. Disponível em <<https://ww2.stj.jus.br/processo/pesquisa/?tipoPesquisa=tipoPesquisaNumeroRegistro&termo=201001775170&totalRegistrosPorPagina=40&aplicacao=processos.ea>>. Acesso em 24.05.2016.

Para se ter uma ideia, um anúncio de 30 segundos no intervalo do Jornal Nacional custa R$740.400,00 (Disponível em <<http://www.jovedata.com.br/>>. Acesso em 24.05.2016). É possível assim afirmar que um único anúncio publicitário de 10 segundos nos intervalos das emissoras de TV é suficiente para cobrir os “prejuízos” decorrentes de uma ação reparatória, daí por que os valores fixados pela jurisprudência não produzem a chamada “força desencorajadora de nova violação ou violações”, referida pelo ex-ministro Cezar Peluso (STF, RE 447584-7/RJ, Segunda Turma, j. 28.11.2006).

[15] As perguntas realizadas durante as mencionadas entrevistas foram as seguintes: a) O entrevistado já foi vítima de ofensas ou pré-condenações proferidas por veículos de comunicação? b) Quando o entrevistado foi ofendido ou condenado por antecipação por veículos de comunicação, utilizou algum mecanismo legal (judicial ou extrajudicial) para sua defesa? c) Em caso afirmativo, qual foi o resultado? d) Caso tenha sido obtida uma decisão judicial favorável, qual o tempo transcorrido desde a ofensa até o efetivo cumprimento da decisão? e) Este resultado foi satisfatório e eficiente para a proteção dos direitos do entrevistado? Por quê? f) Qual a opinião do entrevistado sobre os mecanismos legais destinados à proteção dos direitos violados pelo exercício da liberdade de imprensa? g) A criação de mecanismos extrajudiciais alternativos poderia auxiliar a proteção desses direitos? h) Qual a opinião do entrevistado sobre a criação de uma plataforma virtual centralizada destinada ao exercício do direito de resposta?

Para acessar a íntegra das entrevistas, vide os Anexos I, III, VII e VII da dissertação de Mestrado que originou o presente artigo, denominada “Tecnologia social destinada ao exercício do direito de resposta: uma abordagem interdisciplinar do conflito entre a liberdade de imprensa e os direitos da personalidade”, aprovada em 29 de abril de 2017 (Disponível em <<http://www.pergamum.bib.ufba.br/pergamum/biblioteca/index.php>>. Acesso em 6.11.2017).

[16] Confira-se, a esse respeito, o item nº 5.

[17] Vide Introdução.

[18] De acordo com os mesmos autores, “vai ganhando corpo a consciência de que, se o que importa é pacificar, torna-se irrelevante que a pacificação venha por obra do Estado ou por outros meios, desde que eficientes. Por outro lado, cresce também a percepção de que o Estado tem falhado muito na sua missão pacificadora, que ele tenta realizar mediante o exercício da jurisdição e através de formas do processo civil, penal ou trabalhista” (CINTRA; GRINOVER; DINAMARCO,1998, p. 26).

[19] Como bem observa Frederico Marques, “os titulares dos interesses em antagonismo podem, eles próprios, resolver a situação litigiosa. E isso se dá, ou pela imposição do interesse de um deles, com o sacrifício do interesse do outro, ou pelo consentimento espontâneo de um dos contendores em sacrificar o interesse próprio no todo ou em parte. No primeiro caso, temos a solução egoísta do litígio, ou autodefesa; e, no segundo, a sua resolução altruísta, ou autocomposição” (2000, p. 5).

[20] A respeito do funcionamento da tecnologia proposta, confira-se o item nº 7.

[21] Também chamada de “democracia eletrônica”, “democracia digital”, “ciberdemocracia”, “democracia on-line” e “democracia virtual” (SOARES JUNIOR; MARQUES dos SANTOS, 2007, p. 3).

[22] Destaque-se, neste sentido, uma pesquisa realizada por Belo Interactive, Fundacão Ford e Associated Press Managing Editors, em julho de 2006, sobre quais seriam as fontes de informação de maior credibilidade, com o seguinte resultado: jornais (35%), TV e internet (18%) e radio (12%) (CHRISTOFOLETTI; LAUX, 2008, p. 38).

[23] A respeito da “desjudicialização”, assim discorrem Kümpel e Raldi: “A busca pela diminuição de demandas em juízo não se dá em frente unitária, apenas com a adoção de normas que visem a aceleração dos processos em curso, mas, em verdade, multifacetada. Além da simplificação do processo, com institutos desenhados para maior celeridade do trâmite processual, busca-se, também, diminuir as atribuições do Poder Judiciário. Trata-se do fenômeno da desjudicialização, que retira deste Poder a competência para atuar em lides de direito material que podem ser solucionadas de forma mais célere e eficiente por outros meios (jurisdição voluntária, ainda no escopo da atividade jurisdicional com participação do Judiciário; ou extrajudiciais)” (2017, p. 122).

[24] Nessa mesma esteira, Kelsen cuida do chamado princípio da retribuição (Vergeltung), aplicável à responsabilidade civil, o qual “exige uma pena para a falta ou ilícito e tem, sob este aspecto, psicologicamente, a sua raiz no instinto vindicativo do homem. Na medida em que o direito é uma ordem estatuidora de sanções e as sanções consistem na aplicação coativa de um mal como reação contra um ilícito, o direito – todo o direito – corresponde ao princípio de retribuição” (1998, p. 31-32).

[25] No mesmo sentido a lição de Ávila (2011, p. 34), segundo o qual “o Poder Judiciário e a Ciência do Direito constroem significados, mas enfrentam limites cuja desconsideração cria um descompasso entre a previsão constitucional e o direito constitucional aplicado”.

[26] Conforme relatório anual do Conselho Nacional de Justiça, denominado “Justiça em Números”, de 2016 (Disponível em <<http://www.cnj.jus.br/programas-e-acoes/pj-justica-em-numeros>>. Acesso em 29.05.2017, p. 70-71 e 126-127).

[27] Vide nota nº 18.

[28]Disponível em <<https://esaj.tjsp.jus.br/cpopg/show.do?processo.codigo=2SZX4JANU0000&processo.foro=100&conversationId=&dadosConsulta.localPesquisa.cdLocal=-1&cbPesquisa=NMPARTE&dadosConsulta.tipoNuProcesso=UNIFICADO&dadosConsulta.valorConsulta=Ricardo+Shimada&uuidCaptcha=&paginaConsulta=1>>. Acesso em 29.05.2017.

[29] Confira-se, a respeito: <<https://ww2.stj.jus.br/processo/pesquisa/?tipoPesquisa=tipoPesquisaNumeroRegistro&termo=201001775170&totalRegistrosPorPagina=40&aplicacao=processos.ea>>. Acesso em 29/05.2017.

[30] O direito à mentira. Jornal Folha de São Paulo, 26.11.2016, p. A6 (poder).

[31] Neste mesmo sentido, Soares Junior e Marques dos Santos, após discorrerem acerca dos benefícios da e-democracia, advertem que qualquer “iniciativa no sentido de modificar o atual status quo político e social, sofrerá resistência (mesmo que inercial) à sua implantação” (2007, p. 3).

[32] Sobre o direito ao esquecimento, confira-se: ROSENVALD, Nelson. Do direito ao esquecimento ao direito a ser esquecido. Disponível em <<http://www.cartaforense.com.br/conteudo/artigos/do-direito-ao-esquecimento-ao-direito-a-ser-esquecido/17397>>. Acesso em 19.05.2017; e STJ, REsp 1334097/RJ, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, j. 28.05.2013.

[33] A respeito do direito ao esquecimento na internet, Rosenvald (2017) relembra o leading case relacionado a um cidadão espanhol que sempre tinha as suas buscas na internet associadas à sua condição pretérita de inadimplente, apesar de ter quitado sua dívida havia vários anos. A Corte Europeia de Justiça (CJEU) reconheceu ao autor da ação o direito ao esquecimento, permitindo a remoção dos links que faziam tal associação.

[34] Vide Introdução.

[35] Os interesses transindividuais ou metaindividuais podem ser definidos como “aqueles que atingem uma categoria de pessoas ligadas por uma relação de fato ou de direito, e não apenas um sujeito individualizado” (SCHOEDL, 2015b, p. 857).

[36] Disponível em <<http://www.reclameaqui.com.br/>>. Acesso em 24.05.2016. Identificou-se também outra tecnologia on line destinada à defesa de direitos do consumidor, ligada ao Governo Federal: o site www.consumidor.gov.br, que presta serviços semelhantes aos do “Reclame aqui”, mas com menor número de acessos. Disponível em <<https://www.consumidor.gov.br/pages/principal/?1464897954269>>. Acesso em 02.06.2016.

[37] Para conferir a íntegra da referida entrevista, confira-se o Anexo VII da dissertação de Mestrado que originou o presente artigo, denominada “Tecnologia social destinada ao exercício do direito de resposta: uma abordagem interdisciplinar do conflito entre a liberdade de imprensa e os direitos da personalidade”, aprovada em 29 de abril de 2017 (Disponível em <<http://www.pergamum.bib.ufba.br/pergamum/biblioteca/index.php>>. Acesso em 6.11.2017).

[38] Neste sentido, cumpre mencionar o art. 4º do Código de Ética dos Jornalistas, estabelecendo que “o compromisso fundamental do jornalista é com a verdade no relato dos fatos, deve pautar seu trabalho na precisa apuração dos acontecimentos e na sua correta divulgação”. Disponível em <<http://www.fenaj.org.br/federacao/cometica/codigo_de_etica_dos_jornalistas_brasileiros.pdf>>. Acesso em 12.08.2010.

[39] Produzido por Criahauz Comunicação Integrada (www.criahauz.com.br).

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