A responsabilização tributária dos condomínios edilícios pelas fazendas municipais

Resumo: A natureza jurídica dos condomínios edilícios é um tema altamente controverso no âmbito da doutrina civilista. Essa indefinição levanta questionamentos a respeito da possibilidade de indicá-los como contribuintes, especialmente por parte dos Municípios. O artigo ora proposto busca elucidar a questão, e verificar se há embasamento legal para tanto no ordenamento pátrio.

Palavras-chave: condomínio edilício, responsabilidade tributária, municípios.

Abstract: The legal nature of condominiums is a highly controversial subject within the doctrine civilist. This uncertainty raises questions about the possibility to display them as taxpayers, especially by the Municipalities. The article proposed here seeks to elucidate the issue, and see if there are legal grounds for both the paternal order.

Keywords: building condominium, tax liability, municipalities.

Sumário: Introdução. 1. Conceito de condomínio edilício. 1.1. Condomínio. 1.2. Condomínio edilício. 1.3. Natureza jurídica do condomínio edilício. 2. Personalidade jurídica no código civil. 3. Responsabilidade e capacidade tributárias e a previsão do código tributário nacional. 4. Possibilidade de responsabilização tributária dos condomínios edilícios – a visão da jurisprudência. Conclusões. Referências Bibliográficas.

INTRODUÇÃO

A responsabilidade tributária – isto é, a transferência da responsabilidade de recolher aos cofres públicos os valores decorrentes de tributos – vem se transformando, no decorrer dos anos, numa importante ferramenta de controle e incremento da arrecadação.

Essa ferramenta visa em sua essência facilitar o controle do Fisco e ainda a cobrança do tributo devido, prevenindo a sonegação. Um exemplo é a dita substituição tributária “para frente” prevista no art. 150, § 7º da Constituição Federal[1], amplamente aplicada ao ICMS (Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e sobre Prestações de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação), prevista no art. 155, inciso II da Carta Constitucional, de competência dos Estados e do Distrito Federal.

O seu uso tem se disseminado em várias legislações nas três esferas do Governo, especialmente em relação a tributos onde a evasão é historicamente elevada. Nos municípios, é regra a previsão de responsabilidade tributária para o Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISSQN), dentro dos limites da Lei Complementar 116/03.

Normalmente, figuram como responsáveis tributários tanto pessoas físicas, quanto jurídicas, ainda que isentas ou imunes. Entretanto, a colocação dos condomínios edilícios nesta posição sempre sofreu grande resistência por parte dos municípios, que em sua grande maioria não preveem a possibilidade da inclusão dessa entidade no rol dos contribuintes.

Por outro lado, a jurisprudência vem entendendo que os condomínios edilícios podem figurar no polo passivo de diversas demandas, inclusive naquelas em que se discute lides tributárias. Alem disso, já há um debate no âmbito da doutrina civilista sobre a possibilidade ou não de se reconhecer que eles possuem personalidade jurídica.

A discussão que ora proposta é verificar, a partir do estudo das características do condomínio edilício, e ainda das regras gerais tributárias contidas no Código Tributário Nacional (CTN), se há ou não possibilidade de se indicar o condomínio edilício como integrante do polo passivo tributário.

1. CONCEITO DE CONDOMÍNIO EDILÍCIO

1.1 Condomínio

Antes de se conceituar o estatuto do condomínio edilício, é necessário dominar o que é um condomínio.

O condomínio é uma forma de compartilhamento da propriedade, onde duas ou mais pessoas são proprietárias do mesmo bem. Está previstos no arts. 1.314 e 1315 do Código Civil (CC):

 “Art. 1.314. Cada condômino pode usar da coisa conforme sua destinação, sobre ela exercer todos os direitos compatíveis com a indivisão, reivindicá-la de terceiro, defender a sua posse e alhear a respectiva parte ideal, ou gravá-la.

Parágrafo único. Nenhum dos condôminos pode alterar a destinação da coisa comum, nem dar posse, uso ou gozo dela a estranhos, sem o consenso dos outros.

Art. 1.315. O condômino é obrigado, na proporção de sua parte, a concorrer para as despesas de conservação ou divisão da coisa, e a suportar os ônus a que estiver sujeita”.

Sobre o tema, leciona Carlos Roberto Gonçalves apud Barouch e Milão (2013): “Em regra, a propriedade de qualquer coisa pertence a uma só pessoa. Pode-se dizer que a noção tradicional de propriedade está ligada à idéia de assenhoreamento de um bem, com exclusão de qualquer outro sujeito. Mas há casos em que uma coisa pertence a duas ou mais pessoas simultaneamente. Essa situação é designada por indivisão, com propriedade, comunhão ou condomínio”.

Assim, no condomínio todos os proprietários – ditos condôminos – tem direitos iguais, podendo inclusive reivindicar de terceiro, e obrigações iguais, como a divisão das despesas em comum, proporcionalmente à sua parte.

1.2. Condomínio edilício

O condomínio edilício foi originalmente regulado pela Lei 4.591/64, posteriormente revogada em quase sua totalidade pelos artigos 1.331 a 1.354 do Código Civil.

Em sua essência, o condomínio edilício é um tipo sui generis de condomínio, que permite que existam ao mesmo tempo areas de propriedade comum a todos os condôminos, e areas privativas de cada um desses condôminos, as chamadas unidades imobiliárias.

É o que se depreende do caput do art. 1.331: “Art. 1.331. Pode haver, em edificações, partes que são propriedade exclusiva, e partes que são propriedade comum dos condôminos”.

Ensina Maria Helena Diniz apud Barouche e Milão (2013): “Condomínio edilício é aquele constituído como resultado de um ato de edificação. É uma mistura de propriedade individual e condomínio, caracterizando-se juridicamente pela justaposição de propriedades distintas e exclusivas ao lado do condomínio de partes do edifício forçosamente comuns, como o solo em que está construído o prédio, suas fundações, pilastras, área de lazer, vestíbulos, pórticos, escadas, elevadores, corredores, pátios, jardim, porão, aquecimento central, morada do zelador, etc. Cada condômino tem uma fração ideal do condomínio, que representa a parte que o dono do apartamento tem no terreno em que está construído o prédio. Cada proprietário de fração autônoma (apartamento, sala de utilização profissional, garagem) pode usar livremente das partes comuns, atendendo à sua destinação e não prejudicando a comunhão”.

Desta maneira, o condomínio edilício é uma forma diferenciada de propriedade, onde se admite que haja compartilhamento das áreas comuns, ao mesmo tempo em que há frações individualizadas, que podem inclusive ser comercializadas independentemente da vontade dos demais condôminos.

Sua constituição se dá através do seu registro na matrícula do imóvel, bem como da sua convenção em registro auxiliar, ambos no Registro de Imóveis competente (art. 1.332 e 1.333 do CC).

1.3. Natureza jurídica do condomínio edilício

Há na doutrina civilista um debate a respeito da natureza jurídica do condomínio edilício, que basicamente discute a possibilidade de se atribuir ou não personalidade jurídica a esse instituto.

Aqueles que não admitem a personalidade jurídica do condomínio edilício reconhecem tão somente a personalização judiciária, ou seja, a capacidade de ser representado em juízo pelo síndico, prevista no art. 11, inciso IX do Código de Processo Civil.

Como bem observado por Nadja Machado Botelho (2003, p. 04), os condomínios edilícios carecem de personalidade jurídica:

“O condomínio não é pessoa jurídica; não existe nele um ente dotado de personalidade, composto do conjunto de co-proprietários, com direitos sobre a coisa comum. Também não há uma personificação do acervo patrimonial, ad instar do que se passa com as fundações.

Na verdade, o condomínio constitui modalidade especial de propriedade, direito real por excelência, não sendo, portanto, pessoa, nem se aproximando da associação. […]”

Na visão desses doutrinadores, o condomínio edilício é na verdade um direito real complexo, e o conjunto de proprietários representados pelo síndico carecem da verdadeira unidade em torno de objetivos comuns, a exemplo do que ocorre nas associações.

Por outro lado, já existem aqueles que enxergam a possibilidade de reconhecer a personalidade jurídica ao condomínio edilício. Essa visão é calcada principalmente na complexidade cada vez maior das relações estabelecidas por essas entidades, e que forçam o reconhecimento do aprimoramento do instituto.

Para Marcelo Guimarães Rodrigues (2009, p. 02):

“O condomínio edilício tem sido considerado sob os mais diversos enfoques: ‘ente jurídico’, persona ficta (ou ‘moral’, ‘intelectual’, ‘coletiva), denominação que, do ponto de vista do jusnaturalismo, conceitua comunidades ou corporações, ou ‘comunidade de interesses ativos e passivos’. Não obstante possa se distinguir perfeitamente dos titulares de cada uma das unidades autônomas, não é enquadrado como uma pessoa jurídica em sentido estrito, de igual forma como se dá com outros entes formais, tais como o espólio da herança jacente ou vacante, a massa falida, a sociedade irregular, etc.

Todavia, não se pode deixar de apontar algumas assimetrias na composição desse rol.

De início, releva observar o caráter transitório dos demais entes formais, o que torna despiciendo conferir a tais situações jurídicas uma proteção mais abrangente. Já no condomínio edilício, ocorre justamente o contrário, de sorte que sua instituição é, se não perpétua, ao menos perene, o que justifica sob vários aspectos, inclusive da segurança jurídica, a definição de sua personalidade.

Lado outro, revela o ato de sua instituição a conjugação de todos os requisitos exigidos para a válida constituição da pessoa jurídica: a) a vontade humana criadora, com o direcionamento volitivo de várias pessoas em torno de uma finalidade comum e de um novo organismo; b) o cumprimento das condições legais de sua formação; c) liceidade de seus propósitos; d) a forma prescrita ou não defesa em lei; e) o obrigatório registro público na circunscrição imobiliária respectiva com eficácia constitutiva e oponível perante terceiros”. (grifos em negrito de nossa autoria)

Fato é que a lei civil não reconhece expressamente o condomínio edilício como pessoa jurídica, com todos os reflexos que isso implica. Entretanto, essa ausência de autorização legal não impede a crescente complexidade das relações que essa entidade tem adquirido, nem os reflexos (trabalhistas, tributários, civis, etc.) que essas relações tem tanto para os condôminos quanto para terceiros.

2. PERSONALIDADE JURÍDICA NO CÓDIGO CIVIL

O Código Civil estabelece no art. 1o o conceito de personalidade jurídica: “Toda pessoa é capaz de direitos e deveres na ordem civil”.

Dessa maneira, possuir personalidade civil é possuir, numa conceituação simples, a capacidade de exercer direitos e, por outro lado, cumprir deveres. E essa é uma atribuição tanto de pessoas naturais, quanto jurídicas.

Porém, ao contrário das pessoas naturais, que adquirem personalidade jurídica no momento do nascimento (art. 2o do Código Civil[2]), as pessoas jurídicas somente adquirem sua personalidade através da lei. Plácido e Silva apud Perret (2004, p. 364) leciona: “Em oposição à pessoa natural, expressão adotada para indicação da individualidade jurídica constituída pelo homem, é empregada para designar as instituições, corporações, associações e sociedades, que, por força ou determinação da lei, se personalizam, tomam individualidade própria, para constituir uma entidade jurídica, distinta das pessoas que a formam ou que a compõe. Diz-se jurídica porque se mostra uma encarnação da lei. E, quando não seja inteiramente criada por ela, adquire vida ou existência legal somente quando cumpre as determinações fixadas por lei. … a pessoa jurídica somente tem existência quando o Direito lhe imprime o sopro vital. Criando-se ou as confirmando, é, pois, o Direito que determina ou dá vida a estas entidades, formadas pela agremiação de homens, pela patrimonização de bens, ou para cumprir, segundo as circunstâncias, a realização do próprio Estado”. (grifos em negrito de nossa autoria)

Assim, para a pessoa jurídica a personalidade somente nasce se e quando os requisitos legais estiverem presentes, especialmente quanto à previsão legal expressa de atribuição dessa personalidade.

A principal característica concedida à pessoa jurídica em função da sua personalização é a distinção entre ela e as pessoas físicas que dela fazem parte, com a separação inclusive patrimonial.

3. RESPONSABILIDADE E CAPACIDADE TRIBUTÁRIAS E A PREVISÃO DO CÓDIGO TRIBUTÁRIO NACIONAL

A responsabilização tributária é a transferência da obrigação de recolher o tributo devido, do contribuinte original para um terceiro com relação direta com o fato tributário.

Essa transferência se dá por determinação expressa de lei, e está regulamentada no art. 128[3] do CTN.

À guisa do tema, ensina Eduardo Sabbag (2011, p. 695):

“Em princípio, o tributo deve ser cobrado da pessoa que pratica o fato gerador. Nessas condições, surge o sujeito passivo direto (“contribuinte”). Em certos casos, no entanto, o Estado pode ter necessidade de cobrar o tributo de uma terceira pessoa, que não o contribuinte, que será o sujeito passivo indireto (“responsável tributário”).

Em sentido estrito, é a sujeição passiva indireta a submissão ao direito de crédito do Fisco, em virtude da expressa determinação legal, de a situação que corresponda ao fato gerador (art. 128 do CTN)”.

O instituto da responsabilidade tributária é usado primordialmente para facilitar o controle, por parte do Fisco, do pagamento das obrigações tributárias, já que via de regra, as pessoas indicadas como responsáveis são mais facilmente alcançadas. Nas palavras de Harada (2006, p. 490): “Razões de ordem prática na arrecadação tributária fizeram com que o Direito Tributário introduzisse expedientes vários em prol da comodidade administrativa, entre eles, a transferência da responsabilidade pelo crédito tributário do sujeito passivo natural para um terceiro, desde que haja expressa previsão legal”.

Entretanto, a transferência da responsabilidade tributária passa necessariamente pela capacidade tributária, isto é, pela possibilidade de figurar no polo passivo tributário.

A capacidade tributária esta prevista no art. 126 do Código Tributário Nacional (CTN):

“Art. 126. A capacidade tributária passiva independe:

I – da capacidade civil das pessoas naturais;

II – de achar-se a pessoa natural sujeita a medidas que importem privação ou limitação do exercício de atividades civis, comerciais ou profissionais, ou da administração direta de seus bens ou negócios;

III – de estar a pessoa jurídica regularmente constituída, bastando que configure uma unidade econômica ou profissional”.

A lei tributária não adotou o conceito de capacidade civil, e sim um conceito próprio de capacidade tributária. Ou seja, para figurar no polo passivo basta a previsão legal, não sendo óbice a falta de capacidade civil, ou mesmo de personalidade jurídica. Nesse sentido, legislam Alexandrino e Paulo (2007, p. 210):

“Toda e qualquer pessoa, física ou jurídica, em qualquer situação, inclusive as pessoas jurídicas não regularmente constituídas e as sociedades de fato, tem capacidade passiva, sem nenhuma exceção.

Ter capacidade passiva significa apenas ter possibilidade de realizar o fato gerador de obrigação tributária. Não importa se a cobrança poderá ser feita diretamente da pessoa que realizou o fato gerador ou terá que ser feita de um representante. A pessoa que tem relação direta com o fato gerador da obrigação principal é contribuinte, mesmo que a cobrança não seja feita diretamente contra ele. Assim, um recém-nascido pode ser proprietário de um imóvel urbano; o contribuinte do IPTU é ele. […]

Para enfatizar: somente as coisas, os animais e os mortos não tem capacidade tributária!

O CTN entendeu por bem fazer uma lista exemplificativa de situações que não interferem na capacidade tributária passiva. A lista é desnecessária porque, repetimos, nenhuma circunstância interfere na capacidade tributária passiva. [..]” (grifos em negrito de nossa autoria).

A possibilidade de a lei tributária dar significado diverso para institutos previstos em outros ramos do Direito está expressamente previsto no art. 109 do CTN: “Os princípios gerais de direito privado utilizam-se para pesquisa da definição, do conteúdo e do alcance de seus institutos, conceitos e formas, mas não para definição dos respectivos efeitos tributários”.

Desta feita, no que concerne ao Direito Tributário, pode ser indicado como responsável tributário todo aquele que tenha relação direta com a obrigação, desde que a lei assim preveja.

4. POSSIBILIDADE DE RESPONSABILIZAÇÃO TRIBUTÁRIA DOS CONDOMÍNIOS EDILÍCIOS – A VISÃO DA JURISPRUDÊNCIA

A natureza jurídica do condomínio edilício, e por extensão, a existência ou não da sua personalidade jurídica tem sido tema de debate na jurisprudência. Dentre as areas em que esse debate é trazido à tona estão lides relacionadas à responsabilidade civil (indenizações por danos morais e/ou materiais), reclamações trabalhistas, alem de decisões versando sobre questões tributárias.

No campo tributário, a questão sobre a existência ou não de capacidade tributária para os condomínios edilícios foi levantada indiretamente, através da discussão da existência ou não de personalidade jurídica.

E, em sua maioria, os julgados tem caminhado no sentido de reconhecer que, apesar de não possuir personalidade jurídica, o condomínio edilício pode sim figurar no polo passivo tributário. Portanto, seria sim detentor de capacidade tributária.

O Superior Tribunal de Justiça, através de julgado relatado pelo Ministro Humberto Martins, pronunciou-se assim sobre o tema:

“TRIBUTÁRIO. CONDOMÍNIOS EDILÍCIOS. PERSONALIDADE JURÍDICA PARA FINS DE ADESÃO À PROGRAMA DE PARCELAMENTO. REFIS. POSSIBILIDADE. 1. Cinge-se a controvérsia em saber se condomínio edilício éconsiderado pessoa jurídica para fins de adesão ao REFIS. 2. Consoante o art. 11 da Instrução Normativa RFB 568/2005, os condomínios estão obrigados a inscrever-se no CNPJ. A seu turno, a Instrução Normativa RFB 971, de 13 de novembro de 2009, prevê, em seu art. 3º, § 4º, III, que os condomínios são considerados empresas- para fins de cumprimento de obrigações previdenciárias. 3. Se os condomínios são considerados pessoas jurídicas para fins tributários, não há como negar-lhes o direito de aderir ao programa de parcelamento instituído pela Receita Federal. 4. Embora o Código Civil de 2002 não atribua ao condomínio a forma de pessoa jurídica, a jurisprudência do STJ tem-lhe imputado referida personalidade jurídica, para fins tributários. Essa conclusão encontra apoio em ambas as Turmas de Direito Público: REsp411832/RS, Rel. Min. Francisco Falcão, Primeira Turma, julgado em18/10/2005, DJ 19/12/2005; REsp 1064455/SP, Rel. Ministro Castro Meira, Segunda Turma, julgado em 19/08/2008, DJe 11/09/2008.Recurso especial improvido. (STJ – REsp: 1256912 AL 2011/0122978-6, Relator: Ministro HUMBERTO MARTINS, Data de Julgamento: 07/02/2012, T2 – SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJe 13/02/2012)”. (grifos em negrito de nossa autoria).

Alinhando-se a esse pensamento, o Tribunal de Justiça do Distrito Federal  (TJ-DF) pronunciou-se sobre a possibilidade do condomínio edilício figurar como contribuinte da Contribuição sobre a Iluminação Pública – CIP, em julgado proferido nos autos do Agravo de Instrumento 193919120088070000, em julgado relatado pelo Desembargador Teófilo Caetano:

“TRIBUTÁRIO. CONTRIBUIÇÃO DE ILUMINAÇÃO PÚBLICA – CIP. CONDOMÍNIO. SUJEITO PASSIVO. QUALIFICAÇÃO. DEFINIÇÃO. MODIFICAÇÃO. LEI COMPL EMENTAR Nº 699/04. SUSPENSÃO DE COBRANÇA. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. IMPOSSIBILIDADE. 1. A cobrança da contribuição de iluminação pública – cip no âmbito do distrito federal fora instituída pela lei complementar nº 637/92, que introduzira o artigo 4º-a na lei complementar nº 04/94 – código tributário do distrito federal -, definindo o fato gerador e o contribuinte da exação, cuja conceituação fora alterada pela lei complementar nº 699/04, que, de seu turno, passara a qualificar como sujeito passivo do tributo o titular ou responsável por unidade consumidora constante do cadastro da concessionária de distribuição de energia elétrica, conforme regulamentação da agência nacional de energia elétrica – aneel, exceto os das classes rural e iluminação pública. 2. Desde a inovação impregnada na conceituação legal do contribuinte da contribuição de iluminação pública – cip, o sujeito passivo do tributo se confunde, portanto, com o titular ou responsável por unidade consumidora constante do cadastro de distribuição de energia elétrica, donde, em sendo inexorável que o condomínio edilício, conquanto despersonalizado, assume certas obrigações e titulariza determinados direitos, usufruindo dos serviços de energia elétrica fornecidos pela concessionária de distribuição de energia elétrica, efetivamente se inscreve na conceituação de sujeito passivo da exação, dela não podendo ser alforriado. 3. Agravo conhecido e provido. Unânime. (TJ-DF – AI: 193919120088070000 DF 0019391-91.2008.807.0000, Relator: TEÓFILO CAETANO, Data de Julgamento: 11/03/2009, 4ª Turma Cível, Data de Publicação: 01/04/2009, DJ-e Pág. 35)”. (grifos em negrito de nossa autoria).

Chama atenção o fato de que as decisões retro apresentadas indicam que a falta de personalidade jurídica civil não obsta a figuração passiva dos condomínios edilícios nas relações jurídico-tributárias.

Dentre os julgados encontrados, destaca-se o proferido pelo STJ nos autos dos Embargos no Recurso Especial 446955 SC 2005/0076989-6, da relatoria do Min. Luiz Fux:

“PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA. TRIBUTÁRIO. CONTRIBUIÇÕES SOCIAIS PREVIDENCIÁRIAS DEVIDAS PELOS EMPREGADOS, TRABALHADORES TEMPORÁRIOS E AVULSOS. CONSTRUÇÃO CIVIL. DONO DA OBRA E CONSTRUTOR OU EMPREITEIRO. SUBSTITUTOS TRIBUTÁRIOS. RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA (SÚMULA 126/TRF – ANTERIOR À PROMULGAÇÃO DA CF/88). RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA (CF/88 ATÉ A LEI 9.711/98). RESPONSABILIDADE PESSOAL DO TOMADOR DO SERVIÇO DE EMPREITADA DE MÃO-DE-OBRA (LEI 9.711/98). 1. O sujeito passivo da obrigação tributária, que compõe o critério pessoal inserto no conseqüente da regra matriz de incidência tributária, é a pessoa que juridicamente deve pagar a dívida tributária, seja sua ou de terceiro (s). 2. O artigo 121 do Codex Tributário, elenca o contribuinte e o responsável como sujeitos passivos da obrigação tributária principal, assentando a doutrina que: "Qualquer pessoa colocada por lei na qualidade de devedora da prestação tributária, será sujeito passivo, pouco importando o nome que lhe seja atribuído ou a sua situação de contribuinte ou responsável" (Bernardo Ribeiro de Moraes, in "Compêndio de Direito Tributário", 2º Volume, 3ª ed., Ed. Forense, Rio de Janeiro, 2002, pág. 279). 3. O contribuinte (também denominado, na doutrina, de sujeito passivo direto, devedor direto ou destinatário legal tributário) tem relação causal, direta e pessoal com o pressuposto de fato que origina a obrigação tributária (artigo 121, I, do CTN). 4. Em se tratando do responsável tributário (por alguns chamado sujeito passivo indireto ou devedor indireto), não há liame direto e pessoal com o fato jurídico tributário, decorrendo o dever jurídico de previsão legal (artigo 121, II, do CTN). Acerca do tema, há doutrina no sentido de que: "… qualquer pessoa obrigada ao pagamento de tributo de que não é o contribuinte de direito figura na condição de responsável tributário. Não vislumbramos qualquer distinção possível na figura do retentor que é, sim, responsável tributário por substituição." (Leandro Paulsen, in"Direito Tributário – Constituição e Código Tributário à Luz da Doutrina e da Jurisprudência", 8ª ed., Ed. Livraria do Advogado e Escola Superior da Magistratura Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2006, pág. 1.000). 5. A responsabilidade tributária por substituição ocorre quando um terceiro, na condição de sujeito passivo por especificação da lei, ostenta a integral responsabilidade pelo quantum devido a título de tributo. "Enquanto nas outras hipóteses permanece a responsabilidade supletiva do contribuinte, aqui o substituto absorve totalmente o debitum, assumindo, na plenitude, os deveres de sujeito passivo, quer os pertinentes à prestação patrimonial, quer os que dizem respeito aos expedientes de caráter instrumental, que a lei costuma chamar de 'obrigações acessórias'. Paralelamente, os direitos porventura advindos do nascimento da obrigação, ingressam no patrimônio jurídico do substituto, que poderá defender suas prerrogativas, administrativa ou judicialmente, formulando impugnações ou recursos, bem como deduzindo suas pretensões em juízo para, sobre elas, obter a prestação jurisdicional do Estado." (Paulo de Barros Carvalho, in "Direito Tributário – Fundamentos Jurídicos da Incidência", Ed. Saraiva, 4ª ed., 2006, São Paulo, págs. 158/177). 6. A responsabilidade tributária, quanto aos seus efeitos, pode ser solidária ou subsidiária (em havendo co-obrigados) e pessoal (quando o contribuinte ou o responsável figura como único sujeito passivo responsável pelo recolhimento da exação). […] 18. A Lei 9.711/98, entretanto, que introduziu a hodierna redação do artigo 31, da Lei 8.212/91 (terceiro regime legal que se vislumbra), instituiu técnica arrecadatória via substituição tributária, mediante a qual compete à empresa tomadora dos serviços reter 11% (onze por cento) do valor bruto da nota fiscal ou fatura de prestação dos mesmos, bem como recolher, no prazo legal, a importância retida. Cuida-se de previsão legal de substituição tributária com responsabilidade pessoal do substituto (in casu, o condomínio tomador do serviço de empreitada de mão-de-obra), que passou a figurar como o único sujeito passivo da obrigação tributária. […] (STJ – EREsp: 446955 SC 2005/0076989-6, Relator: Ministro LUIZ FUX, Data de Julgamento: 08/04/2008, S1 – PRIMEIRA SEÇÃO, Data de Publicação: DJ 19.05.2008 p. 1)”. (grifos em negrito de nossa autoria).

O longo mas altamente didático julgado não afasta – antes pelo contrário, afirma tacitamente – a prerrogativa legal da Fazenda em indicar o condomínio edilício (ou qualquer outra pessoa com relação indireta com o fato gerador), como responsável tributário, seja como substituto, seja como responsável subsidiário.

CONCLUSÕES.

A natureza jurídica do condomínio edilício tem suscitado grandes discussões entre os civilistas. Apesar de ter as feições de um direito real complexo, ele tem figurado em relações jurídicas cada vez mais sofisticadas. E essa nova realidade força um debate saudável sobre a necessidade ou não de evolução desse instituto legal.

Contudo, o mesmo dilema não enfrenta o Direito Tributário, pois a capacidade tributária independe da personalidade civil, conforme o art. 121 do CTN já determina. Desta feita, é perfeitamente possível a colocação dos condomínios edilícios como responsáveis tributários, com sujeição inclusive a obrigações acessórias, tais como a inscrição do cadastro mobiliário municipal, e a entrega de declarações de cunho econômico-fiscal.

É esse o caminho que algumas legislações municipais já tomaram, podendo ser citadas como exemplo leis dos municípios de Campinas/SP[4], Curitiba/PR[5] e Salvador/BA[6]. Também a União adotou essa postura, ao estabelecer a responsabilidade tributária para vários tributos como o PIS/Pasep[7], Cofins[8] e Imposto de Renda[9].

Nada obstante, a maioria das legislações silencia sobre o tema, deixando à margem a possibilidade de ampliar o controle e o pagamento do ISSQN. E é sabido que os condomínios edilícios são consumidores de serviços que por sua vez nem sempre são adequadamente registrados em documentos fiscais, a exemplo do que ocorre com as pessoas físicas.

Tambem a posição da jurisprudência – notadamente o STJ – tem referendado essa posição legal, ao dissociar a necessidade de personalidade jurídica da possibilidade de o condomínio edilício figurar como contribuinte, caso a lei assim o determine.

O Município pode aumentar a abrangência do seu universo de contribuintes, e pode fazê-lo ao exigir que o condomínio edilício seja responsável tributário, e que faça sua inscrição junto ao cadastro mobiliário municipal, dentre outras obrigações acessórias.

Essa exigência deve ser feita via lei no tocante à responsabilização tributária do condomínio edilício, especialmente porque geralmente a legislação municipal prevê somente que pessoas jurídicas devem figurar como responsáveis tributárias.

Assim a lei municipal deve ser específica, e incluir expressamente os condomínios edilícios no rol de contribuintes responsáveis. Já em relação às obrigações acessórias a solução vai depender de como a legislação tributária municipal trata a questão. O mais recomendado é que essas obrigações sejam previstas de maneira genérica na lei, com remessa do detalhamento dessa obrigação para decreto.

 

Referências
ALEXANDRINO, Marcelo; PAULO, Vicente. Manual de Direito Tributário. 5a ed., rev. e atual. Impetus: Niterói, 2007.
BAROUCHE, Tônia de Oliveira; MILÃO, Diego Antônio Perini. A responsabilidade no condomínio edilício. Disponível em www.ambito-juridico.com.br/site/?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=10671&revista_caderno=7. Acesso em 10 jun 2013.
BOTELHO, Nadja Machado. Condomínios Edilícios – Ausência de Personalidade Jurídica – Personalidade Judiciária – Regime Tributário e o Simples. Disponível em http://www2.camara.leg.br/documentos-e-pesquisa/publicacoes/estnottec/tema5/pdf/2003_5577.pdf. Acesso em 19 jun 2013.
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituiçao.htm>. Acesso em: 05 jun 2013.
BRASIL. Lei 5.172 de 25.10.1966 – Código Tributário Nacional. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L5172.htm>. Acesso em: 05 jun 2013.
BRASIL. Lei 10.406 de 10.01.2002. Código Civil. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406.htm>. Acesso em: 05 jun 2013.
BRASIL. Lei 5.869 de 11.01.1973. Código de Processo Civil. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l5869.htm>. Acesso em: 05 jun 2013.
HARADA, Kyioshi. Direito Financeiro e Tributário. 15ª ed. rev. e ampl. São Paulo: Atlas, 2006.
RODRIGUES, Marcelo Guimarães. Personalidade Jurídica do Condomínio Edilício. Disponível em http://www.ejef.tjmg.jus.br/home/files/publicacoes/artigos/082010.pdf. Acesso em 19 jun 2013.
SABBAG, Eduardo. Manual de Direito Tributário – Edição Atualizada. Ed. Saraiva: São Paulo. 3a ed., 2011.
Notas:
[1] Art. 150. […]
§ 7º A lei poderá atribuir a sujeito passivo de obrigação tributária a condição de responsável pelo pagamento de imposto ou contribuição, cujo fato gerador deva ocorrer posteriormente, assegurada a imediata e preferencial restituição da quantia paga, caso não se realize o fato gerador presumido.
[2] Art. 2o A personalidade civil da pessoa começa do nascimento com vida; mas a lei põe a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro.
[3] Art. 128. Sem prejuízo do disposto neste capítulo, a lei pode atribuir de modo expresso a responsabilidade pelo crédito tributário a terceira pessoa, vinculada ao fato gerador da respectiva obrigação, excluindo a responsabilidade do contribuinte ou atribuindo-a a este em caráter supletivo do cumprimento total ou parcial da referida obrigação.
[4] Lei 12.392/05, art. 14, inciso III, letra g.
[5] Lei Complementar 40/01, art. 8o, par. 1o.
[6] Lei 7186/06, art. 99, inciso VI.
[7] Art. 10, IV da Lei nº 10.833/2003.
[8] Art. 2º da Lei nº 9.718/1998; art. 1º caput das Leis nº 10.637/2002 e 10.833/2003
[9] Art. 620 e seguintes do RIR /99.

Informações Sobre o Autor

Claudia Roveri

Auditora fiscal tributária no município de Blumenau desde 1998 é Bacharel em Direito e pós-graduada em Direito Tributário e Controle da Gestão Pública Municipal. Foi professora universitária entre os anos de 2007 e 2009 na Uniasselvi unidades Blumenau e Indaial e já publicou vários artigos. Atualmente é Conselheira Suplente no Conselho Municipal de Contribuintes e professora em cursos nos campos de Direito Tributário e Direito Administrativo


Equipe Âmbito Jurídico

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