1. Introdução
Ínsito à idéia de Constitucionalismo, tem-se também a de supralegalidade que orienta todo o ordenamento jurídico no sentido de atribuir àquelas normas alçadas junto ao corpo de um Texto Constitucional, posição hierarquicamente superior frente às demais situadas no âmbito infraconstitucional ( normas materialmente e formalmente constitucionais).
Todavia, tal regime jurídico constitucional não se tornaria viável dentro do sistema normativo, não fosse a característica de rigidez atribuível ao Texto Constitucional.
Sim, pois, em havendo um procedimento mais árduo de mutação constitucional – processo legislativo na elaboração de Emendas Constitucionais – em cotejo com o devido processo legislativo de Lei Ordinária, ter-se-á, dentro de um Sistema lógico-sistemático, como proteger o conteúdo das normas constitucionais em sua estatura supralegal, de eventuais normas infraconstitucionais que adviessem em desacerto com os comandos constitucionais.
Assim sendo, se tivéssemos em vigor um Constituição Flexível, qualquer mudança na legislação ordinária iria refletir no Texto Constitucional, chegando ao ponto de revogá-lo quando se encontrasse diante de uma antinomia, já que tanto a norma constitucional quanto a norma não constitucional, por terem passado pelo mesmo procedimento legislativo teriam o mesmo patamar hierárquico
2. Princípio da Supremacia Constitucional
O conteúdo deste princípio, traduz a idéia de que nenhuma lei pode ir contra às disposições constitucionais, seja do ponto de vista formal, seja do ponto de vista substancial tal submissão deve ser imposta.
Ocorre que, o Princípio da Supremacia se preocupa com a confrontação e priorização da Constituição frente às Leis, e tão-somente à estas espécies de atos normativos, não se preocupando à rigor com o cotejo da Norma Magna com demais atos dotados de normatividade e emanadados dos Poderes Públicos, que não àquelas leis consideradas estritamente.
3. Princípio da Primazia da Constituição
Em superação técnica ao teor que encerra o Princípio da Supremacia, tem-se o Princípio da Primazia da Constituição, que nada mais é do que a ampliação do significado inicial atribuído ao primeiro.
Tem-se por Princípio da Primazia da Constituição o confronto e prevalência do Texto Constitucional perante não apenas às leis mas também a todo e qualquer ato emanado dos Poderes do Estado.
Todos os Poderes Estatais, são emanações decorrentes do Texto Constitucional, e assim sendo, a fortiori todos aqueles atos levados à efeito pelos Poderes Públicos devem extrair fundamento de validade do Texto Constitucional e com este se ajustarem para serem considerados existentes, perfeitos, válidos e eficazes.
4. A importância da distinção entre Supremacia e Primazia em sede de Controle de Constitucionalidade
De início, pode parecer sem utilidade prática tal distinção travada entre os dois Princípios acima aventados. Contudo, não se trata de mero jogo de palavras que uma análise menos acurada possa denotar. A importância prática se revela quando se busca discriminar as bases justificadoras da Ação Direta de Inconstitucionalidade (Princípio da Supremacia Constitucional) da Argüição de Descumprimento de Preceito Fundamental (Princípio da Primazia Constitucional).
Quando se tratar de Ação Direta de Inconstitucionalidade, tomar-se-á como parâmetro de confronto com o Texto Constitucional, um ato normativo específico qual seja a lei propriamente dita.
Todavia, em considerando-se a Argüição de Descumprimento de Preceito Fundamental como veículo de discussão acerca da inconstitucionalidade fundamental ou estrutural, ter-se-á como referencial comparativo qualquer ato emanado do Estado (atos públicos em geral) e não tão-somente o âmbito específico das leis.
Tais inferências são perfeitamente extraíveis quando da inteligência do art. 1º da Lei n.º 9882/99 que expõe textualmente:
Art. 1º – A argüição prevista no § 1º do art. 102 da Constituição Federal será proposta perante o Supremo Tribunal Federal, e terá por objeto evitar e reparar dano ou lesão a preceito fundamental, resultante de ato do Poder Público.
5. Manifestações da doutrina estrangeira sobre a Primazia da Constituição
Segundo KONRAD HESSE há diferença entre Princípio da Supremacia da CF e da Primazia, vez que a Supremacia da Constituição encerra a idéia de cotejo de uma norma constitucional supralegal em desfavor de uma norma infraconstitucional encerrada em Lei propriamente dita. O Princípio da Primazia por seu turno guarda uma maior parametricidade, ou seja, qualquer ato do poder público deve guardar concordâncias com as disposições constitucionais e do Texto Magno extrair fundamento de validade seja tal emanação uma lei, um provimento judicial, ou um ato administrativo de todas as esferas de Governo.
Tal diferenciação é de suma importância, quando se quer diferenciar a ADIN da ADPF, já que esta última admite o controle da inconstitucionalidade estrutural – (ofensa particularizada à preceito fundamental) via processo objetivo de constitucionalidade de qualquer ato estatal em face dos Preceitos Fundamentais extraídos da CF. São princípios diferentes que orientam institutos diferentes.
Segue trecho de Doutrina de Hesse:
” O primado do direito encontra configuração na primazia da Constituição e na primazia da lei; ele é assegurado por um controle judicial quase ilimitado.
Segundo o princípio da primazia da Constituição, nenhum ato estatal pode pôr-se em contradição com ela. Também a legislação está vinculada à ordem constitucional (artigo 20, alínea 3, da Lei Fundamental); a Lei Fundamental proíbe rompimentos constitucionais (artigo 79, alínea 1) e a escavação de direitos fundamentais (artigo 19, alínea 2). Pela primeira vez na história constitucional alemã foi atribuída, com isso, à Constituição – também diante do legislador – força vinculativa ilimitada.
Em virtude da primazia da lei, atos estatais que são promulgados nas formas de legislação, prevalecem sobre todos os outros atos estatais. Na medida em que há regulações legais, todos os poderes estatais estão a elas vinculados …” HESSE, Konrard, Elementos de Direito Constitucional da República Federativa da Alemanha, Porto Alegre: Fabris, 1999. p. 167.
O mestre CANOTILHO ao fazer referência denominado-o como sendo Princípio da Conformidade dos Atos do Estado com a Constituição, preleciona:
“… é mais amplo que o princípio da constitucionalidade das leis. Ele exige desde logo a conformidade intrínseca e formal de todos os atos dos poderes públicos ( em sentido amplo; estado, poderes autónomos, entidades públicas) com a constituição (art. 3º/2.). Mesmo os actos não normativos directamente densificadores de momentos políticos da constituição – actos políticos – devem sujeitar-se aos parâmetros constitucionais e ao controlo (político ou jurídico) de conformidade (cfr. Art. 3º/3). O princípio da constitucionalidade não é apenas uma exigência de actos que não violem positivamente a constituição; também a omissão inconstitucional, por falta de cumprimento de um dever de legislar contido em normas constitucionais, constitui uma violação ao princípio da constitucionalidade (cfr. art. 283.º).” CANOTILHO, J.J.Gomes, Direito Constitucional e Teoria da Constituição ,4. Ed. Coimbra: Almedina, 2001.p. 245.
6. Conclusões
A distinção principiológica proposta neste trabalho, visa auxiliar a investigação científica do instituto da Argüição de Descumprimento de Preceito Fundamental de modo a lhe atribui identidade própria com princípios próprios à orientar seu estudo, interpretação e aplicação no cenário jurídico pátrio. Por tratar-se de uma poderosa Ação Constitucional de competência originário do Supremo Tribunal Federal e que cumpre a nobre função de defender as bases existenciais e mais caras de nossa ordem constitucional, qual seja os Preceitos Fundamentais, deve merecer a reflexão e o aprimoramento indispensável à sua consolidação prática.
Bacharel em direito pela faculdade de direito de presidente prudente (toledo); estagiário da promotoria das execuções criminais de presidente prudente/sp em 2000 e estagiário do ministério público federal de presidente prudente no ano de 2001; Advogado em São Paulo/SP.
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