Tutela de urgência e superveniência de sentença de mérito: breve análise dos embargos de divergência no RESP 765.105/TO

Resumo: Pretende-se por meio deste trabalho analisar os Embargos de Divergência no REsp. 765.105/TO. Neste recurso, o Superior Tribunal de Justiça discutiu se a sentença de procedência torna prejudicado o recurso interposto contra a decisão que defere antecipação de tutela. Depois de analisar o instituto da tutela de antecipada, estabelecendo-se a relação deste com a sentença, e analisar os principais votos do julgado, apresentaremos nossa impressão sobre a solução dada por aquela Corte ao caso.

Palavras-chave: Tutelas de Urgência; Recurso; Processo; Estado Democrático de Direito;

Abstract: This work intends to analyze the Embargos of Divergence in REsp. 765.105/TO. In this appeal, the Justice Court has discussed if the sentença of provenance impairs the appeal interposed against the decision that grants the antecipation of tutelage. After analyzing the institute of antecipated tutelage, establishing the relationship of it with the sentence, an analyzing the main votes of the trialed, we present our impression about the solution provided to the case by that Court of Law.

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Keywords: Urgent Tutelage; Appeal; Process; Democratic State of Law;

Sumário: 1. Introdução – 2. Aspectos Históricos das Tutelas de Urgência no Processo Civil Brasileiro– 3. Efeitos da Tutela Antecipada e da Sentença – 4. Do Voto-Vista do Ministro Teori Albino Zavascki – 5. Da solução dos Embargos de Divergência pela Corte Especial –6. Considerações Finais –7. Bibliografia.

1. Introdução

Recentemente, a Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça travou interessante discussão nos Embargos de Divergência em REsp n. 765.105/TO, interpostos contra acórdão da 3ª Turma daquela Corte, relativa à superveniência de sentença de mérito e a perda do objeto de recurso interposto contra a decisão que tenha antecipado os efeitos da tutela.[1]

A controvérsia surgiu em razão de a 3ª Turma ter rejeitado o REsp n. 765.105/TO, sob o fundamento de que a sentença de mérito superveniente não prejudicaria o agravo de instrumento interposto contra a tutela antecipada concedida pelo juiz de primeiro grau. Por questões de cunho pragmático, a 3ª Turma acompanhou o voto do Rel. Min. Ari Pargendler. [2]

Esse assunto, que à primeira vista não despertaria muito interesse da comunidade jurídica, pois há inúmeros precedentes do Superior Tribunal de Justiça entendendo pela perda do objeto do recurso[3], suscita uma indagação acerca da importância da eficácia temporal dos institutos jurídicos[4] da tutela cautelar e da tutela antecipatória em relação à sentença.

Para analisar a questão proposta, mostra-se necessário estudar os aspectos históricos das tutelas de urgência no Processo Civil Brasileiro, destacando-se em seguida a diferença entre os efeitos da tutela e a sentença de mérito. Depois de se apresentar tais aspectos, serão analisados os dois principais votos do recurso em questão e feitas considerações finais sobre o acerto ou não do Superior Tribunal de Justiça na solução do caso.

2. Aspectos Históricos das Tutelas de Urgência[5] no Processo Civil Brasileiro[6]

Afirma-se ser o grande desafio do Processo Civil contemporâneo equilibrar a efetividade processual e a segurança jurídica.

Com o abarrotamento do Judiciário, em razão do aumento das demandas a ele submetidas nas últimas décadas, e a morosidade da realização da atividade jurisdicional, a efetividade do processo é eleita pela processualística como uma das finalidades a ser alcançada pelo Processo Civil nas sociedades contemporâneas.[7]

No Brasil, depositou-se expectativa no Código de Processo Civil de 1973 para se alcançar a efetividade processual. Na exposição de motivos do Código, o Ministro da Justiça à época, Alfredo Buzaid, ponderava acerca da necessidade de se “pôr o sistema processual civil brasileiro em consonância com o progresso científico dos tempos atuais.”[8]

Segundo observa Ricardo Alessandro Castagna, com a:

“[…] adoção do sistema da oralidade e da concentração dos atos pelo Código de Processo Civil de 1973, pretendeu o legislador dotar os atores do processo meios eficazes para solução rápida dos litígios, mas inúmeros outros fatores – externos ou ligados à disciplina processual -, muitos deles de ocorrência recente, acabaram por imprimir extrema lentidão à prestação jurisdicional”. [9]

Um desses fatores é atribuído ao Processo[10] de Conhecimento[11], cuja introdução no Código de Processo Civil de 1973 representou o ápice do que a doutrina denomina de “universalização da ordinariedade.” [12]

Pontuou, há muito, Ovídio Baptista, que o Processo de Conhecimento, quando universalizado,

“[…] suprime a possível utilização de vias alternativas de tutela processual da urgência, coisa com que o Processo de Conhecimento não se preocupa, enquanto instrumento concebido para abrigar demandas plenárias, tratando-as sob forma ordinária. Esta circunstância provocou, como era de esperar, a utilização massiva do Processo Cautelar para, através dele, veicularem-se demandas satisfativas urgentes, que não encontravam meios jurisdicionais compatíveis com suas necessidades, no Processo de Conhecimento.”[13]

A Ministra do Superior Tribunal de Justiça, Eliana Calmon, teve a oportunidade de elucidar esse contexto, destacando que:

“A demora na prestação jurisdicional levou os advogados a buscarem solução processual e, no processo cautelar, ingenuamente estruturado no chamado Código de Buzaid, encontraram a saída para as urgências: as liminares acautelatórias para se aguardar a demorada sentença, sem correr o risco da imprestabilidade da atuação estatal. Esta foi a solução para atender aos direitos instantâneos.”[14]

A insatisfação de que o Processo de Conhecimento seria insuficiente e inadequado para o acertamento de direitos em tempo adequado nas sociedades de massa ganhou fôlego nos setores diversos da comunidade jurídica, motivando-os a discutirem diversas reformas setoriais no Código de Processo Civil.[15]

Capitaneado pela Escola Nacional da Magistratura, o movimento de reforma atingiu um de seus principais desideratos, que particularmente interessa a este estudo, no ano de 1994, ao introduzir por meio da Lei n. 8.952, no art. 273, do Código de Processo Civil, o famigerado instituto da tutela antecipada:

“Art. 273. O juiz poderá, a requerimento da parte, antecipar, total ou parcialmente, os efeitos da tutela pretendida no pedido inicial, desde que, existindo prova inequívoca, se convença da verossimilhança da alegação e:

I – haja fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação;

ou II – fique caracterizado o abuso de direito de defesa ou o manifesto propósito protelatório do réu.

§ 1o Na decisão que antecipar a tutela, o juiz indicará, de modo claro e preciso, as razões do seu convencimento.

§ 2o Não se concederá a antecipação da tutela quando houver perigo de irreversibilidade do provimento antecipado.

[…] § 4o A tutela antecipada poderá ser revogada ou modificada a qualquer tempo, em decisão fundamentada.

§ 5o Concedida ou não a antecipação da tutela, prosseguirá o processo até final julgamento.”

Em 2002, a Lei n. 10.444 promoveu a alteração do § 3º do art. 273, do Código de Processo Civil, e inseriu neste dispositivo os § 6º e 7º, in verbis:

“§ 3o A efetivação da tutela antecipada observará, no que couber e conforme sua natureza, as normas previstas nos arts. 588, 461, §§ 4o e 5o, e 461-A. […] § 6o A tutela antecipada também poderá ser concedida quando um ou mais dos pedidos cumulados, ou parcela deles, mostrar-se incontroverso. § 7o Se o autor, a título de antecipação de tutela, requerer providência de natureza cautelar, poderá o juiz, quando presentes os respectivos pressupostos, deferir a medida cautelar em caráter incidental do processo ajuizado.”

Com a introdução do instituto da tutela antecipada no Processo de Conhecimento (Lei nº 8.952, de 14 de dezembro de 1994), difundiu-se na doutrina processual pátria[16] o emprego da expressão “tutelas de urgência” para se designar as duas espécies de provimentos interlocutórios diferentes[17]: tutela antecipada e tutela cautelar.

Na medida em que as tutelas satisfativas de urgência passaram ser obtidas no Processo de Conhecimento, assinala-se uma diminuição na concessão das tutelas sumárias satisfativas com supedâneo no art. 798 do CPC, perdendo relevância a própria discussão acerca da diferenciação entre tais tutelas.[18]

3. Efeitos da Tutela Antecipada e da Sentença

Segundo a doutrina, o fato de se ter positivado no caput do art. 273, do CPC, a locução efeitos da tutela revelou claramente a intenção do legislador em distinguir a tutela – entendida aqui como o provimento jurisdicional definitivo – e efeitos da tutela, pois somente estes poderiam ser antecipados.[19]

Neste sentido, sustenta Alexandre Freitas Câmara que: “embora satisfativa, a tutela antecipada não garante o máximo de atendimento à pretensão manifestada pelo autor, razão pela qual o processo de conhecimento deverá prosseguir até final julgamento, para que se possa formar o juízo de certeza necessário à declaração da existência (ou inexistência) do direito material cuja tutela se pretende (art. 273, § 5º, CPC).” [20]

O Prof. Cândido Rangel Dinamarco chega a afirmar que:

“A técnica engendrada pelo novo art. 273 consiste em oferecer rapidamente a quem veio ao processo pedir determinada solução para a situação que descreve, precisamente aquela solução que ele veio ao processo pedir. Não se trata de obter medida que impeça o perecimento do direito, ou que assegure ao titular a possibilidade de exercê-lo no futuro. A medida antecipatória conceder-lhe-á o exercício do próprio direito afirmado pelo autor.” [21]

Mais a frente, o renomado processualista explica que a diferença entre a tutela antecipada e a sentença residiria no fato de que este provimento jurisdicional é concedido com base em um juízo de certeza, ao passo que aquele provimento interlocutório (tutela antecipada) estaria fundado em um juízo provisório sobre os fatos da lide.[22] Reforça o caráter provisório da tutela antecipada o § 4º do art. 273, do CPC, segundo o qual a tutela antecipada poderá ser modificada ou revogada a qualquer tempo.

Por óbvio, as considerações acima não se aplicam à tutela antecipada concedida com base no § 6º do art. 273 do CPC, pois neste previu o legislador a concessão da tutela antecipada com suporte em cognição[23] exauriente, possibilitando que se operem os efeitos da coisa julgada material.

Amparado pela doutrina processual majoritária[24], pode-se concluir que não haveria coincidência integral entre os efeitos do provimento antecipatório e aqueles do provimento definitivo (sentença).

4. Da solução dos Embargos de Divergência no REsp n. 765.105/TO

Segundo dispõe o art. 546, do CPC, é embargável a decisão da turma que: “I – em recurso especial, divergir do julgamento de outra turma, da seção ou do órgão especial; II –  em recurso extraordinário, divergir do julgamento da outra turma ou do plenário.”

Conhecido doutrinariamente como embargos de divergência, este recurso se destina a evitar a existência de dissídios jurisprudenciais entre decisões proferidas no âmbito dos tribunais de superposição (STJ e STF).

Conforme já adiantado no início deste trabalho, a Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça conheceu e deu provimento aos Embargos de Divergência interpostos no REsp n. 765.105/TO, fazendo prevalecer a tese de que a superveniência da sentença de procedência do pedido não prejudica o recurso interposto contra a decisão que deferiu o pedido de antecipação de tutela.”

O Ministro Hamilton Carvalhido, relator cujo voto foi vencedor, sintetizou a questão da seguinte forma: “situa-se a divergência em se a sentença de procedência torna prejudicado o recurso interposto contra a decisão que defere antecipação de tutela.”

Para dirimir a divergência, assentou o Ministro:

“[…] a superveniência da sentença de procedência do pedido não torna prejudicado o recurso interposto contra a decisão que deferiu a antecipação dos efeitos da tutela. É que a antecipação da tutela não antecipa a sentença de mérito, mas sim a própria execução do julgado que, por si só, não produziria os efeitos que irradiam da tutela antecipada”. [25]

Apoiando-se no art. 475-O do CPC[26], o Ministro engendrou a tese de que os efeitos da tutela antecipada não desapareceriam com a superveniência da sentença, mas seriam preservados até que este provimento jurisdicional fosse revisado pela superior instância. [27]

Apesar da eloquência do Ministro, tanto que a maioria dos membros da Corte Especial o acompanhou, seu argumento não problematiza o fato de que o art. 520, VII, do CPC, ao prescrever que a sentença que confirmar a antecipação de tutela será recebida apenas no efeito devolutivo, abre caminho para que a parte beneficiada inicialmente com a decisão interlocutória e agora com a sentença promova a execução provisória deste julgado.

Conforme será visto a seguir, a questão foi enfrentada pelo Ministro Teori Albino Zavascki em seu voto-vista.

5. Do Voto-Vista do Ministro Teori Albino Zavascki

A despeito de vencido, o voto-vista proferido pelo Ministro Teori Albino Zavascki teceu importantes considerações sobre as medidas liminares e os provimentos definitivos.

De início, destacou o respeitável Ministro as características e funções especiais existentes nas duas modalidades de tutelas de urgência. Segundo ele, o fato de tais tutelas serem concedidas com base em um juízo de verossimilhança e em razão da precariedade que lhes são ínsitas, retira-lhes a aptidão para gerar coisa julgada, de modo que podem ser modificadas ou revogadas a qualquer momento.

Grosso modo, para o Ministro a principal diferença entre as tutelas de urgência e os provimentos finais residiria no caráter temporário das primeiras, porquanto são concedidas em caráter precário e para vigorar por prazo determinado, enquanto os segundos possuiriam a marca da definitividade, sendo tomadas com base em cognição exauriente.

Depois de discorrer sobre as características inerentes às medidas liminares, arremata:

“É por isso que o julgamento da causa esgota a finalidade da medida liminar. Daí em diante, prevalece o comando da sentença, tenha ele atendido ou não ao pedido do autor ou simplesmente extinguido o processo sem exame do mérito. Procedente o pedido, fica confirmada a liminar anteriormente concedida bem como viabilizada a imediata execução provisória (CPC, art. 520, VII). Improcedente a demanda ou extinto o processo sem julgamento de mérito, a liminar fica automaticamente revogada, com eficácia ex tunc (Súmula 405 do STF), ainda que silente a sentença a respeito.”[28]

O entendimento esposado pelo Ministro ficou ementado da seguinte forma:

“PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. MEDIDA LIMINAR. SUPERVENIÊNCIA DE SENTENÇA JULGANDO A CAUSA. PERDA DE OBJETO DO RECURSO RELATIVO À MEDIDA ANTECIPATÓRIA. PECULIARIDADES DO CASO CONCRETO. 1. As medidas liminares, editadas em juízo de mera verossimilhança, têm por finalidade ajustar provisoriamente a situação das partes envolvidas na relação jurídica litigiosa e, por isso mesmo, desempenham no processo uma função por natureza eminentemente temporária. Sua eficácia se encerra com a superveniência da sentença, provimento tomado à base de cognição exauriente, apto a dar tratamento definitivo à controvérsia, com força executiva própria (CPC, art. 520, V). O julgamento da causa esgota, portanto, a finalidade da medida liminar. Daí em diante, prevalece o comando da sentença, e as medidas de urgência eventualmente necessárias devem ser postuladas no âmbito do sistema de recursos, seja a título de efeito suspensivo, seja a título de antecipação da tutela recursal, providências cabíveis não apenas em agravo de instrumento (CPC, arts. 527, III e 558), mas também em apelação (CPC, art. 558, § único) e em recursos especiais e extraordinários (RI/STF, art. 21, IV; RI/STJ, art. 34, V). 2. Por isso mesmo, a jurisprudência da Corte Especial, da 1ª Seção e de todas as Turmas do STJ é no sentido de que a superveniente sentença de mérito acarreta a perda de objeto de eventual recurso interposto em face da anterior decisão sobre a medida liminar. 3. No caso concreto, ademais, a sentença de mérito, pela procedência do pedido (confirmatória da liminar), já foi inclusive confirmada no julgamento da apelação. E no âmbito do recurso especial interposto desse acórdão foi deferida medida antecipatória (de efeito suspensivo), que assegura ao recorrente, até o julgamento, a manutenção do status quo, a confirmar, outra vez, a absoluta inutilidade de qualquer juízo que, a essa altura, o tribunal local venha a proferir a respeito da medida antecipatória originalmente deferida. 4. Embargos de divergência providos, sem prejuízo da medida cautelar deferida no âmbito do recurso especial 936.599” (MC 14.378/TO).

Percebe-se que o voto-vista deste Ministro, além estar tecnicamente correto, como não poderia ser diferente, foi mais além, ao sustentar que estando pendente de julgamento o agravo de instrumento, mesmo que em sede recursal, esse recurso perderá o objeto com o advento da sentença.

A postura se justifica porque a tutela de urgência concedida pelo juiz singular no início da demanda, se não for revogada durante o procedimento estabelecido em contraditório, deverá ser confirmada ou rejeitada pela sentença.

Nesse sentido, Daniel Amorim Assumpção Neves afirma que:

“A tutela antecipada concedida durante o trâmite procedimental em primeiro grau deverá ser confirmada ou rejeitada pela sentença, desde que não haja decisão anterior que a tenha revogado, nos termos do art. 273, § 4º, do CPC. Na hipótese de concessão de tutela antecipada no tribunal, o mesmo fenômeno ocorre, devendo a tutela antecipada ser revogada ou confirmada no acórdão que decidirá a ação de competência originária do tribunal ou o recurso”.[29]

Partindo do pressuposto de que a tutela de urgência é fundada em um juízo de provisório, supõe-se que, uma vez observados os princípios institutivos do processo durante o iter procedimental, as partes certamente fornecerão elementos mais consistentes para a construção do provimento jurisdicional final, sendo por este substituída.

A propósito, o Prof. Rosemiro Pereira Leal obtempera:

“A cautelaridade decisória ou a tutelaridade antecipada, em suas variáveis procedimentais, preventivas, preparatórias, inibitórias, mandamentais ou executivas, somente se legitimam na constitucionalidade do direito democrático, se realizadas sob devido processo constitucional, no qual os princípios do contraditório, ampla defesa e isonomia que lhe são institutivos, à finalidade de liminar atendimento inaudita altera parte, já tenham sido atendidos, na estrutura procedimental constituinte, em devido processo legislativo de criação normativa das situações jurídicas (direitos-garantias) de fundamentalidade não cambiáveis (liberdade, igualdade, dignidade, patrimonialidade), desde que também suscetíveis de ampla e intercorrente correição na estrutura espácio-temporal discursiva dos procedimentos instaurados ao pleito das denominadas tutelas de urgência”.[30]

Se o provimento jurisdicional de mérito é prolatado com elementos de prova mais consistentes do que aqueles que legitimaram a concessão da tutela de urgência, parece não haver motivo plausível para que o acórdão que eventualmente reverta a decisão interlocutória opere seus efeitos em detrimento daqueles produzidos pela sentença.

Pensada a questão sob esta ótica, a impressão que se tem é no sentido de que o advento de tais provimentos jurisdicionais (sentença) fatalmente acarretará a perda superveniente do interesse recursal, de modo que sem este pressuposto de admissibilidade não se justifica o julgamento do mérito do recurso interposto para combater as mencionadas decisões interlocutórias.

Nesse sentido, sustenta Daniel Amorim Assumpção Neves que:

“Tratando-se de decisão interlocutória que tenha como objeto uma tutela de urgência, sendo proferida a sentença, a decisão interlocutória será imediatamente substituída pela sentença que, ao conceder a tutela definitiva, substitui a tutela provisória. Havendo recurso de agravo de instrumento pendente de julgamento no tribunal, o relator deverá monocraticamente não conhecer o recurso, por perda superveniente de objeto (recurso prejudicado). Essa substituição da decisão interlocutória pela sentença é imediata, ocorrendo no exato momento em que a sentença torna-se pública, independentemente do trânsito em julgado ou da interposição de apelação”.[31]

Para o citado processualista, mesmo “que de forma inadvertida se tenha o julgamento do agravo de instrumento depois de já existir a sentença – basta imaginar que o tribunal não tomou conhecimento da prolação da sentença –, esta prevalece, porque o julgamento do agravo de instrumento é juridicamente inexistente.”[32]

6. Considerações Finais

À guisa de considerações finais, o que se pode dizer é que a Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça, ao solucionar os Embargos de Divergência no REsp. 765.105/TO, contrariou a sua jurisprudência majoritária sobre o assunto, criando outro precedente que acirrará ainda mais a discussão.

Da forma como ficou a questão, abriu-se o caminho para que casos semelhantes sejam questionados junto à Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça. Em tempos que se clama por efetividade do processo, a posição majoritária contribui para a diminuição de inúmeros recursos que chegam diariamente nas instâncias superiores.

 

Referências:
BUZAID, Alfredo. Exposição de Motivos do Código de Processo Civil. 1973. p. 85-101. In: BRASIL. Código de Processo Civil. Coordenação Mauricio Antonio Ribeiro Lopes. 5. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais. 2000.
CÂMARA, Alexandre Freitas. Lições Preliminares de Direito Processual Civil. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2002.
DINAMARCO, Cândido Rangel. A reforma do Código de Processo Civil. 2. ed. São Paulo: Malheiros, 1995.
GONÇALVES, Aroldo Plínio. Técnica Processual e Teoria do Processo. Rio de Janeiro: AIDE, 2001.
GRINOVER, Ada Pellegrini. Mudanças estruturais no processo civil brasileiro. Disponível em: [www.iobonlinejuridico.com.br]. Acesso em: 20.03.2009.
LEAL, R. P. Teoria Geral do Processo: primeiros estudos. 8. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2009.
MEDINA, José Miguel Garcia, ARAÚJO, Fábio Caldas, GAJARDONI, Fernando da Fonseca. Processo Civil Moderno – Procedimentos Cautelares e Especiais. 2 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010. p. 36.
ZAVASCKI, Teori Albino. Antecipação de tutela. São Paulo: Saraiva, 1999. p. 56-57.
VIEIRA, José Marcos Rodrigues. A nova ordinariedade: execução para a cognição. In: FIUZA, César Augusto de Castro; SÁ, Maria de Fátima Freire; BRÊTAS C. DIAS, Ronaldo Brêtas de Carvalho (Org.). Temas atuais de Direito Processual Civil. Belo Horizonte: Del Rey, 2001.
Notas:
[1] Veja-se a ementa do acórdão: “EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA. DIREITO PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO CONTRA DECISÃO QUE CONCEDE TUTELA ANTECIPADA. SUPERVENIÊNCIA DE SENTENÇA DE MÉRITO CONFIRMANDO A TUTELA. PERDA DO OBJETO. INOCORRÊNCIA. 1. A superveniência da sentença de procedência do pedido não prejudica o recurso interposto contra a decisão que deferiu o pedido de antecipação de tutela. 2. Embargos de divergência rejeitados.” (STJ, EREsp n. 765.105/TO, Corte Especial, Rel. Ministro Hamilton Carvalhido, DJe 25.08.2010)
[2] Esta afirmação se justifica porque não houve uma discussão aprofundada acerca da perda do objeto de recurso em razão da superveniência da sentença de mérito. O Ministro Rel. Ari Pargendler limitou-se a adotar o entendimento esposado por ele no REsp n. 112.111/PR, no qual a discussão surgiu: “A sentença de mérito superveniente não prejudica o agravo de instrumento interposto contra a tutela antecipada; a aludida tutela não antecipa simplesmente a sentença de mérito – antecipa, sim, a própria execução dessa sentença, que, por si só, não produziria os efeitos que irradiam da tutela antecipada. Recurso especial conhecido e provido”. Neste recurso, o Ministro sustentou que: “Não há relação de continência entre a tutela antecipada e a sentença de mérito. A aludida tutela não antecipa simplesmente a sentença de mérito; antecipa, sim, a própria execução dessa sentença, que, por si só, não produziria os efeitos que irradiam da tutela antecipada. É preciso que isso fique claro: os efeitos que o recurso especial quer evitar resultam da tutela antecipada, e não da sentença – pouco importando que ela tenha confirmado a tutela antecipada; a decisão a esse respeito foi tomada antes e não fica prejudicada pela reiteração constante da sentença. De outro modo, a parte não teria recurso relativamente à tutela antecipada. Subsistente a tutela antecipada, deve ela ser cassada nos termos da jurisprudência da Turma.” (STJ, 2ª T. REsp 112.111/PR, Rel. Min. Ari Pargendler, j. 8.9.98, DJ. 14.02.2000).
[3] “Resta prejudicado o agravo de instrumento interposto contra decisão deferitória de antecipa­ção de tutela, em face da prolação da sentença de mérito, ratificadora da liminar, face a per­da de seu objeto” (STJ 6ª T. REsp 595.937, Rel. Min. Paulo Medina, j. 6.4.04, negaram provimento, DJ 3.5.04, p. 224). “[…] 1. Perde objeto o recurso relativo à antecipação da tutela quando a sentença superveniente (a) revoga, expressa ou implicitamente, a liminar antecipatória (o que pode ocorrer com juízo de improcedência ou de extinção do processo sem julgamento de mérito), ou, (b) sendo de procedência (integral ou parcial), tem aptidão para, por si só, irradiar os mesmos efeitos da medida antecipatória. Em qualquer dessas situações, o provimento do recurso relativo à liminar não teria o condão de impedir o cumprimento da sentença superveniente. 2. No caso concreto, a liminar sustou a exigibilidade do tributo e esse mesmo efeito é produzido pela sentença de procedência parcial, que não tem efeito suspensivo. 3. Agravo regimental a que se nega provimento”. (AgRg no REsp 506887/RS, 1ª Turma, Min. Teori Zavascki, DJ de 07.03.2005). Ver ainda: “[…] 1. As medidas liminares, editadas em juízo de mera verossimilhança, têm por finalidade ajustar provisoriamente a situação das partes envolvidas na relação jurídica litigiosa e, por isso mesmo, desempenham no processo uma função por natureza temporária. Sua eficácia se encerra com a superveniência da sentença, provimento tomado à base de cognição exauriente, apto a dar tratamento definitivo à controvérsia, atendendo ou não ao pedido ou simplesmente extinguindo o processo. 2. O julgamento da causa esgota, portanto, a finalidade da medida liminar, fazendo cessar a sua eficácia. Daí em diante, prevalece o comando da sentença, e as eventuais medidas de urgência devem ser postuladas no âmbito do sistema de recursos, seja a título de efeito suspensivo, seja a título de antecipação da tutela recursal, providências cabíveis não apenas em agravo de instrumento (CPC, arts. 527, III e 558), mas também em apelação (CPC, art. 558, § único) e em recursos especiais e extraordinários (RI/STF, art. 21, IV; RI/STJ, art. 34, V). 3. Conseqüentemente, a superveniência de sentença acarreta a inutilidade da discussão a respeito do cabimento ou não da medida liminar, ficando prejudicado eventual recurso, inclusive o especial, relativo à matéria. 4. A execução provisória da sentença não constitui quebra de hierarquia ou ato de desobediência a anterior decisão do Tribunal que indeferira a liminar. Liminar e sentença são provimentos com natureza, pressupostos e finalidades distintas e com eficácia temporal em momentos diferentes. Por isso mesmo, a decisão que defere ou indefere liminar, mesmo quando proferida por tribunal, não inibe a prolação e nem condiciona o resultado da sentença definitiva, como também não retira dela a eficácia executiva conferida em lei. […].”(STJ-1ª T., REsp 667.281, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, j. 16.5.06, julgaram prejudicado, um voto vencido, DJU 8.6.06, p. 122).
[4] “Por instituto jurídico, entende-se um conjunto de princípios que se unificam pela conexão normativa determinante de seu significado e aplicação” (LEAL, Rosemiro. Teoria Geral do Processo: primeiros estudos. 8. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2009. p. 200.) (“destaque no original”).
[5] Para Medina, Araújo e Gajardoni as tutelas de urgência possuem raiz constitucional, decorrendo do comando inserto no art. 5º, XXXV, da CR/88, verbis: “Para que se alcance, plenamente, a aspiração contida no art. 5.º, XXXV da Constituição, prevê o ordenamento jurídico formas de tutela de urgência que tenham aptidão de evitar a ocorrência a direitos fundamentais merecedores de proteção jurídica.”(MEDINA, José Miguel Garcia, ARAÚJO, Fábio Caldas, GAJARDONI, Fernando da Fonseca. Processo Civil Moderno – Procedimentos Cautelares e Especiais. 2 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010. p. 36)
[6] Apesar do recorte histórico feito acima, não se pode deixar de mencionar que: “Desde o direito romano, registra a história do direito processual casos de tutela de conhecimento em que se permite, até por cognição prima facie, a interferência no mundo fático, com antecipação de efeitos materiais. É o que demonstra BRIEGLEB, notável jurista e historiador alemão do século XIX, professor do grande ADOLPH WACH, indicando em sua magistral obra sobre o processo sumário, doze exemplos dessa espécie, dez nas Pandetas — sendo nove de ULPIANO e um de PAULO — e dois nos Códigos, respectivamente d e 213 e 331 d. C.” OLIVEIRA, Carlos Alberto. Perfil dogmático da tutela de urgência. Disponível em: [www.abdpc.org.br]. Acesso em: 20.06.2011.
[7] Para melhor conhecimento do assunto, ver obra do Prof. Cândido Rangel Dinamarco (Cf. DINAMARCO, Cândido Rangel. A Instrumentalidade do Processo. 12. ed. São Paulo: Malheiros, 2005.). Há nesse contexto grande preocupação sobre as influências negativas que o fator tempo exerce sobre o processo, apesar de a questão ser objeto de reflexão da Ciência do Direito como um todo. Sobre o tema, ver obra do jurista e filósofo: OST, François. O Tempo do Direito. 1. ed. São Paulo: Edusc, 2005.
[8] BUZAID, Alfredo. Exposição de Motivos do Código de Processo Civil. 1973. p. 85-101. In: BRASIL. Código de Processo Civil. Coordenação Mauricio Antonio Ribeiro Lopes. 5. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais. 2000.
[9] CASTAGNA, Ricardo Alessandro. Tutela de urgência: análise teórica e dogmática. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008, p. 70.
[10] Coube então ao Prof. Rosemiro Pereira Leal formular um conceito de Processo adequado à Constituição da República de 1988, mediante a Teoria Neo-Institucionalista, segundo a qual: “O processo, como instituição constitucionalizada, define-se, por conseguinte, como uma conjunção de princípios (contraditório, isonomia, ampla defesa, direito ao advogado e à gratuidade procedimental) que é referente jurídico-discursivo da procedimentalidade ainda que esta, em seus modelos legais específicos, não se realize expressa e necessariamente em contraditório. O processo, por concretização constitucional, é aqui concebido como instituição regente e pressuposto de legitimidade de toda criação, transformação, postulação e reconhecimento de direitos pelos provimentos legiferantes, judiciais e administrativos.” (LEAL, Rosemiro Pereira. Teoria Geral do Processo: primeiros estudos. 8. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2009. p. 88. (“destaque no original”).
[11] Para o insigne processualista mineiro Rosemiro Pereira Leal, o Processo de Conhecimento constitui “conquista teórica relevantíssima da humanidade que imprimiu novos rumos ao estudo do Processo pelo princípio moderno da reserva legal, só se admitindo a cognição jurisdicional em bases normativas prévias (precedentes, anteriores) aos fatos e atos a serem jurisdicionalizados.” E vai mais além, ao sustentar o Processo de Conhecimento como uma modalidade de direito fundamental constitucionalizado. (LEAL, Rosemiro. Op. cit. p. 139). Para autorizada doutrina, o Código de 1973, editado em um período autocrático, se pensado sob o enfoque da Teoria Neo-Institutionalista do Processo, cujo autor é o Professor Rosemiro Leal, não instituiu verdadeiramente um Processo de Conhecimento, mas sim Procedimento de Conhecimento. Entretanto, mantendo-se a linguagem do Código, será empregada a expressão “Processo de Conhecimento”. (“destaque no original”)
[12] Para Ovídio Batista, “a tendência histórica que nos persegue desde os últimos estágios do direito romano, conduzindo-nos para a universalização da ordinariedade, com a separação entre cognição e execução, atingiu seu ponto culminante, em nosso sistema, com a edição do Código de 1973.” SILVA, Ovídio Baptista da. Reforma dos Processos de Execução e Cautelar. 1997. Disponível em: [http://online.sintese.com] p. 5. Acesso em: 20.6.2011.
[13] SILVA, Ovídio Baptista da. Op. Cit., p. 5.
[14] ALVES, Eliana Calmon. Tutelas de urgência. Informativo jurídico da Biblioteca Ministro Oscar Saraiva, Brasília, v. 11, n. 2, p. 159-168, jul./dez. 1999. Destaca a citada Ministra: “O ponto crucial da utilização das cautelares, praticamente alertando a sociedade brasileira e os juristas nacionais para o problema, veio ao se bloquear os ativos financeiros do Plano Collor I, pela Lei nº 8.024/90. Milhares de brasileiros socorreram-se da Justiça Federal e, por via de liminares, proferidas em processos cautelares, conseguiram desbloquear os depósitos de contas-correntes e de poupanças, deixando um saldo de milhares e milhares de processos em duplicidade (ação cautelar e ação ordinária) para serem solucionados, em nome de uma formalidade apenas. Sim, porque a só liminar desbloqueando os depósitos bancários, de plena satisfatividade, tornou de absoluta inutilidade o longo caminho a percorrer com o iter procedimental de ambas as demandas (cautelar e ordinária).”
[15] “No início da década de 80 teve início a considerada primeira grande reforma do CPC, mais precisamente no ano de 1985, quando o Ministro da Justiça Fernando Lyra designou uma comissão composta pelos professores Luís Antônio de Andrade, José Joaquim Calmon de Passos, Kazuo Watanabe, Joaquim Correa de Carvalho Junior e Sérgio Bermudes, para elaborar um anteprojeto de modificação do Código de Processo Civil. As conclusões da Comissão foram apresentadas ao Ministério da Justiça em 24 de dezembro de 1985 (texto disponível na Revista de Processo n. 43/1986), porém esse anteprojeto não foi levado adiante. […] Na década de 90 é iniciado um movimento renovador do Código de Processo Civil pela Associação dos Magistrados Brasileiros e pela seccional brasiliense do Instituto Brasileiro de Direito Processual (IBDP). O movimento, em 1992, foi absorvido pela Escola Nacional de Magistratura, por incumbência do Ministro da Justiça, Jarbas Passarinho, sendo, a partir daí, constituída uma comissão de juristas para estudar o problema da morosidade processual, dos óbices à efetividade do acesso à justiça e propor soluções visando à simplificação do Código de Processo Civil brasileiro. A comissão revisora era presidida pelo diretor da Escola e Ministro do Superior Tribunal de Justiça, Sálvio de Figueiredo Teixeira, e secretariada pela Desembargadora Fátima Nancy Andrighi, do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios, tendo como seus integrantes o Ministro Athos Gusmão Carneiro, do Superior Tribunal de Justiça, e os estudiosos Ada Pellegrini Grinover, Celso Agrícola Barbi, Humberto Theodoro Júnior, José Carlos Barbosa Moreira, José Eduardo Carreira Alvim, Kazuo Watanabe e Sérgio Sahione Fadel. O grupo foi responsável pela elaboração de onze anteprojetos de lei, tendo por conteúdo a modificação de capítulos específicos do Código de Processo Civil, os quais foram conduzidos ao Congresso Nacional pelo Deputado Nelson Jobim. Do total dos anteprojetos, dez deles foram convertidos em lei. Foram as leis n° 8.455/92 (perícias), 8.710/93 (citação-intimação via postal), 8.898/94 (liquidação), 8.950/94 (recursos), 8.951/94 (consignação e usucapião), 8.952/94 (processos de conhecimento e cautelar), 8.953/94 (processo de execução), 9.079/95 (ação monitória), 9.139/95 (agravo) e 9.245/95 (procedimento sumário).”
BRASIL. Código de Processo Civil: a história de outras Comissões. 2009. Disponível em: [http://www.senado.gov.br/sf/senado/novocpc/pdf/CPC_Comissões_história.pdf]. Acesso em: 20.06.2011.
[16] Há quem defenda a utilização a expressão “urgências de tutela”, por ser mais adequada ao devido processo e ao paradigma do Estado Democrático de Direito. Cf. TAVARES, Fernando et al. Urgência de Tutelas: por uma Teoria da Efetividade do Processo Adequada ao Estado De Direito Democrático. Trabalho aprovado no XVI Congresso Nacional do Conselho Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Direito (CONPEDI), realizado de 15 a 17 de novembro de 2007, em Belo Horizonte (MG). Disponível em: [http://www.abdpc.org.br] Acesso em: 20.06.2011. Ver também: LIMA, Juliano Vitor. As tutelas de urgência no estado democrático de direito: adequação da urgência da tutela ao devido processo. 2008. 122 f. Dissertação (Mestrado) – Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, Programa de Pós-Graduação em Direito.
[17] Um dos processualistas que diferencia as duas modalidades de tutela de urgência é Teori Albino Zavascki: “a) sujeitam-se a regimes processual e procedimental diferentes: a cautelar é postulada em ação autônoma, disciplinada no Livro do Processo Cautelar; a antecipação é requerida na própria ação destinada a obter a tutela definitiva, observados os requisitos do regime geral previsto no art. 273 (CPC); b) a medida cautelar é cabível quando, não sendo urgente a satisfação do direito, revelar-se, todavia, urgente garantir sua futura certificação ou sua futura execução; a medida antecipatória tem lugar quando urgente é a própria satisfação do direito afirmado;
c) na cautelar há medida de segurança para a certificação ou segurança para futura execução do direito; na antecipatória há adiantamento, total ou parcial, da própria fruição do direito, ou seja, há, em sentido lato, execução antecipada, como um meio para evitar que o direito pereça ou sofra dano (execução para segurança); d) na antecipatória há coincidência entre o conteúdo da medida e a conseqüência jurídica resultante do direito material afirmado pelo autor; na cautelar o conteúdo do provimento é autônomo em relação ao da tutela definitiva; e) o resultado prático da medida antecipatória é, nos limites, dos efeitos antecipados, semelhante ao que se estabeleceria com o atendimento espontâneo, pelo réu, do direito afirmado pelo autor; na cautelar, o resultado prático obtido não guarda relação de pertinência com a satisfação do direito e sim com sua garantia;
f) a cautelar é medida habilitada a ter sempre duração limitada no tempo, não sendo sucedida por outra de mesmo conteúdo ou natureza (isto é, por outra medida de garantia), razão pela qual a situação fática por ela criada será necessariamente desfeita ao término de sua vigência; já a antecipatória pode ter seus efeitos perpetuados no tempo, pois destinada a ser sucedida por outra de conteúdo semelhante, a sentença final de procedência, cujo advento consolidará de modo definitivo a situação fática decorrente da antecipação.” (ZAVASCKI, Teori Albino. Antecipação da Tutela. 2. ed. rev. e ampliada. São Paulo: Saraiva, 1999. p. 56-57).
[18] Uma das mudanças significativas existentes no projeto para criação do novo Código de Processo Civil está na fusão das técnicas da tutela antecipada e satisfativas de urgência, valendo-se dos mesmos fundamentos para sua concessão. Vejam-se os motivos apresentados pelos integrantes da comissão responsável: “Considerou-se conveniente esclarecer de forma expressa que a resposta do Poder Judiciário deve ser rápida não só em situações em que a urgência decorre do risco de eficácia do processo e do eventual perecimento do próprio direito. Também em hipóteses em que as alegações da parte se revelam de juridicidade ostensiva deve a tutela ser antecipadamente (total ou parcialmente) concedida, independentemente de periculum in mora, por não haver razão relevante para a espera, até porque, via de regra, a demora do processo gera agravamento do dano. Ambas essas espécies de tutela vêm disciplinadas na Parte Geral, tendo também desaparecido o livro das Ações Cautelares. A tutela de urgência e da evidência podem ser requeridas antes ou no curso do procedimento em que se pleiteia a providência principal. Não tendo havido resistência à liminar concedida, o juiz, depois da efetivação da medida, extinguirá o processo, conservando-se a eficácia da medida concedida, sem que a situação fique protegida pela coisa julgada.” Disponível em: [http://professormedina.wordpress.com/2010/06/09/exposicao-de-motivos-do-anteprojeto-do-novo-codigo-de-processo-civil/]. Acesso em: 20.06.2011.
[19] Melhor seria o entendimento esposado pelo Prof. Rosemiro Pereira Leal, no sentido de que: “antecipar tutela não é antecipar sentença futura, mas aplicar, por antecipação, os conteúdos tutelares da lei pelo ato sentencial interlocutório, se examinado o tema na perspectiva do que dispõe o art. 273 do CPC vigente e ante a teorização empreendida nos institutos da verossimilhança e inequivocidade em juízo lógico da existência de prova no procedimento como fundamento de convicção do juiz.” (LEAL, R. P. Teoria Geral do Processo: primeiros estudos. 8. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2009, p.160. (“destaque no original”).
[20] CÂMARA, Alexandre Freitas. Lições Preliminares de Direito Processual Civil. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2002.  p. 87.
[21] DINAMARCO, Cândido Rangel. A reforma do Código de Processo Civil. 2. ed. São Paulo: Malheiros, 1995. p. 139.
[22] Op. Cit., p. 140.
[23]A cognição deve ser concebida, em uma perspectiva democrática, não mais como atividade intelectual do julgador, pois “no atual paradigma constitucional do Estado Democrático de Direito, a COGNIÇÃO pode ser conceituada como instituto jurídico regido pelos princípios diretivos da função jurisdicional e institutivos do Processo, que permite a valoração e valorização compartilhada dos argumentos e provas estruturados no procedimento 360 e retratados fisicamente nos autos, cujo exercício resulta na elaboração dos provimentos.” (MADEIRA, Dhenis Cruz. A cognição no direito democrático. 2006. 228f. Dissertação (Mestrado) – Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, Programa de Pós-Graduação em Direito. Disponível em: [http://www.biblioteca.pucminas.br/teses/Direito_MaterialDC_1r.pdf.] p. 116. Acesso em: 20.06.2011).
[24] Ressalte-se o entendimento do Prof. Daniel Amorim Assumpção Neves, segundo o qual “não se antecipam a tutela nem o efeito principal dessa tutela, mas os efeitos práticos que ditam regras de comportamento às partes em respeito ao que foi declarado ou constituído.” (NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Manual de Direito Processual Civil. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2010, p. 1089).
[25] STJ, Corte Especial, Embargos de Divergência no REsp. 765.105 /TO, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, DJe 09.11.2010.
[26]“Art. 475-O. A execução provisória da sentença far-se-á, no que couber, do mesmo modo que a definitiva, observadas as seguintes normas: […] II – fica sem efeito, sobrevindo acórdão que modifique ou anule a sentença objeto da execução, restituindo-se as partes ao estado anterior e liquidados eventuais prejuízos nos mesmos autos, por arbitramento; § 1º No caso do inciso II do caput deste artigo, se a sentença provisória for modificada ou anulada apenas em parte, somente nesta ficará sem efeito a execução.”
[27] A tese do Ministro assentou-se nos seguintes precedentes daquela Corte: “PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. TUTELA ANTECIPADA. COMPENSAÇÃO DE VALORES INDEVIDAMENTE RECOLHIDOS. SENTENÇA DE MÉRITO. AUSÊNCIA DE PERDA DO AGRAVO INTERPOSTO DA DECISÃO DA TUTELA ANTECIPADA. RECURSO ESPECIAL PROVIDO. TUTELA CASSADA NOS TERMOS DA SÚMULA 212/STJ. 1. Não perde o seu objeto o agravo de instrumento desafiado de decisão que concede antecipação da tutela, em sobrevindo a sentença de mérito da ação. A decisão que concede antecipação da tutela não é substituída pela decisão de mérito posto que os seus efeitos permanecem até que seja cassada pela instância superior. “Não há relação de continência entre a tutela antecipada e a sentença de mérito. A aludida tutela não antecipa simplesmente a sentença de mérito; antecipa, sim, a própria execução dessa sentença, que, por si só, não produziria os efeitos que irradiam da tutela antecipada. (REsp 112.111/PR; Min. Ari Pargendler) 2. Pacificada a jurisprudência das 1ª e 2ª Turmas do Superior Tribunal de Justiça no sentido de que o instituto da compensação, via liminar em mandado de segurança ou em ação cautelar, ou em qualquer tipo de provimento que antecipe a tutela da ação, não é permitido. Aplicação da Súmula nº 212/STJ: “A compensação de créditos tributários não pode ser deferida por medida liminar”. 3. Recurso especial provido para cassar a tutela antecipada.” (REsp 546.150/RJ, Rel. Ministro JOSÉ DELGADO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 02/12/2003, DJ 08/03/2004 p. 176). “AGRAVO REGIMENTAL. TUTELA ANTECIPADA. SENTENÇA DE MÉRITO SUPERVENIENTE. PERDA DO OBJETO RECURSO ESPECIAL. NÃO CARACTERIZAÇÃO. 1. O julgamento definitivo da questão em 1ª Instância não exaure o conteúdo do provimento concedido em sede de antecipação da tutela, uma vez que seus efeitos sobrepõem-se muitas das vezes à fase de conhecimento, antecipando no tempo a execução da própria sentença. 2. Agravo regimental a que se nega provimento.” (AgRg no Ag 470096/RJ, Rel. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, SEGUNDA TURMA, julgado em 04/09/2003, DJ 13/10/2003 p. 331)
[28] STJ, Corte Especial, Embargos de Divergência no REsp. 765.105 /TO, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, DJe 09.11.2010.
[29] NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Manual de Direito Processual Civil. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2010, p. 1110.
[30] LEAL, Rosemiro Pereira. Teoria Processual da Decisão Jurídica. São Paulo: Landy, 2002. p. 157.
[31] NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Manual de Direito Processual Civil. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2010, p. 639.
[32] NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Op. Cit., p. 1111.

 


 

Informações Sobre o Autor

 

Cristiano de Oliveira

 

Especialista em Direito Processual pela PUC-MINAS.

 


 

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Equipe Âmbito Jurídico

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