Resumo: Este trabalho busca estudar a incidência da prescrição no procedimento administrativo ambiental.
Palavras-chaves: Prescrição. Tipos. Procedimento administrativo ambiental.
Abstract: This work studies the incidence of prescribing in environmental administrative procedure.
Keywords: Prescription. Types. Environmental administrative procedure.
Sumário: Introdução. 1. A conceituação de prescrição. 2. A prescrição punitiva no processo administrativo ambiental. 3. A prescrição intercorrente no processo administrativo ambiental. 4. A prescrição da pretensão executória no processo administrativo ambiental. 5. A imprescritibilidade do dever de reparar o dano ambiental. Conclusões. Referências.
INTRODUÇÃO.
O processo administrativo ambiental deverá ser conduzido pelos princípios da legalidade, da segurança jurídica e da razoável duração do processo. A prescrição, como mecanismo de segurança jurídica e estabilidade das relações sociais, terá incidência sobre o procedimento, quer seja regulando o prazo inicial e final para sua instauração e satisfação daquilo que for determinado após regular processo administrativo, quer seja para evitar a paralisação injustificada do iter procedimental.
O presente trabalho tem por finalidade estudar os tipos de prescrição que poderão ocorrer no curso do procedimento administrativo ambiental e, dessa forma, prejudicar a imposição de sanção pela prática de conduta contrária ao meio ambiente, ficando, no entanto, ressalvada a sua incidência sobre o dever de reparar o dano ambiental, o qual, como veremos, revela-se imprescritível.
1. A CONCEITUAÇÃO DE PRESCRIÇÃO.
O instituto da prescrição está intimamente ligado ao princípio da segurança jurídica, pois busca dar estabilidade às situações consolidadas pelo tempo. Nos dizeres de Hely Lopes Meirelles[1], “a prescrição administrativa opera a preclusão da oportunidade de atuação do Poder Público sobre matéria sujeita à sua apreciação”.
Para que a prescrição ocorra faz-se necessário a ocorrência de dois fatores, quais sejam: a) o decurso do tempo, capaz de nascer e de consolidar novas situações jurídicas, albergadas ou não pelo direito; e, b) a inércia do titular envolvido.
A prescrição gera não a perda do direito material, mas sim a pretensão de exercê-lo. O artigo 189 do Código Civil dispõe expressamente acerca do instituto da prescrição nos seguintes termos: “Violado o direito subjetivo, nasce para o titular a pretensão, a qual se extingue pela prescrição, nos prazos a que aludem os arts. 205 e 206”.
O referido artigo confirma a forte carga processual do instituto, pois como escreve Sílvio de Salvo Venosa[2] “adota-se o princípio da ‘actio nata’, admitindo-se que a prescrição tolhe o direito de ação, ou mais especificamente, dentro do direito material, a prescrição faz extinguir a ‘pretensão’, que é o espelho do direito de ação”.
Nesses termos, tem-se que “consumada a prescrição, o que se esvai não é o direito de ação, mas sim a pretensão, isto é, a exigibilidade do direito de que se alega ser titular. O direito subjetivo mantém-se incólume, mas não pode mais ser exigido da parte contrária, eis que fulminada a pretensão, com a consumação da prescrição”[3].
No procedimento administrativo, a prescrição adotará três distintos significados. O primeiro, referente à perda do direito de interpor recurso administrativo para rever decisão que entenda o administrado seja desfavorável. O segundo, a perda de prazo para que a Administração reveja seus próprios atos. E, por fim, a perda do prazo para aplicação de penalidades administrativas.
Diante do objeto do presente estudo, restringir-se-á ao estudo da perda do prazo para aplicação de penalidades administrativas, mais especificamente das sanções administrativas ambientais previstas no Decreto nº 6.514, de 2008.
2. A PRESCRIÇÃO PUNITIVA NO PROCESSO ADMINISTRATIVO AMBIENTAL.
O Decreto nº 6.514, de 2008, dentre outras providências, estabelece o procedimento administrativo federal para apuração das infrações administrativas ao meio ambiente e as sanções aplicáveis.
Segundo o referido diploma legal, o procedimento administrativo ambiental inaugura-se pela lavratura do auto de infração pelo agente de fiscalização, o qual deverá conter a identificação do autuado, a descrição clara e objetiva das infrações ambientais constatadas e a indicação dos respectivos dispositivos legais e regulamentares infringidos (arts. 96 e 97).
A autuação decorre do exercício do poder de polícia ambiental conferido a todos os órgãos integrantes do SISNAMA (Lei nº 6.938/81, art. 6º) e que deverá observar o prazo legal, sob pena da perda do direito de ação para apurar a prática de infrações contra o meio-ambiente e, consequentemente, da possibilidade de se impor sanções.
O tema é tratado pela Lei nº 9.873, de 1999, a qual estabelece o prazo prescricional de cinco anos para o exercício da ação punitiva da Administração Pública Federal, Direta ou Indireta, contados da data da prática do ato ou, no caso de infração permanente ou continuada, do dia em que tiver cessado.
O Decreto nº 6.514, de 2008, seguindo o prazo prescricional comum fixado na Lei nº 9.873, de 1999, acima referida, estabelece que “prescreve em cinco anos a ação da administração objetivando apurar a prática de infrações contra o meio ambiente, contada da data da prática do ato, ou, no caso de infração permanente ou continuada, do dia em que esta tiver cessado”.
Assim, uma vez praticado o ato ilícito contra o meio ambiente, ou, no caso das infrações permanentes ou continuadas, quando da cessação da atividade ilegal, iniciará para a Administração Pública a contagem do prazo de cinco anos para a instauração do processo administrativo ambiental e apuração da conduta ilícita.
A prescrição punitiva ambiental terá prazo semelhante ao previsto na legislação penal quando o fato objeto da infração também constituir crime. Sobre tema escreve Milaré[4], “quando se estiver diante de suposta infração administrativa que também configure infração penal, para a definição do prazo de prescrição deve-se verificar qual o tipo penal do ato cometido e, a partir do máximo da pena privativa de liberdade cominada ao respectivo crime, aplicar a tabela de prazos prevista no art. 109 do Código Penal”.
Ainda sobre o termo inicial da contagem do prazo quinquenal de prescrição, Curt Trennepohl[5] faz a seguinte ressalva: “Antes de decidir se uma atividade ilícita ocorrida há mais de cinco anos ainda é passível de punição deve ser verificado se os efeitos negativos da mesma persistem em razão de outra ação antrópica ou não. Em ocorrendo ação ou omissão que impede que os efeitos adversos cessem ou que o meio ambiente retorne ao seu equilíbrio original, afasta-se a prescrição quinquenal para a apuração e punição, por caracterizar o efeito negativo continuado”.
Continua o doutrinador afirmando que o mesmo tratamento deve ser conferido às infrações permanentes ou continuadas, ou seja, aquelas em que a prática ilegal se prolonga no tempo, pois nestes casos o prazo prescricional somente começa a contar a partir da cessação da atividade ilegal.
Uma vez instaurado o procedimento administrativo ambiental (art. 98 do Decreto nº 6.514/2008), o prazo quinquenal da prescrição da pretensão punitiva poderá ser interrompido se ocorrer quaisquer das hipóteses elencadas no rol meramente exemplificativo do artigo 22 do Decreto nº 6.514, de 2008. Vejamos:
“Art. 22. Interrompe-se a prescrição:
I – pelo recebimento do auto de infração ou pela cientificação do infrator por qualquer outro meio, inclusive por edital;
II – por qualquer ato inequívoco da administração que importe apuração do fato; e
III – pela decisão condenatória recorrível.
Parágrafo único. Considera-se ato inequívoco da administração, para o efeito do que dispõe o inciso II, aqueles que impliquem instrução do processo.”
São exemplos de atos do processo administrativo ambiental capazes de interromper o curso do prazo quinquenal, impondo que seja realizado nova contagem a partir do dia da interrupção: o pedido da autoridade julgadora no sentido de requerer parecer técnico ou contradita (art. 119 do Decreto nº 6.514/2008); e, a requisição de informações, documentos, contraditas pelo servidor do NUIP – Núcleo de Instrução Processual de Auto de Infração do IBAMA para subsidiar a instrução processual determinada pela autoridade julgadora (art. 76, parágrafo único da Instrução Normativa IBAMA nº 10, de 2011).
3. A PRESCRIÇÃO PUNITIVA INTERCORRENTE NO PROCESSO ADMINISTRATIVO AMBIENTAL.
No curso do procedimento administrativo ambiental ter-se-á a incidência de dois institutos distintos da prescrição, quais sejam: a prescrição punitiva de cinco anos, iniciada na data da prática da infração, ou de sua cessação, caso se trate de infrações permanentes ou continuadas; e, a prescrição intercorrente.
Também objeto de tratamento expresso pela Lei nº 9.783, de 1999 e pelo Decreto nº 6.514, de 2008, a prescrição intercorrente tem por principal finalidade coibir a inércia dos agentes públicos – responsável por externar a vontade do Estado – em promover os atos necessários a impulsionar o processo, finalizando-o em tempo razoável.
Dispõe o Decreto nº 6.514, de 2008:
“Art. 21.
§ 2º. Incide a prescrição no procedimento de apuração do auto de infração paralisado por mais de três anos, pendente de julgamento ou despacho, cujos autos serão arquivados de ofício ou mediante requerimento da parte interessada, sem prejuízo da apuração da responsabilidade funcional decorrente da paralisação”.
A prescrição punitiva intercorrente poderá se dar enquanto perdurar o processo administrativo apuratório, bastando que, de forma injustificada, reste paralisado, sem qualquer movimentação, por mais de três anos.
Veja que a prescrição punitiva intercorrente somente ocorrerá se a Administração sem qualquer justificativa não adotar medida tendente ao exercício da pretensão de apurar a conduta ilícita, objeto do processo administrativo ambiental, e assim concluir o processo administrativo. Se a inércia ocorre em virtude da conduta do administrado e, desde que devidamente comprovada e certificada nos autos, ou, ainda, em virtude de determinação judicial, a prescrição estará afastada.
Outra questão fundamental é que somente os atos tendentes a apurar o ato ilícito e, via de consequência, capaz de possibilitar o julgamento no sentido da homologação ou não auto de infração será capaz de aniquilar eventual incidência da prescrição intercorrente. Isto porque, o procedimento administrativo é conduzido pelo princípio da segurança jurídica (art. 95 do Decreto nº 6.514/2008), o qual certamente restaria fragilizado se a lei permitisse que todo e qualquer ato, mesmo aqueles que não objetivem o deslinde da situação posta, afastassem a prescrição intercorrente.
Pensar de forma diferente é permitir que meras movimentações processuais, sem qualquer utilidade para elucidação do fato, interrompam o curso do prazo prescricional, eternizando os processos administrativos e, portanto, as relações jurídicas litigiosas.
Por fim, cumpre mencionar que a ocorrência da prescrição intercorrente no procedimento administrativo acarreta a necessária apuração da responsabilidade funcional do servidor desidioso, nos termos da Lei nº 8.112, de 1991.
Ora, o processo administrativo segue o princípio da oficialidade, e, portanto, “a iniciativa da instauração e do desenvolvimento do processo administrativo compete à própria Administração”[6]. Ademais, “ainda que a lei não o estabeleça nesse sentido, o dever da Administração é inerente à função de concluir os processos para a verificação da conduta a ser adotada, satisfazendo, assim, o interesse da coletividade”[7]. Assim, não competirá ao servidor público decidir atuar ou não no processo, já que vinculado à observância da indisponibilidade do interesse público, no caso, da necessária proteção ao meio ambiente ecologicamente equilibrado (art. 225 da Constituição Federal) e a repressão das condutas indesejadas.
Por fim, cumpre trazer a lição de Hely Lopes Meirelles quanto à diferença entre o prazo de prescrição da pretensão punitiva ou da prescrição intercorrente com o prazo fixado para a prática do expediente na repartição como, por exemplo, o prazo de 30 dias para que, terminada a instrução processual, a autoridade ambiental julgue o auto de infração (art. do Decreto nº 6.514/2008). Ensina o ilustre administrativista que “aquele é extintivo do poder de praticar o ato; este é meramente regulatório da atividade interna da Administração e, por isso mesmo, não invalida o ato praticado pela autoridade fora do seu prazo para o despacho”[8].
4. A PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO EXECUTÓRIA NO PROCESSO ADMINISTRATIVO AMBIENTAL.
O termo a quo da prescrição da pretensão executória ambiental dar-se-á com o não pagamento da sanção pecuniária imposta por decisão final administrativa transitada em julgado, que homologue o auto de infração e imponha a sanção pecuniária.
Assim, não realizado o pagamento voluntário no âmbito da Administração Pública, inicia-se o prazo de cinco anos para a tomada de providências no sentido de promover a cobrança do débito constituído na decisão final administrativa, ficando autorizada a adoção de medidas restritivas, dentre as quais se destacam a inscrição no Cadastro de Inadimplentes – CADIN (Lei nº 10.522, de 2002) e na dívida ativa.
A Lei nº 9.873, de 1998, com redação dada pela Lei nº 11.941, de 2009, prevê expressamente a incidência da prescrição da pretensão executória:
"Art. 1o-A. Constituído definitivamente o crédito não tributário, após o término regular do processo administrativo, prescreve em 5 (cinco) anos a ação de execução da administração pública federal relativa a crédito decorrente da aplicação de multa por infração à legislação em vigor."
O Superior Tribunal de Justiça reconhece como o termo inicial da pretensão executória ambiental a necessária constituição definitiva do crédito no âmbito administrativo, ou seja, para que se inicie a contagem do prazo para a cobrança do valor devido a título de multa faz-se imprescindível a sua confirmação pelas autoridades administrativas. Para tanto, em outubro de 2010, editou a Súmula 467, que possui a seguinte ementa: “Prescreve em cinco anos, contados do término do processo administrativo, a pretensão da Administração Pública de promover a execução da multa por infração ambiental”.
Aliás, tal entendimento jurisprudencial decorreu de reiteradas decisões do Superior Tribunal no sentido de se aplicar à execução das multas impostas por regular processo administrativo ambiental o disposto no Decreto nº 20.910, de 1932 – isto em atenção ao princípio da simetria. Como exemplo, vejamos os acórdãos abaixo transcritos:
“PROCESSO CIVIL E ADMINISTRATIVO – COBRANÇA DE MULTA PELO ESTADO – PRESCRIÇÃO – RELAÇÃO DE DIREITO PÚBLICO – CRÉDITO DE NATUREZA ADMINISTRATIVA – INAPLICABILIDADE DO CC E DO CTN – DECRETO 20.910/32 – PRINCÍPIO DA SIMETRIA.
1. Se a relação que deu origem ao crédito em cobrança tem assento no Direito Público, não tem aplicação a prescrição constante do Código Civil.
2. Uma vez que a exigência dos valores cobrados a título de multa tem nascedouro num vínculo de natureza administrativa, não representando, por isso, a exigência de crédito tributário, afasta-se do tratamento da matéria a disciplina jurídica do CTN.
3. Incidência, na espécie, do Decreto 20.910/32, porque à Administração Pública, na cobrança de seus créditos, deve-se impor a mesma restrição aplicada ao administrado no que se refere às dívidas passivas daquela. Aplicação do princípio da igualdade, corolário do princípio da simetria.
3. Recurso especial improvido”.[9]
“ADMINISTRATIVO. EXECUÇÃO FISCAL. MULTA ADMINISTRATIVA. INFRAÇÃO À LEGISLAÇÃO DO MEIO AMBIENTE. PRESCRIÇÃO. SUCESSÃO LEGISLATIVA. LEI 9.873/99. PRAZO DECADENCIAL. OBSERVÂNCIA. RECURSO ESPECIAL SUBMETIDO AO RITO DO ART. 543-C DO CPC E À RESOLUÇÃO STJ N.º 08/2008.
1. O Ibama lavrou auto de infração contra o recorrido, aplicando-lhe multa no valor de R$ 3.628,80 (três mil e seiscentos e vinte e oito reais e oitenta centavos), por contrariedade às regras de defesa do meio ambiente. O ato infracional foi cometido no ano de 2000 e, nesse mesmo ano, precisamente em 18.10.00, foi o crédito inscrito em Dívida Ativa, tendo sido a execução proposta em 21.5.07.
2. A questão debatida nos autos é, apenas em parte, coincidente com a veiculada no REsp 1.112.577/SP, também de minha relatoria e já julgado sob o regime do art. 543-C do CPC e da Resolução STJ n.º 08/2008. Neste caso particular, a multa foi aplicada pelo Ibama, entidade federal de fiscalização e controle do meio ambiente, sendo possível discutir a incidência da Lei 9.873, de 23 de novembro de 1999, com os acréscimos da Lei 11.941, de 27 de maio de 2009. No outro processo anterior, a multa decorria do poder de polícia ambiental exercido por entidade vinculada ao Estado de São Paulo, em que não seria pertinente a discussão sobre essas duas leis federais.
3. A jurisprudência desta Corte preconiza que o prazo para a cobrança da multa aplicada em virtude de infração administrativa ao meio ambiente é de cinco anos, nos termos do Decreto n.º 20.910/32, aplicável por isonomia por falta de regra específica para regular esse prazo prescricional.
4. Embora esteja sedimentada a orientação de que o prazo prescricional do art. 1° do Decreto 20.910/32 – e não os do Código Civil – aplicam-se às relações regidas pelo Direito Público, o caso dos autos comporta exame à luz das disposições contidas na Lei 9.873, de 23 de novembro de 1999, com os acréscimos da Lei 11.941, de 27 de maio de 2009.
5. A Lei 9.873/99, no art. 1º, estabeleceu prazo de cinco anos para que a Administração Pública Federal, direta ou indireta, no exercício do Poder de Polícia, apure o cometimento de infração à legislação em vigor, prazo que deve ser contado da data da prática do ato ou, no caso de infração permanente ou continuada, do dia em que tiver cessado a infração.
6. Esse dispositivo estabeleceu, em verdade, prazo para a constituição do crédito, e não para a cobrança judicial do crédito inadimplido. Com efeito, a Lei 11.941, de 27 de maio de 2009, acrescentou o art. 1º-A à Lei 9.873/99, prevendo, expressamente, prazo de cinco anos para a cobrança do crédito decorrente de infração à legislação em vigor, a par do prazo também quinquenal previsto no art. 1º desta Lei para a apuração da infração e constituição do respectivo crédito.
7. Antes da Medida Provisória 1.708, de 30 de junho de 1998, posteriormente convertida na Lei 9.873/99, não existia prazo decadencial para o exercício do poder de polícia por parte da Administração Pública Federal. Assim, a penalidade acaso aplicada sujeitava-se apenas ao prazo prescricional de cinco anos, segundo a jurisprudência desta Corte, em face da aplicação analógica do art. 1º do Decreto 20.910/32.
8. A infração em exame foi cometida no ano de 2000, quando já em vigor a Lei 9.873/99, devendo ser aplicado o art. 1º, o qual fixa prazo à Administração Pública Federal para, no exercício do poder de polícia, apurar a infração à legislação em vigor e constituir o crédito decorrente da multa aplicada, o que foi feito, já que o crédito foi inscrito em Dívida Ativa em 18 de outubro de 2000.
9. A partir da constituição definitiva do crédito, ocorrida no próprio ano de 2000, computam-se mais cinco anos para sua cobrança judicial. Esse prazo, portanto, venceu no ano de 2005, mas a execução foi proposta apenas em 21 de maio de 2007, quando já operada a prescrição. Deve, pois, ser mantido o acórdão impugnado, ainda que por fundamentos diversos.
10. Recurso especial não provido. Acórdão sujeito ao art. 543-C do CPC e à Resolução STJ n.º 08/2008.”[10]
Da mesma forma como ocorre na prescrição da pretensão punitiva, a Lei nº 9.873, de 1999, elenca as hipóteses em que poderá ocorrer a interrupção do prazo prescricional executória:
“Art. 2o-A. Interrompe-se o prazo prescricional da ação executória:
I – pelo despacho do juiz que ordenar a citação em execução fiscal;
II – pelo protesto judicial;
III – por qualquer ato judicial que constitua em mora o devedor;
IV – por qualquer ato inequívoco, ainda que extrajudicial, que importe em reconhecimento do débito pelo devedor;
V – por qualquer ato inequívoco que importe em manifestação expressa de tentativa de solução conciliatória no âmbito interno da administração pública federal.”
5. A IMPRESCRITIBILIDADE DO DEVER DE REPARAR O DANO AMBIENTAL.
A obrigação de reparar o dano ambiental, ao contrário do que ocorre com as sanções pecuniárias, não é alcançada pela incidência da prescrição no procedimento administrativo ambiental. É a regra disposta no § 4º do artigo 21 do Decreto nº 6.514/2008:
“Art. 21.
§ 4o A prescrição da pretensão punitiva da administração não elide a obrigação de reparar o dano ambiental.
A independência das obrigações nascidas de conduta contrária à legislação ambiental encontra fundamento no texto constitucional, que assim dispõe:
Art. 225.
§ 3º. As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar danos ambientais.”
O Superior Tribunal de Justiça, ao julgar o REsp 1.120.117-AC, manifestou-se no sentido de reconhecer a imprescritibilidade do direito à reparação do dano ambiental, posto que se trata de direito inerente à vida, fundamental e essencial à afirmação dos povos:
“ADMINISTRATIVO E PROCESSO CIVIL – DIREITO AMBIENTAL – AÇÃO CIVIL PÚBLICA – COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL – IMPRESCRITIBILIDADE DA REPARAÇÃO DO DANO AMBIENTAL – PEDIDO GENÉRICO – ARBITRAMENTO DO QUANTUM DEBEATUR NA SENTENÇA: REVISÃO, POSSIBILIDADE – SÚMULAS 284/STF E 7/STJ.
1. É da competência da Justiça Federal o processo e julgamento de Ação Civil Pública visando indenizar a comunidade indígena Ashaninka-Kampa do rio Amônia.
2. Segundo a jurisprudência do STJ e STF trata-se de competência territorial e funcional, eis que o dano ambiental não integra apenas o foro estadual da Comarca local, sendo bem mais abrangente espraiando-se por todo o território do Estado, dentro da esfera de competência do Juiz Federal.
3. Reparação pelos danos materiais e morais, consubstanciados na extração ilegal de madeira da área indígena.
4. O dano ambiental além de atingir de imediato o bem jurídico que lhe está próximo, a comunidade indígena, também atinge a todos os integrantes do Estado, espraiando-se para toda a comunidade local, não indígena e para futuras gerações pela irreversibilidade do mal ocasionado.
5. Tratando-se de direito difuso, a reparação civil assume grande amplitude, com profundas implicações na espécie de responsabilidade do degradador que é objetiva, fundada no simples risco ou no simples fato da atividade danosa, independentemente da culpa do agente causador do dano.
6. O direito ao pedido de reparação de danos ambientais, dentro da logicidade hermenêutica, está protegido pelo manto da imprescritibilidade, por se tratar de direito inerente à vida, fundamental e essencial à afirmação dos povos, independentemente de não estar expresso em texto legal.
7. Em matéria de prescrição cumpre distinguir qual o bem jurídico tutelado: se eminentemente privado seguem-se os prazos normais das ações indenizatórias; se o bem jurídico é indisponível, fundamental, antecedendo a todos os demais direitos, pois sem ele não há vida, nem saúde, nem trabalho, nem lazer, considera-se imprescritível o direito à reparação.
8. O dano ambiental inclui-se dentre os direitos indisponíveis e como tal está dentre os poucos acobertados pelo manto da imprescritibilidade a ação que visa reparar o dano ambiental.
9. Quando o pedido é genérico, pode o magistrado determinar, desde já, o montante da reparação, havendo elementos suficientes nos autos. Precedentes do STJ.
10. Inviável, no presente recurso especial modificar o entendimento adotado pela instância ordinária, no que tange aos valores arbitrados a título de indenização, por incidência das Súmulas 284/STF e 7/STJ.
11. Recurso especial parcialmente conhecido e não provido”[11]. (grifo nosso).
CONCLUSÕES.
O procedimento administrativo ambiental é composto por duas fases distintas: a primeira, que podemos denominar de fase constitutiva, na qual haverá a lavratura do auto de infração e a consequente abertura do procedimento administrativo ambiental, finalizando-se com o julgamento no sentido da homologação ou não do auto de infração e seu transito em julgado (coisa julgada administrativa). E uma segunda fase, que podemos denominar de fase executória.
Na primeira fase, teremos a possibilidade da incidência da prescrição da pretensão punitiva e da prescrição intercorrente. A prescrição da pretensão punitiva decorre do escoamento do prazo de cinco anos, este contado da data da prática do fato ou da cessação da conduta ilícita, o que acaba por retirar da Administração Pública o poder de impor sanções às condutas indesejadas.
A prescrição intercorrente, por sua vez, poderá se dar no curso do procedimento administrativo e decorre unicamente da inércia da Administração Pública em promover atos necessários ao deslinde da causa. A paralisação injustificada do processo por mais de três anos ensejará o reconhecimento de ofício da prescrição intercorrente e demandará a apuração da responsabilidade funcional.
A fase executória do procedimento administrativo diz respeito aos atos necessários à tomada de medidas administrativas tendentes à satisfação do débito imposto na decisão final administrativa, já transitada em julgado, e não satisfeita voluntariamente pelo interessado. A Administração Pública deverá no prazo de cinco anos, a contar da data da constituição definitiva do crédito não tributário, promover as medidas necessárias à satisfação do débito, estando inclusive autorizado a promover a inscrição do nome do infrator no CADIN e na dívida ativa.
Por fim, o dever de reparar o dano ambiental não será prejudicado pelo reconhecimento da ocorrência da prescrição no âmbito administrativo, pois, segundo entendimento do Superior Tribunal de Justiça, o direito constitucionalmente assegurado a um meio ambiente ecologicamente equilibrado (art. 225) é imanente ao direito à vida, e, portanto, indisponível e protegido sob o manto da imprescritibilidade.
Bacharel em Direito pela Universidade Federal do Amazonas. Procuradora Federal desde 2008. Coordenadora Estadual da Procuradoria Federal Especializada junto ao IBAMA no Estado de Roraima
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