Resumo: O tema proposto tem relação com o sistema tradicional de responsabilidade civil, adentrando especificamente no sistema de responsabilidade do fornecedor pelo fato do produto. Enfoca se seria possível a aplicabilidade de uma eximente, ante o dano causado ao consumidor originado de um defeito impossível de ser conhecido e evitado no momento em que o produto foi colocado em circulação, em razão do estágio da ciência e da tecnologia.Esse eximente é estudada na teoria do Risco do Desenvolvimento, que procura justificar, ou não, a responsabilidade civil do fornecedor pelos produtos ou serviços colocados no mercado de consumo, quando a mais avançada ciência e tecnologia não conseguia diagnosticar tais vícios.
Palavras-chave: Responsabilidade civil; Fato do Produto; Fornecedor; Consumidor; Teoria do risco do desenvolvimento.
Abstract: The proposedthemeisrelatedtothetraditional system ofliability ,enteringspecificallythevendorbecauseofproductliability system. Focusesonwhether it wouldbepossibletheapplicabilityof a eximente ,beforethedamagetoconsumeroriginatedfrom a defectimpossibletobeknownandavoidedatthe time theproductwasputintocirculation , in stagereasonofscienceandtechnology. Thiseximenteisstudied in thetheoryofDevelopmentRisk ,whichseekstojustify , ornot, theliabilityofthesupplier for theproductsorservicesoffered in theconsumermarket , wherethemostadvancedscienceandtechnologycouldnot diagnose suchaddictions.
Keywords: Civil responsability; FactoftheProduct; Provider; Consumer; Risktheoryofdevelopment.
Sumário: 1.Introdução. 2. Responsabilidade civil do fornecedor de produto. 2.1. Responsabilidade civil contratual objetiva. 2.2. Excludentes de responsabilidade civil dentro do Código de Defesa do Consumidor. 3.Elementos/requisitos para configuração da responsabilidade civil no código de defesa do consumidor. 3.1 Produto defeituoso e sua colocação no mercado de consumo. 3.2 A responsabilidade solidária dos fornecedores envolvidos e a tecnologia e ciência utilizada. 4. Teoria do risco do desenvolvimento. 4.1 Conceito. 4.2. Teoria do risco do desenvolvimento no Brasil. 5. Conclusão. Referências.
1 Introdução
Na sociedade contemporânea a globalização importa os vícios dos produtos para dentro das fronteiras nacionais – bem como os acidentes de consumo daí originados. Nesse contexto, há necessidade dos fornecedores de produtos dedicarem maiores cuidados ao elaborarem seus projetos. Por vezes, por mais que se valha da mais avançada ciência e tecnologia não é possível identificar, naquele momento, que o produto é um risco para sociedade de consumo. O tema do presente estudo fará a análise da responsabilidade civil dos fornecedores de produtos e a aplicabilidade da Teoria do Risco do Desenvolvimento.
No primeiro capítulo serãodemonstradas as partes que figuram em uma relação de consumo e a responsabilidade civil decorrente. O foco estará voltado para a responsabilidade civil dos fornecedores, nos termos do Código de Defesa do Consumidor, abordando a espécie de responsabilidade que norteia o tema e seus consectários legais, bem como as excludentes de ilicitude, ante a legislação vigente, doutrina e jurisprudência.
No segundo capítulo serão abordados os requisitos e elementos para a configuração da responsabilidade civil na relação de consumo. Para se chegar ao sistema específico de responsabilidade civil nas relações de consumo e suas peculiaridades se utilizarão de regras e conceitosdo sistema tradicional de responsabilidade civil. Posteriormente haverá um detalhamento dos itens preponderantes, com enfoque no que vem a ser produto defeituoso e o momento em que se considerada colocado no mercado.
No terceiro capítulo o entendimento sobre a teoria do risco desenvolvimento será abordado, pincelando o posicionamento utilizado a respeito da teoria pela União Europeia e pelo Brasil. Os principais pensamentos dos doutrinadores, com pontos favoráveis e contra sobre a aplicabilidade da teoria. A utilização de casos e julgados sobre o tema também serão usados a fim de delimitar e configurara teoria.
Por fim a conclusão da aplicabilidade ou não da teoria do risco do desenvolvimento no direito brasileiro e os motivos determinantes que levaram ao deslinde da questão, lembrando-se de utilizar a ótica do código pátrio sobre as relações de consumo e seus participantes.
2Responsabilidade civil do fornecedor de produto
A responsabilidade civil é um fato jurídico, decorrente de uma violação de um dever jurídico originário, que cause dano na esfera patrimonial ou extrapatrimonial a outrem. Importa dizer que o ato que ocasionar o instituto da responsabilidade civil é um ato jurídico capaz de produzir consequências jurídicas. Sua função inspira-se no conceito rupestre de justiça existente no pensamento humano.
Entrementes, os fatos jurídicos voluntários, decorrentes de condutas humanas, tangenciam o nascimento ou não da responsabilidade civil, que decorre de um ato ilícito[1] que provoque lesão de caráter material ou moral.
O conceito de ato ilícito possui grande relevância. Foi pela obra dos pandectistas alemães do século XIX, que se deu o abandono a classificação romanista de delito e quase-delito e em seu lugar adotou-se o conceito único de ato ilícito[2]. Neste compasso, o ato ilícito pode ser entendido por um ato que descumpre uma obrigação originária.
Destarte, para que haja a responsabilidade civil não basta que a conduta humana seja um ato ilícito, esta deve causar dano a algo, pessoa ou coisa, para que então, possa nascer ao ofendido, o direito de ser ressarcido da sua lesão, patrimonial ou extrapatrimonial.
Dependendo de onde provém a conduta violadora do dever jurídico e seu elemento subjetivo, a responsabilidade civil pode ser dividida em diferentes espécies. In casu, os holofotes estão direcionados a relação de consumo, como a norteadora das consequências jurídicas dos atos ilícitos.
Dentro do código consumeirista, que irá dirimir sobre a responsabilização civil nas relações de consumo, se encontram os conceitos das partes envolvidas nessa relação, o consumidor e o fornecedor, que serão partes na relação jurídica processual[3].
Entende-se ser consumidor toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final[4], art. 2º do Código do Consumidor[5]. Sobre o tema se manifestou o Superior Tribunal de Justiça[6]:
“Direito do Consumidor. Recurso especial. Conceito de consumidor. Critério subjetivo ou finalista. Mitigação. Pessoa Jurídica. Excepcionalidade. Vulnerabilidade. Constatação na hipótese dos autos. Prática abusiva. Oferta inadequada. Característica, quantidade e composição do produto. Equiparação (art. 29). Decadência. Inexistência. Relação jurídica sob a premissa de tratos sucessivos. Renovação do compromisso. Vício oculto.- A relação jurídica qualificada por ser "de consumo" não se caracteriza pela presença de pessoa física ou jurídica em seus pólos, mas pela presença de uma parte vulnerável de um lado (consumidor), e de um fornecedor, de outro.- Mesmo nas relações entre pessoas jurídicas, se da análise da hipótese concreta decorrer inegável vulnerabilidade entre a pessoa-jurídica consumidora e a fornecedora, deve-se aplicar o CDC na busca do equilíbrio entre as partes. Ao consagrar o critério finalista para interpretação do conceito de consumidor, a jurisprudência deste STJ também reconhece a necessidade de, em situações específicas, abrandar o rigor do critério subjetivo do conceito de consumidor, para admitir a aplicabilidade do CDC nas relações entre fornecedores e consumidores-empresários em que fique evidenciada a relação de consumo. – São equiparáveis a consumidor todas as pessoas, determináveis ou não, expostas às práticas comerciais abusivas.- Não se conhece de matéria levantada em sede de embargos de declaração, fora dos limites da lide (inovação recursal). Recurso especial não conhecido.”
Equipara-se a consumidor ainda (1) a coletividade de pessoas, ainda que indetermináveis, que haja intervindo nas relações de consumo, art. 2º p.ú.[7]; (2) todas as vítimas do evento danoso pelo fato do produto ou serviço, art.17[8]; e (3) todas as pessoas determináveis ou não, expostas às práticas comerciais previstas no Código consumeirista, art. 29[9].
O conceito de fornecedor por sua vez, encontra-se descrito no caput do art. 3º do Código do Consumidor[10], sendo toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços.
GONÇALVES[11] aponta que o conceito de fornecedor possui liame com a atividade habitual empresarial:
“Observe-se que a lei se refere a fornecedor como aquele que desenvolve “atividade” de produção, montagem, comercialização etc., mostrando que é a atividade que caracteriza alguém como produtor. Ora, atividade significa não a prática de atos isolados, mas a de atos continuados e habituais.
Assim, não é considerado fornecedor quem celebra um contrato de compra e venda, mas aquele que exerce habitualmente a atividade de comprar e vender. Assim como não é fornecedor quem vende a sua casa ou seu apartamento, mas o construtor que exerce a atividade de venda dos imóveis que constrói, habitual e profissionalmente.
O conceito de fornecedor está, assim, intimamente ligado à ideia de atividade empresarial. Desse modo, continua regida pelo Código Civil a compra e venda de carro usado entre particulares, inserindo-se, porém, no âmbito do Código de Defesa do Consumidor a compra do mesmo carro usado efetuada perante uma revendedora.”
2.1Responsabilidade civil contratual objetiva
O código consumeirista é a legislação que abraça o consumidor. A sua elaboração foi pautada na evolução que acontecia ao redor do mundo das relações de consumo, que aumentavam exponencialmente, chegando ao ponto, que o Código Civil sozinho já não satisfazia em plenitude os direitos ali guerreados[12]. A área do direito do consumidor sofreu com os maiores impactos decorrentes das profundas transformações sociais, políticas e econômicas verificadas no curso do século passado[13].
Os direitos ali defendidos nascem de uma relação contratual existente entre o consumidor e o fornecedor de produto ou serviço. A avença diz respeito ao contrato celebrado no momento da compra do produto ou serviço pelo consumidor.
Diferentemente da responsabilidade extracontratual ou aquiliana, decorrente de uma violação de obrigação imposta por lei, a responsabilidade contratual nasce de uma violação de um dever jurídico lato sensu existente em virtude de uma relação jurídica obrigacional preexistente.
A relação de consumo, portanto é contratual e segue regras básicas firmadas na lei nº 8.078, em especial as contidas nos arts. 46 a 54[14]. Não obstante, o contrato entabulado deve seguir os princípios que norteiam as relações contratuais, dando importância às características peculiares que envolvem as relações de consumo.
Os contratos de consumo, em sua maioria, são elaborados de forma unilateral pelos fornecedores, não possuindo manifestação de vontade do consumidor, cabendo a esse somente a escolha de aderir ou não. São espécies de contratos de adesão ou os que não são apresentados (contratos verbais), referentes a um comportamento socialmente típico. Essa forma unilateral de elaboração rompe com o princípio do pacta sunt servanda[15].
Seja em uma ou outra das modalidades de contrato firmadas junto ao consumidor, este na maioria das vezes se apresentará como ser vulnerável e hipossuficiente na relação obrigacional decorrente. Vulnerável, pois não possui acesso ao sistema produtivo e por não ter condições de conhecimento do seu funcionamento. Hipossuficiente em dois aspectos, o de ordem técnica e outro de cunho econômico[16].
Nessa guisa é o fornecedor que detém o monopólio do conhecimento ligado aos meios de produção, referenciados não apenas sobre os aspectos técnicos e administrativos para a fabricação de produtos, como também a decisão do que será colocado no mercado[17] e como, cabendo ao consumidor apenas aceitar o produto.
NUNES[18] discorre sobre os dois aspectos (ordem técnica e cunho econômico) da seguinte forma:
“O primeiro está ligado aos meios de produção, cujo conhecimento é monopólio do fornecedor. E quando se fala em meio de produção não está referindo apenas aos aspectos técnicos e administrativos para a fabricação de produtos e prestação de serviços que o fornecedor detém, mas também ao elemento fundamental da decisão: é o fornecedor que escolhe o que, quando e de que maneira produzir, de sorte que o consumidor está a mercê daquilo que é produzido. (…)O segundo aspecto, o econômico, diz respeito à maior capacidade econômica que, via de regra, o fornecedor tem em relação ao consumidor. É fato que haverá consumidores individuais com boa capacidade econômica e às vezes até superior à de pequenos fornecedores. Mas essa é a exceção da regra geral.”
Frisa-se que às vezes ao consumidor não é dado nem ao menos o direito de escolha, quando, por exemplo, somente existe um medicamento, de uma determinada marca que é indicado pelo médico, como o melhor tratamento de uma doença.
Ainda sobre o assunto, a hipossuficiência não se confunde com a vulnerabilidade, embora esta integre as características daquela. Quase todo consumidor é vulnerável, mas nem todo será hipossuficiente. O conceito de hipossuficiência utilizado no Código de Defesa do Consumidor é em seu sentido mais abrangente, prevendo qualquer situação de superioridade do fornecedor que reduz a capacidade do consumidor[19].
CAVALIERI FILHO[20] ao analisar o pressuposto da hipossuficiência na inversão do ônus da prova opejudicis, leciona:
“(…) nas relações de consumo, a situação do fornecedor é evidentemente de vantagem, pois somente ele detém o pleno conhecimento do projeto, da técnica e do processo de fabricação, enfim, o domínio do conhecimento técnico especializado. A prova, não raro, além de onerosa, é extremamente difícil, encontra-se em poder do fornecedor os documentos técnicos, científicos e contábeis – registro, documentos, contratos, extratos bancários, bancos de dados etc. Como poderia o consumidor provar o defeito de um determinado produto – v.g. que um medicamento lhe causou um mal – se não tem o menor conhecimento técnico ou científico para isso? Se para o consumidor essa prova é impossível, para o fornecedor do medicamento ela é perfeitamente possível ou, pelo menos, muito mais fácil. Quem fabricou o produto tem o domínio do processo produtivo, pelo que tem também condições de provar que o seu produto não tem defeito. O que não se pode é transferir esse ônus para o consumidor.”
Por seguinte, o dever de observação das regras básicas e os princípios que norteiam as relações contratuais atuam de maneira a proteger o consumidor, e esta proteção, consagrada pela carta magna vem em obediência ao princípio da isonomia, tratar de maneira igualitária as partes na relação de consumo.
Neste ínterim, o Código de Defesa do Consumidor traz uma série de vantagens ao consumidor frente ao fornecedor de produto. As normas de proteção, de ordem pública e de interesse social, veem a consagrar o disposto nos arts. 5°, inciso XXXII, 170, inciso V, da Constituição Federal e art. 48 de suas Disposições Transitórias, conforme depreende do art. 1 do Código de Defesa do Consumidor[21].
Vale destacar que as vantagens contidas ali, por força do enunciado “de ordem pública”, possuem verdadeiro escopo aos valores básicos da sociedade, com aplicação necessária e observância obrigatória[22]. Com isso pretende o legislador a criação de uma sociedade, que pautada nas diretrizes contidas no código consumeirista, possa conviver pacífica e saudavelmente com o mercado de consumo[23].
Entrementes o convívio saudável entre o consumidor e o mercado de consumo, deve ser almejado para ir de encontro ao estado de bem estar social, por isso que o Código do Consumidor possui diversas garantias ao consumidor.
Dentre as garantias consumeirista, pode-se destacar o reconhecimento da vulnerabilidade do consumidor (art. 4º, I)[24]; a garantia de produtos de qualidade, segurança, durabilidade e desempenho (art. 4º, II, “d”)[25]; a efetiva prevenção e reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos e difusos (art. 6º, VI)[26]; a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova (art. 6º, VII)[27].
Outra conquista dos consumidores foi à responsabilização objetiva atribuída aos fornecedores de produto e serviço aos danos causados em virtude de defeitos relativos ao fornecimento de produto ou de serviços.
Essa conquista foi possível por causa da grande evolução sofrida pela responsabilidade civil nas relações de consumo ocorridas ao longo do século XX. Começando pela flexibilização do conceito e da prova da culpa, passando pela culpa presumida, depois culpa contratual, a culpa anônima, e finalmente à responsabilidade objetiva[28].
Nessa espécie de responsabilidade civil, não é necessário que o consumidor demonstre a culpa do fornecedor. Com isso há uma relativização do instituto clássico da responsabilidade civil. A desnecessidade da demonstração de culpa foi atribuída a hipossuficiência do consumidor, que não detém condições de provar a culpa do fornecedor.
As ofensas que resultam lesões têm por regra abraçada pelo Código Civil a necessidade do pressuposto da culpa para que haja a responsabilidade, as exceções, ou seja, as hipóteses de responsabilidade objetiva, decorrem da própria lei. Só há responsabilidade objetiva quando a lei assim determina[29].
Não obstante os dizeres que a responsabilidade civil objetiva decorre exclusivamente de lei e que a regra é a responsabilidade subjetiva, em observância a grande importância que as relações de consumo possuemCAVALIERI FILHO, com louvor, chega a dividir a responsabilidade civil em tradicional e responsabilidade nas relações de consumo, sendo que “a responsabilidade objetiva, que era exceção em nosso Direito, passou a ter um campo de incidência mais vasto do que a própria responsabilidade subjetiva” [30].
Sabido então que a responsabilidade civil no âmbito da Lei 8.078/1990[31] é objetiva. Deve-se perquirir, portanto, na hipótese de dano na relação de consumo, acerca da existência do ato ilícito, do prejuízo patrimonial ou extrapatrimonial e do nexo de causalidade que constitui o liame fático entre os dois primeiros (responsabilidade civil objetiva).
A responsabilidade objetiva é a que melhor se encaixa na relação de consumo nos moldes contemporâneos, senão vejamos:
“A sociedade de consumo, com seus produtos e serviços inundados de complexidade tecnológica, não convive satisfatoriamente com um regime de responsabilidade civil baseado em culpa (…)Afastando-se, por conseguinte, do direito tradicional, o Código dá um fundamento objetivo ao dever de indenizar. Não mais importa se o responsável legal agiu com culpa (imprudência, negligência ou imperícia) ao colocar no mercado produto ou serviço defeituoso. Não é sequer relevante tenha ele sido o mais cuidadoso possível. Não se trata, em absoluto, de mera presunção de culpa que o obrigado pode ilidir provando que atuou com diligência. Ressalte-se que tampouco ocorre mera inversão do ônus da prova. A partir do Código – não custa repetir – o réu será responsável mesmo que esteja apto a provar que agiu com a melhor diligência e perícia”[32].
Se o consumidor foi protegido pelo manto da responsabilidade objetiva, o fornecedor não ficou de todo descoberto, ante sua maior capacidade econômica e conhecimento do produto colocado no mercado, pode tutelar seu direito em plenitude, utilizando os meios contidos em lei para eximir-se da responsabilização civil[33].
Outra questão importante a ser pontuada é a Responsabilidade Civil decorrente do fato do produto e vício do produto. Antes, porém, a distinção entre outros dois institutos, vício e defeito, se mostra primordial.
O termo “vício” lembra o instituto do vício redibitório do direito civil, mas com ele não se confunde[34]. Enquanto os vícios redibitórios pelo Código Civil dizem respeito apenas aos defeitos ocultos da coisa (art. 441)[35], os vícios de qualidade ou de quantidade abarcados pelo Código do Consumidor podem ser ocultos ou aparentes[36].
Ainda sobre o tema, para que se configure o vício redibitório é necessário observância há alguns requisitos. A princípio (1) a coisa deve ser recebida em virtude de uma relação contratual; (2) o defeito oculto deve ser grave e contemporâneo, guardando um liame temporal com a celebração do contrato; (3) o defeito de pequena monta ou superveniente à realização do contrato não afeta o princípio da garantia. Em lado oposto, o vício tratado dentro do código consumeirista não é precedido de tais requistos[37], sendo portando mais vantajoso ao consumidor.
Mas o que vem a ser vício no microssistema de proteção ao consumidor? Segundo NUNES[38] são “as características de qualidade ou quantidade que tornem os produtos ou serviços impróprios ou inadequados ao consumo a que se destinam e também que lhes diminuam o valor”. Sendo também considerados “vícios os decorrentes da disparidade havida em relação às indicações constantes do recipiente, embalagem, rotulagem, oferta ou mensagem publicitária”. O vício tem a capacidade de causar dano ao consumidor, porém, de menor vulto.
O defeito é a evolução negativa do vício se caracterizando mais gravoso com um dano mais devastador causado ao consumidor[39]. Isso quer dizer que não existe defeito sem que haja vício. O defeito pressupõe o vício[40].
Exemplificando, uma senhora compra uma cadeira com um de seus pés, menor que os demais. Ao sentar para tomar seu café, percebe que a cadeira não está firme, titubeando. Até o momento se está diante de um vício do produto. Mas imagine que a senhora ao sentar para tomar seu café, em virtude da diferença entre os pés da cadeira, vem a cair no chão fraturando a bacia, neste caso se estará diante de um defeito do produto, comumente chamado de acidente de consumo[41].
Neste ínterim a responsabilidade civil decorrente do fato do produto e do vício do produto guarda ligação direta com o defeito e o vício, respectivamente. O fato do produto vem a ser um acontecimento no mundo exterior que causa dano ao consumidor, mas que decorre de um defeito do produto[42], já o vício é um dano de pequena monta decorrente de um vício do produto.
2.2 Excludentes de responsabilidadecivil dentro do Código de Defesa do Consumidor
Conforme explanado, o fornecedor possui meios de se eximir de indenizar o consumidor pelo dano sofrido pelo fato do produto. A maneira pela qual poderá calcar esse direito se encontra disposta dentro da própria legislação consumeirista e dentre regras tradicionais do nosso Direito[43].
Destarte, caberá ao fornecedor de produtos, ônus seu, provar (1) que não colocou o produto no mercado; (2) a inexistência de defeito no produto, (3) culpa exclusiva do consumidor; (4) culpa exclusiva de terceiro. Essas são as excludentes de responsabilidade presentes no Código de Defesa do Consumidor, art. 12, §3, I a II[44].
Outrossim, com base nas regras tradicionais do Direito, o fornecedor de produtos poderá se eximir quando provar que o dano foi proveniente de caso fortuito e força maior[45].
Questão mais complexa, e por seguinte objeto do presente estudo, seria a possibilidade do fornecedor de produtos, invocando a Teoria do Risco do Desenvolvimento, deixar de ser responsabilizado pelo dano causado ao consumidor.
Retomando as questões de excludentes pacíficas em nosso ordenamento e deixando para uma futura análise a complexa, passa-se a esmiuçar o ônus do fornecedor de produtos de provar que não colocou o produto no mercado.
Mostra-se sem sentido, a princípio, mencionar que não haverá a responsabilidade do fornecedor de produtos quando provar que não colocou o produto no mercado. Isto porque, límpido a inexistência de liame entre o dano suportado pelo consumidor e a conduta do fornecedor (deixar de fazer).
Todavia, merece atenção o enunciado, uma vez que goza a presunção lógica de que o produto estando no mercado de consumo, foi introduzido por quem o produziu, montou, criou, construiu, transformou, importou, exportou, distribuiu ou comercializou. A presunção tem guarita no monopólio do conhecimento ligado aos meios de produção que detém o fornecedor de produtos, já debatido.
Nesse compasso, concluir qual seria o momento de colocação do produto no mercado se mostra importante para dirimir a responsabilidade do fornecedor de produtos. Adota-se o pensamento de que o produto é colocado no mercado de consumo “a partir do momento em que o produto é remetido ao distribuidor, ainda que a título experimental, de propaganda ou de testes” [46].
Não parece certa o entendimento do ilustre doutrinador SANSEVERINO[47], ao mencionar que só haveria a colocação do produto no mercado quando o fornecedor de maneira consciente e voluntária o lançar no tráfico comercial. Isto porque estaria acolhendo várias hipóteses em que o fornecedor, por descuido seu, deixa entrar no mercado de consumo produto defeituoso (ver item 2.1).A respeito do tema, o Superior Tribunal de Justiça já se posicionou: “A responsabilidade da fornecedora não está condicionada à introdução consciente e voluntária do produto lesivo no mercado consumidor”[48].
Passemos para a seguinte hipótese eximente, à inexistência de defeito. O defeito do produto consiste no fato gerador da responsabilidade civil no microssistema de consumo. Não basta que o dano sofrido pelo consumidor tenha sido causado por um produto, é fundamental que este produto apresente um vício, que cause lesão ao consumidor.
Isso significa que o fornecedor deve demonstrar que, embora o dano possa ter sido causado por um produto, inexistia defeito[49]. É uma presunção juris tantum de ocorrência de defeito, cabendo ao fornecedor comprovar a sua inexistência, tarefa essa que se mostra das mais espinhosas[50].
Por seguinte, outra excludente de ilicitude prevista no Código do Consumidor é a culpa exclusiva do consumidor ou terceiro. Enaltece o microssistema ao dispor que o fornecedor não será responsabilizado se comprovar a culpa exclusiva, não tendo profundidade a ausência de responsabilização por culpa concorrente.
Diferentemente, há possibilidade da utilização da culpa concorrente do consumidor, para a atenuação do valor imposto ao fornecedor pelo defeito do produto. Nesse sentido coaduna a doutrina majoritária e a jurisprudência.
Nesse diapasão, a culpa exclusiva do consumidor está atrelada a utilização do produto de forma imprudente, negligente ou imperita. A utilização dos requisitos da culpa imputada ao regramento geral da responsabilidade civil serve para que o fornecedor de produtos tenha um direcionamento em sua defesa.
Nesse sentido está o REsp 1.354.369[51], que julga se houve falha na prestação do serviço de transporte terrestre, em virtude de um ônibus ter ido embora da parada obrigatória deixando o passageiro. No julgado há destaque ao fato do passageiro ter deixado de cooperar (negligência) ao não atender o chamado feito pelo auto falante da partida do ônibus, destarte evidenciado a culpa exclusiva do consumidor decorrente da falta do dever de cuidado (negligência).
O tribunal do Rio Grande do Sul também julgou improcedente uma ação de indenização pelo fato ter sido caracterizada causa excludente da responsabilidade do fornecedor, ou seja, os danos foram causados por culpa
exclusiva da consumidora que não seguiu as recomendações do fabricante, agindo de forma imprudente[52].
Para utilização dessa excludente de responsabilidade o fornecedor de produtos deve provar que a conduta do consumidor se erige em causa direta e exclusiva para o acontecimento do evento, sem que haja qualquer defeito no produto como fato ensejador da sua ocorrência.
Já a culpa exclusiva de terceiro atua rompendo o nexo de causalidade entre o defeito e o dano[53]. Nesses casos há intervenção de uma terceira pessoa, alheia a relação de consumo, atuando, de forma exclusiva, para ocorrência do dano ao consumidor.
O tribunal de justiça do Rio Grande do Sul julgou improcedente uma ação de indenização movida contra uma prestadora de serviço público (telefonia) por ausência de sinal, pelo fato de terem ocorrido atos de vandalismo que danificaram as torres de percepção de sinal e furtaram materiais, o que caracteriza a culpa exclusiva de terceiro[54].
O dano só é vivenciado devido à conduta de uma terceira pessoa. Essa conduta deve ser causa exclusiva do dano, completamente independente do comportamento do ofensor demandado (fornecedor), não podendo a ele ser atribuído. Ainda, o terceiro não pode zelar qualquer relação ou vínculo com o fornecedor.
A particularidade reside no fato de não poder ser aplicado à culpa concorrente nesses casos e consequentemente à minoração do valor arbitrado a título de reparação. Em outras palavras não se deve perquiri a culpa concorrente de terceiro no evento danoso. Acontecendo tal hipótese em nada mudará a responsabilização integral do fornecedor.
Impende bradar o apontamento feito por NUNES[55], de que para que haja a efetivo rompimento do nexo de causalidade, o fato de terceiro deve ser de “tal ordem que não pudesse ser previsto como possibilidade dentro da estrutura do risco em cada espécie de negócio”.
Superado os casos de excludentes contidos no Código do Consumidor, passemos a análise das regras tradicionais do nosso Direito que possibilitam a exoneração da responsabilidade civil, o caso fortuito e a força maior, e posteriormente possibilidade de aplicação ou não do risco do desenvolvimento.
A priori, a exegese literal dos dispositivos arts. 12, §3º, e 14, §3º do Código Consumeirista, poderia pensar que não haveria outras causas de exclusão de responsabilidade civil do fornecedor, a não ser as ali dispostas. Ocorre que tal conclusão absurda não se mostra compatível com um juízo de razoabilidade[56].
O microssistema de responsabilidade civil nas relações de consumo deve ser utilizado em sua plenitude, sem que com isso haja a exclusão de outras eximentes, contidas no sistema tradicional de responsabilidade civil, que se mostrem compatíveis. Nesse diapasão o caso fortuito e a força maior são totalmente compatíveis com o Código de Defesa do Consumidor.
Por seguinte importante tecer comentário sobre a definição de caso fortuito e força maior, que é uma das maiores controvérsias do nosso ordenamento pátrio. No presente estudo os dois institutos serão tratados como uníssonos, pois o art. 393, parágrafo único, do Código Civil[57], não faz distinção entre eles e porque os efeitos jurídicos produzidos por eles são iguais, tendo como principal característica a inevitabilidade[58].
Para Gonçalves[59] “o caso fortuito geralmente decorre de fato ou ato alheio à vontade das partes: greve, motim, guerra. Força maior é a derivada de acontecimentos naturais: raio, inundação, terremoto”. Os dois institutos constituem excludentes da responsabilidade porque corroem a relação de causalidade, rompendo-a, entre o ato do agente e o dano sofrido pela vítima.
Entrementes o caso fortuito e a força maior poderiam ser entendidos como um acontecimento inevitável que ocorra fora da esfera de vigilância do fornecedor de produto[60].
Essa esfera de vigilância do fornecedor está intimamente ligada ao momento de colocação do produto no mercado. Nesse ínterim, se o caso fortuito e a força maior acontecerem antes da colocação do produto no mercado, não poderá o fornecedor invocar a excludente, uma vez que tem o dever de constar o defeito do produto[61]. Na contramão, se o caso fortuito e força maior acontecerem depois da colocação do produto no mercado consumidor, comprovando tal acontecimento inevitável pelo fornecedor de produtos, este não será responsabilizado.
Na hipótese do caso fortuito e força maior atuarem de forma concorrente como causa da produção do dano junto ao defeito do produto, não poderá o fornecedor se valer do fato para deixar de indenizar o consumidor, ou atenuar o valor de sua indenização.
3Elementos/requisitos para configuração da responsabilidade civil no código de defesa do consumidor
Para que nasça o dever de indenizar devem estar presentes alguns requistos, consagrados em uma regra que é universalmente aceita contida no art. 186 do Código Civil[62], “Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito”[63]. A cláusula geral de responsabilidade civil é a combinação do art. supra com o art. 927 do Código Civil[64], que dispõe: “Aquele que, por ato ilícito (art. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo”[65].
CAVALIERI FILHO[66] ao analisar a regra geral, sintetiza-a em alguns requisitos, para que ocorra a Responsabilidade Civil: conduta culposa, ato ilícito, dano e nexo causal. A conduta culposa é a ação ou omissão passível de um juízo de reprovação; o ato ilícito é o ato contrário à norma ou costumes; o dano é a ofensa moral ou patrimonial sofrida pela vítima; e o nexo causal é um elemento referencial entre a conduta e o resultado (dano).
Esses requisitos são clássicos, pertencentes da responsabilidade subjetiva que era regra no Código Civil 1916. Porém a grande evolução ocorrida ao longo do século XX na área da responsabilidade civil teve lugar ao largo do antigo código, por meio de leis especiais[67].
Uma dessas leis foi o Código de Defesa do Consumidor, que instituiu a responsabilidade objetiva do fornecedor. Nessa espécie de responsabilidade não é preciso perquirir um dos pressupostos básicos, a culpa, restando tão somente à comprovação do ato ilícito, dano e nexo causal.
Sobre o assunto escreveu ALMEIDA[68]:
“Consagrada a responsabilidade objetiva do fornecedor, não se perquire a existência de culpa; sua ocorrência é irrelevante e sua verificação desnecessária, pois não há interferência na responsabilização. Para a reparação de danos, no particular, basta a demonstração do evento danoso, do nexo causal e do dano ressarcível e sua extensão.”
Ao analisar o Código do Consumidor evidencia-se a formação de requisitos específicos em relação à responsabilidade civil por acidentes de consumo, não atendendo mais as nomenclaturas da regral geral. Nessa leva podem-se enumerar os seguintes pressupostos: o defeito, a imputabilidade, o dano o nexo causal[69].
O defeito refere-se a produtos que não apresentam a segurança que deles legitimamente se espera na sociedade de consumo. A imputabilidade é o nexo de atribuição estabelecido entre o fato do produto e determinado agente, para que ele possa ser considerado responsável[70]. O dano e o nexo detém o mesmo conceito já estabelecido supra.
3.1Produto defeituoso e sua colocação no mercado de consumo
Um produto defeituoso “é aquele que não oferece a segurança legitimamente esperado ou esperável”[71]. Para a caracterização do defeito como pressuposto da responsabilidade civil pelo fato do produto, devem ser examinados alguns pressupostos: (1) o conceito de defeito; (2) os elementos de valoração para identificação de um defeito; (3) e os produtos perigosos abrangidos[72].
O legislador brasileiro, assim como os legisladores europeus, adotou, ao elaborar o Código de Defesa do Consumidor, uma cláusula geral para conceituar defeito. A escolha tem como objetivo abranger uma variedade de fatos de consumo que ocorrem na vida em sociedade, deixando margem para sua aplicabilidade pelo juiz da causa no julgamento de casos concretos. Assim considera-se defeituosos os produtos que não apresentam a segurança legitimamente esperada pela sociedade de consumo (conceito de defeito) [73].
Destarte, do substantivo “defeito”, contido no caput do art. 12, poderia aventar hipóteses, em um rol exemplificativo, como sendo compreendidos os defeitos de projeto, fabricação, construção, montagem, fórmulas, manipulação, apresentação, acondicionamento, oferecimento de informações insuficientes ou inadequadas sobre o risco e a utilização do produto[74].
A identificação do defeito do produto nem sempre é simples, pois podem ocorrer dúvidas sobre sua efetiva ocorrência, para tanto o legislador sugeriu, noart. 12, §1º[75], algumas circunstâncias relevantes a serem observadas (elementos de valoração); sua apresentação; o uso e os riscos que razoavelmente dele se esperam; a época em que foi colocado em circulação[76].
A apresentação do produto guarda ligação com as informações prestadas pelo fornecedor em suas publicidades, ventiladas através dos meios de comunicação ou as informações que acompanham o produto, como rótulo, bula, instruções, advertências[77].
O uso e o risco razoavelmente esperados é a perspectiva de perigo que aquele produto possui. Em cima dessa vocação existem produtos que possuem um grau mais elevado de periculosidade, tais como faca, tesoura, remédios tarja preta. Neles a possibilidade de ocorrência de dano ao consumidor é maior, mas não será por isso que o dano será de responsabilidade do fornecedor.
O consumidor utilizando a faca vem a se cortar por descuido seu, ou um consumidor que deixa a faca ao alcance de seu filho, e este brincando com a faca se corta. Nesses casos não há de se falar em responsabilidade civil pelo fornecedor, uma vez que o produto não possui defeito, pelo contrário, o produto desempenhou com exatidão o que lhe foi proposto, cortar.
Diferente seria o caso do consumidor manuseando a faca se ver cortado pelo fato do cabo do objeto está mal colocado, fazendo com que a lâmina venha a cair em seu pé, ocasionando profundo corte. Nessa situação responde o fornecedor, pois seu produto possui um defeito, que seja a má fixação do cabo com a lâmina da faca.
Devem ser analisadas também outras formas de utilização do produto, segundo critérios razoáveis. O fabricante de produtos para crianças deve prever que além de seu uso normal, este possa a ser colocado na boca pelos menores, não podendo por isso ser tóxicos. Diferente é a utilização incorreta do produto, que não é legitimamente esperada, como a utilização de cola de sapateiro como substância entorpecente ou garrafa de vidro como arma para lesionar outrem[78].
Outro elemento de valoração é o momento no qual o produto é inserido no mercado de consumo, devendo-se “verificar o estado da ciência na época em que houve a introdução do produto no mercado, pois é possível que se passem vários anos até que ocorra um dano”[79]. A colocação de um produto mais tecnológico não torna o antigo defeituoso.
É notória a constante evolução tecnológica na atualidade, que por ricochete, introduz a cada dia produtos com um grau de tecnologia mais elevada, mas esse fato por si não torna o produto defeituoso, e nem poderia. Pois a adotar essa possibilidade, estaria vetando a corrida pelo melhoramento dos produtos e serviços, na medida em que o fornecedor se veria impossibilitado de introduzir novos produtos, sem que ressarcisse o consumidor pelo antigo.
Destarte, ao esmiuçar a ocorrência ou não do defeito, não se deve ficar atrelado somente à data do acontecimento do dano ou da prolação da sentença, o fato deve ser analisado pelo viés da época em que o produto foi colocado em circulação, e a tecnologia existente e utilizada na época[80].
Sobre esse elemento de valoração, época em que o produto foi colocado em circulação, NUNES[81] com infelicidade leciona comentários contrários:
“(…) o inciso III é ininteligível. Gerar acidente de consumo não depende da época em que o produto foi posto em circulação. Não há data que evite defeito. Não é a época que pode determinar se há defeito ou não. Talvez a norma quisesse tratar de garantia e prazos de garantia; se foi isso, fê-lo inadequadamente e de forma obscura. Mas nem precisaria, pois outros artigos cuidam disso (art. 26, 27, 49 e 50). A intenção do legislador parece ter sido a de salvaguardar as velhas tecnologias diante do avanço de novas. Mas escreveu mal. Assim, o inciso III está ligado ao §2º(…).”
O doutrinador ao ligar o inciso III ao §2º do art. 12 do Código do Consumidor comete um equívoco de interpretação. O §2º estabelece um caso específico pelo qual o produto não será considerado defeituoso: “O produto não é considerado defeituoso pelo fato de outro de melhor qualidade ter sido colocado no mercado”[82]. Já o inc. III analisado remete-se a um critério de valoração que o legislador sugeriu, para que, ao analisar o caso concreto, o juiz identifica-se a efetiva ocorrência do defeito.
Os incisos I, II, III, nada mais são, do que elementos de valoração que atuam de maneira a nortear a ocorrência ou não do defeito do produto ou serviço; diferente do § 2º que é um verdadeiro dispositivo que conceitua que o produto de melhor qualidade não torna o de menor qualidade defeituoso.
Entrementes, não serão apenas os elementos de valoração elencados no Código de Defesa do Consumidor a atuar na solução da lide, o rol é exemplificativo, isto está claro pela locução utilizada “entre os quais”. Destarte outras circunstâncias podem ser utilizadas pelo legislador como “a natureza do produto, a ação deletéria do tempo, o preço, o respeito às normas técnicas e aos regulamentos administrativos”[83].
O último pressuposto a ser analisado para a caracterização do defeito na responsabilidade civil pelo fato do produto é saber quais são os produtos perigosos abrangidos pelo sistema de responsabilidade civil do Código do Consumidor. Para dirimir sobre o assunto necessário saber o conceito de produto e as modalidades de produtos perigosos.
O artigo 3º, § 1º do Código do Consumidor, conceitua produto como sendo “qualquer bem, móvel ou imóvel, material ou material”[84]. A utilização do vocábulo produto ao invés de bens, que tem um significado juridicamente mais abrangente, tem a intenção de tornar a lei mais compreensível aos que nela atuam.
SANSEVERINO[85] sobre a controvérsia da utilização do vocábulo bem ao invés de produto analisa da seguinte forma:
“Discute-se, doutrinariamente, se a denominação “bem” não seria mais adequada do que “produto”, já que a primeira é mais abrangente do que a segunda. Apesar da critica de ordem teórica, o vocábulo “produto” utilizado pelo legislador expressa adequadamente o objeto das relações jurídicas de consumo, não ensejando maiores dificuldades na aplicação concreta do microssistema normativo.”
Destarte, o vocábulo produto deve ser utilizado e entendido em seu sentido econômico e universal, como sendo aquilo que é resultado do processo de produção ou fabricação (conceito de produto) [86].
Converge em pensamento NUNES[87] ao analisar o conceito de produto, e a utilização do vocábulo “produto” ao invés de “bens”, dispostos no art. 3º, §1º do Código de Defesa do Consumidor:
“Esse conceito de produto é universal nos dias atuais e está estreitamente ligado à ideia do bem, resultado da produção no mercado de consumo das sociedades capitalistas contemporâneas. É vantajoso seu uso (vocábulo “produto”), pois o conceito passa a valer no meio jurídico e já era usado por todos os demais agentes do mercado (econômico, financeiro, de comunicações etc.).”
Conceituado produto, importante debruçar os olhares sobre a modalidade de produtos perigosos. Isto porque, o consumidor pode vir a sofrer um prejuízo decorrente dos riscos inerentes da própria coisa, já que muitos produtos são naturalmente perigosos, sem que com isso o fornecedor seja responsável.
Existem duas modalidades de produtos perigosos, os intrinsecamente perigosos e os acidentalmente perigosos. Os primeiros são aqueles que apresentam um risco inerente à sua própria qualidade ou modo de funcionamento, não havendo responsabilização do fornecedor, caso este prove a normalidade e previsibilidade da periculosidade intrínseca do produto[88]. São exemplos de produtos intrinsecamente perigosos às armas brancas e as de munição.
Os segundos são aqueles que adquirem uma periculosidade em virtude de um defeito, em suas várias hipóteses, colocando em risco a saúde e a segurança do consumidor. São exemplos de produtos acidentalmente perigosos, uma geladeira que explode, um carro que o freio não funciona, medicamentos adulterados que causam intoxicação. Esses produtos que são o objeto central da responsabilidade no Código do Consumidor pelo fato do produto.
Analisado o conceito de produto defeituoso impende adentrar no momento no qual o produto é inserido no mercado. No primeiro capítulo foi demonstrada a tese adotada sobre o assunto. Considera o produto lançado no mercado a partir do momento em que ele é remetido ao distribuidor, ainda que a título experimental, de propaganda ou de testes[89].
Esse entendimento foi adotado pelo fato de não levar em consideração a vontade do fornecedor. Deste modo, o fornecedor por descuido seu ou por omissão, lançar um produto no mercado será responsabilizado.
Diferente seria se fosse adotado o posicionamento de doutrinadores que levam em consideração o elemento vontade do agente. SANSEVERINO[90] pontua que “a colocação do produto no mercado ocorre no momento em que, consciente e voluntariamente, o fornecedor o lança no tráfico comercial”. ALMEIDA[91] leciona no mesmo sentido, dizendo que a colocação do produto no mercado “é o ato humano, comissivo, de lançar ou fazer ingressar em circulação comercial produto”.
Ao seguir os conceitos de SANSEVERINO e ALMEIDA, e adotar a vontade do agente como pressuposto, estaria dando uma brecha para que o fornecedor não fosse responsabilizado, caso provasse que não colocou o produto no mercado por sua vontade. Estaria prestigiando casos que o fornecedor, por descuido seu ou por sua omissão, deixa ingressar no tráfico comercial produto impróprio para saúde e segurança do consumidor.
Por exemplo, o fornecedor manda para uma de suas fábricas, por caminhão próprio, medicamentos a título experimental para auxiliar na redução de peso. No meio caminho entra as fábricas, o motorista do caminhão vem a perder o controle e tombar o caminhão, derramando os medicamentos as margens da via. Algumas pessoas pegam os medicamentos, utilizando-os ou revendendo-os. Neste caso a empresa não se preocuparia em avisar aos consumidores sobre os riscos, ou tentar retirar do mercado os medicamentos, uma vez que não foi por sua vontade que os produtos foram colocados no mercado, e por consequência ela não seria responsabilizada.
O elemento vontade do agente não deve ser perquirido, concluindo que o produto é colocado no mercado no momento em que ele é remetido ao distribuidor. Vocifera enaltecer o vocábulo “momento”. Isto porque ele faz ligação com o tempo, período no qual o produto é colocado no mercado.
Essa perspectiva é importante, pois nela se verifica uma ótica que deve ser observada para a análise do risco do desenvolvimento, a tecnologia utilizada e conhecida no momento da colocação do produto no mercado.
3.2 A responsabilidade solidária dos fornecedores envolvidos e a tecnologia e ciência utilizada
Antes, porém, de analisar a tecnologia utilizada, preponderante se falar do princípio da solidariedade existente dentro do Código de Defesa do Consumidor. Esse princípio foi estabelecido no art. 7º da legislação consumerista, responsabilizando a cadeia de fornecedores pelos danos causados ao consumidor[92].
De outra visão, o consumidor pode escolher a qual fornecedor demandar a ação de responsabilidade, mesmo em face daquele que não participou diretamente da relação de consumo, isso porque a solidariedade obriga a todos os fornecedores simultaneamente, a reparação integral do dano[93].
Fortalecido o consumidor pelo princípio da solidariedade, pode escolher contra quem demandar processualmente. Assim poderá demandar em face de apenas um dos fornecedores envolvidos na cadeia de consumo, ou contra quantos achar pertinente, incluindo todos se quiser. Trata-se de litisconsórcio facultativo previsto no art. 46 do Código de Processo Civil[94][95].
Outrossim, caso o fornecedor demandado denuncie a lide para com outro fornecedor, cabe ao magistrado indeferi-la, pois isso iria contra o princípio da economia e da celeridade na prestação jurisdicional, ao mesmo tempo que poder-se-ia concluir que a tramitação de duas ações em uma só onerará em demasia o consumidor hipossuficiente, essa é a ratio do Código de Defesa do Consumidor quando proíbe, no art. 88, a denunciação à lide[96].
O consumidor ao escolher contra quem demandar exerce direito previsto em lei, não cabendo ao réu querer se eximir da responsabilização ou dividi-la, com o pretexto da solidariedade, nem outro qualquer, sem prejuízo da ação de regresso em face de outros fornecedores que tenham causado o dano[97].
Conforme visto na excludente de ilicitude “culpa exclusiva de terceiro”, considera-se fornecedor todo aquele que tenha participado da cadeia de consumo. Em outras palavras, a cadeia de consumo abraça todo e qualquer fornecedor que participou para a produção do produto, ou ainda o comercializou.
Todos esses respondem, via de regra, de forma solidária ao consumidor, existindo algumas peculiaridades a serem observados. Em relação ao fato do produto, são responsáveis de forma solidária o fabricante, o produtor, o construtor e o importador.
O comerciante foi excluído da responsabilidade solidária, sua responsabilidade é subsidiária[98], a princípio, isto porque recebe o produto final, sem qualquer possibilidade de modificação ou destes que possam identificar defeitos ocultos. Não há qualquer interferência do comerciante em relação aos aspectos intrínsecos do produto[99].
Noutro giro, ocorrendo às hipóteses do art. 13, I, II e III do Código do Consumidor[100], o comerciante responde solidariamente com os demais fornecedores[101], com isso a cadeia de coobrigados aumenta, não excluindo os demais fornecedores[102]. Portanto, haverá a responsabilidade solidária do comerciante quando os fornecedores não puderem ser identificados; o produto for fornecido sem identificação clara do fabricante, produtor, construtor ou importador; ou quando o próprio comerciante não conservar adequadamente os produtos perecíveis. Analisada a responsabilidade solidária como princípio do Código do Consumidor, volta-i a atenção à tecnologia utilizada para a concepção do produto.
Sabe-se que o produto passa por uma série de etapas antes de poder ser comercializado com a segurança que dele legitimamente se espera. Essas etapas fazem parte de um processo produtivo que dependendo do produto a ser comercializado pode englobar o projeto, a fabricação, a construção, a montagem, ás formulas usadas, a manipulação, a apresentação, o acondicionamento, a distribuição[103].
Nessas etapas são utilizados tecnologias e conhecimentos científicos existentes á época, que podem ser os mais evoluídos ou não. Frisa-se que a não utilização de tecnologias e conhecimentos científicos mais evoluídos não configura em responsabilidade do fornecedor pelo produto colocado no mercado. Isso porque, como visto só a responsabilidade do fornecedor caso seja colocado no mercado de consumo produto com defeito ou vício.
Importante, para a Teoria do Risco do Desenvolvimento, ao analisar a tecnologia e conhecimento científico é verificar se esses são os mais evoluídos possíveis e existentes no mercado, pois como será esmiuçado no tópico seguinte, essa teoria refere-se a um defeito impossível de ser conhecido e evitado no momento em que o produto foi colocado em circulação, em razão do estágio da ciência e da tecnologia[104]. Ou seja, caso o defeito seja possível de ser previsto pela ciência e tecnologia da época, não se estará diante da teoria do risco do desenvolvimento.
Um exemplo clássico é a pílula de farinha, caso já apreciado pelo Superior Tribunal de Justiça[105]. O medicamento era um anticonceptivo que ao invés de conter os componentes para evitar a gravidez, continha farinha. Neste caso não se estaria diante da teria do risco do desenvolvimento, uma vez que, a ciência e tecnologia da época saberiam dos efeitos do medicamento. Diferente é o caso, também do setor de medicamentos, da Talidomida, que era um medicamento utilizado como calmante para as gestantes contendo substancias que, posteriormente, constatou-se serem causadores de complicações e deformações em crianças[106], neste caso a ciência e tecnologia da época não eram suficientemente avançadas para conhecer do dano.
O produto com novas tecnologias para ser inserido no mercado é submetido a diversos testes com as tecnologias e conhecimentos científicos existentes a época, para atestar a sua segurança ao mercado de consumo. Ocorre que com os avanços científicos, os defeitos que não eram identificados com os antigos testes, agora são.
É certo que o advento das novas tecnologias e conhecimentos científicos faz parte do evoluir humano estando num permanente rejuvenescer de concepções e sentidos. Entretanto essas inovações podem estar trazendo riscos impossíveis de serem previsto pelo conhecimento científico a época de sua utilização. Qualquer nova tecnologia traz risco ao meio ambiente e a saúde humana, por isso o fornecedor deve agir de modo precaucioso ao colocar no mercado produto com nova tecnologia, impondo-lhe o dever de informação ostensiva e adequada[107].
Noutro ponto, as novas tecnologias e ciências utilizadas para a produção de produtos não são repassadas a sociedade, ficam restritas as empresas. Essas novas tecnologias fazem parte da evolução natural dos produtos que são inseridos a cada dia no mercado. Esses novos produtos são levados a diversos testes tanto pelos fornecedores como também pelas autoridades governamentais. Mesmo assim, às vezes só é possível saber o resultado que o produto terá, com a sua colocação no mercado e pela evolução do sistema tecnológico e científico[108].
4 Teoria do risco do desenvolvimento
Antigamente entendia-se que o consumidor ao se atrever consumir determinado produto, o fazia por sua conta em risco. Havia uma espécie de culpa concorrente, na qual o consumidor concorria para o sinistro. O fornecedor só era responsabilizado caso comprovado sua culpa exclusiva[109].
Tratava-se da responsabilidade civil baseada na culpa lato sensu, pela qual havia a necessidade de comprovação de culpa ou dolo do agressor, para nascer o dever de indenizar. As relações de consumo inevitavelmente levavam a acidentes de consumo, nos quais era quase impossível ao consumidor comprovar a culpa do fornecedor[110].
No decorrer dos tempos, viu-se a necessidade de mudança desse pensamento, uma vez que a culpa passou a ser um empecilho para o desenvolvimento social sustentável. O fornecedor ficava impune, não se preocupava com a qualidade dos produtos que eram colocados em circulação. Nessa senda, a jurisprudência verificando a necessidade de solucionar o imbróglio, caminhou para a superação da culpa, a inversão do ônus da prova até se chegar à teoria do risco[111][112].
A evolução ocorrida no campo do direito do consumidor trouxe diversos mecanismos de defesa ao consumidor, que funcionam como niveladores entre as partes na relação de consumo. Não obstante esses mecanismos, ao fornecedor é dado a possibilidade de se defender com as excludentes de responsabilidade dispostas dentro da própria legislação consumeirista e dentre regras tradicionais do nosso Direito[113] (vide item 2.2).
Questão polêmica em relação a excludente de responsabilidade do fornecedor é o risco do desenvolvimento, que tem relação com o alto grau de industrialização e os constantes avanços de tecnologia[114].
O vocábulo risco do desenvolvimento ou de desenvolvimento é utilizado ao mesmo tempo como conceito de algo[115], ora como excludente[116]. Na verdade o risco de desenvolvimento é sim um conceito, que estudado dentro de uma teoria irá ser ou não uma excludente. Em outras palavras a Teoria do Risco do Desenvolvimento irá estudar se o risco do desenvolvimento será ou não uma excludente de responsabilidade.
4.1Conceito
A teoria do risco do desenvolvimento visa definir se o defeito existente no produto ou serviço, impossível de ser conhecido e evitado no momento em que o produto ou serviço foi colocado em circulação, em razão do estágio da ciência e da tecnologia, irá ser de responsabilidade do fornecedor de produto ou serviço.
CAVALIERI FILHO[117] conceitua o risco do desenvolvimento da seguinte forma:
“Entende-se por risco do desenvolvimento o defeito impossível de ser conhecido e evitado no momento em que o produto foi colocado em circulação, em razão do estágio da ciência e da tecnologia. É aquele defeito que não pode ser cientificamente conhecido no momento do lançamento do produto no mercado, vindo a ser descoberto somente após um período de uso do produto, como ocorre com certos medicamentos novos – vacinas contra o câncer, drogas contra AIDS, pílulas para melhorar o desempenho sexual, etc”.
Em outras palavras, o produto é colocado no mercado oferecendo a segurança que dele legitimamente se esperava, ante os testes para colocação do produto no mercado realizados com a ciência e a tecnologia existentes e disponíveis. Em momento posterior, com o avanço da ciência e da tecnologia, descobre-se que aquele produto ou serviço tido como seguro, na verdade causa danos ao consumidor. Poderia ser tratado como excludente de responsabilidade o risco do desenvolvimento?
Impende bradar que a mais avançada tecnologia e conhecimento científico não poderiam identificar o defeito no produto ou serviço no momento da sua colocação em circulação, para que haja a configuração do risco do desenvolvimento. Não importa se a tecnologia e ciência utilizada para a produção do produto era a que melhor dispunha o fornecedor, a que ele melhor podia fornecer; se essa tecnologia e ciência não eram as mais desenvolvidas não está configurado o risco do desenvolvimento[118].
Outra questão que deve ser levada em consideração são as produções científicas. Se há estudos apontando para uma possível possibilidade de dano por determinada substância ou prática de serviço, o fornecedor já tem que levar em consideração essas ponderações, e assumir a responsabilidade pelos danos se efetivados em momento futuro[119]. Nesse caso também não estaria configurado o risco do desenvolvimento.
Nessa senda, o famoso caso da pílula de farinha também não se encaixaria no objeto de estudo do risco do desenvolvimento, uma vez que qualquer conhecimento científico da época poderia prever que o “medicamento” não surtiria o efeito desejado, qual seja o método anticonceptivo, gerando gravidez indesejada.
Não se confunde também o risco do desenvolvimento com o enunciado do art. 12, §1º, inc. III do Código do Consumidor. Sobre o assunto leciona SANSEVERINO[120]:
“Não se confundem os riscos de desenvolvimento com a legítima expectativa do consumidor em relação à qualidade e à segurança do produto na época em que foi colocado em circulação. Na legítima expectativa do consumidor, o produto ou o serviço não apresentava defeito na época em que foi colocado em circulação, mas é superado, posteriormente, pelo surgimento de outros produtos ou serviços mais seguros e de melhor qualidade. É a situação cada vez mais frequente no setor de automóveis, em que a preocupação com a segurança, freios ABS, air bag. Os carros antigos, que não possuem esses equipamentos, não se tornam defeituosos pelas inovações operadas no mercado de consumo.”
Na mesma direção aponta CAVALIERI FILHO[121]:
“Convém, todavia, não confundir o risco do desenvolvimento com a hipótese prevista no art. 12, § 1.º, III, do CDC- a época em que o produto foi colocado em circulação. No primeiro caso, o produto é objetivamente defeituoso no momento de sua colocação no mercado, sem que, no entanto, o estado de desenvolvimento da ciência e da técnica permitissem sabê-lo. No segundo, o produto é perfeito por corresponder às legítimas expectativas de segurança na sua época, apenas superado por produto mais novo, em razão de aperfeiçoamentos científicos e tecnológicos introduzidos pelo fornecedor.”
Ou seja, não existe defeito no momento da colocação do produto no mercado, apenas há uma evolução na tecnologia que torna o produto novo de melhor qualidade[122]. Assim difere o risco do desenvolvimento, pelo fato do defeito já existir no momento da colocação do produto no mercado, só não sendo conhecido ante o estágio da ciência e tecnologia da época[123].
A corrente contra a responsabilização do fornecedor pelo risco do desenvolvimento tem como principais argumentos o fato de que ao atribuir o ônus ao fornecedor iria desestimular pesquisa, o investimento, tornando a atividade demasiadamente onerosa e sem competitividade, frustrando o lançamento de novos produtos. Ainda, ao assumir os riscos do desenvolvimento o preço final dos produtos seria elevado, levando a uma dificuldade ou impossibilidade dos consumidores usufruírem do produto já que as indenizações pagas pelos fornecedores seriam repassadas ao preço do produto[124][125].
Essa última questão é de importante valor. Ao se pensar que o produto encarecido é um carro de luxo, poder-se-ia dizer que a população não iria sofre drasticamente, afetando apenas uma pequena parcela; mas ao pensar que este produto poderia ser um remédio utilizado para o combate da AIDS e do câncer, a situação muda totalmente, causando imensa revolta, inclusive a efeito mundial[126].
Em outra direção, a corrente que defende a responsabilização do fornecedor pelo risco do desenvolvimento tem como principais argumentos (1) o fato do risco do desenvolvimento não estar elencado como causa de excludente dentro do Código de Defesa do Consumidor; (2) o fornecedor se preocuparia mais com as consequências do produto colocado em circulação; (3) teria como o fornecedor suportar os efeitos do risco do desenvolvimento, sem ser sobrecarregado, uma vez que possui mecanismos como o seguro e o repasse dos custos das indenizações ao produto.
No direito comunitário europeu houve intenso debate sobre o risco do desenvolvimento, sendo objeto de vigoroso loby por parte de consumidores e empresários, acabando por ser adotada uma solução intermediária, através da diretiva 85/374/CCE, na qual cada Estado membro pudesse deliberar sobre a eximente. Apesar do grande esforço empregado pelo Conselho da Comunidade Econômica Europeia, para que se estabelecesse regramento unívoco para todos os Estados-membros[127].
Frisa-se que a diretiva em seu art. 7º, alínea “e” prevê expressamente a exclusão da responsabilidade do fornecedor pelo risco do desenvolvimento, flexibilizando, porém, no art. 15º, letra “b”, a possibilidade para cada Estado membro deliberar sobre o assunto[128].
Estados como a Finlândia, Noruega e Luxemburgo afastaram completamente a eximente. A Espanha a previu de maneira restritiva, excluindo a sua aplicabilidade em casos de medicamentos e produtos agrícolas. Mas a grande maioria, Portugal, Alemanha, Reino Unido, Itália e outros, acabaram dispondo sobre o risco do desenvolvimento como uma eximente[129].
Importante mencionar que mesmo nos países que adotaram o risco do desenvolvimento como uma eximente, sua aplicação não é tão simples. Sobre o assunto escreveu BENJAMIN[130]:
“A análise do grau de conhecimento científico não é feita tomando por base um fornecedor em particular. Importam, ao revés, as informações científicas disponíveis no mercado. Ou seja: pouco interessa o que um determinado fornecedor sabe, mas sim o que sabe a comunidade científica. Uma das consequências que se podem daí extrair é o dever do fornecedor, em especial do fabricante, de acompanhar e controlar o comportamento de seus produtos e serviços, mesmo após a sua comercialização. E, quanto maiores os seus perigos potenciais, mais intensiva deve ser a obrigação de acompanhamento e controle.”
O risco do desenvolvimento está ligado principalmente a casos no setor de medicamentos, o mais famigerado é o do medicamento Talidomida,desenvolvido na Alemanha e comercializado em 146 países a partir de 1957, incluindo o Brasil[131]. O calmante ministrado a gestante contendo uma substancia capaz de ultrapassar a barreira placentária e interferir na formação do feto, causando-o deformações conhecidas como Focomelia, que é o encurtamento dos membros com consequente aparência de foca[132].
O aumento de casos de bebes que nasceram com Focomelia vez com que diversos pesquisadores se engajassem a procura da origem do problema. A confirmação que o medicamente era o responsável só veio em 1961. Houve diversas mortes atribuídas ao medicamente. Ainda, estima-se que até o início dos anos 60 pelo menos 20 mil pessoas ao redor do mundo foram vítimas das deformidades[133], sendo o caso um divisor de águas.
Pode-se dizer que o caso foi primeiro a chamar a atenção mundial sobre o grande potencial lesivo e efeitos jurídicos para disciplinar resultados que foram identificados como “riscos do desenvolvimento” [134].
No Brasil, onde também existem vítimas do evento, o Estado editou a Lei 7070 de 20 de dezembro de 1982[135], que reconhece o direito a danos materiais, estipulando especial, mensal, e vitalícia e intransferível as vítimas a ser paga pela Previdência. A solução proposto pelo Estado foi a socialização do dano por meio da tributação, sendo portando, custeado pelos contribuintes[136]. Frisa-se que o Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento de que a edição da lei não estabelece uma relação de solidariedade entre o laboratório e a União “vez que se trata de lei previdenciária e que, por seu conteúdo, não determina ser essa responsável, direta ou indiretamente, pelos danos causados aos beneficiários” [137].
CAVALIERI FILHO[138] cita outros casos de aplicação da teoria do risco do desenvolvimento:
“Nos Estados Unidos, entre 1960 e 1962, um outro medicamento anticolesterol chamado MER-29, provocou graves defeitos visuais em milhares de pessoas – mais de cinco mil -, inclusive cegueira, e, por isso, foi também retirado do mercado. Todos nos lembramos da vacina Salk, contra a poliomielite. Por um defeito de concepção, essa vacina acabou provocando a doença em centenas de crianças na Califórnia. Na França, em 1972, o Talco Morhange causou intoxicação em centenas de crianças, levando algumas delas à morte, também em decorrência de um defeito de concepção”.
Outras searas de aplicação da teoria são as áreas técnicas e científicas, como fazem exemplos os alimentos transgênicos, nanotecnologias, cosméticos e outros[139][140][141].
4.2 Teoria do Risco do Desenvolvimento no Brasil
O risco do desenvolvimento não foi tratado expressamente no regramento brasileiro, assim como aconteceu na comunidade Europeia, levando a um debate na doutrina.
STOCO[142] defende que o fornecedor não deve ser responsabilizado pelo risco do desenvolvimento. Começa a defender sua tese, referindo-se a Carta Magna de 1988, que atribui poder a legislação infraconstitucional para regulamentar a relação de consumo. No Código de Defesa do Consumidor houve omissão voluntária do legislador sobre o tema, refletida no art. 10, §1º[143], que preceitua que posteriormente a colocação do produto ou serviço no mercado, tiver o fornecedor conhecimento da periculosidade deles, deve informar imediatamente as autoridades competentes e aos consumidores, através de anúncios publicitários. Dessa maneira, reconheceu o legislador à possibilidade de o produto, após sua colocação em circulação, apresentar perigo para o consumidor, preferindo não responsabilizar o fornecedor pelo risco do desenvolvimento, mas apenas impor a comunicação às autoridades e consumidores através de anúncios.
O doutrinador supra, cita e adere ao pensamento de SOUZA[144], que acolhe a eximente risco do desenvolvimento combinando as regras do art. 10º e do art. 12º, §1º, inc. III, combinado com o §3º, inc. II, do Código do Consumidor. Desenvolve sua tese interpretando os artigos ventilados, afirmando que ao fornecedor é lícito colocar em circulação produto que não saiba nem deveria saber resultarem perigosos porque o grau de conhecimento científico à época da introdução do produto no mercado de consumo não permitia tal conhecimento. Concluindo que o risco do desenvolvimento se encaixa no disposto art. 12º, §3º, inc. II do Código do Consumidor, por não existir defeito no produto no momento da sua colocação no mercado de consumo.
Na contramão, CAVALIERI FILHO[145], entende que o risco do desenvolvimento é espécie do gênero defeito de concepção. Ou seja, é defeito, e consoante art. 12º, §3, inc. II e art.14º, §3, inc. I deve ser o fornecedor responsabilizado por sua existência.
SANSEVERINO[146] entende que a eximente risco do desenvolvimento não se perfila com o regramento brasileiro, que adota a responsabilidade objetiva. Ao pensar que se poderia eximir o fornecedor caso ele provasse a ausência de conhecimento específico da época, estaria, de certa forma, retornando ao sistema de responsabilidade subjetiva. Conclui que o risco do desenvolvimento se encaixa como defeito de projeto ou concepção do produto ou serviço contido de maneira expressa no art. 12º e 14º caput.
Importante demonstrar a diferença entre do que ocorre no caso de caso fortuito e força maior, eximentes aceitas pela doutrina e jurisprudência, mas que não possuem tratamento expresso dentro do Código do Consumidor, do caso da aplicabilidade do risco do desenvolvimento que também não possui tratamento expresso. No primeiro caso, as eximentes são aceitas, ante a ausência de tratamento expresso, pelo fato de já pertencerem ao sistema tradicional de responsabilidade[147]. Já no segundo, não há qualquer referência no sistema tradicional, seria acolher uma eximente que ocasionaria uma lesividade grande ao consumidor, o que não se amolda com o sistema paternalista do Código de Defesa do Consumidor, que detém a responsabilidade, delegada pela Carta Magna, de defender o ser hipossuficiente e vulnerável da relação de consumo.
A jurisprudência pátria vem devagar enfrentando o tema, direta ou indiretamente. O Tribunal de Justiça de São Paulo[148], ao julgar uma ação de indenização por danos morais e materiais decorrentes de erro no exame pericial, realizado por determinado instituto, reconheceu que à época, o exame não era suficiente, dadas suas limitações técnicas, passível de auferir o ponto controvertido da demanda com exatidão. Salientou que a técnica utilizada era a mais avançada, inexistindo “defeito” na prestação do serviço. Destarte, pressupôs que a pretensão buscava responsabilização pelo risco do desenvolvimento, o que não era admissível, pois apesar de ausência de fundamentação legal expressa, o legislador tratou sobre o assunto, de maneira indireta nos art. 10, § 1º e 12, § 2° do Código de Defesa do Consumidor, deliberando por não inserir qualquer causa de responsabilidade decorrente da evolução da técnica.
O Tribunal de Justiça deSanta Catarina ao enfrentar uma pretensão reparatória de danos morais por morte em decorrência do uso prolongado do cigarro julgou improcedente a ação por inexistência do defeito. Especificamente em relação ao risco do desenvolvimento, alertou que o produto cigarro possui periculosidade inerente, que não se confunde com a adquirida, sendo que o demandado (fornecedor de produtos-cigarro) colocou no mercado produto que atendia as especificidades da época. Neste momento faz um gancho à Teoria do Risco do Desenvolvimento, dispondo não ser possível responsabilizar o fornecedor “se a comunidade científica naquela ocasião desconhecia com precisão a extensão dos riscos inerentes ao hábito de fumar” [149].
Em outra direção o Tribunal de Justiça do Espírito Santo entendeu que o risco do desenvolvimento não pode ser encarado como uma eximente. Ao analisar uma pretensão de dano moral e material, na qual o demandante alega ter adquirido Hepatite C ao realizar uma transfusão de sangue no demandado/hospital nos anos de 1982, enfrenta o tema objeto do presente estudo de forma indireta, fazendo uma analogia. Dispõe que se “eventualmente se descubra dano potencial não detectável à época do evento – risco e dano intrinsecamente ligados à própria atividade do fornecedor – caracteriza o que se conhece como fortuito interno”, caso não exonerativo de responsabilidade civil no código consumeirista. Continua fazendo uma suposição que mesmo que o vírus da hepatite C fosse desconhecido à época, deveria ser responsabilizado o demandado pelo risco do desenvolvimento, uma vez que a prestação do serviço hospitalar possui “risco inerente” assumido pelo demandado com base na teoria do risco[150].
5Conclusão
No primeiro capítulo observou-se a grande evolução que aconteceu na responsabilidade civil tradicional para se chegar à responsabilidade civil nas relações de consumo. O aumento das relações de consumo tornou o sistema de responsabilidade civil do código do consumidor de grande destaque, tendo um campo de incidência mais vasto que o da responsabilidade tradicional. A necessidade da evolução teve como escopo proteger o consumidor, vulnerável e hipossuficiente em relação ao fornecedor. Assim a responsabilidade baseada na culpa, que era regra, foi substituída pela responsabilidade objetiva.Não obstante ser aplicado à responsabilidade objetiva, a comprovação de outros requisitos se mostram necessários para que nasça o dever de indenizar. Desta forma, o fornecedor pode se ausentar de indenizar o consumidor caso comprove as excludentes presentes no código do consumidor e no sistema tradicional de responsabilidade civil, questão mais polêmica seria a possibilidade de aplicar a eximente risco do desenvolvimento.
No segundo capítulo os requisitos para configuração da responsabilidade civil nas relações de consumo foram tratados, com atenção aos específicos do sistema consumeirista. Verificou-se que nem sempre a constatação do defeito é fácil, motivo pelo qual o legislador elencou elementos para ajudar na sua caracterização. Observou-se a grande preocupação do Código do Consumidor em defender o consumidor em todos os momentos, utilizando de conceitos gerais que abrangem uma variedade de fatos de consumo que ocorrem na vida em sociedade, inclusive estabelecendo uma solidariedade entre a cadeia de fornecedores.
No terceiro capítulo a Teoria do Risco do Desenvolvimento foi abordada, visando desemaranhar conceitos, casos, julgados sobre a eximente do risco do desenvolvimento no ordenamento pátrio. Exprimiu-se que a teoria abarca uma lesividade grande de danos nas relações de consumo. Os casos e suas possibilidades de acontecimento tendem a alcançar uma grande quantidade de consumidores. Motivo pelo qual a possibilidade de acolher ou não a eximente causa impacto aos fornecedores. Apesar disso o código do consumidor não abordou o tema de maneira expressa. Por isso, há grande movimentação paradecidir se a eximente pode ser aceita no ordenamento pátrio. Os pontos favoráveis à aceitação da teoria têm alicerce na evolução do mercado de consumo e os negativos focam no prejuízo que seria causado ao consumidor.
Analisado o sistema de responsabilidade civil pelo fato do produto e a Teoria do Risco do Desenvolvimento, conclui não ser possível a aplicação da eximente dentro do ordenamento jurídico pátrio, pela incompatibilidade e por ausência de tratamento específico pela lei.
Dentre os principais pontos ventilados, por parte da doutrina que aceita a aplicabilidade da eximente, observa a preocupação de se onerar excessivamente o fornecedor, o que impediria o desenvolvimento tecnológico e o avanço do mercado de consumo. A verdade é que o mercado de consumo sempre está em constante evolução, cada vez mais se observa que o lançamento de novos produtos, de melhor qualidade ou ineditismos, é primordial para a permanência do fornecedor no mercado. Ou seja, a atribuição do risco do desenvolvimento não iria frear a evolução do mercado de consumo, uma vez que o lançamento de novos produtos é algo vital para a continuidade do fornecedor.
O fornecedor não seria capaz, mesmo que quisesse, de interromper o lançamento e a pesquisa sobre novos produtos. O atrativo financeiro do mercado de consumo faz com que o fornecedor se aventure no mercado, auferindo lucro, em contrapartida deve ser responsabilizado pelos riscos que sua atividade pode causar. Não é possível transferir o ônus ao consumidor vulnerável e hipossuficiente.
Ainda em relação ao mercado de consumo, a tese que haveria uma retração, com consequente impacto financeiro se mostra em contrassenso com o que aconteceu com Países da União Europeia que afastaram completamente a eximente. Finlândia, Noruega e Luxemburgo, não sofreram retratação em suas economias por causa da escolha. E mais, o que deve ser perquirido, não é somente o crescimento do mercado de consumo, e sim o crescimento atrelado com o desenvolvimento sustentável das partes da relação de consumo. Em outras palavras, a relação de consumo, figurada pelo consumidor e o fornecedor, deve evoluir de maneira que todos sejam favorecidos; não é usufruindo o lucro, o fornecedor, e atribuindo o ônus ao consumidor, especificamente o do risco do desenvolvimento, que será possível tal premissa.
Outro ponto a ser analisado verte sobre o encarecimento dos produtos, ante o repasse feito pelos fornecedores das indenizações pelo risco do desenvolvimento. A principal preocupação é de que os produtos fiquem tão caros, chegando ao ponto que os consumidores não possam usufruí-los. Apesar da ressalva feita em relação aos produtos ligados a saúde, vide item 4.1, o encarecimento em demasia dos produtos, retiraria os mesmos do mercado de consumo, que é altamente competitivo, sendo o preço algo determinante para a escolha do produto. O encarecimento na verdade, não seria tão exorbitante assim, uma vez que os fornecedores possuem mecanismos para evitar o aumento vultoso dos preços, como o seguro, já mencionado. A produção em massa, refletida pela enorme quantidade de produtos lançados no tráfico comercial, também favorece o não encarecimento, uma vez que pode se dividir a indenização por cada produto lançado.
Poderia se pensar que ao atribuir o risco do desenvolvimento ao fornecedor seria algo extremamente oneroso. Se o risco é considerado demasiadamente grande para ser suportado pelos fornecedores, não seria também insuportável para o consumidor? A partir da indagação, reflete-se que não há como atribuir o ônus ao consumidor, pelo risco do desenvolvimento, uma vez que atrelado ao princípio da equidade, é do fornecedor, sujeito com maior capacidade técnica e financeira, a responsabilidade de arcar com a grande capacidade lesiva detida pelo risco do desenvolvimento.
Deve ser rechaçada a tese de que o legislador brasileiro ao tratar sobre o risco do desenvolvimento deliberou não inserir qualquer causa de responsabilidade decorrente da evolução da técnica, apenas um dever de informação as autoridades competentes, com fundamento na redação dada aos arts. 10, § 1º e 12, § 2° do Código de Defesa do Consumidor. Com base na inspiração do legislador brasileiro para a elaboração do Código do Consumidor, na diretiva Europeia, que tratava expressamente da exclusão de responsabilidade pelo risco do desenvolvimento, ao não mencionar taleximente no rol dos arts. 12, §3 e 14, §3 do Código, presume-se na verdade, ao revés, que tal eximente não pode ser aplicada, por ausência de previsão expressa.
Por todo exposto, não se pode admitir que o risco do desenvolvimento seja suportado pelo consumidor ante a ausência de previsão legal e pelo fato de haver incompatibilidade com o ordenamento pátrio.
Advogado
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