A educação em direitos humanos é essencialmente a formação de uma cultura de respeito à dignidade humana através da promoção e da vivência dos valores da liberdade, da justiça, da igualdade, da solidariedade, da cooperação, da tolerância e da paz. Portanto, a formação desta cultura significa criar, influenciar, compartilhar, e consolidar, mentalidades, costumes, atitudes, hábitos e comportamentos que decorrem, todos, daqueles valores essenciais citados – os quais devem se transformar em práticas. (Maria Vitória Benevides)
1. Introdução
Está se tornando cada vez mais forte a idéia de que não respeitar, proteger ou atender aos direitos humanos são obstáculos importantes e fundamentais ao desenvolvimento econômico e à justiça social.
De maneira geral, os Estados democráticos reconhecem o imperativo moral de enfrentar as violações aos direitos humanos, principalmente, em suas políticas sociais. Na prática, contudo, ainda estamos tentando compreender o que significa essa importante mudança social.
Expressões como políticas públicas, direitos humanos, cidadania e democracia, tornam-se tão familiares as pessoas e ficamos inclinados a concluir antecipadamente que elas são bem compreendidas pela maioria da população. Contudo, isso não é verdade, ainda existe um longo caminho a ser percorrido na defesa da cidadania e dos direitos humanos no Brasil.
A presente tese apresentada ao15º Congresso Brasileiro de Advocacia Pública e ao 3º Congresso Sul Americano de Direito do Estado tem como objeto defender a idéia do envolvimento dos advogados públicos na efetivação da Educação em Direitos Humanos no Brasil, como proposto no Plano Nacional de Educação em Direitos Humanos (PNEDH) e nas três versões do Plano Nacional de Direitos Humanos (PNDH) e no Plano Nacional de Educação em Direitos Humanos, como realização de sua função social.
Os advogados públicos gozam não só de prestigio junto à comunidade como estão à frente de decisões importantes dentro da administração pública. Como profissionais ligados à área da justiça e segurança figuram como público alvo do PNEDH. Nesse sentido, cabe não somente as instituições investir em um amplo processo de formação em educação em direitos humanos, como a construção de uma doutrina que inclua essa visão nos processos e procedimentos administrativos, fortalecendo assim uma cultura de respeito e promoção aos direitos humanos.
2. A Educação em Direitos Humanos
A Declaração Universal dos Direitos Humanos (DUDH) enquanto marco teórico, jurídico, político e educacional de construção de uma cultura universal de respeito aos direitos humanos implicou historicamente em processos múltiplos culturais e políticos direcionados as gerações futuras e todos os povos.
No campo político institucional a DUDH resultou em um conjunto de responsabilidades por parte dos Estados-membros em assumir medidas progressivas internacionais e nacionais de promoção e defesa dos direitos humanos permeados e atravessados por práticas culturais, educativas e pelo reconhecimento social, cultural ético e político (ZENAIDE, 2008).
No mesmo prisma, o Congresso Internacional sobre Educação em prol dos Direitos Humanos e da Democracia, realizado pela Organização das Nações Unidas (ONU) em março de 1993, instituiu o Plano Mundial de Ação para a Educação em Direitos Humanos que foi referendado na Conferência Mundial de Viena de 1993, visando promover, estimular e orientar compromissos em prol da educação em defesa da paz, da democracia, da tolerância e do respeito à dignidade da pessoa humana.
Entre outras políticas, o programa aprovado em Viena consagrou questões como erradicação do analfabetismo, a inclusão de direitos humanos nos currículos de todas as instituições do ensino formal e não-formal, assim como a necessidade de promover a realização de programas e estratégias educativas visando ampliar o máximo a educação em direitos humanos (ROCHA, 2009).
Tendo como objetivo reiterar a importância de uma educação em direitos humanos a ONU declara em dezembro de 1994 a década da educação em direitos humanos, através da Resolução 49/184, equivalendo ao período de 01 de janeiro a 31 de dezembro de 2004. Com isso a ONU reconhece e defende o direito de toda pessoa humana à educação em todos os níveis com o pleno exercício das liberdades fundamentais e o respeito aos direitos humanos.
Dessa forma, o acesso à instrução é posto como um meio de potencialização dos sujeitos para participarem e tomarem decisões na defesa dos seus direitos, a educação enquanto bem e direito é que vai dinamizar todo um conjunto de compromissos em relação à educação em e para os direitos humanos.
O Pacto Internacional dos Direitos Humanos Econômicos, Sociais e Culturais (PIDESC) corrobora com uma educação voltada para os direitos humanos como uma condição indispensável a um desenvolvimento econômico e social sustentado, justo e solidário, voltado para a construção da cidadania em relação ao indivíduo e da democracia em relação à sociedade (ROCHA, 2009a).
A Declaração e Plano de Ação Integrado sobre Educação para a Paz, os Direitos Humanos e a Democracia ratificada pela Conferência Geral da UNESCO em 1995, afirma o compromisso em dar prioridade a educação de crianças, adolescentes e jovens face às formas de intolerância, racismo e xenofobia (UNESCO, 2001).
Nessa linha de raciocínio, a Conferência Mundial contra o Racismo, a Discriminação Racial, a Xenofobia e Formas Correlatas de Intolerância (CMR) realizada em Durban, África do Sul, em 2001, indicou para os Estados o compromisso com a luta contra o racismo, a discriminação racial, a xenofobia e a intolerância religiosa, a implementação de programas culturais e educacionais que incluam componentes antidiscriminatórios e anti-racistas, a realização de campanhas públicas de informação, programas de educação em direitos humanos em todos os níveis, produção de material didático e programas de educação pública formal e informal que promovam a diversidade cultural e religiosa e a implementação de políticas de promoção da igualdade de oportunidades (ONU, 2001).
Para realização dos objetivos e metas da década passada o Alto Comissariado para os direitos humanos da ONU elaborou o plano de ação internacional que pretende, entre outras coisas, avaliar necessidades e definir estratégias no campo da educação em direitos humanos; criar e reforçar programas de educação em matéria de direitos humanos a nível internacional, regional, nacional e local; coordenar a elaboração de materiais didáticos em matéria de direitos humanos; reforçar o papel dos meios de comunicação social; promover e divulgar a DUDH a nível mundial (2001).
Ao analisar os maiores problemas mundiais, a ONU estabeleceu 8 (oito) Objetivos do Milênio (oito Jeitos de Mudar o Mundo) na Declaração do Milênio, ratificada no ano 2000. Essa Declaração reúne os planos de todos os Estados-Membros da ONU para melhorar a vida de todos os habitantes do planeta no século XXI.
Até 2015 todos os 191 Estados-membros assumiram o compromisso de: erradicar a extrema pobreza e a fome; atingir o ensino básico e fundamental; promover a igualdade entre os sexos e a autonomia das mulheres; reduzir a mortalidade infantil; melhorar a saúde materna; combater o HIV/AIDS, a malaria e outras doenças; garantir a sustentabilidade ambiental e estabelecer uma parceria mundial para o desenvolvimento.
Muitas têm sido as contribuições referentes aos dispositivos, medidas e instrumentos específicos dos direitos humanos aos quais os Objetivos do Milênio podem se alinhar, mas todas possuem como característica comum o fato de suas conexões serem amplas e óbvias. Como a Declaração do Milênio considera o desenvolvimento sob a perspectiva dos direitos humanos, podemos dizer que são relevantes todas as medidas estabelecidas em convenções e tratados internacionais como a DUDH e o PIDESC e em medidas nacionais como o PNEDH e seus respectivos planos estaduais.
Com a Constituição Federal de 1988 que instituiu o Estado Democrático e de Direito, o Brasil ampliou processos de ratificação criando, no nível interno, importantes mecanismos nacionais de proteção aos direitos humanos.
Em 1996, o Estado Brasileiro em resposta a pressões sociais cria o Plano Nacional de Direitos Humanos (PNDH) buscando transformar os direitos humanos como eixo articulador e transversal de programas e projetos de promoção, proteção e defesa dos direitos humanos.
O PNDH estabelece como uma das linhas de ação do governo brasileiro a implementação do PNEDH atendendo a compromissos firmados no plano internacional com a Década da Educação em Direitos Humanos. A terceira versão do PNDH traz ainda mais forte esse compromisso.
Só em 2003, todavia, é que a SEDH através da Portaria nº 98/09 de julho de 2003 cria o Comitê Nacional de Educação em Direitos Humanos com o propósito de conceber políticas públicas no campo da educação em direitos humanos.
A inclusão da educação em direitos humanos no ordenamento jurídico brasileiro, principalmente, na legislação educacional também é feita após a Constituição Federal de 1988 a exemplo da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), do Plano Nacional de Educação (PNE), dos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs), do Plano Nacional de Extensão Universitária e das Diretrizes Nacionais Curriculares para os cursos de graduação.
O marco legal desse processo, entretanto, foi a elaboração do PNEDH, o qual situa a educação em direitos humanos como um processo multidimensional que propõe articular o debate sobre os direitos humanos e a formação para a cidadania no Brasil.
Essa concepção de direitos humanos incorpora a compreensão de cidadania democrática, cidadania ativa e cidadania planetária, embasadas nos princípios da liberdade, da igualdade, da diversidade, e na universalidade, indivisibilidade e interdependência dos direitos. A democracia, ao ser entendida como regime alicerçado na soberania popular e no respeito integral aos direitos humanos, é fundamental para o reconhecimento, a ampliação e a concretização dos direitos (PNEDH, 2006).
Nesse entendimento, o processo de construção da cidadania ativa requer, necessariamente, a formação de cidadãos conscientes dos seus direitos e deveres, e protagonistas da materialidade das normas e pactos que os regulamentam, englobando a solidariedade internacional e o compromisso com outros povos e nações.
A educação é tanto um direito humano em si mesmo, como um meio indispensável para realizar outros direitos, constituindo-se em um processo amplo que ocorre na sociedade e ganha maior importância quando direcionada ao pleno desenvolvimento humano e às suas potencialidades e a elevação da auto-estima dos grupos socialmente excluídos, de modo a efetivar a cidadania plena para a construção de conhecimentos, no desenvolvimento de valores, crenças e atitudes em favor dos direitos humanos e da justiça social (2006).
A LDB estabelece que educar em direitos humanos é fomentar uma prática educativa inspirada nos princípios de liberdade e nos ideais de solidariedade humana, com a finalidade do pleno desenvolvimento do educando, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho (BRASIL, 2008).
A partir desses pressupostos, o PNEDH foi concebido com o objetivo de contribuir para a vigência de um estado brasileiro democrático, embasado em uma proposta que prioriza as políticas públicas em busca da melhoria das condições de vida da população. O PNEDH, na condição de política pública, apresenta-se como um instrumento orientador e fomentador de ações educativas, no campo da educação formal e não-formal e nas esferas pública e privada.
Para efetivar a implementação do PNEDH a SEDH criou em 2005 a Coordenação Geral de Educação em Direitos Humanos vinculada a Subsecretaria de Promoção e Defesa responsável pela implementação dos programas projetos e ações.
Em 2007 a SEDH, o Ministério da Educação (MEC) e o Ministério da Justiça (MJ) durante o Congresso Interamericano de Educação em Direitos Humanos lançaram a versão ampliada do PNEDH. Durante a Reunião de altas Autoridades de Direitos Humanos do MERCOSUL, atendendo a recomendações da ONU, foram aprovadas as Diretrizes para formulação de Planos Nacionais de Educação em Direitos Humanos que estão sendo discutidos em conferências territoriais e estaduais de direitos humanos.
Nos dias atuais, no plano federal a política de educação em direitos humanos vem sendo proposta pela Secretaria para a Diversidade do MEC (SECAD) e pela Secretaria de Direitos Humanos (SEDH). Nos estados foram criados comitês estaduais de educação em direitos humanos. Contudo, a efetivação das ações previstas no PNEDH depende de um maior envolvimento de atores como a OAB e os advogados públicos.
Compreendemos, portanto, que a relação do advogado, sobretudo, o advogado público com os direitos humanos e a EDH diz respeito a sua função social e os fins que a OAB assumiu no Brasil em defesa do Estado democrático e de direitos e na radicalização da democracia participativa para atingir a igualdade e a justiça social, tomando a proteção aos direitos humanos como o principal objetivo do Estado democrático no Brasil.
Pesquisador permanente do Programa de Pós-Graduação Doutorado Multi-Institucional e Multidisciplinar em Difusão do Conhecimento (DMMC) e do Programa Mestrado Profissional em Gestão e Tecnologia Aplicada à Educação (GESTEC). É professor Adjunto da Universidade do Estado da Bahia (UNEB), coordenador do Centro de Referência em Direitos Humanos (CRDH) e Pró-Reitor de Pesquisa e Ensino de Pós-Graduação da UNEB
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