Resumo: Breve análise da visão de Hart sobre o positivismo, a teoria geral do Direito e a importância para a interpretação e aplicação das regras jurídicas. Inicialmente trata-se da distinção entre direito natural e direito positivo, da definição e tipos de regras, a relevância dos princípios, o conceito do Direito e sua separação da moral e o reconhecimento da discricionariedade. E, enfim nos famosos embates com Lorde Devlin e com Ronald Dworkin e sua influência na jurisprudência brasileira atual.
Palavras-chave: Hart. Positivismo. Regra. Legalidade. Interpretação. Aplicação do Direito.
Abstract: Brief analysis on the vision of Hart's positivism, the general theory of law and the importance for the interpretation and application of legal rules. Initially it is the distinction between natural law and positive law, the definition and types of rules, the relevance of the principles, the concept of law and your separation of morality and the recognition of discretion. And finally the famous clashes with Lord Devlin and Ronald Dworkin and its influence on current Brazilian’s jurisprudence.
Keywords: Hart. Positivism. Rule. Legality. Interpretation. Application of Law.
A legalidade sempre serviu como principal ponto de acusação aos adversários do positivismo jurídico. E a descrição do positivismo por Hart que representa um dos mais importantes juristas do século XX desenvolve preciosa argumentação visando enfim conservar a salutar separação entre o direito e a moral.
A obra de Herbert Lionel Adolphus Hart (professor de Filosofia em Oxford) sob o título “Positivism and separation of Law and Morals” que corresponde ao ápice do desenvolvimento teórico do positivismo jurídico especialmente para a distinção entre direito e moral e sua relação com a obediência das leis.
Trata-se de ponto fulcral de ataque dos jusnaturalista ao positivismo, por correlacionar as graves consequências dos totalitarismos da segunda guerra mundial.
Desde o dilema grego apresentado por Sófocles na pela Antígona, onde o tirano Creonte insiste em aplicar as leis da polis, porém Antígona as viola por considerar que as leis dos deuses são eternas, irrevogáveis e superiores aos códigos dos homens e, por essa razão, devem ser obedecidas. Creonte, tirano de Tebas, promulgou lei proibindo que aqueles que atentassem contra a polis[1] fossem sepultados e, desta forma, estabeleceu a morte como pena por desobediência.
Polinices, irmão de Antígona, havia combatido na guerra contra seu irmão Etéocles que apoiava Creonte. Etéocles era considerado herói de guerra, e fora sepultado com todas as honras de guerreiro ilustre, porém, Polinices não. Inconformada Antígona seguiu o direito divino que determinava que um membro da família deveria ser sepultado por seus parentes ou seu espírito não teria descanso.
Por desobedecer as leis da polis, Antígona fora condenada a ser sepultada vivo, mas declarou estar de consciência tranquila por ter agido conforme o que ordenavam as mais sagradas leis dos deuses.
Para Antígona[2] viver com o conhecimento de sua incapacidade de agir seria negar o significado à sua vida e fazer desta uma “não-existência”. Enquanto que Creonte considerava que o governante, a que o Estado conferia poder, deveria ser obedecido até as mínimas coisas fossem justas ou injustas e justificou sua atitude com a afirmação de que a desobediência do governante era uma desgraça, esta destrói os Estados, leva lares a ruína e, nos combates, traz consigo a derrota dos exércitos ( Sófocles, 1994).
A velha distinção conceitual entre o direito positivo e o direito natural está presente em toda tradução do pensamento jurídico ocidental, sendo o direito natural àquilo que é por natureza enquanto que o direito positivo é aquele posto ou convencionado pelos homens.
O direito natural[3] como ideia abstrata do fenômeno jurídico, pretendendo corresponder a uma justiça superior (e que pode até mesmo confrontar com o texto da lei). Assim, para respeitar um sentimento de justiça, o direito natural admite soluções diferenciadas, a partir de inspirações ilimitadas. O principal traço característico do direito natural é o reconhecimento da existência de um direito, de uma justiça, anterior e acima e do direito positivo vigente.
Aristóteles foi considerado por meio como o “pai do direito natural”, mesmo no período do pré-socrático já havia defensores como Pitágoras, Heráclito e Sófocles que desenvolveram a ideia de que o antes do direito positivo estava o logos divino e os próprios deuses.
Na Idade Média, o direito natural vinculou-se a Deus e conforme aduz São Tomás de Aquino deve presidir a prática humana. A filosofia estóica[4] muito influenciou a doutrina moderna do jusnaturalismo e, foi marcada pela generalidade, racionalidade, caráter subjetivo e a tendência para a positividade.
Também se desenvolveu sob a ambiência do idealismo cartesiano e pela busca do saber racional e estável[5]. O jusnaturalismo baseou-se na crença no poder da razão individual para descobrir as regras do justo que fugisse à contingência, por se radicar a ordem racional (e quase matemática) advinda da natureza (mathesis universalis – matéria universal) do qual a razão participava.
Como representantes da doutrina do direito natural racional, podemos apontar Hugo Grotius, Thomas Hobbes, Rousseau, Locke, Leibniz, Spinoza, Kant e Puffendorf. Desta forma, universalizou-se a razão humana e secularizou-se o tema. Com tais doutrinadores também se desenvolveu a teoria do contratualismo na qual fundo o Estado Moderno, e teve grande influência nas primeiras declarações de direitos que tão consagraram os direitos naturais do homem.
Para Bobbio, com a criação do Estado Moderno[6] ocorrera um processo de monopolização da produção jurídica da parte do Estado e o juiz, que antes era um livre órgão da sociedade podendo escolher entre as várias possíveis normas a aplicar (direito positivo ou normas de direito natural como os princípios da razão ou equidade), tornou-se um órgão deste ou normas reconhecidas de alguma maneira pelo Estado consuetudinário, o direito positivo aos poucos se tornou o único e verdadeiro direito e o Estado seu único criador e provedor.
Com a Escola da Exegese, por exemplo, não se negou a existência do direito natural, mas este foi desvalorizado e considerado sem importância para o jurista. Havia a crença de que o legislador era a autoridade adequada para estabelecer o que seria justo ou injusto, por isso, era devida a obediência total ao texto da lei.
A teoria da obediência absoluta à lei enquanto tal foi presente especialmente no início do desenvolvimento teórico do positivismo ético[7], por se tratar de uma afirmação moral ou ideológica e não científica. A verdade é que o positivismo ético fora sustentado por poucos teóricos e, mais contemporaneamente rejeitado por completo pelos positivistas como John Austin, Hans Kelsen, Alf Ross e Herbert Hart que realizaram uma separação teórica absoluta entre direito e moral[8]. Sendo expressão de um momento histórico que teve como clímax o advento da modernidade.
Hart em sua obra procurou aplicar a análise de linguagem ordinária ou linguística ao campo do direito. E utilizou-se das conquistas filosóficas de Ludwig Wittgenstein[9] quando da publicação da obra “Investigações filosóficas” onde rompeu com sua teoria fotográfica da linguagem, tal como expôs no célebre Tractatus e passou a dirigir sua atenção aos usos e costumes cotidianos da linguagem.
Retratou Ihering a relação entre o direito e a moral de forma tensionada como um cabo de tempestades da ciência jurídica, sendo mesmo um dos temas mais complexos e centrais de toda filosofia moral e jurídica.
Muitas das questões suscitadas ainda aguardam por respostas apaziguadoras, como a referente à eutanásia[10], como podemos defini-la: como questão moral, jurídica ou de mera consciência? Se for possível o Estado, através do Direito intervir no direito de cada ser humano de querer viver ou morrer. Cogita-se então na acepção da morte digna.
A questão do estupro e do aborto dos fetos anencefálicos ou das mulheres estupradas que não desejem a gravidez. Nesse sentido, recentemente o STF decidiu positivamente sobre a constitucionalidade[11] do aborto de anencefálicos. Tais questões geram intensos debates onde trafegam vários desacordos jurídicos, sociais e religiosos. Hart enfrentou tal temática através de teoria enriquecedora e aceitável ainda que em alguns pontos quando aborda o conteúdo mínimo do Direito natural não seja completamente satisfatório.
Para melhor compreender o ponto de vista de Hart é preciso observar o modelo positivista a partir de três teses principais, a saber: 1.A tese das fontes sociais; 2.A tese da separação conceitual; 3. A tese da discricionariedade[12] judicial.
A primeira tese defendeu que a existência do Direito é definida pelas práticas sociais complexas e que estipulavam a formação das fontes sociais do Direito. A segunda tese argui as conexões entre direito e a moral que são contingentes. E, a terceira tese estava baseada na questão da textura aberta da linguagem, e em particular, da linguagem jurídica que mantém normas jurídicas com termos genéricos, vagos e controvertidos.
O que nos leva à assertiva de que o Direito é parcialmente indeterminado ou incompleto e, portanto, quando um juiz se depara com uma norma potencialmente indeterminada ou imprecisa o julgador age de forma discricionária.
A indeterminação é uma das características da norma jurídica, e todo intento de guiar o comportamento humano mediante normas gerais, e, isto não escapa ao Direito pode falhar. Consequentemente, a teoria do Direito não pode estar imersa entre o realismo e o ceticismo perante as normas.
Assim teríamos ora o pesadelo[13] e ora o nobre sonho a partir do fato dos juízes sempre criarem ou nunca o fazê-lo, e nunca encontrar o Direito que impõem as partes do processo.
Os dois fatos na opinião de Hart, são ilusões e o trivial é que às vezes os juízes fazem uma coisa ou outra. Sua teoria prega a vigília para que a interpretação do Direito não apresente excessivos problemas, posto que fundamentada apenas na obviedade jurídica da linguagem.
Porém, as dúvidas surgirão em razão da textura aberta da linguagem jurídica, quando é inevitável o atuar judicial com discricionariedade, o que não equivale à eleição arbitrária[14]. Ressalte-se que mesmo diante dessa abertura do Direito a discricionariedade é limitada e intersticial.
Porém, caberia o seguinte questionamento: a certeza do direito é inalterada se a regra de reconhecimento incorporasse como critérios últimos de validez jurídica, ademais do critério de filiação, princípios morais substantivos e de justiça?
Tal como fazem as Constituições contemporâneas – cujo cumprimento é indispensável. Reconhece expressamente Hart que alguns ordenamentos jurídicos incorporaram como critérios de validez, princípios e valores morais.
E, nesses casos, afirma Hart desta forma, a regra de reconhecimento pode tolerar relativo (e limitado) grau de incerteza, pois serão os juízes em última instância que definirão o alcance e significado da norma jurídica culpável.[15]
E essa afirmação custou a Hart a pecha de ser um “jurista antidemocrático”. E, se defendendo alegou que nenhum jurista pode negar que nas democracias atuais, as faculdades normativas não são exercidas só pelo Poder Legislativo e, ainda aponta ser menos custoso para coesão social e para a democracia a resolução com base na discricionariedade judicial, que não dar nenhuma solução do caso concreto proposto.
De qualquer forma, podemos deduzir que Hart não aceita a legalização da moral, porque existem limites de intervenção da moralidade nas ações privadas. Bem ilustra tal entendimento o célebre debate entre Hart e Lorde Patrick Devlin sobre a proposta de reforma do Parlamento sobre as leis penais vigentes na Inglaterra que criminalizavam a prostituição e homossexualidade.
Não pode o Direito transformar em delito ou crime, o que na esfera moral é considerado pecado. A sexualidade, por exemplo, é uma questão privada e, não diz respeito ao Direito. Porém, para Devlin não é tão fácil separar propriamente pecado de delito já que as convicções morais são características históricas da identidade das normas jurídicas.
Alterar as tradições morais[16] significa partir a identidade social e desintegrar a sociedade. Portanto, concluiu Lorde Devlin a preservação da moralidade positiva é instrumentalmente valiosa como meio de defender a sociedade dela mesma.
Aponta Hart que as sociedades contemporâneas são caracterizadas pelas constantes mudanças sociais e pelo pluralismo de tradições e valores que montam as pautas morais vigentes, portanto é difícil deduzir um consenso moral.
Ademais pode viger uma moral positiva aberrante e, por essa razão, o jurista deve ser cautela ao identificar a introdução de conteúdos morais do Direito. Tal consideração nos leva a repensar a inclusão dos princípios jurídicos no self positisvism que é modelo teórico que se opõe ao positivismo forte onde há a regra de reconhecimento[17] isenta de conteúdo valorativo.
Algumas das basilares características do Direito tais como a generalidade, a clareza, inteligibilidade, perpetuidade e a publicidade das normas jurídicas, bem como o princípio da irretroatividade das leis e a congruência em sua aplicação que deve ser imparcial, implicam na realização do mínimo de justiça, ainda que seja justiça formal por parte do Direito.
Portanto, para Hart é inegável existir as conexões em Direito e moral situadas no âmbito da justificação e legitimidade do Direito. Essa é a grande virtude da tese de Hart de manter um ponto de vista moral perante o direito positivo livre.
O Direito como todo sistema normativo possui algumas características proeminentes como a relação que estabelece com linguagem, a coação, o poder, a moral e, sua capacidade de subministrar razões para ação.
É a normatividade do Direito que o faz distinto perante as demais instituições sociais. Hart encaminha toda sua tese para o atual estágio do Direito que está inserido não chamados Estados Democráticos Constitucionais e, que nos permite distinguir o ponto de vista interno (participante), do ponto de vista externo (observador), o que resulta na dimensão de validez dos enunciados jurídicos.
Ao identificar o direito contemporâneo Hart ainda o justifica através do positivismo jurídico, não negando a complexidade dos sistemas bem como a presença de princípios e valores morais. Repisamos que para o positivismo jurídico é crucial a separação conceitual entre direito e moral. E a relação entre o direito e os princípios morais não é necessária, mas sim, contingente posto que o Direito seja moralmente neutro.
E tal postura procura preservar a autonomia e a liberdade individual preservando-as da interferência estatal exorbitada (paternalismo) e de terceiros (ditadura das maiorias ou tirania das minorias).
O famoso embate[18] filosófico travado entre Herbert Hart e Ronald Dworkin (autor da obra “O Império do Direito”) tem como foco principal a separação entre direito e moral bem como a sua implicação na interpretação do direito e a constatação ou não da discricionariedade judicial.
É sabido que o referido debate teve grande relevância no mundo jurídico do século XX e, em particular, na análise de como o judiciário e, nossos tribunais superiores interpretam o Direito, ou melhor, qual a concepção[19] de Direito era adotada efetivamente no crucial momento da decisão judicial.
O esforço inicial de Hart foi ao sentido de propiciar uma construção que superasse os positivistas como Austin[20] e Kelsen, e propor um conceito universal capaz de ser adequado a quaisquer sistemas jurídicos vigentes.
Procura o professor inglês a esquadrinhar todo o fenômeno jurídico principalmente para colmatar algumas lacunas deixadas por certas teorias jurídicas (principalmente no sentido de fundamentar a existência e alcance de todas as espécies de regras).
Enfim, questiona sobre quais as condutas humanas que são facultativas e quais as obrigatórias, no interesse de diferenciar o direito das demais ordens baseadas na coerção. Também investiga a distinção da obrigação jurídica da obrigação moral. Finalmente propõe que o direito seja considerado uma unção ou união de regras.
A primeira questão é saber, se a regra consiste em comando. Primeiramente, para se configurar uma regra, é certo que esta elege determinada conduta como padrão. Assim, determinar que alguém esteja sujeito a uma obrigação, indica que existe uma regra.
Porém, o inverso nem sempre é verdadeiro. As regras capazes de impor obrigações e, em geral, pressionam e punem aqueles que se desviam destas obrigações ou condutas. A pressão limita as ações humanas.
Portanto, há dois aspectos a observar quanto às regras: o interno[21] consubstanciado no modo de como o grupo social encara seu próprio comportamento, ou seja, seu posicionamento crítico em relação às regras sociais que praticam.
Assim, a teoria do direito que o encara como ordem coercitiva apenas vislumbra o aspecto externo de suas regras, dando a impressão de que as pessoas agem corretamente apenas por medo de prováveis retaliações nos desvios de conduta. Mas desconsidera que um sujeito pode não sentir-se obrigado a realizar uma ação, apesar de que tenha de fazê-la em razão da higidez do regramento social.
Outro questionamento procura saber se as regras seriam apenas aquelas que estatuem sanções punitivas em caso de seu descumprimento. Assim, procura diferenciar uma lei criminal da lei civil, que, por exemplo, impõe a responsabilização civil. E, ainda analisa as regras de um contrato. Ressalta Hart a função social da lei bem como o papel informativo e limitador das leis processuais.
Em razão da diferença do conteúdo das regras[22], existe decorrentemente uma distinção entre os atos nulos praticados por particulares e as decisões de tribunais que violam normas processuais sobre a competência jurisdicional.
Pois o primeiro ato não produzirá os efeitos jurídicos, já o outro ato, se não for impugnado devidamente, será juridicamente válido e passível de execução. Desta forma, a nulidade pode se apresentar diante o simples não preenchimento de condição essencial para o exercício do poder outorgado pelas leis retirando a eficácia jurídica do ato.
Sublinha Hart que o direito resulta da combinação de regras primárias de obrigação e as secundárias de reconhecimento, mudança ou adjudicação. Lembre-se que a regra de reconhecimento é parte das regras secundárias, que segundo Hart, juntamente com as regras primárias (regras de obrigação, de tipo básico) ocupam o lugar central do Direito.
Assim, as regras secundárias se dividem em regras de reconhecimento, de alteração e de julgamento, cada uma destas trazida como remédio para os três defeitos (ou crises) diagnosticados dentro da estrutura social simples das regras primárias (crise da incerteza, caráter estático e ineficácia e da pressão social difusa).
Sobre a regra do reconhecimento especificamente, Hart considerou a forma mais simples de remédio para a incerteza do regime das regras primárias. Ao conferir a marca dotada de autoridade, introduz, embora de forma embrionária, a ideia de sistema jurídico posto que as regras não sejam agora apenas um conjunto discreto e desconexo, mas, estão de um modo simples, unificadas.
Por outro lado, para resolver o problema da estática, cria-se o regime das regras de alteração. E, finalmente para solucionar a ineficácia da pressão social difusa, são necessárias as regras de julgamento, que também servem para determinar que alguns indivíduos detenham o poder de julgar, de maneira definitiva, e com legitimidade, se houver violação às regras primárias[23].
A textura aberta das regras advém, por sua vez, dos termos gerais aplicados para prescrever as condutas. Porém mesmo diante de regras gerais orais, em casos particulares concretos, podem surgir incertezas quanto à forma de comportamento exigido por estas. Os limites de aplicação da regra estão na linguagem. O que obriga o intérprete fazer uma escolha entre qual significado aplicar. E, nesse sentido Hart prega um poder discricionário aberto pelos limites apresentados pela linguagem.
Reconhece explicitamente Hart a função criadora[24] dos tribunais, posto que elaborem o direito na mesma medida em que os funcionários da administração o fazem com sua competência de editar atos administrativos para dar concreção a certa lei.
Dworkin rejeita veementemente as teorias semânticas do direito, em especial, o positivismo jurídico que se pauta pela incompletude do ordenamento jurídico, na medida em que não aceita que os indivíduos tenham outros direitos fora daqueles previstos por instituições sociais específicas e reconhecidas como produtoras de Direito.
Concluiu Dworkin que o direito deve ser considerado como junção de princípios e regras, na medida em que ambas se conformam com padrões jurídicos a serem seguidos no caso de obrigações jurídicas.
Hart foi favorável à separação entre direito e moral, e afirmou em sua teoria descritiva que pode aceitar a presença de princípios que podem ser invocados pelo julgador no momento da decisão. Todavia, tais princípios decorrentes de moral convencional e desde que sejam considerados como jurídicos pela regra de reconhecimento, podem ser utilizados de forma discricionária pelo juiz, na medida em que não está sujeito a padrões na decisão, assim como não possuem obrigação jurídica de invocá-los para resolver um determinado caso difícil.
Em nosso judiciário, podemos observar que a formulação hartiana é mais utilizada[25], ainda que inconscientemente pelos julgadores. Os valores morais que utilizam para julgar não correspondem àqueles advindos de construção histórica- política, nem de uma moral política objetiva, ou de análise de decisões políticas anteriores, seguidas de uma teoria a respeito de como o direito deva ser interpretado.
É inegável concluir que os juízes operam suas decisões conforme sua consciência, de forma que a margem de discricionariedade em suas decisões, colocando em xeque um caro elemento do positivismo que é a segurança jurídica.
Os juízes divergem teoricamente não sobre o conceito substancial e presente do direito, mas sim, sobre aquilo que deveria ser o que torna ainda contemporânea e recomendável a leitura e o entendimento da discussão entre Hart e Dworkin[26].
A moralidade[27] transcende a legalidade no sentido que a censura às leis e às decisões judiciais, reforça a relevância da separação conceituado do direito e da moral. Enfim, realmente a moral que deve ser separada do Direito e tal distinção possui especial relevância no debate contemporâneo sobre o Direito e sua atuação principalmente para cumprir a meta de construir uma sociedade mais justa, igualitária e próspera. Concluímos que Hart não labora uma teoria completa de interpretação, mas nos fornece os essenciais elementos para melhor compreensão do problema da linguagem e função do direito na sociedade contemporânea.
Professora universitária, Mestre em Direito, Mestre em Filosofia, pedagoga, advogada, conselheira do Instituto Nacional de Pesquisas Jurídicas.
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