Sumário: 1. Introdução; 2. Do cabimento da medida cautelar para agregar
efeito suspensivo a recursos extraordinários; 3. Necessidade de admissão do
recurso extraordinário pelo presidente da corte “a quo”.
Crítica à jurisprudência restritiva do Supremo Tribunal Federal.
1. Introdução
O direito processual, sem dúvida, é o ramo da ciência jurídica que
tem apresentado as mais rápidas transformações legais e jurisprudenciais na
última década. A busca incessante pela efetividade da tutela jurisdicional, a
tentativa de agilizar e informalizar o trâmite dos
litígios e a necessidade de resgatar a credibilidade do Poder Judiciário junto
à sociedade civil, inquestionavelmente, são os nortes que têm conduzido os mais
ilustres juristas nacionais na elaboração das reformas procedimentais.
Dentro desse campo, a introdução do nobre instituto da antecipação
de tutela – quando verificados os pressupostos da verossimilhança e da prova
inequívoca das alegações formuladas -, a reforma do sistema recursal -com
ampliação dos poderes do relator e agilização do trâmite dos processos nos
tribunais- e a desburocratização do processo executivo alinham-se entre
as alterações mais importantes e notáveis que presenciamos.
Em que pese todos os esforços e resultados positivos obtidos com
as reformas colocadas em prática, o excessivo número de demandas submetidas à
apreciação de nossos juízos continua a ser um grande fantasma a importunar os
operadores do direito em sua árdua missão de efetivar a justiça. Diante do quadro vigente e acuados pela pressão da opinião pública,
nossos Tribunais Superiores vêm criando uma série de óbices ao conhecimento de
questões de profunda relevância ao cotidiano da nação, como forma de tentar
diminuir o número de demandas em suas prateleiras.
Desde logo, é preciso registrar nosso imenso respeito e
consideração pelos eminentes juristas que compõem as Altas Cortes de nosso
país. Todavia, parece-nos que os aludidos obstáculos procedimentais levantados,
na maioria das vezes, revelam-se inoportunos e formalistas ao extremo,
desviando a atuação do tribunal de sua real e única função, qual seja a da
prestação jurisdicional solicitada.
E, mais grave, o rigorismo das Cortes Superiores no conhecimento
das postulações que lhes chegam para exame, geralmente, contraria ou não possui
qualquer base de sustentação legal. É o caso, por exemplo, da orientação do
Supremo Tribunal Federal quanto ao não cabimento de medida cautelar para
concessão de efeito suspensivo a recurso extraordinário ainda não admitido pelo
Presidente do Tribunal Regional, que será objeto de estudo e crítica nesse
artigo.
2. Do cabimento da medida cautelar para agregar efeito suspensivo
a recursos extraordinários.
A doutrina tradicional identifica o duplo efeito na interposição
de um recurso, ou seja, a devolução da matéria impugnada (efeito devolutivo) e
a não executoriedade da decisão atacada (efeito
suspensivo). Em regra, todos os recursos possuem tais atributos, salvo quando a
lei disponha expressamente em sentido contrário.
É o caso dos recursos de natureza extraordinária, que possuem devolutividade restrita às hipóteses de cabimento elencadas nos artigos 102, inciso III, e 105, inciso III,
da Constituição Federal de 1988; além de serem desprovidos de efeito
suspensivo, à luz do que prevê o artigo 497 do CPC.
Nota-se, pois, que nem toda impugnação, na via extraordinária,
chegará ao conhecimento do Tribunal Superior (devolutividade
restrita) e que, em regra, a decisão regional atacada possui eficácia
executória (ausência de efeito suspensivo).
Na lição de Nelson Nery Junior, “o efeito suspensivo
consiste em qualidade que adia a produção de efeitos da decisão, assim que
impugnável, perdurando até que transite em julgado a decisão ou o próprio
recurso dela interposto… As eficácias do efeito suspensivo se direcionam para
a não executoriedade da decisão impugnada. O efeito
suspensivo é dado como regra aos recursos, exceto quando a lei expressamente
dispuser em contrário” (Nery, Recursos, 357 ss.). Barbosa Moreira é
mais claro ao ensinar que este efeito consiste “em fazer subsistir o
óbice à manifestação da eficácia da decisão. A interposição não faz cessar
efeitos que já estivessem produzindo, apenas prolonga o estado de ineficácia em
que se encontrava a decisão, pelo simples fato de estar sujeita à impugnação
através do recurso.” (Barbosa Moreira, Novo Processo Civil Brasileiro,
122 ss.).
Disso resulta a conclusão lógica de que nada impede a parte
vencedora de executar a decisão impugnada em sede extraordinária, enquanto
aguarda o resultado do julgamento, mediante execução provisória, na forma do
artigo 588 do Código de Processo Civil.
Todavia, há certas situações em que as circunstâncias da causa
exigem a paralisação dos efeitos da decisão regional atacada pela via recursal
extraordinária. Nalgumas situações excepcionais, a execução imediata da decisão
impugnada poderá ter conseqüências irreversíveis e irreparáveis, fazendo
perecer o objeto do recurso.
Para tais hipóteses, o processo civil nacional possui regra
positiva abstrata e genérica que se destina à salvaguarda dos interesses das
partes litigantes. Referimo-nos à disposição contida no artigo 798 do CPC – que
trata das cautelares inominadas – que prevê a possibilidade de o juiz
determinar as medidas provisórias que julgar adequadas, quando houver fundado
receio de que uma parte, antes do julgamento da lide, cause ao direito da outra
lesão grave e de difícil reparação.
E o Regimento Interno de ambas as Cortes Superiores elencam entre as atribuições de seus Ministros a faculdade
de submeter à deliberação do Tribunal as medidas cautelares necessárias à
proteção de direito suscetível de grave dano de incerta reparação, ou ainda
destinadas a garantir a eficácia da ulterior decisão da causa (RISTJ, arts. 34, inc. V, e 288, RISTF, arts. 21, inc. IV, e 304).
Com base em tais disposições, tanto o Superior Tribunal de Justiça
quanto o Supremo Tribunal Federal têm admitido o cabimento de medida cautelar
para agregar efeito suspensivo ao apelo extremo interposto.
3. Necessidade de admissão do recurso extraordinário pelo presidente
da corte “a quo”. Crítica à jurisprudência
restritiva do supremo tribunal federal.
Consoante o art. 800 do Código de Processo Civil, “ interposto o recurso, a medida cautelar
será requerida diretamente ao tribunal”; logo, dependendo do recurso
cabível, conforme se trate de controvérsia de índole infraconstitucional ou
constitucional, a medida cautelar deverá ser interposta diretamente no Superior
Tribunal de Justiça ou no Supremo Tribunal Federal.
O Eg. STJ, com amparo nesse dispositivo
processual, já possui linha pacífica de precedentes no sentido de que é
possível a concessão de medida liminar, quando as circunstâncias da causa autorizarem, para conceder efeito suspensivo a recurso
especial, ainda mesmo quando este não tenha sido interposto. Nesse sentido o
lapidar precedente da MC 2000-DF, relator Ministro Milton Luiz Pereira,
publicado recentemente no Informativo de Jurisprudência do STJ:
“MEDIDA CAUTELAR. RESP NÃO INTERPOSTO. ACÓRDÃO NÃO PUBLICADO.
A Turma, por maioria, negou provimento
aos agravos regimentais e manteve a liminar concedida na medida cautelar. A
falta da interposição do recurso especial, pela justificativa aceitável de que
o acórdão combatido não foi ainda publicado, não constitui óbice intransponível
ao favorecimento da cautelar, porque não se defere a suspensão ao recurso mas, sim, aos efeitos daquele acórdão – que desconstituiu
liminar em mandado de segurança, deferida a favor da autora da cautelar – até
que se decida em definitivo sobre o sucesso ou não da interposição e admissão
do especial. Precedentes citados: MC 488-PB, DJ 3/9/1996; MC 1980-RS, DJ
15/10/1999; MC 1.475-SP, DJ 7/6/1999; MC 136-SP, DJ 29/5/1995; MC 1.482-PR, DJ
8/3/1999; MC 424-PA, DJ 2/9/1996, e MC 1.310-PR, DJ 26/4/1999. AgRg na MC 2.000-DF, Rel. Min. Milton Luiz
Pereira, julgado em 2/12/1999.” (notícia publicada no INFORMATIVO n. 42 do STJ).
Outra, contudo, a interpretação que o tema ganha no Excelso
Pretório, a merecer nossa especial atenção nesse trabalho.
Está consagrado na jurisprudência do Supremo Tribunal que “Não
cabe medida cautelar, visando ao efeito suspensivo de recurso extraordinário
não apreciado pela Presidência do Tribunal “a quo”
(Precedente) Pet. 150, RTJ
116/280″ (Pet. 535, Rel. Min. Moreira Alves,
e Pet. 260, Rel. Min. Octávio Galotti).
Com a máxima vênia, tal entendimento revela-se superado não só
pela legislação superveniente (especialmente o art. 800, par. único, do CPC), mas, sobretudo, pela necessidade de proteção
jurisdicional às situações levadas ao conhecimento da Augusta Corte.
Passemos, pois, a refletir e argumentar.
Em primeiro lugar, merece registro um aspecto de natureza prática
e que, por si só, demonstra o perigo da interpretação conferida ao tema pelo
Augusto Pretório.
Conforme reza o “caput” do artigo 542 do Código
de Processo Civil, “recebida a petição pela
secretaria do tribunal e aí protocolada, será intimado o recorrido, abrindo-se-lhe vista para apresentar contra-razões”.
E o parágrafo 1º da mesma norma estabelece que “findo esse prazo, serão
os autos conclusos para a admissão ou não do recurso, no prazo de 15 (quinze)
dias, em decisão fundamentada”.
E a praxis forense tem-nos mostrado que
para o cumprimento de tais formalidades legais não menos do que seis meses são
necessários, com muito boa vontade.
O prazo de 15 dias fixado pelo §1º do art. 542 do CPC não vincula
o prolator do despacho admissional, ficando a parte
na dependência do volume de processos e do ritmo de trabalho da assessoria da
Presidência do Tribunal. Aliás, mesmo que o prazo fosse obedecido, seriam
necessários, no mínimo, dois meses para a realização de tais atos, interregno
que ainda se mostra demasiado largo para que o direito fique ameaçado sem
qualquer providência acautelatória.
Por outro lado, não se pode admitir que a parte prejudicada por
uma decisão, cujo atributo de eficácia imediata possa trazer consequências irreversíveis e irreparáveis, seja compelida
a cumpri-la, sem que lhe seja dada a possibilidade de
esgotar o “procedural duo process
of law” que o
ordenamento jurídico-processual lhe faculta.
A lei processual e o regimento interno do tribunal, como se disse,
facultam ao relator tomar as providências cautelares cabíveis à proteção de direito suscetível de grave dano de incerta reparação, ou ainda
destinadas a garantir a eficácia de ulterior decisão da causa. Então,
toda aquela decisão do relator que omitir tais providências, quando as
circunstâncias de fato e de direito recomendarem-nas, desrespeitará a cláusula
do devido processo legal.
Geralmente, a parte que manejar o recurso extraordinário ver-se-á
obrigada a tomar uma difícil iniciativa entre cumprir a decisão recorrida –
mesmo diante de plausíveis alegações de contrariedade à Lei Maior – ou
descumpri-la, em procedimento nada recomendável num Estado Democrático de
Direito. Nota-se, assim, que qualquer uma das duas alternativas que se colocam
para a parte recorrente são extremamente nefastas à
preservação da ordem jurídica e à segurança.
Diante disso, parece-nos que a tese prevalente nesta Corte
choca-se com a cláusula “duo process”,
insculpida no inciso LIV do art. 5º da CF/88. De
outra parte, afigura-se-nos evidente que a
jurisprudência aqui criticada acarreta num vazio de tutela jurisdicional
inaceitável.
Em boa hora, nosso legislador constitucional ampliou a definição
positiva do princípio da inafastabilidade do Poder
Judiciário, fazendo constar no Texto Maior que “a lei não excluirá da
apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito” (art.
5º, XXXV, da CF/88 – com grifo nosso).
Restou evidente a intenção de tutelar o patrimônio jurídico de
todos contra qualquer ameaça de lesão a direito, sendo este, sem dúvida, o
ponto mais significativo da nova redação conferida ao preceito (cf. Manoel Gonçalves Ferreira Filho, in
Comentários à Constituição Brasileira de 1988, Saraiva, Volume I, 1990, p. 55);
Quer dizer que a toda ameaça de direito deve haver uma medida
cabível para que a parte possa solicitar a tutela jurisdicional. A ação, como
poder de acudir a jurisdição, existe sempre. Jamais pode ser negada ao
indivíduo a tutela jurisdicional, sem que nisso resida um maltrato ao cânon
constitucional.
Nesse sentido, aliás, a ótima lição do saudoso mestre cisplatino
EDUARDO J. COUTURE, em sua clássica obra “Fundamentos del Derecho
Procesal Civil”, que tomamos a liberdade de
transcrever como subsídio:
“?Y la acción? La acción, como poder jurídico de
acudir a la jurisdición,
existe siempre: con derecho (material) o sin él; con pretensión
o sin ella, pues todo individuo tiene ese poder jurídico, aun antes de
que nazca su pretensión concreta. El poder de accionar es un
poder jurídico de todo individuo en cuanto tal; existe aun cuando no se ejerza efectivamente.
De la misma manera que todo individuo, en cuanto tal, tiene el derecho de recibir
asistencia del
Estado en caso de necesidad,
tiene también derecho de acudir a los órganos de la jurisdición,
para pedirles su ingerencia cuando la considera procedente. Esa facultad es independiente
de su ejercicio; hasta puede ejercerse sin razón, como cuando la invoca y pretende ser
amparado por el Estado, aquel
que no se halla efectivamente
en estado de nesecidada o aquel cuyo crédito ya se ha extinguido porque el pago hecho
al mandatario era válido.” (Obra Citada, Editora Depalma, Buenos
Aires, 3ª edição, 1997, p. 68);
A propósito, o Superior Tribunal de Justiça já teve oportunidade
de se deparar com situação em que o recurso extremo sequer havia sido aviado na
instância “a quo”, porque não
publicado o acórdão. E, diante do prejuízo eminente da parte recorrente e da
necessidade de tutelar o direito ameaçado, aquela Egrégia Corte chegou ao
seguinte veredicto:
“Cautelar – Recurso Especial. Possibilidade, em tese, de ser
concedida à suspensão da execução de ato judicial, mesmo não interposto ainda o
especial, uma vez que não publicado o acórdão. A ser de modo diverso não
haveria Tribunal competente para tutelar o direito ameaçado.” (MC nº 488-PB, 3ª Turma do STJ, Relator Ministro
Eduardo Ribeiro, DJU de 19/08/1996).
Tal julgado ilustra com precisão a necessidade de preservar
qualquer espécie de ameaça à violação do sistema jurídico-positivo nacional.
Aliás, repita-se, essa não é nenhuma novidade jurisprudencial, mas sim um
mandamento constitucional, devidamente encartado no inciso XXXV do art. 5º da Lex Legum.
De toda forma, mesmo que desconsiderados tais argumentos, é
preciso observar que o juízo de admissibilidade definitivo do recurso
extraordinário é atribuição do órgão competente para julgá-lo, ou seja, de uma
das Turmas Julgadoras do Supremo Tribunal Federal. Isso porque o juízo de
admissibilidade efetuado pelo Presidente do Regional e provisório e temporário,
cabendo à Corte Superior o exame definitivo da presença de uma das hipóteses de
cabimento elencadas no inciso III do art. 102 da
Carta Constitucional.
Aliás, contra a decisão que denega seguimento aos recursos de
natureza extraordinária, como se sabe, é cabível agravo de instrumento (visando
à apreciação do conhecimento pelo órgão competente para o exame definitivo da
admissão do recurso). Tal recurso, que é interposto junto à Corte Regional, não
pode ter o seu seguimento indeferido, sob pena de abrir campo para ajuizamento
de reclamação, para preservar a competência do Tribunal Superior de efetuar o
juízo definitivo de admissibilidade do apelo extremo.
Assim, cabendo ao Supremo Tribunal Federal a competência para
efetuar o juízo definitivo de admissibilidade do recurso extraordinário, não há
como adotar o argumento de que a jurisdição da Excelsa Corte ainda não estaria
aberta, enquanto pendente de admissão o apelo. A jurisdição da Suprema Corte no
feito, s.m.j., abre-se no momento da interposição do recurso extraordinário,
momento em que a controvérsia constitucional é oferecida para análise.
Não bastassem tais argumentos, além de criticável, revela-se
também ultrapassado, o posicionamento em debate. Isso porque a
nova regra processual introduzida no parágrafo único do artigo 800 do CPC, pela
Lei n. 8952/94, prevê que a parte deve requerer a medida cautelar diretamente
ao tribunal competente para apreciar o recurso. A inovação foi deveras bem
compreendida pelo processualista Nelson Nery Jr., que assim concluiu:
“Melhorou bastante o sistema da
competência para a concessão de medidas cautelares, depois de proferida
sentença pelo juiz de primeiro grau. Interposto o recurso, a competência para a ação cautelar incidente
é do tribunal. O juiz que proferiu a sentença somente tem competência para a
concessão de cautela, se a parte ou interessado ainda não tiver interposto
apelação ou agravo. Interpostos embargos de declaração da sentença, a
competência para a cautelar ainda é do juízo monocrático.
(…)
No regime atual, instituído pelo CPC 800 par.ún. reformado, ficou mais
explícita a possibilidade de a parte, interpondo o recurso, dirigir-se ao
tribunal e pleitear medida cautelar para suspender os efeitos da decisão impugnada.
Essa providência já tem sido utilizada no STJ, conforme permite o RISTJ 288.
De outra parte, o CPC 558, com a
redação da Lei 9139/95, permite ao relator de qualquer recurso, conceder efeito
suspensivo a recurso, nas hipóteses que menciona.” (Nelson Nery Jr., Atualidades sobre o Processo Civil, 2ª edição,
RT, p. 215 – grifamos e destacamos);
Aliás, é preciso registrar que a 1ª Turma do Supremo Tribunal
Federal já teve oportunidade de titubear diante do novo panorama legislativo,
quando do exame do Agr.Pet. 1.333-PE, sob a relatoria do eminente Ministro SEPULVEDA PERTENCE, ocasião
em que ficou decidido:
“Recurso extraordinário: concessão de efeito
suspensivo por medida cautelar: indeferimento. Ainda quando se
admita que o art. 800, parág. único,
C. Pr. Civ., com a nova
redação da L. 8952/94, haja superado a jurisprudência do STF – que só tem
admitido deferir medida cautelar após a admissão do recurso
extraordinário pelo presidente do Tribunal a quo
– no caso, a decisão agravada contém fundamento suficiente – a ausência do periculum in mora – que o agravo não questiona.” (STF – 1ª Turma – Agr.Pet.
1.333-PE – Rel. Min. Sepulveda Pertence – DJ 31.10.1997, p. 95 – grifamos);
Diga-se de passagem, tal entendimento já vinha amadurecendo desde
o julgamento do Agr. Pet.
535, Rel. Min. Moreira Alves, no qual, embora tenha
prevalecido a tese aqui atacada, os eminentes Ministros Ilmar Galvão e Sepúlveda Pertence deixaram claro, em seus
votos, a possibilidade de rever suas posições (vide RTJ 140/756).
Na doutrina também é possível encontrar algumas lúcidas
manifestações contrárias à tese do Supremo Tribunal. Sobre ela, assim se
posicionou o douto integrante dos quadros do Ministério Público mineiro e
professor Giovanni Mansur Solha
Pantuzzo:
“Tal posicionamento, extremamente rigoroso, não encontra respaldo legal, tratando-se
de construção exclusivamente jurisprudencial, das mais infelizes, diga-se en passant, pois, além de
arbitrária e autoritária, esvazia a própria essência do processo cautelar, qual
seja, o amparo a direito ameaçado de dano iminente, irreparável ou de difícil
reparação, que não pode esperar sequer o juízo de prelibação por parte do
tribunal local, que geralmente demanda meses, chegando, não raro, a ultrapassar
ano. N a realidade, criou-se um verdadeiro pressuposto processual não imaginado
pelo legislador e que, na prática, inviabiliza a medida cautelar, tornando inóquo seu manejo na maioria das vezes, dado perecimento do
direito durante o intervalo em que não foi realizado o juízo de admissibilidade
dos apelos extremos.
Em oposição a essa corrente, surgiu no
Superior Tribunal de Justiça entendimento mais condizente com a realidade
processual, o qual admite a interposição da medida cautelar mesmo antes do
aviamento do apelo raro…” (in Prática dos Recursos Especial e Extraordinário, Ed. Del Rey, Belo Horizonte, 1998, p. 104);
Mas quem melhor analisou a “quaestio
juris” foi o doutor Luiz Rodrigues Wambier, em ótimo trabalho constante da obra “Aspectos
Polêmicos e Atuais do Recurso Especial e do Recurso Extraordinário”,
editada pela Revista dos Tribunais. Do referido trabalho podemos retirar as
seguintes indagações e respostas, fundamentais ao enfrentamento da questão:
“No Supremo Tribunal Federal,
todavia, essa possibilidade tem sido tida como excepcionalíssima. Via de regra (somente uma exceção foi localizada), só se admite o
manejo da tutela cautelar quando o recurso extraordinário já tenha sido
admitido no juízo a quo.
Trata-se de procedimento criticável, pois retira toda ou quase
toda a utilidade do pedido cautelar apresentado. Sendo, de fato, caso de
deferimento da medida, parece insensato e injurídico submeter essa concessão à
condição de o recurso já ter sido admitido no órgão a quo,
já que exigir-se esse requisito no mais das vezes esvazia a função cautelar que
seria, no caso, a de garantir o julgamento útil do recurso.
Segundo se decidiu em pedido cautelar
requerido pelo Estado do Rio de Janeiro, incidentalmente a recurso
extraordinário interposto de acórdão que, em mandado de segurança, determinou a
entrega à Procuradoria Geral da Justiça da totalidade dos recursos
orçamentários até o dia vinte de cada mês, “não é cabível medida cautelar
inominada que visa a obter efeito suspensivo para recurso extraordinário ainda
não apreciado pela Presidência do Tribunal a quo”.
A grande dúvida que resta, diante desse posicionamento do Supremo
Tribunal Federal, é esta: que fazer nesse espaço de tempo que vai da
interposição do recurso extraordinário até o exercício do juízo de
admissibilidade? Quem é o juízo competente para conhecer do pedido de tutela
cautelar? “
(…)
Trata-se, como já asseveramos, de questão
de fundamental importância e de extrema gravidade, pois nesse período de
“limbo”, em que o recurso ainda não subiu, porque nem mesmo o juízo de admissibilidade
se realizou, a eficácia da decisão impugnada pode causar danos ao resultado
útil do próprio recurso extraordinário.
Melhor seria, e sem dúvida atenderia aos princípios que informam
todo o sistema processual, como o da efetividade da prestação jurisdicional, se
o Supremo Tribunal Federal admitisse, como já acontece
no Superior Tribunal de Justiça, que, por simples petição, acompanhada dos
documentos necessários à comprovação do estágio em que se encontra o processo,
se pudesse deferir o pedido cautelar (se, é claro, estivessem presentes os seus
pressupostos autorizadores: periculum in mora e fumus boni iuris).
Há um outro acórdão, de que foi relator o Min. Moreira Alves, em
que novamente se decidiu pelo descabimento de pedido cautelar visando obter a suspensão
da eficácia da decisão impugnada por recurso extraordinário, “que pende de
decisão quanto à sua admissibilidade”. Embora a decisão da Turma tenha sido
unânime, é preciso registrar trechos dos votos dos Mins. Ilmar Galvão e
Sepúlveda Pertence, inclusive porque este último se refere expressamente à
possibilidade alvitrada no acórdão anteriormente analisado, ou seja, de que o
Presidente do Tribunal em que se processa o juízo de admissibilidade possa
conhecer do pedido cautelar.
O primeiro, embora acompanhando o voto do relator, ressalvou entendimento contrário.
Segundo consta de seu voto não há impedimento legal à concessão da medida “em
certos casos que estejam a indicar a necessidade da suspensão dos efeitos da
decisão objeto do recurso extraordinário, havendo, ao revés, previsão expressa,
no art. 798 do CPC, no sentido de que, além dos procedimentos cautelares
específicos, poderá o juiz determinar as medidas provisórias que julgar adequadas”.
O Min. Sepúlveda Pertence, de sua vez, votou com o relator,
ressaltando, entretanto, o seguinte: “O congestionamento crônico do judiciário
brasileiro mostra que esse período, em que a causa aguarda admissão ou
indeferimento do recurso extraordinário no tribunal recorrido, que deveria ser
curto, pode estender-se por tempo considerável, de modo a, eventualmente,
prejudicar a aficácia da decisão a ser proferida no
recurso extraordinário. Creio, entretanto, que, não cabendo, por isso, eliminar
de antemão a possibilidade de medida cautelar nesse intervalo, a solução é
reconhecer, para isso, por interpretação ampliativa do disposto no parágrafo
único do art. 800, a
competência do Presidente do Tribunal a quo”.
É interressante observar que no corpo de seu voto o Min. Sepúlveda
Pertence reserva-se (assim como também o faz o Min. Ilmar
Galvão) “para um futuro reexame do mérito da jurisprudência”, deixando
expressamente registrada a possibilidade de revisão dessa posição.
Pesou contra o deferimento da medida cautelar, aqui, o conjunto de
precedentes do próprio Supremo Tribunal Federal. o
que, em nosso sentir, não deveria servir de fundamento para se afastar a
possibilidade de concessão de medida que visa, em última análise, resguardar a
utilidade do próprio sistema processual. Esse entendimento, a nosso ver, está
em completa desarmonia com o sistema do Código, em que os precedentes da
jurisprudência não têm efeito vinculante.
Por outro lado, tanto no Superior Tribunal de Justiça quanto no
Supremo Tribunal Federal, os respectivos Regimentos Internos prevêem a
possibilidade de concessão de medidas cautelares.
(…)
No Supremo Tribunal Federal a norma regimental prevê que:
Admitir-se-ão medidas cautelares nos recursos, independentemente dos seus
efeitos (art. 304). Ao tratar das atribuições do relator, o art. 21, inc. IV,
do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal dispõe ser de sua competência
“determinar, em caso de urgência, as medidas do inciso anterior, ad referendum do Plenário ou da Turma”.
Em nosso entender, a previsão regimental tem o condão de
determinar a competência para conhecimento do processo
cautelar incidental, enquanto de seu cabimento, nos juízos especial e
extraordinário, trata principalmente o Código de Processo Civil, nas normas
gerais a respeito do processo cautelar e, especificamente, nas normas a respeito
do poder geral do cautelar, ou seja, não são os regimentos internos dos
Tribunais superiores que tornam possível o aforamento de processo cautelar
incidental buscando medidas ínsitas ao poder geral de cautela, mas sim o
próprio sistema do Código de Processo Civil. O parágrafo único do art.
800 do CPC dispõe que: “Interposto o recurso, a medida cautelar será
requerida diretamente ao tribunal”. (Luiz
Rodrigues Wambier, “Do Manejo da Tutela Cautelar
para Obtenção de Efeito Suspensivo no Recurso Especial e no Recurso
Extraordinário”, encartado na obra cima citada, pp. 370, 373/374 e 375/376)
Vale ressaltar que a jurisprudência, sem dúvida, é fonte de grande
valor à evolução do direito, devendo ser, na medida do possível, respeitadas as
teses dominantes, até mesmo para que se possa construir um sistema processual
em que prevaleça os postulados da economicidade
e da segurança jurídica. Todavia, isso não pode acarretar na estratificação do
direito, julgando-se sempre de acordo com uma tese que esteja nitidamente
superada ou que desrespeite garantias processuais das partes litigantes. Com
base nessa idéia, preferimos ficar ao lado do Justice Field,
que, em análise crítica ao sistema americano do “stare
decisis”, no caso Bardem
vs. Northern Pacific Railroad Co.,
154 U.S. 288 (1894), concluiu: “é mais importante que o tribunal decida
corretamente com base em análise posterior e mais elaborada dos casos do que
ele seja consistente com as decisões anteriores”.
Por tudo isso que aqui expomos, com os ricos subsídios jurisprudenciais
e doutrinários trazidos, parece-nos que se deve concluir como cabível a medida
cautelar para agregar efeito suspensivo a recurso extraordinário, ainda nas
hipóteses em que não haja sido o mesmo admitido pelo Presidente da Corte “a
quo”.
Procurador Autárquico do INSS
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