A redução dos prazos prescricionais e a proteção ao idoso

Resumo: Dentre as causas extintivas da punibilidade, destaca-se a prescrição, em razão da importância e complexidade da matéria. O artigo 115 do CP dispõe sobre a redução dos prazos de prescrição, pela metade, tanto para o réu menor de 21 anos (não abordado no presente trabalho) como para o maior de 70 anos. O idoso, seja ele, sujeito ativo ou passivo do delito tem seus direitos e garantias disciplinados em diversas passagens do nosso ordenamento jurídico. A prescrição etária, para o agente maior de 70 anos revela um importante papel na legislação penal brasileira, não apenas por razões de política criminal, mas também por atentar pela digna proteção ao idoso.[1]


Palavras-chave: Extinção da punibilidade. Prescrição. Redução dos prazos prescricionais. Proteção ao idoso. Estatuto do Idoso.


Abstract: Between the reasons that might extinguish the punishment, the statute of limitation is considerable for its complicate subject. The article 115 of the Penal Code treats about the reduction in 50 per cent of the limitation period to the  accused miner, under 21 years old, (not addressed off this work) as well as to those older than 70 years old. The aged, weather active or passive responsible of the delict, has his rights and guarantees disciplined in many extracts of our juridical ordainment. The statute of limitation to the aged has an important role to the Brazilian Penal Legislation, not only for political criminal reasons, but also for take care of the estimable aged protection.


Keywords. Extinction of punishment. Prescription. Reduction of Limitations. Protecting the elderly. The Elderly.


1 Introdução


Conforme prevê o artigo 115 do Código Penal Brasileiro, a redução dos prazos prescricionais, pela metade, é um benefício conferido ao criminoso menor de vinte e um anos, ao tempo do crime, e ao maior de setenta, na data da sentença. Nesse trabalho, será abordado especialmente as peculiaridades concernentes ao agente idoso.


O idoso, nomenclatura atual dada àqueles que se acham na “terceira idade”, encontra proteção legal expressa em diversas passagens de nosso ordenamento jurídico, podendo-se destacar: o artigo 226 da Constituição Federal; a Lei 10.741/03, denominada de Estatuto do Idoso; e nos artigos 65 inciso I (circunstâncias atenuantes da pena) e 115 do Código Penal, dispositivo em comento.


A redução do prazo prescricional conferida ao agente idoso encontra amparo, basicamente, nos seguintes fundamentos: decurso do tempo; não reincidência ao crime, e por este não mais representar um risco à sociedade – salvo raras exceções.


Com efeito, a aplicação da prescrição etária traz como resultado a legítima garantia de proteção ao idoso, assegurando-lhe seu bem estar e o próprio direito à vida.


2 Extinção da punibilidade – Prescrição


A extinção da punibilidade significa o desaparecimento do poder de punir do Estado.


 O ius puniendi, ou, a pretensão punitiva do Estado se extingue em determinadas situações previstas expressamente em seus diplomas legais. Nesse sentido, estão capituladas no art. 107 do CP as causas extintivas da punibilidade, quais sejam: morte do agente; anistia, graça ou indulto; retroatividade de lei que não mais considera o fato como criminoso; prescrição, decadência ou perempção; renúncia do direito de queixa, ou pelo perdão aceito, nos crimes de ação privada; pela retratação do agente, nos casos em que a lei a admite; e pelo perdão judicial nos casos previstos em lei.


Dentre as ditas causas, destaca-se a prescrição, que pode ser definida como a perda do direito de punir do Estado, ou de executar a pena aplicada. O ius puniendi  do Estado, em razão da prática de ato ilícito tem seu exercício condicionado ao tempo. Se dentro de certo lapso temporal, que varia em razão da pena máxima abstratamente prevista para o delito, ou da pena concretamente aplicada na sentença, o Estado não exercer sua pretensão punitiva ou executória, ocorre a prescrição.


A legislação penal brasileira sistematiza a matéria da prescrição tomando como referência a sentença criminal, assim considerada: a) a prescrição antes do trânsito em julgado da sentença criminal; b) a prescrição depois do trânsito em julgado da sentença criminal;


A prescrição antes do trânsito em julgado da sentença representa a prescrição da ação penal ou da pretensão punitiva e regula-se pelo máximo da pena privativa de liberdade cominada ao crime, nos prazos previstos no art. 109 do CP[2]:


Art. 109 – A prescrição, antes de transitar em julgado a sentença final, salvo o disposto nos §§ 1º e 2º do art. 110 deste Código, regula-se pelo máximo da pena privativa de liberdade cominada ao crime, verificando-se: I – em vinte anos, se o máximo da pena é superior a doze;


II – em dezesseis anos, se o máximo da pena é superior a oito anos e não excede a doze;


III – em doze anos, se o máximo da pena é superior a quatro anos e não excede a oito;


IV – em oito anos, se o máximo da pena é superior a dois anos e não excede a quatro;


V – em quatro anos, se o máximo da pena é igual a um ano ou, sendo superior, não excede a dois;


VI – em dois anos, se o máximo da pena é inferior a um ano”.


A prescrição depois do trânsito em julgado da sentença representa a prescrição da pretensão executória, regulada pelos mesmos prazos do art. 109 do CP, ou seja, da pena abstrata.     O CP traz ainda as hipóteses de prescrição retroativa e prescrição superviniente ou intercorrente. A primeira encontra fundamento no § 2º do art. 110,  cujo cálculo prescricional é refeito, retroagindo-se, passando-se a contar da data do fato; e a última, ocorre depois do trânsito em julgado, para a acusação ou do improvimento do seu recurso, tomando-se como base a pena fixada na sentença penal condenatória.


3 Fundamentos legitimadores da prescrição penal


 


     A prescrição em nossa legislação penal fundamenta-se, basicamente, em três pilares: a) o decurso do tempo (teoria do esquecimento); b) a correção do condenado; e c) a negligência da autoridade.


Na obra, Tratado de Direito Penal, Cezar Roberto Bitencourt, aborda-os de modo bastante elucidativo[3]:


1)O decurso do tempo leva ao esquecimento do fato: com a prescrição, a exigência de uma reação contra o delito, praticamente desaparece, pois a memória dos acontecimentos humanos vai enfraquecendo, atenuando. O alarma social, que é fator determinante à intervenção do Estado na repressão dos crimes, com o decurso do tempo, pouco a pouco acaba desaparecendo, a ponto de provocar a ausência do interesse que justifica a pretensão punitiva;


2)O decurso do tempo leva à recuperação do criminoso:  com o decurso do tempo sem que o réu tenha praticado outro delito, a finalidade da pena foi alcançada, qual seja, a sua readaptação ou reajustamento social. Acaso o réu volte a delinquir, se pode concluir que o decurso do tempo não foi capaz de regenerá-lo. Por isso, é que a legislação penal estabeleceu a interrupção do prazo de prescrição da pretensão executória pela reincidência (art. 117, VI, do CP);


3) O Estado deve arcar com sua inércia: Os prazos processuais existem e devem ser cumpridos, não devendo o réu arcar sozinho com o ônus de sua inobservância,  a mercê da vontade punitiva do Estado. A prestação jurisdicional tardia, salvo nos crimes de maior gravidade, não atinge sua finalidade que é a justiça. Não há interesse social, em deixar o criminoso indefinidamente sujeito a um processo ou a uma pena;


     Além desses fundamentos que embasam a legitimidade da prescrição penal, o referido doutrinador aponta, ainda, o enfraquecimento do suporte probatório em razão do decurso do tempo, o que torna a apuração do fato delituoso mais incerto, e a defesa do acusado mais precária e difícil.


Foram desenvolvidas outras teorias que levam à recuperação do criminoso: a da expiação temporal, segundo a qual, as angústias e os remorsos sofridos pelo culpado durante todo o lapso temporal, já são suficientes à expiação do criminoso; e a psicológica, para qual o tempo muda a condição psíquica do culpado, eliminando o nexo psicológico entre o fato e o agente; o individuo que sofrerá a pena, depois do longo decurso de tempo, não estará mais nas mesmas condições da época em que praticou o delito.


Assim, vale destacar, que o instituto da prescrição, que se dá pelo decurso do tempo, além dos aspectos psicológicos e expiatórios, tem seu caráter preventivo, por ser um instrumento que busca evitar a utilização da pena de forma distorcida, ou seja, aquela que assume um caráter meramente retributivo, incompatível com um Estado Democrático de Direito e com o principio da dignidade da pessoa humana.


Sobre o tema, observa DAMÁSIO DE JESUS:


“Pelo transcurso do tempo, considera-se a inexistência do interesse estatal em apurar o fato ocorrido há muitos anos, ou de ser punido o seu autor. A prescrição genérica e específica advindas da resposta penal, pelo passar dos anos, perdem a sua eficácia”[4].


Nesse mesmo sentido, arremata FIGUEIREDO DIAS:


“Por outro lado, e com maior importância, as exigências de prevenção especial, porventura muito fortes, logo a seguir o cometimento do facto, tornam-se progressivamente sem sentido e podem mesmo falhar completamente os seus objetivos: quem fosse sentenciado por um facto há muito tempo cometido e mesmo porventura esquecido, ou quem sofresse a execução de uma reação criminal há muito tempo já ditada, correria o sério risco de ser sujeito a uma sanção que não cumpriria quaisquer finalidades de socialização ou segurança. Finalmente, e sobretudo, o instituto da prescrição justifica-se do ponto de vista da prevenção geral positiva: o decurso de um largo período sobre a prática de um crime ou sobre o decretamento de uma sanção não executada faz com que não possa falar-se de uma estabilização contrafáctica das expectativas comunitárias, já apaziguadas ou definitivamente frustradas”[5]


4 O artigo 115 do CP – A redução do prazo prescricional pela metade


Feita essas considerações acerca do instituto da prescrição, passemos a analisar o dispositivo que estabelece a redução dos prazos de prescrição. Prescreve o art. 115 do CP, in verbis:


“Art. 115 – São reduzidos de metade os prazos de prescrição quando o criminoso era, ao tempo do crime, menor de 21 (vinte e um) anos, ou, na data da sentença, maior de 70 (setenta) anos.” (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984).


Sobre o tema é a jurisprudência do TRF:


“CRIME CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA – PRESCRIÇÃO RETROATIVA – 1. Beneficia-se da regra insculpida no art. 115 do CPC o réu que, na data da sentença, contava com mais de setenta anos de idade, restando o prazo prescricional reduzido a metade. 2. Verificado que transcorreu prazo superior a quatro anos do fato até o recebimento da denuncia, é de se declarar, de ofício, extinta a punibilidade pela“ (AC 2002.70.00.069735-6 – 7ª.T-Rel. Des.Fed.Tadaaqui Hirose – DJU 06.04.2005).


Analisando conjuntamente os fundamentos elencados no item acima, os quais buscam justificar a adoção do instituto da prescrição penal, é possível compreender e reconhecer a importância de sua existência no ordenamento jurídico, bem como, a sua aplicação nos casos práticos.


 O decurso do tempo, aliado a não reincidência ao crime, são na maioria dos casos, motivos suficientes para verificar-se que o ilícito penal cometido, prescinde de punição a ser aplicada pelo Estado. E ainda, em não havendo a prática de outro delito, presume-se que, a finalidade da pena, qual seja, o reajustamento social do indivíduo delituoso, já alcançou seu desiderato. Do contrário, o caráter da pena, assumiria uma feição meramente retributiva.


Vale registrar, que nosso ordenamento jurídico, mais precisamente o art. 5º, incisos XLII e XLIV, da Constituição Brasileira de 1988, contrariando ao moderno Direito Penal Liberal, que prega a prescritibilidade de todos os ilícitos penais, elencou os casos em que o lapso temporal não extingue o ius puniendi do Estado. São eles: a prática de racismo e a ação de grupos armados civis ou militares contra a ordem constitucional e o Estado Democrático. Para os demais casos, portanto, o instituto da prescrição penal será plenamente aplicado.


5 A proteção ao idoso no ordenamento jurídico brasileiro


A proteção ao idoso é tão importante, que tem reconhecimento expresso em passagens diversas de nosso ordenamento jurídico: nos artigos 115 e 65, I, ambos do CP, já mencionados acima; o art. 230 da CF/88, in verbis: “A família, a sociedade e o Estado tem o dever de amparar as pessoas idosas, assegurando a sua participação na comunidade, defendendo sua dignidade e bem estar e garantindo-lhes o direito à vida; e ainda, de forma especial a Lei 10.741 de 1º. de outubro de 2003, denominada de Estatuto do Idoso, dispõe em seus artigos iniciais:


Art.1º. É instituído o Estatuto do Idoso, destinado a regular os direitos assegurados às pessoas com idade igual ou superior a 60 (sessenta) anos.


 Art. 2º. O idoso goza de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata esta Lei, assegurando-se-lhe, por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades, para preservação de sua saúde física e mental e seu aperfeiçoamento moral, intelectual, espiritual e social, em condições de liberdade e dignidade.


Art. 3º. É obrigação da família, da comunidade, da sociedade e do Poder Público assegurar ao idoso, com absoluta prioridade, a efetivação do direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, à cultura, ao esporte, ao lazer, ao trabalho, à cidadania, à liberdade, à dignidade, ao respeito e à convivência familiar e comunitária.”


Com o advento da Lei 10.741/2003, a proteção jurídica à terceira idade é consagrada em nosso Estado Democrático de Direito. O Estatuto do Idoso traz em seu Título II um extenso, porém, não exaustivo, rol de direitos fundamentais da pessoa idosa, em atendimento aos preceitos constitucionais de respeito à cidadania e dignidade da pessoa humana.


Prevê ainda o referido Diploma que o envelhecimento é um direito personalíssimo e a sua proteção um direito social (art. 8º), além de estabelecer como obrigação do Estado, garantir à pessoa idosa a proteção à vida e à saúde, mediante efetivação de políticas sociais públicas que permitam um envelhecimento saudável e em condições de dignidade (art. 9º).


No tocante à parte penal, o Estatuto do Idoso cuidou apenas das hipóteses nas quais o tutelado seja vítima de crime, não havendo previsão legal quando ele atue na qualidade de agente ativo de delito ou contravenção. Circunstância esta, causadora de relevantes discussões no que concerne à idade do agente para efeito da concessão de benefícios legais, tal qual, o referido no art.65, I e 115 do CP (70 anos).


Questiona-se nesse sentido, se a nova lei teria derrogado o disposto nos artigos do Código Penal, fixando a idade para sessenta anos, ou continua vigente a regra estabelecida na legislação penal.


A despeito de tais controvérsias, é o entendimento do STJ:


EMENTA: PENAL. PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. AGENTE MAIOR DE 70 (SETENTA) ANOS. ESTATUTO DO IDOSO. REDUÇÃO DE METADE NO PRAZO PRESCRICIONAL. MARCO TEMPORAL. SENTENÇA CONDENATÓRIA. I – A idade de 60 (sessenta) anos, prevista no art. 1º do Estatuto do Idoso, somente serve de parâmetro para os direitos e obrigações estabelecidos pela Lei 10.741/2003. Não há que se falar em revogação tácita do art. 115 do Código Penal, que estabelece a redução dos prazos de prescrição quando o criminoso possui mais de 70 (setenta) anos de idade na data da sentença condenatória. II – A redução do prazo prescricional é aplicada, analogicamente, quando a idade avançada é verificada na data em que proferida decisão colegiada condenatória de agente que possui foro especial por prerrogativa de função, quando há reforma da sentença absolutória ou, ainda, quando a reforma é apenas parcial da sentença condenatória em sede de recurso. III – Não cabe aplicar o benefício do art. 115 do Código Penal quando o agente conta com mais de 70 (setenta) anos na data do acórdão que se limita a confirmar a sentença condenatória. IV – Hipótese dos autos em que o agente apenas completou a idade necessária à redução do prazo prescricional quando estava pendente de julgamento agravo de instrumento interposto de decisão que inadmitiu recurso extraordinário. V – Ordem denegada” (Supremo Tribunal Federal, 1a Turma, Habeas Corpus nº 86320/SP, DJU 24-11-2006, p. 76, Ementário vol. 2257-05, p. 880, RB v. 19, n° 518, 2007, p. 29-31, Relator Min. Ricardo Lewandowski).


“PENAL. HABEAS CORPUS. ART. 1º, INCISO I, DO DECRETO-LEI Nº 201/67. DOSIMETRIA DA PENA. FIXAÇÃO DA PENA-BASE. FUNDAMENTAÇÃO. PRESCRIÇÃO. LEI Nº 10.741/2003. I – A pena deve ser fixada com fundamentação concreta e vinculada, tal como exige o próprio princípio do livre convencimento fundamentado (arts. 157, 381 e 387 do CPP c/c o art. 93, inciso IX, segunda parte da Lex Maxima). Ela não pode ser estabelecida acima do mínimo legal com supedâneo em referências vagas e dados não explicitados. II – O Estatuto do Idoso não deve ser interpretado de forma ilimitada, de modo a alterar dispositivo legal específico do CP, referente à redução do prazo prescricional para o réu com mais de 70 (setenta) anos na data da sentença (art. 115, do CP). Ordem parcialmente concedida para anular a r. decisão condenatória unicamente quanto à dosimetria da pena, a fim de que outra seja proferida com nova e motivada fixação da reprimenda.” (HC 37752/BA, STJ, Rel. Ministro Felix Fischer, Quinta Turma, DJ 21/02/2005, p. 200).


“CRIMINAL. RHC. DIFAMAÇÃO. RÉU MAIOR DE 60 ANOS. ALTERAÇÃO DO ART. 115 DO CÓDIGO PENAL PELO ESTATUTO DO IDOSO. INOCORRÊNCIA. PRESCRIÇÃO. NÃO CONFIGURAÇÃO. RECURSO DESPROVIDO.I. O art. 1º do Estatuto do Idoso não alterou o art. 115 do Código Penal, que prevê a redução do prazo prescricional para o réu com mais de 70 (setenta) anos na data da sentença. Precedente. II. Não tendo ocorrido a prescrição, tendo em vista a não consumação do interregno previsto no Código Penal, inexiste o constrangimento ilegal afirmado na impetração. III. Recurso desprovido.” (RHC 16856/RJ, STJ, Rel. Ministro Gilson Dipp, Quinta Turma, DJ 20/06/2005, p. 295).


Em sentido contrário, disserta Luis Regis Prado[6]:


“No que se refere ao marco etário de 70 anos, com a edição da Lei 10.741/2003 (Estatuto do Idoso) passa ele a ser de 60 anos, para efeitos de prescrição, numa interpretação favorável constitucionalmente assegurada (art.5º., XL, CF)”.


Com efeito, e aderindo o posicionamento dos Tribunais Superiores, é sensato considerar que a idade definida pelo Estatuto do Idoso não revogue os dispositivos penais, que a estabelecem em 70 (setenta anos). A despeito de tais fundamentos, forçoso é, levar-se em consideração que com o aumento da expectativa de vida do brasileiro, a idade limite estipulada para a concessão do aludido benefício, se mostra razoavelmente compatível. Podendo se concluir que a regra estabelecida no dispositivo penal, continua vigente.


Ainda no tocante à interpretação do aludido dispositivo, verifica-se dos julgados acima, que os tribunais têm conferido interpretação extensiva quanto ao momento da concessão do benefício da redução do prazo prescricional. O STJ tem se manifestado majoritariamente no sentido de ampliar o momento em que o réu completa setenta anos para além da sentença, ou seja, para as hipóteses em que houver reforma da sentença absolutória, ou reforma parcial da sentença condenatória em sede de recurso.  Não cabendo, todavia, a aplicação do benefício, nas hipóteses em que o acórdão se limitar a confirmar a sentença condenatória.


No mesmo sentido, é a decisão do TJSP:


“O Legislador, no art. 115 do CP, estabeleceu que faz jus à redução da metade dos prazos prescricionais o réu maior de setenta anos de idade ao tempo da sentença. Deve-se, no entanto, entender que, sendo esta recorrível, se o réu vem a completar tal idade enquanto pendente de julgamento a apelação, restará abrangido pelo exposto no referido dispositivo – interpretação preferível por ser mais favorável ao réu. Deve preponderar sobretudo, no exame da questão, o inconveniente de se levar à prisão,pessoa já não mais perigosa, ao fim de sua existência, para permanecer ali por pouco tempo”. (AC – Rel. Marinho Falcão – RT 614/282).


7 Considerações finais


Em síntese, a redução do prazo prescricional concedida aos maiores de setenta anos, regulada pelo artigo 115 do CP, é um benefício que tem papel fundamental em nossa legislação penal. Não se pode negar que o legislador ao elaborar o referido dispositivo, além de todos os fundamentos legitimadores de sua instituição, cuidou ainda da proteção de um ser humano  – salvo raras exceções –  com a capacidade física e mental irreversivelmente reduzida, não devendo pois,  ficar indefinidamente a mercê da vontade estatal em exercer sua atividade jurisdicional.


Logo, com o decurso do tempo e a inércia do Estado, a pena perde seu fundamento, esgotando-se os motivos para o Estado aplicá-la.


A prescrição etária para o idoso que não mais representa um risco à sociedade, seja pelo fundamento da não reincidência em ilícitos penais, seja ainda, pela natural fragilização advinda da idade, é inegavelmente é um importante instituto penal que integra a legislação brasileira, visando legitimar a tutela jurídica do agente maior de 70 anos.


Por fim, não se pode olvidar que a função da pena no direito brasileiro, ao menos na teoria, é a ressocialização do indivíduo.


Em suma, a instituição do artigo 115 (parte final), em sintonia com o Estatuto do Idoso consagra em nosso Estado Democrático de Direito, os preceitos constitucionais garantidores da cidadania e da dignidade da pessoa do idoso, assim como o direito personalíssimo ao envelhecimento e o direito social à sua proteção.


 


Referências

BITTENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal. Parte Geral. 12ª. Ediçao. São Paulo: Saraiva, 2008.

HUNGRIA, Nelson. Comentários ao Código Penal, Vol. IV. 3.ª Edição, Forense, 1955.

GRECO, Rogério. Curso de Direito Penal. 9ª. Edição. Rio de Janeiro: Impetus, 2007.

JESUS, Damásio Evangelista de. Prescrição Penal. São Paulo: Saraiva, 1999. p. 19.

SANTOS, Juarez Cirino dos. Direito Penal: Parte Geral. Curitiba. Lumen Juris, 2006.

VAZ, Paulo Afonso Brum, O sistema penal brasileiro e a prescrição: Violação ao dever de proteção no Estado Democrático de direito, extraido de, http://virtualbib.fgv.br/dspace/bitstream/handle/10438/2762/DMPPJ%202008 %20-%20Paulo%20Afonso%20Brum%20Vaz.pdf?sequence=1. Acesso em 30.12.2009


Notas:

[1] Artigo apresentado para avaliação na disciplina Direito Penal IV do Curso de Bacharelado em Direito da Universidade do Estado da Bahia, ministrada pelo Professor Mestre Urbano Félix Pugliese do Bomfim.

[2] Santos, Juarez Cirino dos. Direito Penal: Parte Geral. Curitiba. Lumen Juris, 2006. p. 675/677.

[3] Bittencourt, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal. Parte Geral. 12ª Edição. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 725/726.

[4]JESUS, Damásio Evangelista de. Prescrição Penal. São Paulo: Saraiva, 1999. p. 19.

[5]DIAS, Jorge de Figueiredo. Direito Penal Português: As conseqüências jurídicas do crime. Coimbra: Coimbra, 2005. p. 699.

[6] Prado, Luis Regis. Comentários ao Código Penal. 2007. p. 391.

Informações Sobre o Autor

Ana Cristina Sampaio Ribeiro

Acadêmica de Direito na Universidade do Estado da Bahia, Departamento de Ciências Humanas,Campus IV. Jacobina/BA


Equipe Âmbito Jurídico

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