Resumo: O presente artigo visa a tratar, em suma, da participação processual como corolário da democratização decorrente do novel ordenamento constitucional estabelecido pela Carta de 1988. Objetiva o texto destacar brevemente a ligação entre democracia e participação no processo civil.
Palavras-chave: Constituição. Democracia. Processo. Participação.
Sumário: Introdução. 1. A democratização processual. 2. Participação no processo. Conclusão.
INTRODUÇÃO
A Constituição Federal de 1988 instituiu o Estado Democrático de Direito visando a garantir o exercício pleno e efetivo dos direitos fundamentais estabelecidos constitucionalmente (SILVA, 2003), sendo, pois, paradigma jurídico-institucional, o qual possui caráter vinculante para toda atividade, pública ou privada.
Logo, como o Estado Democrático de Direito rege a prática a atividade estatal, inclusive a judicial (MADEIRA, 2010), as funções de aplicação e interpretação do direito devem atentar para esse novo standard normativo, com fulcro no princípio da supremacia constitucional.
Contudo, a democracia não deve ser encarada como “um mero conceito político abstrato e estático, mas é um processo de afirmação do povo e de garantias dos direitos fundamentais que o povo vai conquistando no correr da história” (SILVA, 2003, p. 126), de onde se extraem os seus princípios fundamentais: a soberania popular e participação (direta ou indireta) do povo no poder.
Esse processo histórico de consolidação dos direitos fundamentais albergados em uma constituição democrática é justamente o que lhe confere legitimidade, ou, noutro dizer, a noção de povo é delimitada pelo respeito e a prática dos direitos fundamentais construídos historicamente, pois, estes “fundamentam juridicamente uma sociedade libertária, um estado democrático” (MÜLLER, 2010, p. 58).
1. A DEMOCRATIZAÇÃO PROCESSUAL
A democracia participativa, expressão de direito fundamental da quarta geração (BONAVIDES, 2005), requer o exercício do poder diretamente pelo povo, no sentido de excluir a possibilidade de comportamentos de índole excludentes, autocráticas ou unitaristas.
Nessa quadra, potencializa-se “o valor participação no processo, incrementando-se as posições jurídicas das partes no processo, a fim de que esse se constitua, firmemente, como um democrático ponto de encontro de direito fundamentais” (MITIDIERO, 2009, p. 59).
Vale dizer: o processo deixa de ser apenas instrumento da jurisdição para se tornar instrumento de realização de valores constitucionais, entre eles, a própria democracia, pois, “não basta influenciar no momento da promulgação do texto. Como texto e norma não se confundem, a democracia no Estado Constitucional só se faz plena com a possibilidade de as partes influenciarem diretamente a outorga de sentido ao texto, de influenciarem as reconstrução do sentido normativo dos textos jurídicos e do Direito não legislado no processo” (MARINONI; MITIDIERO, 2010, p. 19).
A lei processual, portanto, deve representar “um ato de concretização dos valores humanos, morais e éticos fundamentais consagrados na Constituição, numa perspectiva democrática imposta pela soberania popular” (CUNHA JÚNIOR, 2009, p. 551).
Com efeito, se a Constituição da República de 1988 impõe um modelo democrático de Estado, e se o processo, necessariamente delineado pelo Estado, passa a servir à concretização de valores previstos na Carta Magna, é inconcebível, nessa quadra, a conformação de qualquer sistema processual divorciado da efetiva participação popular.
2. PARTICIPAÇÃO NO PROCESSO
É absolutamente necessário, no novel paradigma democrático instituído pela Carta Magna de 1988, permitir às partes a oportunidade de contribuir efetivamente para a formação dos provimentos jurisdicionais, por meio da participação e do debate processuais (NUNES, 2010), uma vez que a participação efetiva no ambiente processual representa, “de forma imediata, uma posição subjetiva inerente aos direitos fundamentais, portanto ela é mesmo o exercício de um direito fundamental.” (OLIVEIRA, 2010, p. 44).
Direitos fundamentais, na ordem constitucional hodierna, constituem-se em “máximas processuais” (OLIVEIRA, 2010, p. 132), vale dizer, são elementos da ordem jurídica que determinam o standard processual (o processo em si, a conduta das partes e do juiz, a competência dos tribunais etc) a ser observado.
Em virtude da complexa estrutura social brasileira na atualidade, que torna temerária a tomada de decisões divorciada dos autênticos interesses em questão (PEREIRA, 2010), o processo, na perspectiva democrática, deve atenuar seus traços autoritários, historicamente fundados na ideia de que apenas o julgador teria o monopólio cognitivo.
Com efeito, se o Estado Democrático repele a tomada de decisões desprovidas de mecanismos de controle sem a efetiva participação popular, força é concluir que não cabe mais a interpretação solitária do direito apenas por uma autoridade judicial, pois que o seu produto (provimento judicial) deve emergir de um processo democrático, essencialmente dialógico e cooperativo, no sentido de que os envolvidos (juiz, MP, partes e advogados) não mais disputem posições de protagonistas processuais. Ao revés, exige-se o franco debate processual, num ambiente dialógico e comparticipativo para construção de um provimento jurisdicional efetivo, útil à realização dos direitos fundamentais, valores constitucionalmente consagrados.
CONCLUSÃO
O Estado não é um fim em si mesmo, pois sua existência se legitima na resolução dos diversos problemas sociais; ou seja, ele existe para “garantir segurança, fazer justiça, promover a comunicação entre os homens, dar-lhes paz e bem-estar e progresso” (MIRANDA, 2005, p. 214).
Em decorrência da assunção do regime democrático, o Estado atribui a cada cidadão o papel de zelar “pelos princípios elementares de sua vida em comum na sociedade”, e assegura “mediante balizas processuais constitucionais, uma participação constante e efetiva dos sujeitos de direito” (NUNES, 2009, p. 196-197).
Essa nova perspectiva de “corresponsabilidade processual” exigida pela Constituição Federal, aliada à percepção de que os Códigos Civis de 1939 e 1973 foram gestados em momentos históricos pouco afetos à democracia, reclama uma devida releitura dos fundamentos do sistema processual civil, para que se contemple a ampliação da soberania popular, condição sine qua non para o próprio desenvolvimento e fortalecimento de um estado constitucional democrático (MÜLLER, 2010, p. 39).
Analista Tributário da Receita Federal. Bacharel em Direito pela Faculdade de Direito do Recife/UFPE. Pós-graduando em Direito Constitucional pela Universidade Anhanguera-Uniderp/MS
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