Sumário: 1. Introdução. 2. Desenvolvimento. 2.1. Os limites objetivos da coisa julgada no controle difuso e no controle concentrado de constitucionalidade. 3. Conclusão. Referências bibliográficas.
1. Introdução
Abordaremos nesse breve estudo um tema que se encontra em franca revolução no direito brasileiro, que é a utilização da teoria dos motivos determinantes da sentença no controle difuso de constitucionalidade.
2. Desenvolvimento
Para situar o tema, primeiro temos de fazer breve incursão no direito processual civil, para compreendermos o que ordinariamente faz coisa julgada numa sentença.
Em nosso escopo, importa a análise dos limites objetivos da coisa julgada, pelos quais se estabelecem o objeto e os contornos de proteção da coisa julgada, a partir da norma jurídica concreta e individualizada, criada pelo Poder Judiciário, a partir do pedido feito pela parte e o que lhe foi entregue no dispositivo da sentença ou acórdão que julgou a lide (art. 468 do CPC), ficando de fora do âmbito dos seus efeitos os motivos, as verdades dos fatos e as questões prejudiciais incidentais (art. 469 do CPC). Nesse sentido diz Didier Jr.:
“As questões resolvidas na fundamentação da decisão judicial não ficam acobertadas pela coisa julgada material (art. 469 CPC). Por esta razão, tudo que é ai analisado pelo magistrado pode ser revisto em outros processos, que envolvam as mesmas ou outras partes, não se submetendo os julgadores desses outros processos às soluções alvitradas na motivação das decisões anteriores. A coisa julgada material, conforme se verá no capítulo próprio, torna intangível apenas o conteúdo da norma jurídica concreta estabelecida no dispositivo da decisão judicial.” (DIDIER JR., Fredie. 2010, p. 291-296).
Assim, o que ordinariamente faz coisa julgada numa sentença ou acórdão é a regra do dispositivo, ficando de fora a ratio decidendi , que são os motivos determinantes da deliberação, os quais incluem as principais razões jurídicas pelas quais, por exemplo, se concluiu pela (in)validade de determinado dispositivo.
2.1. Os limites objetivos da coisa julgada no controle difuso e no controle concentrado de constitucionalidade.
No controle concentrado de constitucionalidade o Supremo Tribunal Federal atribui efeitos vinculantes também aos fundamentos determinantes da decisão e os aplica a outras ações. Pedro Lenza adverte que nessa hipótese, o STF vem entendendo que a ‘razão da decisão’ passa a vincular outros julgamentos” (in Direito Constitucional Esquematizado. 12 ed. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 171).
Luís Roberto Barroso, ao tratar especificamente da teoria da transcendência dos motivos determinantes, afirma que, “por essa linha de entendimento, tem sido reconhecida eficácia vinculante não apenas à parte dispositiva do julgado, mas também aos próprios fundamentos que embasaram a decisão. Em outras palavras: juízes e tribunais devem acatamento não apenas à conclusão do acórdão, mas igualmente às razões de decidir” (in O Controle de Constitucionalidade no Direito Brasileiro. 2 ed. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 184).
No controle difuso de constitucionalidade, a incompatibilidade da legislação infraconstitucional perante a Constituição é aferida incidentalmente como questão prejudicial (incidenter tantum). Não é o objeto principal do pedido, como nas ações diretas. Em regra, nesse tipo de ação de controle de constitucionalidade, apenas o dispositivo tem efeito vinculante às partes daquele processo. A ratio decidendi, que é a análise da constitucionalidade da norma, assim como o próprio dispositivo, não teriam efeitos vinculantes e erga omnes. A maneira de estender a toda comunidade jurídica os efeitos dessa decisão está no procedimento do art. 52, X da Constituição da República, com a comunicação da decisão ao Senado, a quem cabe suprimir o texto reconhecido como inconstitucional, pelo quorum da reserva de plenário do art. 97 da CFRB.
No entanto, nos últimos anos, o sistema de controle difuso de constitucionalidade está em franca revolução jurídica e está se aproximando do controle concentrado em relação aos seus efeitos. Há clara objetivação das decisões prolatadas no controle difuso, como a edição de súmulas vinculantes, as reclamações ao STF para dar aplicação a outros processos de decisões prolatadas no controle difuso, o instrumento da repercussão geral, a introdução do parágrafo único ao art. 741 do CPC, entre outros.
Na esteira dessa tendência, surge a aplicação da teoria da transcendência dos motivos determinantes no controle difuso de constitucionalidade. É que necessariamente precisa ser aplicada essa teoria para que a decisão em processo inter-partes tenha efeitos a terceiros, já que o dispositivo nesse tipo de ação tratará do bem da vida, que não interessa a terceiros. O STF, capitaneado pelo Min. Gilmar Mendes, vem decidindo nesse sentido, para dar efeito automático a essas decisões, conforme se depreende nas Reclamações n° 4335 e 2986. O Ministro declarou ser caso de mutação constitucional, pelo qual caberia ao Senado a tarefa de apenas dar publicação ao que foi decidido pela Corte Suprema.
3. Conclusão
Ainda é cedo para afirmamos se vai prevalecer a teoria que encampou a possibilidade da aplicação da teoria dos motivos determinantes da sentença no controle difuso de constitucionalidade no Brasil. Decisões recentes do STF indicam que sim e apontam no sentido da mutação constitucional.
Há valores em colisão. Por um lado está a autoridade do Supremo, a força normativa da Constituição e a isonomia. De outro, há o próprio texto da Constituição, que mesmo sempre sujeito à interpretação, não pode ter seus termos frontalmente contrariados. Também, há os princípios da separação dos poderes e o princípio democrático (não podemos esquecer que nosso Judiciário não é eleito). Há que se ter em mente que há muita diferença entre os sistemas do controle abstrato e do controle difuso de constitucionalidade. Este nasce entre partes, visa diretamente a bem da vida, tem qualquer pessoa como legitimada ativa, dentre inúmeras outras diferenças. Assim, causa preocupação dar-se o mesmo feito a processos tão distintos, não obstante as inegáveis vantagens que tal mutação constitucional poderia proporcionar.
Neste particular, Pedro Lenza menciona que “na medida em que a análise da constitucionalidade da lei no controle difuso pelo STF não produz efeito vinculante, parece que somente mediante necessária reforma constitucional (modificando o art. 52, inc. X, e a regra do art. 97) é que seria possível assegurar a constitucionalidade dessa nova tendência – repita-se, bastante ‘atraente’- da transcendência dos motivos determinantes no controle difuso, com caráter vinculante”.
Procurador da Fazenda Nacional. Membro da Fundação Escola Superior de Direito Tributário. Pós-graduando em Direito Público pela Universidade Anhanguera-Uniderp.
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