A (in) viabilidade de um constitucionalismo do futuro em face das críticas ao neoconstitucionalismo na República Federativa do Brasil

Resumo: O presente trabalho tem por escopo discutir a (in) viabilidade de um Constitucionalismo do Futuro em face das críticas ao Neoconstitucionalismo na República Federativa do Brasil. Para tanto, serão consideradas correntes doutrinárias e filosóficas sobre o tema. Constitucionalismo do Futuro será vislumbrado como a projeção do movimento constitucional formulado pela doutrina de José Roberto Dromi e pautado em sete premissas básicas que objetivam a busca de um equilíbrio entre os atributos do Constitucionalismo Moderno e os excessos do Constitucionalismo Contemporâneo. E, Neoconstitucionalismo, como o movimento estruturado em Direitos Fundamentais e Princípios Constitucionais, que almejam dentre outras acepções afirmar a Força Normativa da Constituição, a expansão da Jurisdição Constitucional e o desenvolvimento de uma nova Dogmática da Hermenêutica Constitucional. Afinal, qual a (in) viabilidade de substituição do Neoconstitucionalismo por um Constitucionalismo do Futuro?

Palavras- Chave: Constituição. Neoconstitucionalismo. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Constitucionalismo do Futuro.  Estado.

Abstract: This work is scope to discuss the (in) feasibility of a future of Constitutionalism in the face of criticism of Neoconstitutionalism the Federative Republic of Brazil. To do so will be considered doctrinal and philosophical currents on the subject. Constitutionalism Future is envisioned as the projection of the constitutional motion filed by the doctrine of Jose Roberto Dromi and ruled by seven basic premises aimed at the search for a balance between the attributes of constitutionalism Modern and Contemporary excesses of constitutionalism. And Neoconstitutionalism, as the movement structured Fundamental Rights and Constitutional Principles, which aims among other renderings state Normative Force of the Constitution, the expansion of Constitutional Jurisdiction and the development of a new Dogmatic Constitutional Hermeneutics. After all, what (in) replacement viability of Neoconstitutionalism for Constitutionalism of the Future?

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Key words: Constitution. Neoconstitutionalism. Constitution of the Federative Republic of Brazil 1988. Constitutionalism of the Future.  State.

Sumário: Introdução. 1. Neoconstitucionalismo na República Federativa do Brasil. 1.1. Constitucionalismo e Constituição. 1.2 As Peculiaridades do Neoconstitucionalismo. 1.2.1Aspectos Conceituais e Históricos do Neoconstitucionalismo. 1.2.2A Doutrina Neoconstitucionalista. 1.2.3 As Contradições E Falsas Perspectivas Do Neoconstitucionalismo. 2. A (In) Viabilidade do Constitucionalismo do Futuro na República Federativa do Brasil.2.1 As Perspectivas do Constitucionalismo do Futuro. 2.1.1 As Críticas ao Constitucionalismo Vindouro. 2.2 O Constitucionalismo do Futuro em Substituição ao Neoconstitucionalismo na República Federativa do Brasil. Conclusão. Referências.

Introdução

Os estudos e teorias constitucionais nem sempre foram objeto da devida preocupação por parte do homem, enquanto elemento contributivo para o aprimoramento do Estado e a regulação da vida em sociedade até o término da Primeira e Segunda Guerras Mundiais.

Muito embora buscasse desde a antiguidade reger direitos e limitar o poder do monarca por meios de regras jusnaturalistas, remete- nos a história a sujeição dos mais fracos, sob as expoentes figuras da religião e dogmática, que décadas mais tarde com a evolução do constitucionalismo se fundamentaria em uma ordem escrita e um holocausto autorizaria.

E diante de tal quadro, apesar de já serem regulamentados alguns direitos e garantias individuais em face do Estado e de seus semelhantes, é que o homem sentiria a necessidade de consagrar também a fraternidade e a paz. E com base em tais fundamentos é que se desenvolveria no século XX, o chamado “Neoconstitucionalismo” e conquanto, inúmeras críticas, se proporia a implementar significativas mudanças e desafios, chamando atenção ao papel da Constituição em um Estado, o seu conteúdo instrutivo por regras e princípios e a função do Poder Judiciário na resolução de conflitos e lacunas da lei. Mas, o que viria depois desse constitucionalismo? Pode-se falar em um Constitucionalismo do Futuro? Se positivamente, de que maneira?

Desta feita, o presente trabalho tem por objetivo discorrer sobre a (in) viabilidade de um Constitucionalismo do Futuro em face das críticas tecidas ao Neoconstitucionalismo, abordando para tanto o tema em dois capítulos.

No primeiro deles, fazendo breves apontamentos sobre Constitucionalismo e Constituição, os ideais do Neconstitucionalismo e a exposição das críticas feitas pela doutrina, sobretudo às proferidas pelos professores Daniel Sarmento e Dimilis Dimoulis.

No segundo e último capítulo, apresentar a projeção de um novo Constitucionalismo dito “do futuro”, idealizado pelo professor Roberto Dromi, na qual pautado em sete premissas básicas se equilibraria os excessos e contratempos de toda a história constitucional já vivenciada pelo mundo.

Todavia, o que esperar desse novo constitucionalismo? Seria ele realmente novo, ou, apenas um aprimoramento dos outros constitucionalismos? Seria viável a sua inserção na República Federativa do Brasil em substituição ao Neoconstitucionalismo?

1. Neoconstitucionalismo na República Federativa do Brasil

1.1. Constitucionalismo e Constituição

Antes de iniciarmos quaisquer considerações sobre o Neoconstitucionalismo na República Federativa do Brasil, convém elucidar o significado dos termos “Constitucionalismo” e “Constituição”.

Compreendido sob os aspectos de evolução histórica das Constituições e os avanços trilhados pela ciência jurídica constitucional ao longo dos séculos, o Constitucionalismo parte da ideia de que todo Estado dever possuir uma Constituição e que os textos constitucionais devam garantir a limitação do poder pelo Direito. (SOARES; RIGOLDI, 2013, p. 431).

Isto porque, segundo Lazari (2011, p. 110), teria o movimento constitucional surgido em “(…) oposição ao caráter divino e/ou imperativo do monarca, num tentame de impor limitação ao poder e seus desdobramentos negativos, como o autoritarismo e a censura”.

Como se denota, destacam em sua concepção ideias de afirmação da supremacia do indivíduo em face do Estado, racionalização do poder, limitação e divisão de poderes, muito embora sejam atribuídos a ele inúmeros outros sentidos.

 Neste diapasão, André Ramos Tavares, salienta que são identificáveis pelo menos quatro sentidos, a saber; sendo numa primeira acepção, empregado para fazer referência ao movimento político social com origens históricas, que pretende limitar o poder arbitrário. Em uma segunda acepção, denota a imposição de cartas constitucionais escritas. Noutras, o indicativo de propósitos latentes e atuais da função e posição das Constituições nas diversas sociedades e, por fim, a evolução histórico constitucional de um Estado (TAVARES, 2006, p. 1-16).

Para José Gomes Canotilho (1988, p. 45), trata-se de uma ideologia que ergue o princípio do governo limitado e representa um movimento político, social e cultural, que a partir do século XVIII, questionou o domínio político, sugerindo em contratempo uma nova ordem e fundamentação do poder político.

Em suma, trata-se de uma sucessão de fatos que levou o homem a elaborar uma Constituição escrita que contemplasse direitos e garantias, muito embora já como norma de organização e pressuposto do Estado ela já existisse. Mas, e qual a definição de uma Constituição?

Segundo Juliano Bernardes (2012, s/p), o termo Constituição teria origem grega  advinda do termo “politeia”, mas igualmente do vernáculo latim “constitutio”, expressando a depender da transcrição em letras maiúscula ou minúscula distintos significados. Importando apenas o conteúdo expresso pelas letras garrafais, frisa o autor, ser ela o indicativo de um conjunto de normas (escritas ou consuetudinárias), estruturas institucionais ou, ainda, a ordem jurídica política de determinado sistema socialmente organizado.

Como se denota, o termo em si guarda uma proposição a inúmeros significados, sob os mais variados aspectos, tal como fizeram Ferdinand Lassalle, Carl Schmitt e Hans Kelsen, ao atribuírem sentidos a ela, respectivamente, sociológico, político e jurídico. (BERNARDES, 2012, s/p).

Desta forma, como um elemento contribuinte para a idealização de uma Constituição, o Constitucionalismo deve ser compreendido como um movimento que ao priorizar as mais demasiadas naturezas, busca por meio de suas ideologias assegurar pela ordem escrita direitos e garantias desrespeitados, dando ênfase a valores e princípios que dignifiquem o homem enquanto, sujeito de direitos e obrigações e zelem pelo aprimoramento do Estado e da Sociedade.

1.2 As Peculiaridades do Neoconstitucionalismo

1.2.1. Aspectos Conceituais e Históricos do Neoconstitucionalismo

Compreendidas as definições de Constitucionalismo e Constituição, importantes para a análise de qualquer movimento constitucional que se objetive estudar, neste capítulo, tratar-se-á do contexto conceitual e histórico do “Neoconstitucionalismo”, preliminarmente, expondo breves apontamentos sobre o berço de sua ideologia.

Formulado pelas doutrinas espanhola e italiana, o termo Neoconstitucionalismo, muito embora se deva retomar os traços históricos da Europa Ocidental, principalmente os relativos a Segunda Guerra Mundial, só viria a ser conhecido mundialmente após a publicação da obra “Neoconstitucionalismo (s)”, de organização do jurista mexicano Miguel Carbonell, no ano de 2003. (SARMENTO, 2009, s/p).

Apenas a título de compreensão do instituto, até a Segunda Guerra Mundial prevalecia nos meios jurídicos uma cultura legicêntrica, voltada as leis editadas pelo Parlamento, desconsiderando o papel das Constituições escritas, que eram vislumbradas como programas políticos despidos de qualquer vinculação e proteção por parte do Judiciário e até mesmo de direitos e garantias perante o Parlamento. (SARMENTO, 2009, s/p).

E diante de tal cenário, sobretudo após os massacres ocorridos nas Guerras Mundiais, é que países como a Alemanha, Itália e mais tarde a Espanha e Portugal, sentiram a necessidade de modificar as Constituições e o Sistema Constitucional que os regiam, instituindo mecanismos que os aproximassem das Constituintes americanas e fossem além de prever Direitos Fundamentais. E a partir de tais precedentes, nascia uma teoria focada no pós- guerra, na Dignidade da Pessoa Humana, crítica a legalidade estrita, valorização e normatividade de princípios, valor jurídico da Constituição e Jurisdição Constitucional. (SARMENTO, 2009, s/p).

Segundo Mello, tratava de um movimento que se desenvolveria no final do século XX, inspirado na justiça, nos Direitos Fundamentais e na Dignidade Humana que prestigiaria a superioridade das Constituições, as inovações hermenêuticas e a concretização das promessas constitucionais. (MELLO, 2008, p. 40).

Para o ministro Luís Roberto Barroso, tratou-se de um conjunto de transformações ocorridas no Estado e no Direito Constitucional e cujos, marcos históricos, filosóficos e teóricos foram bem delineados correspondendo, respectivamente, a formação do Estado Constitucional de Direito; o pós positivismo, com a centralidade dos Direitos Fundamentais e a reaproximação entre Direito e Ética; as mudanças que incluem a força normativa da Constituição, a expansão da Jurisdição Constitucional e o desenvolvimento de uma nova dogmática da interpretação constitucional (BARROSO, 2005, s/p).

Na República Federativa do Brasil, contemplando iguais ideais seus marcos introdutórios seriam o Processo de Redemocratização e a Constituinte de 1988, muito embora a supremacia da Constituição fosse tratada pelo Controle de Constitucionalidade Difuso nas Constituintes anteriores, desde o ano de 1891. (SARMENTO, 2009, s/p).

Comentando o processo de inserção do Neoconstitucionalismo na República Federativa do Brasil, Humberto Ávilla argumenta que embora tenham sido muitas as teorias, métodos e discussões, até mesmo movimentos jurídicos marcantes no período de vigência da Constituinte de 1988, nenhum deles foi tão expressivo e importante quanto o Neoconstitucionalismo ao pregar a teorização e aplicação do Direito Constitucional pautada em princípios em vez de regras, ponderação no lugar de subsunção, justiça particular em vez de justiça geral, Poder Judiciário e menos Poderes Legislativo ou Executivo e Constituição em substituição á lei (ÁVILLA, 2009, s/p).

Referindo-se igualmente a tal período, Sarmento salienta que não se deve desconsiderar o movimento antecessor ao Neoconstitucionalismo, denominado de “Constitucionalismo de Efetividade”, cuja doutrina teve grande êxito no Brasil, pois foi ele o real responsável por fixar no senso comum dos juristas a ideia de que a Constituição é norma que pode e deve ser aplicada, independentemente de regulamentação de seus dispositivos por parte do legislador ordinário. Da mesma forma que, o estudo das teorias jurídicas pós- positivistas, sobretudo as de Dworkin e Alexy, e a descrença geral da população em relação à política, Poder Legislativo e nos Partidos Políticos, foram importantes precedentes (SARMENTO, 2009, s/p).

Como se denota na República Federativa do Brasil o Neoconstitucionalismo se desenvolveu em meio a um período de transição de um modelo supressor para outro que prestigiava a democracia, incutindo uma ideia até mesmo naquela época de que seria ele o movimento responsável pelo fim de todas ou parte das mazelas que afligiam o sistema constitucional e legal.

1.2.2.A Doutrina Neoconstitucionalista

Tratado os aspectos conceituais e históricos do movimento neoconstitucionalista, importa, neste tópico, abordar os pontos principais da doutrina neoconstitucionalista, quais sejam a Força Normativa da Constituição, a Expansão Constitucional, a Nova Dogmática Hermenêutica e a Normatividade dos Princípios para que, posteriormente, possamos analisar as críticas e controversas a sua natureza.

Como salientado anteriormente, o Neoconstitucionalismo foi um movimento instaurado no Pós- Guerra Mundial, que inicialmente tinha a pretensão de auferir as Constituições Européias semelhante valor ao que era conferido as constituintes americanas, mas que ao fim acabou se tornando um expoente movimento constitucional comentado e aplicado mundialmente.

 Segundo Daniel Sarmento as teorias neoconstitucionalistas buscam construir novas grades teóricas, substituindo velhos preceitos do positivismo tradicional incompatíveis com a realidade e anseios da sociedade e do Estado. E, dedicando-se a discussão de métodos, teorias de argumentação, que oportunizem melhores respostas as pretensões sociais e individuais, acaba endossando um ativismo judicial na pessoa do juiz, em nome da proteção aos Direitos Fundamentais e a Dignidade da Pessoa Humana. (SARMENTO, (2009, s/p).

Concernente aos paradigmas e mudanças ofertadas pelo Neoconstitucionalismo, Barroso (2005, s/p), afirma que a Força Normativa da Constituição foi sem dúvida alguma uma das grandes mudanças ocorridas ao longo do século XX, superando inclusive, o modelo europeu, que como já salientado anteriormente era apenas um documento político condicionado a atividade legislativa, sem qualquer papel relevante atribuível ao Judiciário.

Para Daniel Sarmento, essa Força Normativa da Constituição, se faz igualmente nítida quando aquela leitura clássica do Princípio da Separação de Poderes, em que limites rígidos freiam a atuação do Poder Judiciário, cede espaço ao ativismo judicial e ao invés de contemplar uma teoria focada no código e na lei formal, enfatiza a centralidade da Constituição no ordenamento. (SARMENTO, 2009, s/p).

Como se denota, tanto o ministro Barroso, quanto o promotor Sarmento ao tratarem da Força Normativa da Constituição enumeram a importância da Separação de Poderes e, principalmente, a função do Poder Judiciário, enquanto, órgão incumbido de solucionar os conflitos e aplicar a lei ao caso concreto.

Quanto à expansão constitucional, decorrente indiretamente dessa ideia de atribuição de Força Normativa da Constituição, frisa o ministro Barroso (2005,s/p), que, somente após o ano de 1945, alguns países passariam a ter Tribunais Constitucionais, sendo um dos mais recentes casos o de Moçambique, no ano de 2003.  Na República Federativa do Brasil, embora já existisse previsão no ordenamento jurídico desde as primeiras Constituições republicanas, somente em 1988, é que se desenvolveria o Controle de Constitucionalidade e ampliar-se-ia o rol de legitimados análogo aos modelos austríaco e americano.

Semelhante ao juízo que fizemos acima ao tratar da Força Normativa da Constituição, observe que temos novamente o indicativo de uma judicialização da política e das relações sociais, deslocando poderes para a esfera do Judiciário.

Tão importante quando as demais, a nova Dogmática da Hermenêutica Constitucional, passaria diante dos inúmeros problemas ligados a realização da vontade constitucional a argumentar uma nova forma de interpretar o sistema constitucional e legal, e questionando, sobretudo, o papel da norma e o papel do juiz. Na acepção do ministro Luís Roberto Barroso, as respostas para todos os problemas estariam integralmente no ordenamento jurídico e ao intérprete caberia o dever de realizar uma função técnica de conhecimento, valorando o sentido para as cláusulas abertas, procedendo às escolhas dentre as possíveis. (BARROSO, 2005, s/p).

E nesse plano ainda de interpretação constitucional, reconhecer-se-ia a normatividade dos princípios e sua distinção qualitativa, que em face de colisões de normas constitucionais demandaria uma ponderação de valores e uma argumentação racional por parte do intérprete. Para Daniel Sarmento (2009, s/p), significa que se busca por novas grades teóricas, em substituição aquelas do positivismo tradicional, consideradas incompatíveis com a nova realidade.

Dessa forma, o Neoconstitucionalismo enumera um movimento constitucional que tendo como principais vertentes a Força Normativa da Constituição, a Jurisdição Constitucional e uma nova Dogmática Hermenêutica, objetiva contribuir para a concretização de Direitos e Garantias, zelando pela Dignidade da Pessoa Humana e valores de solidariedade e fraternidade perdidos durante uma das fases mais obscuras da humanidade.

1.2.3 As Contradições E Falsas Perspectivas Do Neoconstitucionalismo

Uma vez conhecidas as definições e ideais operados pelo Neoconstitucionalismo na República Federativa do Brasil ainda que de forma superficial, é oportuno para que tenhamos condições de compreender as projeções do Constitucionalismo do Futuro, entender igualmente as suas contradições e falsas perspectivas.

Consoante argumentos tecidos no contexto histórico, até a Segunda Guerra Mundial prevalecia na cultura jurídica uma natureza essencialmente legicêntrica, não se atribuindo força normativa ás Constituições.

Frise-se, no entanto, que diferentemente desse constitucionalismo desenvolvido entre os países europeus, sobretudo na Alemanha e Itália, os Estados Unidos da América, desde os primórdios de sua história já compreendia ser a Constituição uma autêntica norma jurídica que limita o Poder Estatal e justifica a invalidação de leis. (SARMENTO, 2009, s/p).

Semelhante posicionamento é declarado pelo professor Dimoulis, para quem não há de se falar em uma Força Normativa atribuída pelo Neoconstitucionalismo, pois tal acepção já era reconhecida pela doutrina norte-americana. Da mesma forma que, como um projeto político que objetivava garantir Direitos e a Democracia representativa, na República Federativa do Brasil, desde a proclamação da República, se teve introduzido o mais solene reconhecimento institucional da supremacia jurídica da Constituição pelo Controle de Constitucionalidade Difuso, muito embora sua expansão tenha se dado após a Segunda Guerra Mundial (DIMOULIS, 2007, p. 06).

Tratando-se da Jurisdição Constitucional, outro precedente afirmado pelo Neoconstitucionalismo, os professores Daniel Sarmento e Dimoulis afirmam veemente que esta obsessão pelo Poder Judiciário leva a certa desconsideração do papel desempenhado por outras instituições, como os Poderes Legislativo e Executivo na interpretação constitucional. Esquece-se, assim, dos problemas que afligem o Judiciário, criando uma aparente ideia da figura do juiz na concretização da Constituição Brasileira. (SARMENTO, 2009, s/p).

Como se observa, ao atribuir ao Judiciário à tarefa de interpretar a Constituição, dando-lhe a última palavra, incorre-se em erros de suprimir a participação do povo nos caminhos de sua própria história e desrespeitar um dos postulados mais importantes do sistema constitucional; o Princípio da Separação de Poderes.

Referindo-se a Hermenêutica e a necessidade de novas técnicas, face aos problemas enfrentados pelo sistema constitucional e legal, Dimoulis chama- nos a atenção ao fato de que na história do direito, inúmeras são as referências teóricas e práticas de uma interpretação flexível, citando a exemplo: o direito pretoriano, a equidade, o espírito das leis e analogia, sendo forma igualmente errônea a idéia de que o Neoconstitucionalismo privilegia uma interpretação mais aberta e voltada ao raciocínio jurídico (DIMOULLIS, 2007, p. 10).

Especificamente em relação ao uso de princípios em vez de regras, Sarmento (2009, s/p), considerando a diferença técnica e teórica entre eles, sobretudo, concernente a previsibilidade e segurança jurídica para os seus destinatários, salienta que o uso demasiado de princípios aufere ao Judiciário um poder decisório perigoso que deixa de sopesar as singularidades da cultura.

Para Ávilla ao se fundamentar exclusiva e preferencialmente em princípios, mesmo que nossa Constituinte de 1988, seja regulatória e composta também por regras, se estará consentindo no erro de desvalorização da função legislativa e depreciando o papel democrático desse poder.  Em outros termos, ao priorizar o uso de princípios, obedecer-se-ia a Constituição em parte, e violá-la-ia em outra. (ÁVILLA, 2009, s/p).

Destarte, as críticas formuladas por Sarmento e Dimoulis expressam a ideia de que o Neoconstitucionalismo é um aprimoramento ainda errôneo de velhas premissas elaboradas pelos primeiros movimentos constitucionais, em que se objetivava limitar o poder e garantir Direitos e Liberdades, e que na ânsia de concretizar suas pretensões busca por meio de um novo autor a efetividade das Constituições.

2. A (In) Viabilidade do Constitucionalismo do Futuro na República Federativa do Brasil

2.1 As Perspectivas do Constitucionalismo do Futuro

Retratadas as principais nuances e críticas ao “Neoconstitucionalismo”, resta a este capítulo abordar a questão da (in) viabilidade do Constitucionalismo do Futuro na República Federativa do Brasil.

Se a história nos ensina que o constitucionalismo foi sempre marcado pela limitação do poder, certamente também elucida que desde a sua origem seu conteúdo não é estático, mas variável. Neste sentido, surge no século XXI, sob a perspectiva de uma incorporação constitucional social, a união entre o fraterno e o solidário, criando um “Constitucionalismo do Futuro”.

Segundo Lazari (2011, s/p), trata-se de uma projeção do que haveria depois do “Neoconstitucionalismo”, destacando-se a doutrina de José Roberto Dromi, para quem haveria um equilíbrio entre atributos do constitucionalismo moderno e os excessos do contemporâneo. Em outras palavras, um movimento constitucional que pautado em sete premissas básicas de verdade, solidariedade, consenso, continuidade, participação, integração e universalização de direitos, busca a prevalência da Dignidade Humana e dos Direitos Fundamentais a todos os indivíduos habitantes no mundo.

Para Soares e Rigoldi (2013, p.436), tais premissas representariam valores fundamentais a serem observados para que se possa alcançar o equilíbrio entre as concepções do constitucionalismo moderno e o constitucionalismo contemporâneo e concretizar os ideiais do Neoconstitucionalismo.

A verdade consistiria na transparência das metas e promessas que de fato poderão ser cumpridas pelo Poder Público. Em outras palavras, o comprometimento ético e transparente do ente com o interesse público (SOARES, RIGOLDI, 2013, p. 436),

Para Lazari (2011, s/p), tal premissa deve ser compreendida não apenas como a preocupação com as promessas feitas pelo constituinte e deixadas de lado, mas igualmente com os excessivos protecionismos que violam a legalidade e o Princípio da Igualdade.

A premissa solidariedade seria a perspectiva pautada na igualdade, dignidade e justiça social, devendo ser observada sob um tríplice aspecto, quer seja entre os povos, na forma de implementação de direitos e como cooperação e tolerância. (LAZARI, 2011, s/p).

O consenso expressaria a adesão consensual e solidária da parte em prol do interesse maior, pressupondo como frisa Lazari (2011, s/p), na inquebrantibilidade da ordem democrática.

Referindo-se ao respeito à história e aos direitos consagrados por um povo, a continuidade, seria um “(…) impeditivo de ruptura do ordenamento a partir de excessivas e violadoras transformações a ordem constitucional vigente” (SOARES; RIGOLDI, 2013, p. 437). Isto é, consistente na necessidade de que a Constituição respeite a história e se desenvolva a partir dos direitos já consagrados.

Outrossim, a participação enumeraria a necessidade de influência na sociedade, por meio de controle de atos e atendimentos aos princípios, imprimindo a ideia de democracia participativa e Estado Democrático de Direito (SOARES; RIGOLDI, 2013, p. 437).

As premissas integração e universalização de direitos pregariam, respectivamente, a comunhão entre os povos por meio de políticas integracionalistas e a prevalência da dignidade e direitos fundamentais para todos os povos. (SOARES; RIGOLDI, 2013, p. 437).

Assim, denotará o leitor que o Constitucionalismo do Futuro projeta-se em valores conhecidos da doutrina constitucional não consistindo, sob um primeiro enfoque em novidades extraordinárias.

2.1.1 As Críticas ao Constitucionalismo Vindouro

Consubstanciado como um novo constitucionalismo que busca por meio de premissas básicas um equilíbrio entre o Constitucionalismo Moderno e o Constitucionalismo Contemporâneo é salutar que suas principais críticas sejam igualmente comentadas.

Segundo Rafael Lazari, as premissas formuladas por Dromi não existem para criar um novo constitucionalismo. Tratam-se de “(…) proposições que, ou refletem o ânimo de quem as escreve ou já estão institucionalizadas por meio de mecanismos símiles, ou são, simplesmente, incríveis” (LAZARI, 2011, s/p).

Ainda, conforme salienta o autor a verdade de que trata o constitucionalismo vindouro já está sendo vivenciada pela República Federativa do Brasil a muito tempo, desde que se pensou em um Estado Social. A incapacidade estatal e as normas programáticas que frustram as expectativas dos indivíduos são hoje entendidas de forma pacífica pelo Supremo Tribunal Federal e não podem se transformar em promessas inconseqüentes e vazias. Isso é a prova de que se compromete com a verdade (LAZARI, 2011, s/p).

Outrossim, as premissas da integração, solidariedade, consenso e participação, não são os maiores problemas que a República Federativa do Brasil enfrenta, pois dispomos de ações afirmativas, distribuição de competências, formas de controle da maioria, manutenção das minorias e  meios e atores, dentre eles o Ministério Público (LAZARI, 2011, s/p).

Frise-se, que pela redação das críticas feitas ao Constitucionalismo Vindouro, vislumbramos que tais valores na República Federativa do Brasil já se encontram em fase de implemento ou operação, ainda que de forma insatisfatória, carecendo apenas de modificações, ou, quiçá inovações, levando-nos a concluir neste primeiro momento que não haveríamos de denominá-lo como um novo Constitucionalismo.

No entanto, devemos salientar que a premissa mais controversa elencada pelo “Constitucionalismo do Futuro”, diz respeito à universalização de Direitos e, cujo posicionamento é duramente criticado pelo Relativismo Cultural por buscar uma ocidentalização das culturas norte-americana e européia e de certa forma, por desconsiderar o grau evolutivo e moral dos indivíduos que atualmente trilham caminhos diferentes. Neste diapasão, Soares e Rigoldi argumentam que é imprecisa a possibilidade de se desenvolver um constitucionalismo universal, que por meio de uma Constituição Mundial detenha um rol único de Direitos Fundamentais que satisfaçam as diferentes historicidades culturais, costumes e ideologias de todos os povos, pois tanto o Relativismo, quanto o universalismo são um erro, sendo o mais correto dialogar sobre as incompletudes e buscar efetivar uma transnacionalização dos Direitos Fundamentais. (SOARES; RIGOLDI, 2013, p. 438).

De tal modo, percebe-se que as críticas formuladas ao “Constitucionalismo do Futuro”, versam sobre o fato de serem as premissas já consagradas pelos estudos constitucionais e a universalização de Direitos, por deixar de conviver harmoniosamente com o posicionamento do Relativismo Cultural, destruindo seu brilhantismo inicialmente consagrado, tornando-o uma mera repetição que enumera os mesmos erros e concepções.

2.2 O Constitucionalismo do Futuro em Substituição ao Neoconstitucionalismo na República Federativa do Brasil

Debatido o desenvolvimento dos movimentos constitucionais e a formulação do “Neoconstitucionalismo” e do “Constitucionalismo do Futuro”, bem como elucidadas suas principais críticas, neste tópico, enfrentaremos o tema acerca da (in) viabilidade desse último na República Federativa do Brasil.

Como já salientado, o “Neconstitucionalismo” foi um movimento constitucional que visou promoveu significativas mudanças na forma de conceber o Poder Judiciário, na afirmação da Força Normativa das Constituições e na Interpretação Constitucional que priorizasse o indivíduo e seus direitos de uma forma geral.

E o Constitucionalismo do Futuro ao objetivar-se implantar como uma forma de equilíbrio entre o Constitucionalismo Moderno e o Constitucionalismo Contemporâneo, pecaria por repetições não objetivando nenhuma novidade na resolução dos problemas.

Para Lazari (2011, s/p), por representar um marco no processo de civilização humano, ao limitar o poder, implementar a separação de funções e assegurar direitos e garantias individuais, o Constitucionalismo deve ser compreendido como um movimento uno, que não está livre de equívocos e ideias errôneas por evoluir juntamente com o homem, tal como os excessos do “Neoconstitucionalismo” e, a repetividade de alguns preceitos e a impossibilidade de outros no Constitucionalismo de Roberto Dromi, o que nos leva a concluir que  substituir os movimentos constitucionais na República Federativa do Brasil não seria um caminho mais viável para solucionar os inúmeros problemas que enfrentamos, sobretudo, os relativos à efetividade constitucional.

Se fizermos um comparativo histórico de nossas Constituições, perceberemos que não apenas o conceito de Constituição mudou, mas igualmente a forma de conceber e compreender o poder. O que talvez nos faça falta não é justamente a ideia de força normativa da Constituição, participação, consenso, verdade do constituinte, pois todos nós sabemos de sua existência, mas a sua expressão por aqueles que são responsáveis pelo orçamento, criação e implementação das leis. Trata-se de uma percepção muito mais material do que legal.

Ademais, ao pregar uma ideia de universalização que contemplasse uma única Constituição para todos os povos, deixaríamos de considerar as características e costumes de diferentes nações, restringindo o seu direito á cultura, liberdade e dignidade e desconsiderando a evolução psicológica e espiritual dos indivíduos, que os fazem diferentes e semelhantes uns dos outros.

Assim, em substituição ao “Neconstitucionalismo” na República Federativa do Brasil, o Constitucionalismo do Futuro não seria viável, mas uma velha repetição que continua ainda a enumerar os mesmos erros e acredita nos mesmos paradigmas.

Conclusão

Concluímos o presente trabalho afirmando que nossa pretensão não se voltou a esgotar o tema, mas apenas a exposição de algumas linhas que fomentassem a curiosidade do leitor.

Outrossim, de ressaltar algumas características do Constitucionalismo e de sua compreensão na idealização de uma Constituição escrita, que expusessem os ideais que hoje contemplamos e o caminho que pretendemos trilhar no futuro.

Ademais, salientar o papel do Neoconstitucionalismo, apesar de algumas críticas relevantes, na consolidação dos princípios, da Justiça Constitucional e na idealização de um Poder Judiciário mais forte e frisar que, um Constitucionalismo do Futuro, tal como concebido por Roberto Dromi, não é um novo tipo de movimento constitucional, mas um conjunto de premissas e técnicas que buscam por meio de outras interpretações e em meios a antigos erros primar pela dignidade humana e valores, incutindo a ideia de que ao Estado cabe tal tarefa, fazendo assim, sua substituição na República Federativa do Brasil ser inviável.

 

Referências
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Informações Sobre o Autor

Bruna Conceição Ximenes de Araújo

Advogada. Graduada em Direito pelas Faculdades Integradas de Três Lagoas AEMS. Pós-Graduada em Direito Constitucional pela Universidade Anhanguera- Uniderp


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Equipe Âmbito Jurídico

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