Gabriel Antonio Silva Rechi Guedes[1]
Resumo: Diante da crescente criminalidade, a alta demanda dos processos criminais e a ineficácia das medidas atuais de execução penal, o instituto do plea bargaining, largamente utilizado pelos países membros do sistema jurídico do common law, é medida que o judiciário brasileiro deve se socorrer. Introduzido recentemente no ordenamento jurídico, pelo instituto do acordo de não persecução penal, vindo a oferecer a possibilidade de não se iniciar o procedimento ordinário penal, aumentando a celeridade processual, já encaminhando, desde que com o devido acordo entre o investigado e o promotor de justiça – bem como a homologação do juiz –, o cumprimento das medidas alternativas apresentadas em face da gravidade do delito praticado. Para isto, é necessário realizar a análise contextual da origem criminosa do ser humano, não só pela visão categórica do direito penal, mas apresentando os posicionamentos aplicados ao longo dos anos pelas vertentes da filosofia, sociologia e a criminologia. Ao longo do trabalho, se encontra o fundamento que as medidas alternativas ao cumprimento da pena privativa de liberdade, possuem maior função ressocializadora do agente praticante do delito.
Palavras-chave: Acordo de não persecução penal. Plea bargaining. Medidas alternativas. Celeridade processual.
Abstract: In the face of increasing crime, the high demand for criminal cases and the ineffectiveness of current criminal enforcement measures, the plea bargaining institute, widely used by member countries of the common law legal system, is a measure that the Brazilian judiciary must help itself with. Recently introduced into the legal system, by the institute of the non-criminal prosecution agreement, it has come to offer the possibility of not starting the ordinary criminal procedure, increasing the procedural speed, already forwarding, provided that with the due agreement between the investigated and the prosecutor of justice – as well as the approval of the judge – compliance with alternative measures presented in view of the seriousness of the offense committed. For this, it is necessary to carry out a contextual analysis of the criminal origin of the human being, not only by the categorical view of criminal law, but presenting the positions applied over the years by the strands of philosophy, sociology and criminology. Throughout the work, it is found that the alternative measures to fulfillment of the deprivation of liberty have a greater re-socializing function of the offending agent.
Keywords: Plea bargaining. Agreement between the parties. Alternative measures. Procedural celerity.
Sumário: Introdução. 1. A introdução do acordo de não persecução penal no ordenamento jurídico brasileiro. 1.1. Plea bargaining. 1.1. As diferenciações para aplicação. 1.1.1. Charge bargaining. 1.1.2. Count bargaining. 1.1.3. Fact bargaining. 1.1.4. Sentence bargaining. 1.2. Aderência dos acusados aos institutos. 1.3. Renúncias acarretas com a aceitação do acordo. 1.4. A distinção do nolo contendere. 1.5. O plea bargaining nos Estados Unidos da América. 1.5.1. O vasto número carcerário do Estados Unidos da América. 1.6. O plea bargaining no Canadá. 1.6.1. O tramite do processo penal no Canadá. 1.6.2. A criminalidade no Canadá. 1.7. O acordo de não persecução penal seria uma forma de plea bargaining? 2. O acordo de não persecução penal acostado no artigo 28-A do Código de Processo Penal. 2.1. A suposta mitigação do princípio da obrigatoriedade da ação penal. 2.2. Os benefícios da introdução do acordo de não persecução penal no Brasil. 2.3. O acordo de não persecução penal é uma maneira útil de reduzir os índices de criminalidade? 2.4. O acordo de não persecução penal e a colaboração premiada. 2.5. A ausência de posicionamento sobre a possibilidade de aplicação do acordo de não persecução penal após o oferecimento da denúncia pelos tribunais. Conclusão. Referências.
Introdução
A constante alta da demanda de processos criminais, em todo território nacional, bem como os crescentes números da criminalidade, abarrota a máquina judiciária, criando um sistema ineficiente e atrasado.
Para isto, pesquisas para a melhor do desenvolvimento do judiciário foram iniciadas, resultando na importância de se analisar mecanismos estrangeiros e verificar sua aplicabilidade no ordenamento jurídico nacional para que estes possam sanar as condições encontradas.
Dentre os mecanismos dispostos no common law, surge a figura do plea bargaining, utilizada, inclusive, por países de civil law, como o Brasil. Devido a sua alta taxa de aceitação e aplicabilidade nos países constantes, deu-se início em sua forma primária para aplicação em território nacional, por meio da Lei nº 12.850/13, pelo instituto da colaboração premiada, e quatro anos após, pela Resolução 181/17 do Conselho Nacional de Justiça.
Somente com a entrada da Lei 13.964/19, que entrou em vigor no início do ano de 2020, deu-se a apresentação do plea bargaining em sua forma clássica, por meio do acordo de não persecução penal, incluso no Código de Processo Penal.
Para isto, é necessário identificar as correntes elucidativas existentes para que se saiba a forma em que se dá a criminalidade e as melhores respostas para reduzir os indicies.
No entanto, para maior análise da caraterística da funcionabilidade do plea bargaining no Brasil, bem como, a efetivação – de agora, um direito do investigado – é necessário uma análise concreta e precisa das situações e maneiras de efetivação do instituto nos Tribunais de Justiça Estaduais e Federais, bem como, a participação do Ministério Público em aplicar a matéria.
1. A introdução do acordo de não persecução penal no ordenamento jurídico brasileiro
Presente em nossa Carta Magna, o princípio da individualização das penas, é a certeza que, após o tramite do processo penal, o indivíduo condenado poderá receber uma sentença mediante ao crime cometido, bem como, se atendente as peculiaridades do agente.
Embora isto, é extremamente comum encontrar sentenças iguais, onde não são observadas as necessidades e prestadas atenções essenciais para a prolação dela.
Isto se deve ao um judiciário sobrecarregado, com números altíssimos de demandas processuais, afetando e ferindo diretamente os princípios da individualização da pena, tanto como, o princípio da celeridade processual.
O crescimento populacional e má contribuição das políticas públicas, contribuíram para a situação atual, sendo necessárias mudanças expressivas para que continue aplicando os princípios constitucionais, bem como, amenize as consequências da sobrecarga.
Ao mais, atualmente o Brasil possui uma quantia de 748 mil detentos enfrentando uma luta contra a administração da população carcerária diariamente.
O terceiro pais no ranking mundial de população carcerária, somente atrás do Estados Unidos da América e da China, possui uma demanda por vagas prisionais superior à sua capacidade de fornecimento de estabelecimentos penitenciários, resultando na má condição de proteção dos detentos.
No mês de agosto de 2017, tivemos a publicação da Resolução número 181/2017 do Conselho Nacional do Ministério Público, onde estabelece a aplicação do Acordo de Não Persecução Penal.
Constante no artigo 18 da resolução, o acordo traz a hipótese de que, não sendo caso de arquivamento, não havendo grave ameaça ou violência, e tendo o investigado confessado a prática do crime formalmente, o representante do Ministério Público poderá oferecer o acordo com fim de evitar o cumprimento da pena e tramite ordinário do processo.
Assim, cabe a análise do instituto introduzido a sua semelhança com outros dois institutos já presentes no ordenamento brasileiro: a transação penal e a suspenção do processo.
Os dois institutos trazidos pela Lei nº 9.099/95, embora semelhantes, apresentam a diferença de que, a transação penal é exclusiva dos crimes de competência do Juizado Especial Criminal, já suspenção do processo, se aplica aos crimes constantes em outros textos legais, mas com limite da pena mínima sendo igual ou inferior a 01 (um) ano.
Mesmo constante na Resolução do Conselho Nacional do Ministério Público, o acordo de não persecução penal poucas vezes era utilizado, visto que cabia ao representante do parquet a possibilidade, de oferecer a proposta, o que raramente acontecia.
No mês de janeiro de 2020, temos a entrada em vigor da Lei nº 13.964/19, conhecida como Pacote Anticrime, onde dentre suas mudanças no ordenamento brasileiro, traz o artigo 28-A a ser introduzido no Código de Processo Penal, onde continha a previsão legal do Acordo de Não Persecução Penal.
Com texto semelhante ao apresentado pelo Conselho Nacional do Ministério Público, o artigo trazia o limite de aplicabilidade do instituto, fora as demais condições, a pena mínima igual ou inferior de 04 (quatro) anos.
A sua entrada formal a legislação penal brasileira, oferece a opção diversa ao tramite regular do processo penal – bem como medidas alternativas ao cumprimento da pena de reclusão – similar apresentada pela suspenção do processo e da transação penal, mas agora atingindo uma espécie de crime não atendida pelas anteriores.
Embora sabemos que a melhor forma de diminuição da criminalidade é a prevenção por meio de políticas públicas como, a diminuição da desigualdade social, o oferecimento de condições básicas necessárias, a redução do desemprego e investimentos maiores nas áreas da educação e saúde, medidas como o acordo de não persecução penal nos oferecerem meios mais simples e eficazes para a resolução das demandas judiciais, favorecendo os princípios constitucionais da individualização da pena e da celeridade processual.
1.1. Plea bargaining
Sempre que o uma pessoa comete um crime, ou recaí sobre ela a suspeita da autoria deste, realizadas os procedimentos até sua apresentação ao juízo responsável para apreciação e prosseguimento de seu julgamento, há a possibilidade do acusado se declarar culpado, confessando a prática do crime, que poderá resultar em um tramite menor de seu julgamento e, muitas vezes, na declaração de sua sentença no mesmo ato.
Para isto, é necessário que o investigado, tome ciência – imprescindivelmente com a assistência e instrução de seu defensor –, mediante a comunicação legal do juiz responsável em lhe informar que ao se declarar culpado, irá renunciar alguns direitos básicos que teria direito se optasse pelo julgamento comum (BERGMAN, 2020).
Neste momento surge a figura do plea bargaining, onde será possível o investigado, junto com seu advogado, negociar com o promotor de justiça presente, a elaboração de um acordo, para que traga benefícios ao acusado mediante a celeridade de seu julgamento.
Para entender o significado e a utilidade do instituto, é necessário dissecar seu nome, onde “plea” se remete diretamente ao conceito de confissão e a segunda, “bargaining”, se referindo a barganha. Em termos concretos, possamos traduzir em ‘confessar o crime para barganhar’.
Tendo-se principal aplicabilidade no sistema judiciário criminal estadunidense, é comumente encontrado em países que se utilizando do common law, que vem exercendo grande influência em países que se utilizando do civil law, como o Brasil (CHEMIM, 2020).
Ao que se consiste, o plea bargaining, é um acordo entre o promotor de justiça e o, então, investigado. Desta forma, a sua elaboração visa diminuir o julgamento, facilitando o trâmite processual, deste que, o acusado confesse a prática do crime em troca de benesses que poderão ser acordadas.
Os benefícios em troca de sua confissão, poderão resultar na diminuição de imputações sobre os delitos praticados, a atenuação das qualificações do delito ou a redução da gravidade da pena, se houver.
1.1. As diferenciações para a aplicação
Entanto, para cada caso é necessária uma aplicação própria do instituto, fazendo que se dívida em subclassificações (SCHWARTZBACH, 2020). Pegamos por exemplo a aplicabilidade no Estados Unidos da América, onde são encontradas quatro vertentes distintas:
1.1.1. Charge bargaining
Neste conceito, há a barganha referente a imputação delituosa que será feita ao acusado após a confissão. Se tem o principal objetivo de reduzir o tipo penal do crime praticado para um tipo penal mais brando. Utiliza-se o exemplo vago que, o acusado comete o crime de roubo, após a elaboração do acordo, o representante do parquet, imputa o crime de furto.
1.1.2. Count bargaining
A elaboração do acordo tem a principal função em reduzir o número de acusações referentes aos delitos práticos. Sendo assim, o exemplo a ser aplicado, é que, o acusado tenha praticado furto e receptação, e acordando com o promotor de justiça, por meio de seu advogado, confessa a prática da receptação, sendo denunciado apenas por este delito.
1.1.3. Fact bargaining
Este ponto se refere aos fatos praticados, onde a denúncia levará uma gravidade menor da conduta do agente, mas não se alterando o tipo penal, o que pode influenciar diretamente na pena – ou condições diversas – que serão impostas. Em um exemplo claro, temos a receptação de mais três delitos, de proprietários distintos, o que acarretaria uma pena mais gravosa. Em troca de sua confissão, a denúncia será oferecida relatando apenas a receptação de um veículo, que resultará em uma pena mais branda.
1.1.4. Sentence bargaining
O foco do instituto é a negociação diretamente da sentença que será prolatada, referente ao delito praticado. Desta forma, mediante o prévio acordo, o promotor de justiça poderá recomendar uma pena inferior à do tipo penal consumado, ou, se possível, recomendar uma condição de cumprimento da pena diversa da prisão.
1.2. Aderência dos acusados ao instituto
Conforme a análise pelo Departamento de Justiça Estadunidense, a porcentagem dos acusados ao aceitaram a ofertar de negociar as condições referente aos delitos praticados, atinge de 90% a 95% (DEVERS, 2020).
Desta forma, inegável dizer que, mesmo em sua porcentagem mínima, apenas cerca de 10% das pessoas que cometem crimes em toda extensão do país, se negam, ou estão impedidas, de aceitar as condições oferecidas pelo plea bargaining sendo seus casos remetidos ao julgamento comum – chamado de “trial”.
1.3. Renúncias acarretas com a aceitação do acordo
O magistrado, ao aceitar o acordo formulado – e concordado pelo acusado e seu advogado –, irá proferir uma sentença, essa que, implica na não realização de seu julgamento completo.
Com isto, ocorre renúncias a direitos do acusado, inclusive constitucionais, que não poderá usufruir destas, sendo responsável o juiz em explicar ao acusado que aceitando o acordo, não poderá se utilizar destas.
Dentre elas se encontram:
No entanto, havendo alguns casos em que não foram obedecidas as condições básicas de instrução ao acusado, sendo vedado alguns direitos essenciais, demonstrou a necessidade da Suprema Corte Estadunidense em debater o assunto.
Elabora a Discussão número 626, a Suprema Corte decidiu que, quando forem negados direitos essenciais ao acusado – se este desejar utilizar seu plea e elaborar o acordo – irá acarretar a condição de revogação da renúncia imposta no momento da sentença.
A impossibilidade de se ter assistência jurídica, por meio de um advogado, no momento da elaboração do acordo, houve exceção aos limites legais da sentença para o delito praticado ou que o acusado tenha sido sentenciado erroneamente com bases em sua raça, são motivos que, segundo a Suprema Corte, permite que o acusado apele ao tribunal, para que se revise as condições da sentença.
1.4. A distinção do Nolo Contendere
Ainda em análise ao procedimento criminal dos Estados Unidos, se encontra similar ao plea bargaining, o instituto do nolo contendere, que em tradução livre do latim, significa “sem contestação”.
A principal divergência deste instituto, tem o foco onde o acusado aceita a punição que está sendo lhe imputada – mas não a responsabilidade –, tendo como momento primordial onde apenas irá confessar a prática do delito após a elaboração do acordo com o promotor de justiça e não antes, como é feito no plea bargaining.
Desta forma, surge a condição que, sua confissão judicial na seara criminal, não haverá comunicação com a esfera cível.
Em um exemplo prático, o acusado pratica um furto. Posteriormente, detido e levado a julgamento, poderá requisitar a aplicação do nolo contendere para condições mais favoráveis de cumprimento de pena ou diminuição desta.
Confessado o crime, e devidamente sentenciado conforme as condições legais impostas, a vítima não poderá ingressar com uma ação cível, em face do acusado, pela reparação do valor do objeto furtado.
1.5. O plea bargaining nos Estados Unidos da América
Embora não tenha elementos fundamentais para descrever a origem do plea bargaining, mas há indícios primórdios da sua aplicabilidade 1189, na Inglaterra, onde o fato do acusado confessar a prática do delito, já era prolatada a sentença, sem o tramite regular do procedimento (ALSCHULER, 1979, p. 07). No entanto o instituto foi popularizado no Estados Unidos da América.
Popularizado após a guerra civil, em 1865, onde foi utilizado para julgamento dos soldados que tinham cometidos crimes durante a guerra, visto que as demandas judiciais aumentaram consideravelmente, requerendo assim, uma forma mais célere e eficiente para a resolução destas (MEYER, 2020).
Durante esse período, principalmente com a análise dos dados que demonstraram sendo os Estados Unidos da América o maior aplicador do plea bargaining, ainda possuindo o maior percentual de detentos ingressos aos estabelecimentos penitenciários, a não aplicabilidade resultou em situação maior ainda.
No final da década de 1910 e no início de 1920, os Estados Unidos da América passa por uma onda de criminalidade, devido a publicação da 18ª Emenda à Constituição, onde em sua primeira seção proibia a produção, importação, venda e transporte de bebidas alcoólicas, considerando-as “bebidas intoxicantes” superiores a 1.28% de volume alcoólico.
A alegação da proibição de bebidas alcoólicas se baseava na necessidade da redução dos números de mortes por cirrose, nas internações em hospitais de tratamento psiquiátrico por dependência do alcoolismo e nas prisões por embriaguez pública. Se baseando em princípios religiosos e conservadores, tendo um dos principais apoiadores a Ku Klux Klan (ESCHNER, 2020).
No entanto, o efeito foi contrário, dando origem a uma onda enorme de criminalidade, já que, o consumo de bebidas alcoólicas continuava, mas agora de maneira clandestina, feitas por destilarias ilegais ou por importações comumente do México, e linhas de distribuições por tuneis subterrâneos ou durante a madrugada (CASAGRANDE, 2020).
Neste mesmo período surge um dos maiores e mais famosos criminosos da história dos Estados Unidos da América, Alphonse Gabriel Capone, conhecido mais tarde como Al Capone e apelidado pelos jornais de “Inimigo Público Número 1”.
Novamente, mediante a uma carga processual enorme nos tribunais, foi necessário aos promotores se socorreram do plea bargain para reduzir as demandas e aumentar a efetividade das decisões (RODAS, 2019).
1.5.1. O vasto número carcerário do Estados Unidos da América
Mas por que, então, sendo o plea bargaining uma forma tão benéfica de reduzir as quantidades de demandas processuais e número carcerários, os Estados Unidos da América, seu maior idealizador e aplicador, possui o maior número de detentos?
Acontece que, o instituto do plea bargaining é voltado – assim como sua aplicação no Brasil – para crimes que não possuem grave ameaça ou violência, como furto (theft), fraude de impostos (tax fraud), posse de drogas (drug possession), dirigir com a capacidade cognitiva comprometida (driving under the influence), entre outros do mesmo gênero (TURNER, 2018).
Considerando assim, crimes violentos aqueles que possuem em seu texto legal a necessidade de violência ou grave ameaça para o cometimento desde, como homicídio (murder), roubo (robbery), lesão corporal (assault) e estupro (rape, sexual abuse and sexual assault).
No entanto, não há regulamentação expressa da aplicação do plea bargaining, ficando a cargo de cada estado estabelecer suas normas de aplicação, bem como, o quesito individual de cada promotor em oferecer a proposta de barganha, podendo ou não, ser aplicadas a alguns crimes violentos como forma de reduzir o tramite do trial aumentando a celeridade processual.
Analisando um período de trinta e três anos pelas informações colhidas por meio do Federal Bureau of Investigation pelos sistemas National Incident-Based Reporting System e Summary Reporting System, desde o ano de 1985 o número de crimes violentos vem crescendo.
No ano de 1991, os dados atingiram a maior marca até os marcadores de 2018, contabilizando 758 crimes violentos para 100 mil habitantes, totalizando uma marca de aproximadamente 1.917.740 cometimento de crimes violentos para toda população dos Estados Unidos da América no mesmo ano.
Em comparação, o percentual de cometimento de crimes não violentos atingiu seu maior marcador no mesmo ano, totalizando uma marca de 5.140 para 100 mil habitantes.
As políticas criminais não surtiram efeito, e no ano seguinte, os marcadores apenas tiveram a redução inferior a um ponto, totalizando a marca de 757 crimes violentos para o mesmo percentual.
Foram necessários 23 anos para que o marcador registrasse seu menor índice, o de 361 cometimento de crimes violentos para o ano de 2014, como também ocorreu com o marcador dos crimes não violentos, registrando o percentual de 2.199.
No entanto, o marcador dos crimes violentos retornou a subir após 2014, influenciado pelos maiores índices de cometimento dos crimes de homicídio e estupro.
Foram necessárias revisões de dados relativos aos crimes de estupro, onde o número vem crescendo em percentual igual aos índices das décadas de oitenta e noventa. Em 2018, o número de cometimento de estupros chegou ao patamar similar ao maior índice registrado pelo estudo, o de 1992, onde foram registrados 42 crimes de estupro a cada 100 mil habitantes.
Conforme dados colhidos até o mês de março de 2020, o número de detentos, egressos nos sistemas prisionais estadunidenses, que cometeram crimes violentos são superiores aos detentos egressos por cometimento de crimes não violentos, onde apresentam a marca de 713 mil para 571 mil (SAWYER, 2020).
É evidente que reformas nas políticas criminais, bem como a reforma das políticas públicas, são necessárias para reduzir os índices de cometimentos de crimes de quaisquer gêneros, mas ressalta-se que os crimes que possuem a aplicabilidade do instituto plea bargaining demonstraram maior efetividade em suas reduções de cometimento de delitos.
1.6. O plea bargaining no Canadá
Se utilizando de um país fronteiriço com o mesmo sistema jurídico do common law dos Estados Unidos, o Canadá se utiliza da aplicação do plea bargaining para diminuir suas demandas e oferecer benefícios, ao então investigados, para um tramite mais facilitado e rápido das condições impostas.
No entanto as possibilidades de se negociar as condições durante a elaboração do acordo entre o promotor de justiça e a defesa do acusado, são mais amplas que a do sistema estadunidense, sendo estas:
Como se pode perceber, as formas de acordar não se limitam apenas as condições alternativas ao cumprimento da pena e das imputações delituosas a serem consideradas como no sistema estadunidense, mesmo assim, se podem serem classificados dentro das categorias de charge bargaining, sentence bargaining e fact bargaining.
Desta maneira se oferece ao acusado um maior leque de opções para que se possa escolher, mediante seu juízo qualitativo, conforme deseja prosseguir com o processo criminal em que está sendo acusado.
1.6.1. O tramite do processo penal no Canadá
No sistema processual criminal canadense, as acusações sumárias são definidas como sumário, indiciável e híbrido.
O procedimento sumário é para crime de menor gravidade, não levando a prisão preventiva, somente em caso de prisão flagrancial. Ao mais, não é obrigatória sua participação na audiência, podendo o acusado ser representado pelo seu advogado, salvo se o juiz requisitar a obrigatoriedade da presença.
Já o tramite do procedimento indiciável é de competência de crimes mais gravosos, onde o acusado será preso preventivamente se houverem indícios de autoria e materialidade. Neste tramite há a obrigatoriedade de o acusado comparecer na audiência, bem como, deverá elaborar sua própria defesa ou ser representado por um advogado.
No sistema híbrido, cabe ao promotor de justiça, mediante as circunstâncias do cometimento do delito, bem como a gravidade por ele causado, em requisitar a transferência do tramite originário para o outro.
1.6.2. A criminalidade no Canadá
Em uma comparação direta, o Canadá – mesmo com uma população dez vezes inferior aos Estados Unidos da América – possui uma taxa de homicídios inferior a metade dos indicies do mesmo crime registrado no país vizinho.
No ano de 2019, o Canadá registou 678 homicídios, enquanto isso os Estados Unidos registraram o índice de 14.185 homicídios em todo o território.
Desde a normatização da aplicação do plea bargaining, no ano de 1993, houve queda consistente em todos os índices criminais ocorridos no Canadá, levando os indexadores em 2014 a atingirem os menores números desde 1970 (MOREAU, 2020).
Tal diminuição, das taxas de delitos se deve também na regularização do Governo do Canadá na política sobre a regulamentação do uso da cannabis, onde desde 17 de outubro de 2018 a posse de até 30 gramas de cannabis, desidratada ou não, bem como a compra de um vendedor autorizado, não configura o crime de tráfico de drogas.
Como esperado, as prisões e condenações relativas ao tráfico de cannabis, sofreram queda significativa. Também houve queda, para os mesmos níveis, aos crimes envolvendo a posse e mercantilização de cocaína.
1.7. O acordo de não persecução penal seria uma forma de Plea Bargaining?
Em face do instituto já existente nos Estados Unidos da América, ficou o questionamento se o Acordo de Não Persecução Penal, seria uma espécie de plea bargaining, visto que se associava em vários aspectos com a faculdade estadunidense.
Marllon Souza, esclarece que sim, o acordo de não persecução penal é um modelo autêntico de plea bargaining, ressaltando-se que, por uma ausência dos legisladores, o seu texto legal, não trouxe a expressão “barganha” propriamente utilizada pelo instituto (SOUZA, 2020, p. 171).
No entanto, o fato do acordo de não persecução penal, não trazer uma espécie definitiva de pena, possibilitando assim, o não cumprindo as condições impostas no acordo, o processo penal retornará a seu tramite normal.
Com esta fundamentação, Rodrigo Leite Ferreira Cabral, esclarece que, o acordo de não persecução penal não poderia ser considerado como uma forma de plea bargaining (CABRAL, 2020, p. 70).
Ainda se funda que, o fato de o instituto nacional possibilitar a aplicabilidade em apenas alguns delitos, demonstra, ainda mais, a sua não semelhança com o instituto anglo-saxão.
Em referência ao instituto estadunidense, não se existe legislação ou posicionamento das cortes superiores sobre a possibilidade de aplicabilidade do acordo em determinados crimes. No entanto, esta possibilidade fica a cargo unicamente do promotor designado para o cargo, onde, mediante seus critérios fará a análise do caso e do que irá ofertar para a defesa.
Esta forma, além de possuir uma enorme influência dos quesitos subjetivos, oferece também instabilidade jurídica, deixando muitas vezes o acusado sem amparo por parte da realização do acordo. Bem como, ressalta-se a divergência entre legislação e aplicabilidade jurídica dentro dos estados membros do país.
As formas alegadas não impedem ou restringe a aplicabilidade do acordo de não persecução penal, visto assim, como o primeiro ingresso da forma de acordo entre o promotor de justiça e a defesa, do então acusado, na legislação brasileira, não fazem que o presente instituto não possa ser considerado uma forma de plea bargaining.
A mera adaptação, realizada com fulcro na conformidade entre o cenário jurídico atual, não interfere a tal ponto de desclassificar o acordo de não persecução penal como uma forma de plea bargaining, visto que, sua maior natureza, a barganha das condições que serão impostas, se encontra presente.
2. O acordo de não persecução penal acostado no artigo 28-a do código de processo penal
Introduzido pela Lei nº 13.964/19, conhecida como Pacote Anticrime, que apresentou reformas pontuais nas legislações penais, esta introduziu o acordo de não persecução penal, previsto no artigo 28-A do Código de Processo Penal, no ordenamento jurídico brasileiro.
“Art. 28-A. Não sendo caso de arquivamento e tendo o investigado confessado formal e circunstancialmente a prática de infração penal sem violência ou grave ameaça e com pena mínima inferior a 4 (quatro) anos, o Ministério Público poderá propor acordo de não persecução penal, desde que necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime, mediante as seguintes condições ajustadas cumulativa e alternativamente.”
O instituto baseado no plea bargaining estadunidense apresenta a possibilidade, de que cumprindo alguns requisitos – o indivíduo não ter usufruído nos últimos 05 (cinco) anos os benefícios da transação penal, o próprio acordo de não persecução penal e da suspensão condicional do processo; o crime cometido ter pena igual ou inferior a 04 (quatro) anos; e, ter confessado formalmente a prática do delito – é possível a elaboração do acordo entre a defesa do acusado e o membro presente do ministério público.
Ao mais, ressalta-se que, crimes referentes a violência doméstica não são hábeis a aplicação do instituto, conforme a inteligência do inciso IV.
Após elaborado o acordo, este será levado ao juiz titular da vara para a sua devida homologação.
O magistrado pode-se fundar que não possível a homologação do acordo neste momento, encaminhando ao ministério público novamente os autos, para que se adeque as normas formais, ou que se complemente o acordo (NUCCI, 2020, p. 226).
Se negada a homologação do acordo de não persecução penal, caberá recurso em sentido estrito, conforme o artigo 581, inciso XXV do Código de Processo Penal, também introduzido pela Lei nº 13.964/19.
No caso do representante presente do ministério público se negar em oferecer a elaboração do acordo de não persecução penal, caberá ao magistrado remeter os autos para o Procurador Geral de Justiça (NUCCI, 2020, p. 227).
Por sua vez, o Procurador Geral de Justiça irá se manifestar ou designar outro membro do parquet para que manifeste sobre o oferecimento do acordo. Esta fundamentação encontra-se prevista no parágrafo 14 do artigo 28-A do Código de Processo Penal.
Homologado o acordo, os autos seguiram para o juízo de execução penal, e desta forma se dará o prosseguimento ao cumprimento das medidas alternativas impostas no acordo.
Embora o acordo de não persecução penal não gere uma sentença no momento da sua homologação, a decisão cumprida gera um efeito de sentença, se dando por extinta a execução da pena sem o tramite regular do processo.
Ao mais, não havendo o cumprimento regular das medidas impostas – segundo o parágrafo 10 –, o ministério público deverá encaminhar os autos ao juízo da vara criminal, para que o magistrado realize audiência afim de ouvir o investigado e saber das causas do não cumprimento das medidas. Sendo relevantes os motivos, o investigado poderá continuar a cumprir as medidas, ou o acordo será rescindido possibilitando o membro do ministério público oferecer denúncia sobre o fato e dar-se-á início ao tramite ordinário do processo (LOPES JUNIOR, 2020, p. 320).
Cumpridas todas as medidas constantes no acordo, o juízo declarará a extinção da punibilidade, conforme o parágrafo 13 do seu artigo (LOPES JUNIOR, 2020, p. 321).
2.1. A suposta mitigação do princípio da obrigatoriedade da ação penal
Entende-se, pelo posicionamento doutrinário, que vigora no sistema jurídico brasileiro, o princípio da obrigatoriedade da ação penal, sendo classificado como o instituto que obriga a autoridade policial a instaurar o inquérito policial, bem como, o representante do ministério público – quando o caso dispuser de indícios suficientes de autoria e materialidade, e não sendo caso de arquivamento – a promover a ação penal pública.
No entanto, ao passar dos anos, e pelas mudanças legislativas ocorridas, o antigo promotor público, agora chamado de promotor de justiça, não ostenta a condição exclusiva de promover a ação penal pública imediatamente quando apresentados indícios de autoria e materialidade no relatório final do delegado de polícia.
No artigo 129, da Constituição Federal de 1988, onde é estabelecido as funções institucionais do Ministério Público, precisamente em seu inciso I, o texto é claro ressaltando a expressão que cabe ao ministério público – sem distinções entre estaduais e federal – a promoção, privativamente, da ação penal pública.
Com isto, a doutrina, em grande maioria, entendeu-se por considerar que, vigora com base no artigo supracitado, o princípio da obrigatoriedade da ação penal.
Ainda se utilizada, frequentemente, para complementar a fundação anterior, a tese que, o princípio da obrigatoriedade da ação penal, estaria ligado, diretamente, com o princípio da indisponibilidade do interesse público. Que, por sua vez, se funda em que o interesse público deverá permanecer, a todo custo, sobre o interesse da administração pública.
Em outras palavras seria dizer que, segundo esta linha doutrinária, o promotor de justiça, mesmo entendo ser um caso necessário de se promover a ação penal pública, deverá oferecê-la mesmo assim, para cumprir com os dois princípios positivados no ordenamento pátrio.
Desta forma, há o embasamento que o artigo 24, do Código de Processo Penal e o artigo 100, §1º, do Código Penal, reforçariam a ideia de que, as ações penais públicas serão promovidas por denúncia do Ministério Público, bem como ressaltando-se a inexigência da representação do ofendido quando a lei o fizer necessário (OLIVEIRA, 2017).
Neste atual sistema representado, seria dizer que a única função do promotor de justiça criminal seria de, acompanhar as audiências de custódia, as requisições durante o inquérito policial, o oferecimento de denúncia e o acompanhamento durante o tramite regular do processo inicial. Salvo, claro, as demais funções institucionais que lhe cabe.
Devido a isto, a entrada em vigor da Lei nº 13.964/19, conhecida como pacote anticrime, e seu instituto de acordo de não persecução penal, previsto no artigo 28-A, que fora introduzido no Código de Processo Penal, levantou questionamentos se a matéria do dispositivo era constitucional.
Todavia, na presente situação em que se vive a justiça pública, principalmente a criminal, não se considera o bastante. Talvez este sistema pudesse apresentar suas qualidades e funções próprias, quando utilizado no início do século XX. Contudo, com as crescentes taxas de demandas criminais, e altas nos números de registros de crimes, é necessário adotar condutas mais eficientes e produtivas.
Para isto, Hugo Nigro Mazzilli, discorre sobre a relação entre o princípio da obrigatoriedade da ação penal e as ações possíveis ao membro do parquet:
“Não se veja aí, porém, um dever cego e automático de agir: o Ministério Público tem liberdade para identificar ou não a hipótese de agir, desde que o faça fundamentadamente. […] Em suma, isso é mera consequência da livre valoração do interesse público pelo parquet: o dever de agir do Ministério Público pressupõe essa valoração da existência ou da persistência do interesse público, seja para propor a ação, seja para nela prosseguir, seja para nela intervir. Com efeito, a instituição deve apreciar a justa causa não só para propor, como para prosseguir na ação, ou para nela ser órgão interveniente. Essa valoração da desistência só não pode ser feita no processo penal, porque a lei expressamente a vedou” (MAZZILLI, 2012).
Tal fundamento encontra-se, também, disposto no ordenamento da Assembleia Geral das Nações Unidas, em sua Resolução 45/110, conhecida como Regras de Tóquio, onde, discorre sobre a elaboração de medidas não privativas de liberdade e garantias mínimas para que sejam aplicadas penas privativas de liberdade:
“Sempre que adequado e compatível com o sistema jurídico, a polícia, o Ministério Público ou outros serviços encarregados da justiça criminal podem retirar os procedimentos contra o infrator se considerarem que não é necessário recorrer a um processo judicial com vistas à proteção da sociedade, à prevenção do crime ou à promoção do respeito pela lei ou pelos direitos das vítimas. Para a decisão sobre a adequação da retirada ou determinação dos procedimentos deve-se desenvolver um conjunto de critérios estabelecidos dentro de cada sistema legal. Para infrações menores, o promotor pode impor medidas não privativas de liberdade, se apropriado” (PRESTES, 2016).
Desta forma, não há o que se enunciar em mitigação do princípio da obrigatoriedade da ação penal, nem tanto que este princípio é ferido pelo acordo de não persecução penal.
Ao mais, o professor Antonio Scarance Fernandes, ao discorrer sobre os aspectos da suspensão condicional do processo e da transação penal, concluiu que:
“Na prática, em grandes centros é praticamente impossível que de todo crime seja iniciado processo, o que, se ocorresse, representaria o caos em uma Justiça já atravancada; é comum, em casos de lesão de pequena intensidade ao bem jurídico, ser pedido arquivamento de inquérito com o beneplácito do Poder Judiciário, invocando-se muitas vezes razões até de política criminal ou fundamentando-se o requerimento justamente na pouca relevância do fato. Outro caminho consistiu em dar maior elasticidade ao conceito de justa causa para a ação penal, fundando-a na viabilidade da acusação; assim, se os indícios vindos da investigação não permitiam antever possibilidade de sucesso de ação penal, ela não era intentada” (FERNANDES, 2010, p. 214).
Desta forma, é possível aprontar que o mero oferecimento de denúncia sem qualquer pressuposto da possibilidade da ação penal, bem como a ressocialização do agente, e da prevenção de condutas igualitárias futuras, não apresentariam qualquer feito relevante.
Por fim, fundar-se que, o acordo de não persecução penal fere os princípios da obrigatoriedade da ação penal e o princípio da indisponibilidade do interesse público, é ignorar os diversos mecanismos já presentes no ordenamento brasileiro, como a transação penal e a suspensão condicional do processo, bem como, retardar um avanço significativo na capacidade de administração das demandas processuais (BARROS, 2020, p. 90).
2.2. Os benefícios da introdução do acordo de não persecução penal no Brasil
De fato, o princípio da celeridade processual, previsto no artigo 5º, inciso LXXVIII da Constituição Federal de 1988, não vem sendo comumente efetivado no sistema judiciário brasileiro, gerando assim, processos com seu tramite regular em prazos altíssimos e grande número de fluxo de demandas processuais.
Devido a seriedade que a seara criminal apresenta, o simples fato de ser investigado em um inquérito policial, faz com que recaía um véu de incertezas e receio sobre o averiguado.
Tanto como, possuí ainda mais gravidade quando o acusado toma ciência que, foi concluído o inquérito penal e o Ministério Público promoveu uma denúncia contra ele.
Desta forma, tendo o investigado confessado o crime, em solo administrativo – durante seu interrogatório ou tomada de declarações – e tenha a plena capacidade das condições que lhe possam ser impostas referente ao delito por ele praticado, se ter um tramite longo do procedimento criminal pode aumentar a sensação de aflição.
Ainda há o posicionamento atual dos Tribunais que, não tendo o acusado confessado formalmente a prática do crime, poderá o fazê-lo se designada audiência para oferecimento do acordo, ou, não sendo designada a audiência, poderá requisitar a requisição da audiência em sua resposta a acusação.
Ao mais, a confissão da prática do delito com objetivo da elaboração do acordo de não persecução penal, não pode ser utilizada para prejudicar o investigado durante o tramite regular do processo, no caso de descumprimento das medidas alternativas provenientes do acordo.
Isto se dá pelo entendimento que não há o reconhecimento expresso da culpa do acusado, somente havendo uma admissão implícita de culpa. No caso, para o reconhecimento formal da culpa, é necessário o devido processo legal (CUNHA, 2020, p. 129).
Ainda existe a linha de raciocínio que o acordo se assemelha com a delação premiada desfeita, em que as provas autoincriminatórias não podem ser utilizadas para prejudicar o acusado (MAZLOUM, 2020).
Ressalta-se ainda a não é necessidade que a audiência seja designada na sala de audiência da vara onde tramita o inquérito policial, podendo ser designada no gabinete do promotor de justiça atuando no caso, bem como, em qualquer lugar reservado dentro das instalações do ministério público.
Por isto, mediadas alternativas ao tramite ordinário do processo penal, podem oferecer benefícios, só não a máquina judiciária, mas para o acusado.
Um dos motivos mais benéficos ao acusado é o fato do cumprimento das condições impostas pelo acordo de não persecução penal, não serem constante nas certidões criminais. Este mecanismo é apresentado no §12º do artigo 28-A, do Código de Processo Penal, que versa sobre o acordo de não persecução penal.
A possibilidade de já nos primeiros atos processuais ter a alternativa de realizar um acordo, com o membro do ministério público, para que se tenha a escolha das medidas alternativas ao cumprimento da pena, mediante acordo entre as partes, retira a estigma e ameniza a preocupação em relação ao processo, além de já se encaminhar o processo para a vara de execução criminal (LOPES JUNIOR, 2020, p. 319).
As medidas alternativas, que poderão serem impostas individualmente ou cominadas, consistem em:
Observa-se que no último item, a possibilidade da condição diversa a indicada no texto legal, possibilita ao membro do parquet o oferecimento de outras condições constantes em outros dispositivos penais, como as oferecidas no artigo 89 da Lei n° 9.099/95 ou as restritivas de direitos oferecidas no artigo 43 do Código Penal.
Ainda assim, não há qualquer impedimento no oferecimento de condição diversa das estabelecidas em lei, desde que, seja proporcional e razoável ao delito praticado, bem como, a capacidade do acusado em cumprir a condição.
2.3. O acordo de não persecução penal é uma maneira útil de reduzir os índices de criminalidade?
Recentemente tem sido ventilada a hipótese que maneiras diversas a pena restritiva de liberdade, não são funcionais e não contribuem para a redução dos índices de criminalidade e reincidência no Brasil, acarretando uma sensação de abandono e inercia do estado.
No entanto, não há qualquer procedência nestas alegações.
Para isto, o jurista alemão Claus Roxin, em uma discussão sobre o direito penal do futuro, explica que as formas alternativas as penas privativas de liberdade, são consideradas como maneira de diversificação da pena originária, e não uma forma de se abolir inteiramente o tipo penal, o que é o objetivo categórico do abolicionismo penal.
Como discorrido anteriormente, as teses originárias do direito penal do inimigo não provaram que consegue reduzir os marcadores de criminalidade, apenas oferece uma falsa sensação da ação positiva do estado em realizar o encarceramento de um enorme número de pessoas, diminuindo ainda, a qualidade e segurança jurídica dos encarcerados.
Manifestando suas opiniões, Roxin chega à conclusão de que, as vertentes da criminalização em massa, proveniente direito penal do inimigo:
“Submete numerosos cidadãos, nem sempre culpados, a medidas persecutórias extremamente graves do ponto de vista social e psíquico. Ela estigmatiza o condenado e o leva à desclassificação e à exclusão social, consequências que não podem ser desejadas num Estado Social de Direito, o qual tem pôr fim a integração e a redução de discriminações” (ROXIN, 2006, p. 02).
Desta forma, uma das maneiras de se evitar as consequências vindas de um sistema retrógrado e preferencial a criminalização por meios de encarceramento, surge a diversificação das penas privativas de liberdade, que oferecerem um caráter menos gravoso sobre a ótica criminal, e oferece meios mais humanizados.
“Poder-se-á evitar as desvantagens da criminalização através de alternativas à condenação formal por um juiz. Tais métodos de diversificação são utilizados em quantidade considerável na Alemanha, pois o juiz e também o Ministério Público podem arquivar o processo quando se tratar de delitos de bagatela em cuja persecução não subsista interesse público; tal arquivamento pode ocorrer inclusive no âmbito da criminalidade média, se o acusado prestar serviços úteis à comunidade (como pagamentos à Cruz Vermelha ou a reparação do dano). Estes métodos de diversificação são utilizados já hoje na Alemanha em quase metade de todos os casos, tendo reduzido consideravelmente a quantidade de punições” (ROXIN, 2006, p. 14).
Salva-se que, alguns delitos, que possuem maior gravidade – roubo, sequestro, estupro, homicídio, terrorismo, dentre outros – merecem maior atenção do estado, necessitando de um tratamento diferenciado em seu regime de cumprimento da pena.
Já os crimes que possuem menor gravidade – furto, estelionato, apropriação indébita, receptação – que são as maiorias dos processos nas varas criminais, fazem jus a aplicabilidade do instituto que oferece as condições alternativas a pena privativa de liberdade, e oferece um tramite e um execução mais facilitada.
Ressalta-se, aqui, a pretensão da legislação em introduzir o acordo de não persecução penal, no ordenamento jurídico brasileiro, como mecanismo para efetivar a celeridade processual, dando ênfase para processos referentes a crimes de maior gravidade.
Neste sentido, Roxin esclarece que, nos crimes de menor potencial ofensivo, a mera execução da pena em um regime privativo de liberdade, oferece mais danos do que ressocializa o indivíduo.
“Afinal, o fato de que, nos delitos pequenos e médios, que constituem a maior parte dos crimes, não é possível uma (re-)socialização através de penas privativas de liberdade, é um conhecimento criminológico seguro. Não se pode aprender a viver em liberdade e respeitando a lei, através da supressão da liberdade; a perda do posto de trabalho e a separação da família, que decorrem da privação de liberdade, possuem ainda mais efeitos dessocializadores” (ROXIN, 2006, p. 18).
Desta forma, é claro que, medidas alternativas ao cumprimento da pena, refletem em uma melhor qualidade da ressocialização do agente, bem como, em seu tramite mais fácil de resolução da demanda criminal.
2.4. O acordo de não persecução penal e a colaboração premiada
Embora não sendo o objeto principal de análise deste trabalho, de fato, a primeira legislação em trazer a espécie de plea bargaining para o ordenamento jurídico brasileiro foi a Lei nº 12.850/13, em seu artigo 3º-A até seu artigo 7º, conhecia como Lei de Combate ao Crime Organizado.
O mecanismo que apresenta a forma de possibilidade de acordo negocial entre a defesa e o membro do ministério público, chamado de colaboração premiada, consistia no quesito de que, um membro integrante de uma organização criminosa, apresentava meios suficientes de obtenção de provas, para o parquet, e em troca possibilitada hipóteses de redução de pena dentre outras.
Comumente, a colaboração premiada, é utilizada em organizações criminosas que atuam nos meios políticos – sem distinção das esferas municipais, estaduais e federais – entre empresas públicas ou privadas, com intenção de obtenção de vantagens indevidas ou desvios de verbas públicas.
A principal semelhança entre o instituto da colaboração premiada e o acordo de não persecução penal, os dois não incidem sobre o princípio da obrigatoriedade da ação penal, visto que possuem formas de facilitar o tramite processual, ou evitá-lo por inteiro (NUCCI, 2020, p. 188).
Uma das principais diferenciações entre o instituto do acordo de não persecução penal e a colaboração premiada, é que nesta última não basta apenas a confissão da prática do delito, mas sim, há a necessidade no esclarecimento e indicação das demais pessoas, e atos, que faziam parte da organização criminosa.
Da mesma forma não há especificação formal sobre quais crimes são passíveis de sua aplicabilidade, ficando à critério dos promotores a necessidade de se realizar a colaboração premiada para se obter provas, que sem a colaboração de um membro interno da organização, não seria possível. Tanto como, a possibilidade, conforme o artigo 4º da Lei nº 12.850/13, de se haver o perdão judicial, das práticas delituosas cometidas (DEMERCIAN, 2020, p. 72).
2.5. A ausência de posicionamento sobre a possibilidade de aplicação do acordo de não persecução penal após o oferecimento da denúncia pelos tribunais
Devido a matéria recente trazida pela Lei nº 13.964/19, é de conhecimento que tanto como o Supremo Tribunal Federal, quanto o Superior Tribunal de Justiça, não se posicionaram definitivamente sobre a matéria do acordo de não persecução penal, surgindo embates jurídicos nos Tribunais Estaduais.
Desta forma, somente é possível obter resultados pontuais de análises das matérias discutidas.
Uma das maiores discussões é sobre a aplicabilidade do acordo de não persecução em demandas já em tramite. Com isto, Aury Lopes Junior esclarece:
“O acordo de não persecução penal poderá ser oferecido aos processos em curso quando da sua entrada em vigor, na medida em que se trata de norma mista (retroage para beneficiar o réu). Também não vislumbramos obstáculos a que seja oferecido em qualquer fase do procedimento, caso não tenha sido acordado no início do feito” (LOPES JUNIOR, 2020, p. 318).
Em 18 fevereiro de 2020, surge a primeira decisão que se funda neste quesito, ainda em primeira instância, o Juiz da 13ª Vara Federal de Curitiba, ilustra em seu raciocínio:
“No dia 23/01/2019, entrou em vigor a Lei 13.964/2019, promovendo diversas alterações na legislação penal e processual penal, com a finalidade de refinar a persecução penal e os trabalhos das Cortes Criminais do Brasil. Dentre as alterações promovidas, houve a introdução do art. 28-A do CPP, que elevou ao patamar legal o denominado acordo de não persecução penal. […] Trata-se de norma que introduziu instituto despenalizador, de aplicação imediata nos feitos em curso, pelo disposto no art. 2º, do CPP, sem prejuízo da validade dos atos já praticados, em razão da teoria do isolamento dos atos processuais. Interpretação definitiva em relação aos limites e momento adequado à propositura do acordo de não persecução ainda serão objeto da análise pelas Cortes de Justiça. Nada obstante, não vislumbro óbices para que, desde logo, seja oferecida a processos em curso.”
Continuando na seara Federal, o posicionamento do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, estendeu seu fundamento aos mesmos motivos apresentados anteriormente por Bonat:
“O acordo de não persecução penal consiste em novatio legis in mellius, vez que a norma penal tem, também, natureza material ou híbrida mais benéfica, na medida que ameniza as consequências do delito, sendo aplicável às ações penais em andamento. 4. É possível a retroação da lei mais benigna, ainda que o processo se encontre em fase recursal […]. 5. Cabe aferir a possibilidade de acordo de não persecução penal aos processos em andamento (em primeiro ou segundo graus), quando a denúncia tiver sido ofertada antes da vigência do novo artigo 28-A, do CPP.”
Desta vez em discussão no Tribunal de Justiça de Santa Catarina, se deu prosseguimento aos mesmos fundamentos:
“As prescrições legais que consagram medidas despenalizadoras qualificam-se como normas penais de caráter material benéficas e, por força de princípio constitucional, têm aplicação inclusive aos casos em curso, não ocorrendo preclusão do direito de propositura do acordo de não persecução penal se este instituto passou a viger após a denúncia.”
No entanto, em sua devida análise no Tribunal de Justiça do Distrito Federal, houve o entendimento que, o fato do processo se encontrar em sede de apelação, impossibilita a aplicação do acordo de não persecução penal, visto a matéria se encontra preclusa.
“Não há como ser proposto à apelada acordo de não persecução penal, nos termos do artigo 28-A do Código de Processo Penal, quando a mesma teve contra si um decreto condenatório, estando a matéria preclusa.”
Seguindo em análise, agora no Tribunal de Justiça de São Paulo, se encontra o fundamento que, devido ao acordo de não persecução penal, ser um negócio jurídico de natureza extrajudicial – já que ocorre antes do início da ação penal – é impossibilitado a sua aplicação em sede de apelação.
“Ademais, embora o apelante tenha confessado nos autos, a celebração do acordo após a sentença condenatória não é mais possível, pois a jurisdição ordinária esgotou-se, não havendo razões jurídicas para o retorno dos autos ao 1º Grau, até porque a sentença, hígida, válida, proferida sem qualquer mácula, não pode ser anulada. Desse modo, seria visto como um contrassenso, neste momento processual, cogitar na aplicação do acordo de não persecução penal, quando a própria persecução penal já foi encerrada, sendo definida a responsabilidade criminal do acusado. Passo outro, pela disposição topográfica do instituto, interpreta-se que a proposição do acordo deve se dar logo após o encerramento da fase investigatória, quando não for o caso de arquivamento dos autos de Inquérito Policial. Desta feita, entendo que não é viável, no caso dos autos, falar-se em acordo de não persecução penal, diante da fase processual em que se encontram.”
Se utilizarmos o entendimento mais recente do Superior Tribunal de Justiça sobre a matéria similar da suspensão condicional do processo, encontraremos o seguinte:
“Na linha de precedentes desta Corte, por se tratar de nulidade relativa, é alcançada pela preclusão a alegação formulada após a prolação de sentença condenatória, em que se aponta a falta de oferta de suspensão condicional do processo.”
Neste mesmo sentido, Rodrigo Cabral Leite se funda:
“Parece ser plenamente possível ainda que temporariamente a aplicação do acordo de não persecução penal para os processos penais em curso, nos quais ainda não tenha sido proferida sentença. É dizer, o marco final para que possa celebrar o acordo de não persecução penal, a nosso sentir, é a sentença penal condenatória, não, portanto, sendo cabível o ANPP para os casos penais que se encontram na fase recursal. Isso porque, uma vez já tendo sido proferida sentença (condenatória), o acusado não poderia mais colaborar com o Ministério Público com sua confissão, que é, como já visto, um importante trunfo político-criminal para a celebração do acordo. Ademais, já proferida sentença, esgotada está a jurisdição ordinária, não podendo os autos retornar ao 1º Grau, mesmo porque a sentença jamais poderia ser anulada, uma vez que hígida” (CABRAL, 2020, p. 213).
Entre ambos os posicionamentos distintos, permita-me discorrer sobre duas possibilidades de aplicação.
O investigado tendo confessado formalmente a prática do delito, fazendo jus a aplicabilidade do acordo de não persecução penal conforme os requisitos apresentados no artigo 28-A do Código de Processo Penal, mesmo havendo sentença condenatória transitada em julgado, é medida que deverá ser requisitada a elaboração do acordo.
Como a confissão formal se deu no bojo do processo, é possível então, que pela entrada em vigor de lei mais benéfica, o investigado tenha a possibilidade de se beneficiar com as medidas alternativas constante em lei.
O investigado não tendo confessado formalmente a prática do delito, mesmo que faça jus aos requisitos apresentados em lei, e não havendo sentença condenatória, poderá requisitar a realização da audiência para a elaboração do acordo junto com o membro do ministério público.
Este fato se dá que, após a sentença condenatória não se entende que é permitido ao investigado a possibilidade de confessar a prática do delito para que possa se beneficiar das formas alternativas ao cumprimento da pena.
Com estes fundamentos, se complementa a alegação anterior que, carece um posicionamento definitivo sobre a aplicabilidade do acordo de não persecução penal – em demandas em curso ou já havendo sentença condenatória – pelo Supremo Tribunal Federal e pelo Superior Tribunal de Justiça, e que este uma vez ventilado o entendimento das Cortes, a segurança jurídica deverá ser restaurada nos Tribunais nacionais.
Conclusão
Como foi apresentado, as políticas públicas não estão contribuindo para a redução da criminalidade, tanto como, o poder judiciário se encontra com uma enorme sobrecarga de processos.
Diversos países, principalmente os países que possuem o sistema jurídico de common law, se utilizam das formas do plea bargaining, dentre eles, os Estados Unidos, que ao tentar enrijecer sua política criminal, e cessar a aplicação do plea bargaining, presenciou a crescente onda de criminalidade e ineficácia do tramite regular do processo, tendo que se socorrer novamente ao instituto.
O Canadá, também um país do sistema jurídico de common law, apresenta melhores políticas sociais e criminais – dispondo de indicies baixos de criminalidade –, se utilizando também do plea bargaining, para oferecer melhores condições aos investigados. Com a introdução do instituto do acordo de não persecução penal, surgiu-se diversas opiniões de doutrinadores se o instituto fosse realmente uma forma de negociação entre o promotor de justiça e o investigado, surgindo, inclusive, posicionamentos diversos.
Em uma análise afunda a característica do instituto em comparação com as formas de barganha processual penal estrangeiras, é inegável considerar que o acordo de não persecução penal, é uma forma clássica do plea bargaining, visto que seu objeto principal – a confissão da prática do delito – se encontra presente no texto legal.
Se manifestando propriamente sobre o instituto do acordo de não persecução penal, encontramos que o atual instituto é pode ser classificado como um direito do investigado, em que, havendo a possibilidade de aplicação do instituto, este ao menos deverá ser oferecido, não sendo oferecido, ou não havendo homologação por parte do magistrado, caberá recurso.
O entendimento doutrinário constante atualmente sobre o princípio da obrigatoriedade penal, não é ferido, ou sequer mitigado, visto que o princípio vincula ao promotor de justiça em oferecer a denúncia contra todos os casos os inquéritos policiais que possuem indícios de autoria e materialidade. Não há como negar que o simples fato de ser investigado durante a elaboração do inquérito policial, bem como figurar na parte passiva em uma ação penal, possui um estigma impaciente que os procedimentos terminam.
Desta forma, a maneira de se oferecer um tramite mais ágil da demanda processual, e ainda garantir que a confissão não possa ser considerada no caso de descumprimento das medidas impostas, traz maiores benefícios ao investigado.
Suma importância ressalta-se a pretensão – frisa-se pretensão, já que não há dados concretos para a análise das efetivas mudanças provocadas pelo acordo, devida a recente introdução do instituto – do legislador em estabelecer o instituto de não persecução penal, como maneira de dar mais atenção aos casos mais gravosos, bem como a possibilidade da aplicação do instituto no ordenamento jurídico nacional, em oferecer mais seguras e eficientes para a ressocialização do investigado, tanto quanto, a redução nos índices de criminalidade, como fundamentado por Roxin.
Restando assim, cabe a futura análise dos efeitos provocados pelo plea bargaining em um país com sistema jurídico de civil law, como é o Brasil.
Inicialmente, o mecanismo de elaboração de um acordo entre a acusação e a defesa, se deu pela entrada do instituto da colaboração premiada, havendo a principal diferença que não é somente necessário confessa a prática do delito, mas sim, auxiliar na produção de provas, que não seria possível sem a ajuda de um membro da organização criminosa.
Ao fim, se tem o conflito de posicionamentos que são encontrados nos Tribunais de Justiça estaduais, provocando decisões contrarias em casos similares, causando insegurança jurídica.
Inegável que o acordo de não persecução penal apresenta benefícios tanto para o investigado, como o próprio poder judiciário que carece urgentemente de meios mais eficientes e benéficos para administrar suas demandas processuais. No entanto, somente o lapso temporal poderá nos oferecer meios suficientes para contar se o instituto trouxe, de fato, benefícios ao beneficiário, como sua própria ressocialização, e o desafogamento do poder judiciário.
Para que isto aconteça, é necessário que tanto o Superior Tribunal de Justiça, como o Supremo Tribunal Federal, se posicione de maneira definitiva a respeito da matéria, no entanto segue-se esperando a discussão da matéria.
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[1] Bacharel em Direito pela Universidade Wyden Metrocamp. Pós-Graduando em Direito Penal e Criminologia pelo INTROCRIM. E-mail (gabriel-guedes@outlook.com).
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