Resumo: O objetivo principal deste trabalho é realizar uma análise crítica acerca da Organização Mundial do Comércio, bem como acerca da atuação do Brasil diante da OMC e do comércio internacional. A escolha justifica-se pelo fato de que tal organização alcançou alta importância no que tange à regularização das relações do comércio internacional. O surgimento de novos blocos econômicos fomentou novas relações no comércio internacional e é dentro deste contexto de transformações que a OMC busca ser um veículo de manutenção do comércio. Serão abordadas também, ao longo do trabalho, questões relativas aos objetivos e funções que o órgão possui na atualidade, assim como a sua forma de trabalho. Por fim, cabe aludir que a metodologia aqui empregada se traduz no método de abordagem indutivo e na técnica bibliográfica de pesquisa. O tema é atinente à disciplina de Direito Internacional Público.
Palavras-chave: OMC, comércio internacional, mercado internacional.
Abstract: The main objective of this work is to perform a critical analysis on the World Trade Organization (WTO) as well as about the performance of Brazil towards the WTO and the international trade. The choice is justified by the fact that this organization has achieved high importance with regard to the regularization of international trade relations. The emergence of new economic blocks fostered new relationships in international trade and is within this context of changes that the WTO seeks to be a vehicle for maintaining trade. There will also be discussed, during the work, issues related to the objectives and functions that the body has at present and the way they work. Finally, it is important to mention that the methodology employed here is the inductive approach method and the literature search technique. The theme refers to the discipline of Public International Law.
Keywords: WTO, international trade, international market.
Sumário: 1. Aspectos introdutórios históricos; 2. Objetivos, funções e estrutura da OMC ; 3 A atuação do Brasil junto à OMC e ao comércio internacional; 4 Considerações finais; Referências bibliográficas.
1. Aspectos introdutórios históricos
O sistema de regras do comércio internacional como é hoje conhecido foi estabelecido a partir de oito rodadas de negociações multilaterais ao longo dos anos. As seis primeiras visaram a diminuição dos direitos aduaneiros, através de negociações de concessões recíprocas; as duas últimas foram mais amplas, mas também incluíram reduções tarifárias. Importante salientar o papel da oitava rodada, a Rodada Uruguai, que foi a mais ambiciosa e complexa negociação no âmbito do General Agreement on Trade and Tarifs (GATT), preservando deveras o protecionismo ao comércio e consubstanciando, efetivamente, a criação da OMC.[1]
Criada em 1995, como um dos mais importantes resultados da rodada de negociações do GATT, realizada no Uruguai entre 1986 e 1994, a OMC é, certamente, uma instituição inovadora nas Relações Internacionais, uma vez que ela difere dos Comitês das Nações Unidas, assim como também difere dos organismos internacionais como o Fundo Monetário Internacional (FMI) e o Banco Mundial (BM), os quais são coordenados por um grupo de diretores. Além disso, apresenta um sistema de resolução de controvérsias com grande eficácia e atividade.[2]
Teoricamente, a OMC foi idealizada em 1944, simultaneamente à criação do FMI e do Banco Mundial – as chamadas “instituições de Bretton Woods, concebidas pelos Estados Unidos e pela Inglaterra[3]”. A partir da relação com as duas recém criadas instituições, a “então denominada Organização Internacional do Comércio (OIC) formaria o tripé do sistema econômico multilateral ”[4], funcionando como uma agência especializada das Nações Unidas. O projeto de criação da OIC era um compêndio de regras acerca do estabelecimento de disciplinas para o comércio de bens, normas sobre emprego, práticas comerciais restritivas, investimentos estrangeiros e serviços.
De acordo com o Ministério do Desenvolvimento:
“Apesar do papel preponderante desempenhado pelos Estados Unidos nestas negociações, questões políticas internas levaram o país a anunciar, em 1950, o não encaminhamento do projeto ao Congresso para sua ratificação. Sem a participação dos Estados Unidos, a criação da Organização Internacional do Comércio fracassou. Assim, o GATT, um acordo criado para regular provisoriamente as relações comerciais internacionais, foi o instrumento que, de fato, regulamentou por mais de quatro décadas as relações comerciais entre os países.”[5]
A OMC, pois, tem sua origem no Acordo Geral Sobre Tarifas e Comércio (GATT, pela sigla em inglês) assinado após a oposição do Congresso Norte-americano às regras da OIC, em 1947, pós-II Guerra Mundial, com o objetivo de “diminuir as barreiras ao comércio e tornar o mundo um único mercado[6]”, quando 23 países, incluindo o Brasil, decidiram regular as relações econômicas internacionais, tendo em vista a melhora da qualidade de vida de seus cidadãos, e também por entenderem que os problemas econômicos influenciavam seriamente as relações entre os governos. Não só, tais países tencionavam “impulsionar a liberalização comercial e combater práticas protecionistas adotadas desde a década de 30[7]”.
Nesta senda, a institucionalização do GATT como sendo uma base de negociações comerciais resultou num primeiro momento de negociações, ainda em 1947, ao passo que são as grandes potências as determinantes das regras do comércio internacional para produtos manufaturados[8]. Neste momento foi criada a cláusula central do Acordo, mais conhecida como “cláusula de nação mais favorecida[9]”, a qual define que qualquer concessão feita por uma nação a um parceiro comercial deve ser estendida a todos os países integrantes do GATT. Era esta cláusula que impedia as chamadas preferências na abertura comercial[10].
Todavia, sempre houve uma grande pressão dos países do Norte em criar regras de Direitos de Propriedade Intelectual à proteção de tecnologias, ao passo em que buscaram maior acessibilidade às abundantes matérias primas do Sul. Este protecionismo versus liberalização dos mercados é a base para desigualdade inerente no seio do GATT e da OMC. Os países do norte buscam liberalizar as áreas de comércio que lhes convêm, enquanto alguns destes têm maior influência para promover mais os seus interesses do que outros[11].
Conforme assevera o Ministério do Desenvolvimento:
“Sem a participação dos americanos, a criação da Organização Internacional do Comércio fracassou. Assim, o GATT, um acordo criado para regular provisoriamente as relações comerciais internacionais, foi o instrumento que, de fato, regulamentou por mais de quatro décadas as relações comerciais entre os países até a criação da OMC, em 1995”[12].
Logo, a OMC foi criada em 1995 sob a forma de um secretariado para administrar o Acordo Geral de Tarifas e Comércio (GATT), um tratado comercial que, apesar de fracassado, foi fundamental à fundação da OMC. Ela é, portanto, é uma organização internacional que supervisiona um grande número de acordos sobre as regras do comércio entre os seus estados-membros, com sede em Genebra, na Suíça. Ela provém, pois, de históricos estudos acerca da regulamentação e disciplinarização do comércio, o quais, por sua vez, despontam como fator primordial ao desenvolvimento da economia mundial e, por tal motivo, tornam-se alvo de tantas preocupações por parte, sobretudo, das maiores potências do planeta.
2. Objetivos, funções e estrutura da OMC
A OMC tem como objetivos a nova organização do comércio. E para obter esse fim, os países membros estabeleceram os seguintes termos: As partes reconhecem que as suas relações na área do comércio e atividades econômicas devem ser conduzidas com vistas à melhoria dos padrões de vida, assegurando o pleno emprego e um crescimento amplo e estável do volume de renda real e demandada efetiva, e expandindo a produção e o comércio de bens e serviços, simultaneamente à permissão do uso dos recursos naturais de acordo com os objetivos do desenvolvimento sustentável. Tudo isso procurando proteger e preservar o ambiente e reforçar os meios de fazê-lo, de maneira consistente com as suas necessidades nos diversos níveis de desenvolvimento econômico[13]. As partes também reconhecem que é necessário realizar esforços para que os países em desenvolvimento obtenham uma parte do crescimento do comércio internacional correspondente às necessidades de seu desenvolvimento econômico[14].
Não só, a OMC objetiva fornecer o quadro institucional comum necessário à condução das relações comerciais entre seus membros em matérias relacionadas aos acordos e instrumentos legais, incluídos no Acordo sobre a OMC[15].
No que tange às funções da Organização Mundial do Comércio, traz-se à baila a denominação feita por Thorstensen:
“1 – Facilitar a implantação, a administração, a operação e os objetivos dos acordos da Rodada Uruguai.
2 – Construir um “fórum” para as negociações entre os Estados membros das suas relações comerciais, com objetivo de criar ou modificar acordos multilaterais de comércio.
3 – Administrar o Entendimento (Understanding) sobre Regras e Procedimentos relativos às Soluções de Controvérsias, isto é, administrar o “tribunal” da OMC.
4 – Administrar o Mecanismo de Revisão de Políticas Comerciais (Trade Policy Review Mechanism) que faz a revisão periódica das Políticas de Comércio Externo de todos os membros da OMC, apontando os temas que estão em desacordo com as regras negociadas”[16].
Noutro diapasão, imperioso conhecer que, em nível estrutural, os principais níveis da OMC como instituição internacional são os seguintes, ainda conforme Thorstensen:
“1- Conferência Ministerial: é o órgão máximo da organização e composta pelos representantes de todos os seus membros, que se reúne, no mínimo, a cada dois anos. Este órgão tem a autoridade para tomar decisões sobre todas as matérias dentro de qualquer um dos Acordos Multilaterais. Costuma ser integrada pelos ministros das Relações Exteriores e / ou Ministros de Comércio Externo dos países membros.
2- Conselho Geral: é o corpo diretor da OMC e composto pelos representantes de todos os membros, que devem se reunir quando apropriado. Em geral é integrado pelos embaixadores que são os representantes permanentes dos países membros em Genebra.
3. Órgão de Solução de Controvérsias: é o mecanismo de solução de conflitos na área do comércio internacional, e contém todo um sistema de regras e procedimentos para dirimir controvérsias sobre as regras estabelecidas pela OMC. Prevê uma fase de consultas entre as partes, e se necessário, o estabelecimento de grupos de peritos para examinar a questão, e finalmente, quando solicitado, uma consulta para o órgão de Apelação. O Órgão de Solução de Controvérsias é composto pelo próprio Conselho Geral que aqui atua em função específica.
4. Órgão de Revisão de Políticas Comerciais: é o mecanismo criado para examinar periodicamente as políticas de cada membro da OMC, e tem como objetivo confrontar a legislação e a prática comercial dos membros da organização com as regras estabelecidas nos acordos, além de oferecer aos demais membros do sistema uma visão global da política seguida por cada membro, dentro do princípio da transparência. A periodicidade é a seguinte: os quatro maiores membros em termos de comércio, Estados Unidos, Comunidade Européia, Canadá e Japão, são examinados de 2 em 2 anos; os seguintes dezesseis são examinados de 4 em 4 anos; e os membros restantes, de 6 em 6 anos, ou em períodos fixados especialmente para os países menos desenvolvidos. O Brasil é examinado a cada 4 anos.
5. Conselhos de Bens, de Serviços e de Propriedade Intelectual: foram criados três Conselhos para regular cada um dos principais segmentos que resultaram da Rodada Uruguai: Conselho de Comércio de Bens, Conselho de Comércio de Serviços e o Conselho de Direitos de Propriedade Intelectual Relacionados ao Comércio. Têm assento nesses conselhos os delegados dos países membros.
6. Comitês: as atividades da OMC se desenvolvem através de cerca de 30 comitês ou grupos de trabalho, onde tem assento os delegados dos países membros, normalmente diplomatas credenciados em Genebra e / ou técnicos dos ministérios envolvidos especialmente para as reuniões. A conferência Ministerial pode criar entidades subordinadas ou novos comitês. Assim foram estabelecidos três comitês durante a Rodada Uruguai: Comércio e desenvolvimento, Restrições por Motivo de Balanço de Pagamento, e Orçamento, Finanças e Administração.
7. Secretariado: a OMC tem apoio de um Secretariado, chefiado por um diretor geral designado pela Conferência Ministerial, e quatro vice-diretores. O corpo técnico da OMC é composto atualmente por cerca de 500 técnicos. O Diretor e o Secretariado têm responsabilidade de caráter internacional, não devendo pedir nem receber instruções específicas de algum governo ou outra autoridade externa à OMC.[17]
Atualmente, a OMC conta com 151 países membros, sendo que Tonga é o mais novo membro, que aderiu a 27 de Julho de 2007. Sua sede se encontra em Genebra, na Suíça, e seu atual diretor-geral, eleito em 2005, é Pascal Lamy[18].
Um dos casos mais conhecidos de disputa comercial envolvendo o Brasil na OMC foi a briga do país com o Canadá devido à Embraer e à Bombardier. Até que o caso passasse por todas as etapas da Organização, foram necessários quase sete anos de muita discussão e polêmica. O problema entre os dois países começou em 1996, quando a Bombardier pediu que o governo do Canadá questionasse o apoio do Brasil à Embraer, por meio do Proex (Programa de Financiamento às Exportações). A OMC autorizou o Canadá a retaliar o Brasil em US$ 1,4 bilhão, valor que após muitas discussões foi reduzido para US$ 231,6 milhões, que não chegaram a ser aplicados.[19]
Em janeiro de 2001, o governo canadense anunciou que subsidiaria as vendas da Bombardier à Air Wisconsin, levando o Brasil a solicitar a arbitragem da OMC. Com o financiamento, a Bombardier conseguiu oferecer à Air Wisconsin aviões com um desconto de US$ 2 milhões por unidade. Para o Brasil, esses mecanismos serviam para dar subsídios às exportações das aeronaves canadenses, o que estaria violando as regras da OMC.[20]
Descontente com a decisão do Brasil, o Canadá levou a disputa para outros setores, além do da aviação, e decidiu suspender a importação de carne brasileira. Os Estados Unidos e México, companheiros dos canadenses no Tratado de Livre Comércio Norte-Americano (Nafta), entraram no conflito e tomaram a mesma decisão. O Brasil, na ocasião, temia que a Europa acompanhasse os países do Nafta e entrasse no que ficou conhecido como o boicote contra a carne bovina brasileira. Criou-se uma verdadeira crise diplomática entre Brasil e Canadá, com o aquele ameaçando até retirar sua embaixada deste.
Dez meses depois, em outubro de 2001, a OMC divulgou parecer favorável ao Brasil e determinou que o Canadá retirasse os subsídios concedidos à Bombardier, no valor de US$ 4 bilhões, para a venda de aeronaves à Air Wisconsin.[21] Em junho de 2002, a Organização autorizou o Brasil a retaliar o Canadá, devido aos prejuízos decorrentes dos subsídios canadenses. O Brasil então tentou pedir US$ 3,3 bilhões em retaliação e o Canadá não concordou com o valor. Após muitas discussões, a OMC autorizou o Brasil a adotar contramedidas ao Canadá em até US$ 247,8 milhões, mas as sanções também não foram aplicadas.
O Brasil é autor de várias controvérsias na OMC, em especial contra os Estados Unidos e a União Européia. Algumas ainda estão em julgamento; outras foram favoráveis ao Brasil; há, ainda, aquelas em que foram firmados acordos entre os países envolvidos e as queixas retiradas. Em conjunto com a Tailândia e a Austrália, o Brasil entrou com denúncia, em 2002, na OMC contra os subsídios da União Européia aos produtores de açúcar. A ação argumentava que os europeus estavam em desacordo com as normas da Organização em dois pontos: nas exportações do açúcar produzido na própria Europa e na não-inclusão dos subsídios nas exportações do produto das ex-colônias. Ainda no mesmo ano, a OMC deu ganho ao Brasil.
Os exportadores brasileiros questionam a decisão da União Européia de aumentar de 15% para 75% a taxa cobrada sobre as importações do frango salgado brasileiro. Segundo a ação, o aumento viola os artigos II (Lista de concessões) e XXVIII (Modificação da lista de concessões) do GATT/1994. O Brasil busca o direito de continuar exportando o produto para a União Européia com a alíquota reduzida e defende que, no acordo, seja estabelecida uma cota para o Brasil, baseada na média das exportações de frango dos últimos três anos, quando a indústria brasileira passou a exportar esse tipo de produto para a Europa. Em maio de 2005, a OMC decidiu a favor do Brasil, que entrou com um painel contra a UE após a elevação da tarifa de exportação do frango salgado, que em 2003 passou de 15,4% para 75%.
Em 2002, os EUA impuseram sobretaxas de 30% ao aço importado de 22 países, inclusive o Brasil, com o objetivo de proteger a indústria local. A ação, porém, foi considerada ilegal pela OMC. Em dezembro de 2003, o presidente George W. Bush decidiu suspender a cobrança após União Européia e o Japão ameaçarem retaliar o país americano, inclusive com os europeus falando em sanções comerciais da ordem de US$ 6 bilhões.[22]
No mesmo ano, o Brasil entrou com ação na OMC questionando o imposto cobrado na Flórida sobre o suco de laranja importado. A taxa, equivalente a uma alíquota de 50%, era destinada a campanhas de produtores da fruta cítrica em território americano. Segundo a ação, o Brasil entendia que esta tarifa (denominada Imposto de Equalização do Estado – EET) violava as regras da Organização. O governo do Brasil fechou um acordo com o americano e retirou a queixa, graças à decisão do governador da Flórida de sancionar uma emenda que permite a mudança nas regras de incidência e destinação da arrecadação do EET.
Em 2003, o Brasil contestou seis programas de ajuda doméstica e de crédito concedidos pelo governo dos Estados Unidos aos produtores de algodão de seu país, que desrespeitam as normas da OMC. A organização não-governamental Oxfam afirma que os EUA dão até US$ 3,9 bilhões aos seus 25 mil produtores de algodão todos os anos. Isso, segundo a organização, seria equivalente a mais de três vezes a ajuda financeira dada pelo governo americano à África. A OMC deu vitória ao Brasil no caso. No entanto, o relatório oficial sobre a decisão da entidade ainda não foi divulgado e os EUA podem recorrer da sentença.[23]
Por fim, há o caso dos pneus, no qual o Brasil pode ser obrigado por uma decisão da OMC a recuar em algumas de suas políticas de proteção à saúde e ao meio ambiente. A União Européia impugnou junto a OMC, entre outras medidas, a proibição de importação de pneus recauchutados imposta pelo Brasil.
O Brasil justifica a proibição da importação com base na proteção do meio ambiente e na proteção da saúde de sua população. Argumenta, ainda, que não existe forma realmente segura de eliminar os pneus usados (que não são biodegradáveis e, quando queimados, liberam substâncias altamente tóxicas). Ademais, os pneus usados acumulam água no seu interior, podendo causar a propagação do mosquito da dengue.
Caso o Brasil sofra uma derrota, será obrigado a tolerar a importação de pneus recauchutados da União Européia e de outros países. O que está em jogo nesse caso é quem deve se responsabilizar por seu próprio passivo ambiental. Exportando pneus recauchutados, a União Européia se livra da responsabilidade de dar uma destinação final a um de seus produtos poluentes.
De acordo com o direito internacional dos direitos humanos, o Brasil tem a obrigação de tomar medidas concretas a fim de realizar o direito à saúde física e mental de sua população. Um fracasso na implementação dessas obrigações implicaria à responsabilização internacional do Estado brasileiro.
A OMC deve interpretar as regras de comércio internacional de tal forma que não coloque o Brasil numa situação de violação do direito internacional dos direitos humanos. De fato, o artigo XX do GATT permite uma leitura positiva tanto do ponto de vista do direito internacional dos direitos humanos como do direito do comércio.
Pela primeira vez na história da OMC, organizações brasileiras fizeram uma apresentação como amicus curiae (“amigo da corte”) perante o Órgão de Solução de Controvérsias da OMC. Amicus curiae é uma apresentação na qual uma instituição, que não é parte num caso, oferece informação sobre algum aspeto do direito para ajudar a decidir a questão.
Esse caso será fundamental para que a OMC tome uma posição mais clara sobre a compatibilidade das obrigações comerciais dos Estados-membros e suas obrigações de proteção do meio ambiente e dos direitos humanos. Afinal, o sistema internacional do comércio não pode tentar subsistir isolado do resto do ordenamento jurídico internacional.
Apesar dos princípios estabelecidos em seus estatutos, a sua atuação fazia com que a OMC não passasse de um “clube”, onde o bloco da União Européia e os EUA determinavam as diretrizes (sempre de acordo com seus interesses), enquanto o resto dos membros acenava com a cabeça.
Ao chefiar a delegação brasileira na reunião de Cancun, em 2003, o então Ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, manteve seus interesses e fez fracassar, diante da resistência, as negociações do encontro. Era a primeira vez que, decididamente, os membros mais pobres da organização faziam valer seus direitos e interesses. A partir de então, principalmente os europeus passaram a recompor seus princípios e a contabilizar, nos seus cálculos para as negociações, as relações custo-benefício de suas políticas as vantagens e desvantagens, ao invés de somente benefícios e vantagens. Passou a ser firme o entendimento de que o comércio internacional precisa ser uma via de duas mãos e não de interesses unilaterais.
4 Considerações finais
A OMC tem sido utilizada para promover uma extensa série de políticas ao comércio, investimentos e desregulamentações que exacerbam a desigualdade entre o Norte e o Sul, entre os países ricos e pobres dentro dos países. Esta organização internacional executa cerca de vinte acordos comerciais diferentes, inclusive o AGCS (Acordo Geral de Comércio em Serviços ou GATS General Agreement on Trade em Services), o Acordo sobre Agricultura (AoA) e os Aspectos dos Direitos de Propriedade Intelectual relacionados ao Comércio (ADPIC ou TRIPS – Trade Related Intellectual Property Rights).
Os poderosos países industrializados participantes da OMC estão promovendo uma ampla expansão do escopo da OMC, e incorporando ainda mais as áreas operativas de nossas vidas diárias e de nossos governos.
A OMC é inerentemente antidemocrática. Seus tribunais de comércio, trabalhando a portas fechadas, estabeleceram normas contra uma impressionante série de leis de saúde e segurança nacional, do trabalho, de direitos humanos e ambientais, as quais foram diretamente desafiadas como barreiras pelos governos que agem em nome de seus clientes corporativos. Políticas e leis nacionais que se acreditou violarem as normas da OMC devem ser eliminadas ou alteradas, ou então o país enfrentará sanções comerciais perpétuas que podem ser de milhões de dólares. Desde o começo da OMC, em 1995, a ampla maioria de decisões judiciais em disputas comerciais entre nações membros tem favorecido os poderosos países industrializados. Conseqüentemente, muitos países, particularmente o países em desenvolvimento, sentem uma enorme pressão para enfraquecer suas políticas de interesse público, sempre que um desafio da OMC é ameaçado a fim de evitar sanções dispendiosas.
Torna-se evidente a importância desta organização no tocante à organização do comércio entre os países, seja unilateralmente ou entre blocos econômicos. Entretanto, ela não é tão somente fiscalizadora das relações comerciais, pois devido à sua grande influência nessas questões e aos montantes financeiros envolvidos nas transações, a OMC está influenciando indiretamente na vida de milhões de habitantes de todos os países membros, principalmente daqueles em desenvolvimento, os quais, por sua vez, para se concretizarem o desenvolvimento necessitam diminuir seus investimentos nos setores sociais. Em vista dessa pressão comercial, os grandes favorecidos por tal situação são as nações ricas, que não necessitam privilegiar um setor em detrimento de outro porque possuem uma economia extremamente superavitária.
Importante notar que, ultimamente, alguns países em desenvolvimento conseguiram vitórias importantes em questões de práticas comerciais desleais das nações desenvolvidas.
O Brasil tem sido um personagem importante no cenário da OMC, visto que obteve recentemente grandes vitórias frente aos EUA, tanto na questão do aço como na dos subsídios americanos à sua agricultura, cujos produtos concorrem diretamente com os produzidos no Brasil.
Futuramente, através dos blocos econômicos, a OMC funcionará primordialmente como uma agência ou tribunal comercial, que regulará as negociações dentro dos blocos econômicos, bem como entre eles. Preocupa, sobremaneira, a situação indefinida do Mercosul, porque num futuro bem próximo as relações comerciais serão fortemente disputadas entre os blocos econômicos e, fatalmente, o conjunto melhor estruturado e forte financeiramente acabará impondo seus produtos aos demais. Dessa forma, os países que não se unirem em blocos bem estruturados e com políticas comerciais internas resolvidas não terão chance de competir no mercado mundial e poderão ser subjugados pela força de pressão econômica dos grandes blocos econômicos.
Acadêmica do 3º ano do curso de Direito da Fundação Universidade Federal do Rio Grande (FURG); bolsista do Núcleo de Pesquisa, Extensão e Estudos Jurídicos em Direitos Humanos – NUPEJDH.
Acadêmico de Direito da FURG
Bacharel em Direito pela Universidade Federal do Rio Grande – FURG
Acadêmica de Direito da FURG
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