SUMÁRIO: Intróito; 1.o meio ambiente de trabalho; 2.conceitos de assédios; 3.o assédio moral; 3.1. Conceitos; 3.2. Formas e tipos de assédio moral; 3.3. Vítimas do assédio; 3.4. Agente causador; 3.5. Individual e coletivo; 3.6. Caracterização; 3.7. As ações dos envolvidos no assédio moral; 4. Assédio sexual; 5. Assédio moral x assédio sexual; 6. Agressão física; 7. Os danos; 8. Reparação dos danos; 9. Assédios, danos e meio ambiente do trabalho propostas e aspectos e políticas preventivas e solucionantes; 10. Considerações finais; Referências bibliográficas.
INTRÓITO
O desenvolvimento das relações empresariais proporcionaram inúmeras mudanças no contexto sócio-laboral nos últimos anos, inclusive no que tange ao meio ambiente de trabalho e seus desdobramentos. Desdobramentos estes que começam a incomodar, tais como as novas formas de doenças ocupacionais ou problemas físico-psíquicos que surgem ou são diagnosticados pela medicina a cada dia.
Se a medicina do trabalho passa a voltar-se para a qualidade de vida e de trabalho dos operários é porque algo está acontecendo e se o fato social assim se concretiza o direito precisa se preocupar em regulamentar e tutelar tais mudanças, quer por legislações, quer por normas entre os particulares, quer por atos administrativos, enfim, a preocupação passa a ser de todas as áreas, pois o que a medicina observou foi: “o ser humano trabalhador não está bem!”
O fato de não estar bem no local de trabalho influencia não só o desempenho do labor mas também o ambiente de trabalho e a vida particular do trabalhador. Assim, estudar assédios e danos, com enfoque ao meio ambiente de trabalho se torna necessário para delimitar o alcance do problema, ou alias, preceituar os desafios que estão por vir.
Os estudos dos assédios são relevantes, não só por serem meios e formas de degradação do ambiente de trabalho, mas pela crescente onda de problemas de saúde, físicos e mentais, que vem sendo diagnosticados e que já estão chegando ao Poder Judiciário por decisões, até colegiadas.[1]
Neste intuito e com esta proposta desenvolve-se o presente estudo e ao final buscam-se alternativas ou delineamentos para evitar-se um mal maior, que prejudicará o ser humano trabalhador sem precedentes se não for ou remediado ou solucionado.
1.O MEIO AMBIENTE DE TRABALHO
Necessário identificar o que é e o alcance do Meio Ambiente de Trabalho, para tanto, utilizando-se de Celso Antonio Pacheco Fiorillo[2] que apresenta que o termo meio ambiente é um conceito jurídico indeterminado, e destaca que o “direito ambiental tem como objeto maior tutelar a vida saudável”, subdividindo-o em quatro aspectos para valorá-los conforme o grupo que pertença. Sendo estes: Meio ambiente natural[3]; meio ambiente artificial[4], meio ambiente cultural[5] e o meio ambiente de trabalho, pode-se alcançar um conceito.
Em assim sendo, o Meio Ambiente do Trabalho:[6]
“é aquele constituído pelo local onde as pessoas desempenham suas atividades laborais, sejam remuneradas ou não, cujo equilíbrio está baseado na salubridade do meio e na ausência de agentes que comprometam a incolumidade físico-psíquica dos trabalhadores, independente da condição que ostentem (homens ou mulheres, maiores ou menores de idade, celetistas, servidores públicos, autônomos etc.)”.
O meio ambiente de trabalho possui proteção constitucional, no Brasil, dentro do Título VIII da Constituição que trata da ordem social, precisamente, no art. 200, ao estipular que ao sistema único de saúde compete a atribuição de colaborar na proteção do meio ambiente, e nele compreendido o do trabalho. E ainda, no art. 225 do texto constitucional, ao este prever que “todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e á coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.”
O conjunto das condições internas e externas do local de trabalho e sua relação coma saúde dos trabalhadores são tidas como integrantes do conceito de meio ambiente do trabalho, conforme Sidnei Machado[7], que complementa ao dispor que:
“para o mundo do trabalho essa aproximação do meio ambiente com a saúde do trabalhador, numa perspectiva antropocêntrica, coloca a ecologia dentro da política. O produtivismo é a lógica do modo de produção capitalista, cuja irracionalidade dilapida a natureza para sua reprodução. Essa é a verdadeira fonte da crise ecológica, que também gera a exploração desenfreada da força de trabalho que coloca em perigo a vida, a saúde ou o equilíbrio psíquico dos trabalhadores.”
A proteção ao ambiente de trabalho, como proposto, abrange os princípios e as regras que envolvem os direitos fundamentais, como, a saúde, o trabalho, a segurança, a vida e outros, efetivados e sedimentados em 1988 como normas constitucionais. Estas garantias e direitos propostos pela positivação incluem a redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança, conforme o art. 7° inciso XXII da Constituição.
Embora a norma seja de eficácia limitada, ou até contida, dependendo do enfoque axiológico com que a lê, há o caráter principiológico e vinculante, pois ao mesmo tempo em que inspira a legislação infraconstitucional, possibilita que as demais normas do sistema a tenha como fonte inspiradora, inclusive para a leitura harmoniosa com as já existentes.
A redução de risco ao ambiente de trabalho alinha-se a proposta dos organismos internacionais de proteção à pessoa, que buscam efetivar os direitos humanos em todas as suas facetas, inclusive no âmbito laboral. O trabalhador deve, e assim se busca, ser encarado como cidadão, detentor de direitos mínimos, e sua atividade laboral como meio de transformação da sociedade econômica e não como empecilho ao desenvolvimento, assim o é que há proteção a em face de automação, no inciso XXVII do art. 7° da Constituição, bem como as profissões e ao mercado de trabalho, além da inserção e reconhecimento da função social do trabalho dentro dos princípios norteadores da República Federativa do Brasil no art. 1°, inciso IV da Constituição.
Portanto, o equilíbrio do meio ambiente somado à sua proteção e à saúde e bem estar do ser humano possibilita o alcance de obrigar a todos a proteger e tutelar o sempre saudável meio ambiente de trabalho, incluindo a concepção de trabalho decente da OIT e excluindo qualquer forma de assédio, por qualquer agente.
2.CONCEITOS DE ASSÉDIOS
A legislação nacional não apresenta um conceito pacífico sobre o que vem a ser o assédio, quer moral quer sexual, o que há sim é a previsão em legislações estaduais e municipais destinados ao funcionalismo público, além da previsão no Código Penal Brasileiro do crime de Assédio Sexual.
Diferentemente da Lei Portuguesa n.º99/2003 de 27 de Agosto, que instituiu o Código do Trabalho, pois em seu Artigo 24.º tem-se o conceito de:
“Assédio, como: 1 – Constitui discriminação o assédio a candidato a emprego e a trabalhador. 2 – Entende-se por assédio todo o comportamento indesejado relacionado com um dos factores indicados no n.º 1 do artigo anterior, praticado aquando do acesso ao emprego ou no próprio emprego, trabalho ou formação profissional, com o objectivo ou o efeito de afectar a dignidade da pessoa ou criar um ambiente intimidativo, hostil, degradante, humilhante ou desestabilizador. 3 – Constitui, em especial, assédio todo o comportamento indesejado de carácter sexual, sob forma verbal, não verbal ou física, com o objectivo ou o efeito referidos no número anterior.”
Sonia A.C. Mascaro Nascimento, destaca que “assédio é o termo utilizado para designar toda conduta que cause constrangimento psicológico ou físico à pessoa. Dentre suas espécies, verificamos existir pelo menos dois tipos de assédio que se distinguem pela natureza: o assédio sexual e o assédio moral.”[8]
Partindo-se deste entendimento pode-se constatar que àquele comportamento indesejado que objetivar ou afetar a dignidade da pessoa ou criar um ambiente intimidativo, hostil, degradante, humilhante ou desestabilizador, caracterizará o assédio. Assim para a correta conceituação do que vem a ser assédio, torna-se necessário analisar o aspecto do ambiente de trabalho, ou ainda que, para se chegar as formas de assédios, ter-se-à que passar pela relação das pessoas e assim pelo ambiente de trabalho em que estas se relacionam.
Deste modo o estudo das formas de assédios, suas reparações e concepções, todas voltadas ao meio ambiente do trabalho são necessárias para equacionar o equilíbrio que deve ser almejado pelos agentes evolvidos na relação de trabalho.
3.O ASSÉDIO MORAL
3.1.CONCEITOS
Como ponto de partida do que vem a ser o Assédio Moral vale ressaltar que a saúde do ambiente de trabalho depende decisivamente do modo pelo qual o poder diretivo é exercido, o abuso do poder ou a omissão ou inoperância da direção da empresa, podem favorecer e potencializar o desenvolvimento de relações e situações perversas dentro da empresa, provocando assim ou o desgaste dentro do meio ambiente de trabalho ou sua deteriorização por completo. E uma das formas de tal fato ocorrer é quando há o assédio moral.
O assédio moral para Marie-France Hirigoyen[9]
“é uma conduta bastante sutil, pois as condutas mais ostensivas têm outro tratamento legal. Para ela assédio moral no trabalho é: toda e qualquer conduta abusiva que se manifesta, sobretudo, por comportamentos, palavras, gestos, escritos, que possam trazer dano à personalidade, à dignidade ou à integridade física ou psíquica de uma pessoa, pôr em perigo seu emprego ou degradar o ambiente de trabalho”.
Vilja Marques Asse, destaca embora de forma mais simples mas suficiente, de que o “Assédio Moral psicoterrorismo é a exposição dos trabalhadores e das trabalhadoras a situações humilhantes e constrangedoras, repetitivas e prolongadas, durante a jornada de trabalho e no exercício das funções profissionais.”[10]
Ou ainda, pode-se conceituá-lo como sendo “a exposição dos trabalhadores e trabalhadoras a situações humilhantes e constrangedoras, repetitivas e prolongadas durante a jornada de trabalho e no exercício de suas funções, sendo mais comuns em relações desumanas e as éticas de longa duração, de um ou mais chefes dirigida a um subordinado, desestabilizando a relação da vítima com o ambiente de trabalho e a organização.”[11]
O que deve ser observado na caracterização do assédio moral é a reiteração da conduta ofensiva: um ato isolado não basta para ser caracterizado como assédio moral. A palavra “assédio” significa perseguição, insistência, impertinência. Daí possível chegar à natureza jurídica do assédio, que não é um dano à moral e sim uma forma de discriminação à pessoa vítima do assédio, quer voluntário quer involuntariamente. [12]
Numa tentativa de legislar sobre a lacuna da lei federal sobre o tema, o município de São Paulo elaborou a lei municipal de São Paulo n° 13.288, de 10 de janeiro de 2002, que conceituou assédio moral como:
“todo tipo de ação, gesto ou palavra que atinja, pela repetição, a auto-estima e a segurança de um indivíduo, fazendo-o duvidar de si e de sua competência, implicando em dano ao ambiente de trabalho, à evolução da carreira profissional ou à estabilidade do vínculo empregatício do funcionário, tais como: marcar tarefas com prazos impossíveis; passar alguém de uma área de responsabilidade para funções triviais; tomar crédito de idéias de outros; ignorar ou excluir um funcionário só se dirigindo a ele através de terceiros; sonegar informações de forma insistente; espalhar rumores maliciosos; criticar com persistência; subestimar esforços” (art. 1o., parágrafo único).
A tentativa da inserção do tipo do assédio em uma legislação é louvável, embora tenha sua abrangência limitada pelos seus sujeitos, ou seja, apenas os funcionários públicos municipais. Da mesma forma outros municípios no Brasil e até estados vem procedendo, vide exemplo o Estado de São Paulo pela lei estadual n° 12.250 de 19/02/2006.[13]
Uma vez conceituado o assédio cumpre analisar as formas de sua ocorrência, que podem ser variáveis e para a classificação a seguir busca-se selecionar algumas das formas.
3.2.FORMAS E TIPOS DE ASSÉDIO MORAL
O assédio moral pode ocorrer de várias formas, sendo ilusória a tentativa de descrevê-las todas, como bem aponta Márcia Novaes Guedes[14]. Entretanto, podemos classificá-las conforme a iniciativa e, fundamentalmente, o objetivo a ser alcançado com o assédio. As classificações a seguir apresentadas levam em consideração não apenas o emprego formal regularmente conhecido como o estipulado entre os sujeitos dos arts. 3° e 2° da CLT e na forma do 442 de tal legislação, ou seja, com subordinação, pessoalidade, prestado por pessoa física, com remuneração e não eventual, mas também todas as relações desenvolvidas nos ambientes de trabalho regidos pelo art. 114 da Constituição, alterado pela EC ° 45 de 2004, em que estendeu para as relações de trabalho muitos dos conceitos até então aplicáveis às relações de emprego, incluindo o assédio moral.
A primeira classificação a considerar é a do Assédio Vertical, que pode ocorrer das seguintes formas:
Assédio Vertical Descendente, que é oriundo do sistema e graus hierárquicos, ou seja, é àquele proveniente de um superior hierárquico e se destina ao seu subordinado ou subordinados.
Há ainda, neste mesmo grupo o Assédio Perverso que é àquele pelo praticado pelo sujeito com o objetivo puramente gratuito de eliminação do outro ou valorização do próprio poder. Não é fato ignorado que algumas pessoas têm certa perversidade que é acentuada pelo exercício de cargos com certo poder de mando.
No mundo competitivo do mercado liberal há o Assédio Estratégico que é aquele que se destina a forçar o empregado a pedir a rescisão do contrato de trabalho e assim contornar os procedimentos legais de dispensa, trata-se de forma pura e cruel de deslealdade procedimental, em que os sujeitos envolvidos são conduzidos, para não dizer arrastados pela perversidade de fraudar a legislação em detrimento ao já prejudicado hipossuficiente da relação de trabalho.
Ainda tratando de formas de assédios que infrinjam a lealdade que deveria guarnecer as partes durante a relação de trabalho, tem-se o Assédio Institucional, que é um instrumento de gestão do conjunto de pessoal. Nesse sentido, a empresa “estimula” o assédio a fim de que os “gerentes, supervisores” possam “extrair” o melhor de seu pessoal, embora por alguns tal forma seja considerada como legítima no mundo corporativo-liberal,trata-se novamente de falta de boa-fé exigir da parte contrária mais do que “suas regulares forças físicas e psíquicas” .
Outra forma de ocorrência do assédio é o Assédio Vertical Ascendente: Embora seja menos comum, é igualmente preocupante. Este pode se dar de duas formas:
– Falsos relatos de assédio moral ou sexual ao superior hierárquico: em que é imputada uma falsa conduta de assédio, geralmente sexual, mas também podendo ser moral. O caso gera grande repercussão, sem que, contudo, haja provas concretas. Uma acusação falsa dessa natureza causa grande perturbação na vida pessoal do ser humano, gerando conseqüências físicas, psíquicas e morais. Ou:
– Reações coletivas de grupo: é uma atitude de represália em face de uma nova chefia. Exemplos concretos são as atitudes que caracterizam o “boicote” a uma nova diretoria de uma empresa por parte dos subordinados, ocasionando prejuízos ou até demissão dos novos diretores, ou ainda, a assunção de cargos de chefia em repartições publicas por pessoas com menos tempo de carreira ou de funcionalismo público, ou ainda com menos idade, do que outros funcionários.
Outra forma de Assédio Moral é o Horizontal, ou seja, aquele que ocorrer entre empregados do mesmo nível hierárquico. As razões que o motivam podem ser as mesmas daqueles que motivaram o assédio vertical descendente (ínsita a perversidade ou atitude provocada pela direção da empresa). Estudos psicológicos colocam também o comportamento de inveja e rivalidade. Todavia, esse comportamento também pode ter sido provocado pela empresa.
3.3.VÍTIMAS DO ASSÉDIO
As vítimas dos assédios morais, em qualquer de suas formas, não é, como se pode pensar, o empregado desidioso, em geral, são empregados responsáveis, e às vezes, quase ingênuos ao acreditar nos outros. São geralmente pessoas bem-educadas e possuidoras de valiosas qualidades profissionais e morais. De um modo geral, a vítima é escolhida justamente por ter algo mais, é esse algo mais que o perverso busca “roubar”, subtrair o êxito da vítima.
Por sua vez, o assediante também não faz distinção entre homens e mulheres, o que lhe importa é reduzir a estima de uma pessoa, persegui-la, enfim, agir com perversidade e deslealdade na relação de trabalho.
Como bem menciona Márcia Novaes Guedes, no “psicoterror a vítima é presa numa armadilha; não sabe do que a acusam, que crime afinal, cometeu, o que dificulta sobremaneira sua defesa.”[15] A vítima fica totalmente submissa ao agressor. Não se trata unicamente de medo de perder o emprego, porém, de mecanismos que o sujeito perverso utiliza para imobilizar as possíveis reações da vítima.
Dentre os meios ou métodos de limitar a ação da vítima Márcia Novaes Guedes[16] menciona alguns praticados corriqueiramente, quais sejam: o ato de recusar a comunicação com a vítima, ou seja, pratica-se o isolamento; outra forma é a desqualificação da vítima e de seu potencial, sendo assim uma agressão sub-reptícia, que pode ser por gestos, olhares, recados e outras formas; a destruição da auto-estima da vitima, ou seja, desqualifica a pessoa moralmente, desacreditando-a perante o grupo dentre outras; outro meio é o de cortar as relações sociais, novamente, isolá-lo do grupo com que ele e seu agressor até então conviviam; o ato de vexar ou constranger perante outras pessoas também pode caracterizar o assédio, pois há a confiança à vítima de tarefas inúteis ou degradantes, ou fixam-se metas impossíveis de serem atingidas, obrigando a pessoa a trabalhar mais sem alcançar resultados, provocando, inclusive estafa física.
3.4.AGENTE CAUSADOR
Se a vítima pode ser qualquer indivíduo o agressor é sem dúvida um sujeito perverso próximo à vitima e ligado à ela ou pelo ambiente de trabalho ou pelo próprio trabalho. Sabe-se que toda e qualquer pessoa, em um dado momento de crise, é levada a utilizar-se de mecanismos perversos para de se defender, mas no sujeito perverso esses mecanismos são “regra de vida”.
Além do agressor direto, há àqueles agressores passivos ou os Espectadores, que geralmente são os colegas de trabalho, os superiores, os encarregados da gestão de pessoal que, querendo ou não, de algum modo participam dessa violência e a vivenciam ainda que por reflexo. Há os conformistas passivos e os ativos. Os passivos nada fazem para fazer cessar a atividade do agressor e os ativos até mesmo colaboram.
3.5.ASSÉDIO INDIVIDUAL E COLETIVO
Tanto o agressor quanto a vítima podem ser pessoas individuais ou coletivas, por exemplo, um departamento todo de uma determinada empresa sofre represálias sutis por parte da direção da empresa ou de um único diretor e vice-versa, um diretor que sofre a represália de todos os seus subalternos e assim por diante. Ou seja, não há regra para determinar a forma de ocorrência do assédio moral, e assim dependerá do caso concreto.
3.6.CARACTERIZAÇÃO
Possível caracterizar o assédio moral de formas variadas, mas algumas delas, costumeiramente são verificáveis durante a relação de trabalho, quais sejam[17]:
– Deterioração Proposital das Condições de Trabalho, como: Retirar da vítima a autonomia; Não lhe transmitir mais as informações úteis para a realização de tarefas; Contestar sistematicamente todas as suas decisões; Criticar seu trabalho de forma injusta ou exagerada; Privá-la do acesso aos instrumentos de trabalho: telefone, fax, computador… Retirar o trabalho que normalmente lhe compete; Dar-lhe permanentemente novas tarefas; Atribuir-lhe proposital e sistematicamente tarefas inferiores às suas competências; Atribuir-lhes proposital e sistematicamente tarefas superiores às suas competências; Pressioná-la para que não faça valer seus direitos (férias, horários, prêmios); Agir de modo a impedir que obtenha promoção; Atribuir a vitima, contra a vontade dela, trabalhos perigosos; Atribuir à vítima tarefas incompatíveis com sua saúde; Causar danos em seu local de trabalho; Dar-lhe deliberadamente instruções impossíveis de executar; Não levar em conta recomendações de ordem médica indicadas pelo médico do trabalho; Indicar a vítima ao erro.
– Isolamento e recusa de comunicação, como: A vítima é interrompida constantemente; Superiores hierárquicos ou colegas não dialogam com a vítima; A comunicação com ela é unicamente por escrito; Recusam todo contato com ela, mesmo o visual; É posta separada dos outros; Ignoram sua presença, dirigindo-se apenas aos outros; Proíbem os colegas de lhe falar; Já não a deixam falar com ninguém; A direção recusa qualquer pedido de entrevista;
– Atentado contra a dignidade, como: Utilizam insinuações desdenhosas para qualificá-la;
– Fazem gestos de desprezo diante dela (suspiros, olhares desdenhosos, levantar de ombros…); É desacreditada diante dos colegas, superiores ou subordinados; Espalham rumores a seu respeito; Atribuem-lhe problemas psicológicos (dizem que é doente mental); Zombam de suas deficiências físicas ou de seu aspecto físico; é imitada ou caricaturada; Criticam sua vida privada; Zombam de suas origens ou de sua nacionalidade; Implicam com suas crenças religiosas ou convicções políticas; Atribuem-lhe tarefas humilhantes; È injuriada com termos obscenos ou degradantes.
– Violência verbal ou física, como: Ameaças de violência física; Agridem-na fisicamente, mesmo que de leve, é empurrada, fecham-lhe a porta na cara; Falam com ela aos gritos; Invadem sua vida privada com ligações telefônicas ou cartas; Seguem-na na rua, é espionada diante do domicílio; Fazem estragos em seu automóvel; Não levam em conta seus problemas de saúde.
Para Maria José Giannella Cataldi, caracteriza-se o Assédio Moral
“pela degradação deliberada das condições de trabalho onde prevalecem atitudes e condutas negativas dos chefes em relação a seus subordinados, constituindo uma experiência subjetiva que acarreta prejuízos emocionais para o trabalhador e a organização. A vítima escolhida é isolada do grupo sem explicações, passando a ser hostilizada, ridicularizada, inferiorizada, culpabilizada e desacreditada diante dos pares.”
Há ainda o ponto do estresse profissional que pode ter sua causa advinda do assédio moral, como apresenta Fernanda Moreira de Abreu[18] “a má condição ou organização do trabalho pode gerar estresse profissional e no que tange ao tipo de gestão e à qualidade das relações humanas pode-se encontrar a figurado assédio moral que são dois fatores importantes no desencadeamento ou agravamento da depressão.(…) Ressalta-se, portanto, que se o assédio moral se prolonga no tempo, um estado depressivo forte pode se solidificar.”
3.7.AS AÇÕES DOS ENVOLVIDOS NO ASSÉDIO MORAL
Os envolvidos, direta ou indiretamente, em casos de assédios morais podem, aliás, devem agir, porém mecanismos como a prevenção e a informação de todos os membros que utilizam ou transitam no meio ambiente de trabalho são úteis para evitar e coibir a existência a ser remediada do mal “in questio”.
Outros mecanismos podem ser adotados quer pelos obreiros quer pela direção. Dentre alguns se destacam: a) a mudança nas condições de trabalho; b) as mudanças no comportamento da direção; c) a melhoria na posição social de cada indivíduo; d) a melhoria do padrão de moralidade do setor; e) o exercício do “ius puniendi” com aplicação de advertência, suspensão ou até demissão do agressor ou ainda a mudança de local de trabalho do agressor, e em último caso a utilização de rescisão do contrato de trabalho por justa causa.
A demissão com justa causa ocorrerá por “ato lesivo da honra ou da boa fama praticado no serviço contra qualquer pessoa, ou ofensas físicas, nas mesmas condições, salvo em caso de legítima defesa, própria ou de outrem” (art. 482, “j”, CLT). Por outro lado, comete falta grave o patrão que exigir serviços superiores às forças do empregado (art. 483, “a”, CLT), tratá-lo (diretamente ou através de superiores hierárquicos) com rigor excessivo (“b”), colocá-lo em perigo manifesto de mal considerável (“c”), descumprir as obrigações do contrato (“d”) ou praticar contra ele ou pessoas de sua família atos lesivos da honra e da boa fama (“e”) e ofensas físicas (“f”).
4. ASSÉDIO SEXUAL
Para tratar do assédio sexual necessário caracterizá-lo, para tanto se utiliza do conceito de Ernesto Lippmann, que o apresenta quando há[19]:
“O pedido de favores sexuais pelo superior hierárquico, ou sócio da empresa, com promessa de tratamento diferenciado em caso de aceitação e/ou ameaças de tratamento diferenciado em caso de recusa, como a perda do emprego, ou de benefícios. É necessário que haja uma ameaça concreta de demissão do emprego, ou da perda de promoções, ou de outros prejuízos, como a transferência indevida, e/ou pela insistência e inoportunidade. É a “cantada” desfigurada pelo abuso de poder, que ofende a honra e a dignidade do assediado.”
Há que se observar que o assédio também pode ocorrer de forma mais ampla, ou seja, ser proveniente de comentários ousados sobre a beleza, sobre os dotes físicos, ou ter aspectos físicos como toques indesejados, por abraços mais prolongados que o costume autoriza.
Após a inserção no Código Penal no art. 216-A do crime de assédio sexual[20] pela lei n° 10.224 e 16 de maio de 2001, muito na doutrina se debate sobre o assédio sexual no meio ambiente do trabalho.
Para a configuração do tipo previsto no estatuto penal necessário haver subordinação, ou seja, que o assediador seja ou esteja em grau hierárquico superior ao do assediado, desfrutando do poder de comando, podendo oferecer vantagens e desvantagens, podendo ainda, utilizar o poder intimidando ou chantageando, ameaçando ou diminuindo a capacidade de resistência do assediado, procurando obter, para si ou para outrem, favores de ordem sexual.[21]
Tanto para a configuração do crime ou mesmo somente para a prática de ilícito civil, qual seja o de perturbação ou deteriorização da honra e da personalidade da pessoa humana, basta existir um único ato de agressão sexual dispensando-se assim a reiteração. O ato, mesmo que único, mas grave e inconveniente e que traga implícita ou explicitamente represália no caso de recusa ou favorecimento no aceite pode configurar o assédio sexual.
Embora seja costumeiramente realizado por homens face às mulheres, não há obrigatoriedade, ao menos para o ilícito civil, de seguir tal regra, assim é possível ter-se o assédio entre homens e mulheres ou entre mulheres e homens, bem como entre pessoas do mesmo sexo, pois o importante é ficar configurada a prática de favorecimento ou prejuízo diante do aceite ou não da agressão.
“Geralmente o assédio ocorrer a portas fechadas”, destaca Ernesto Lippmann, “porém para que o assediante seja punido, e o assediado indenizado, as provocações devem ser claramente demonstradas.”[22] Portanto, mesmo sendo assediada, a vítima da agressão terá que produzir provas de suas alegações, como por exemplo utilizando-se gravações com ameaças ou cantadas inconvenientes, quer de conversas pessoais ou realizadas pelo telefone, mesmo que tal meio de prova tenha de ser submetido à perícia, além de e.mails, correspondências, recados lembretes em papéis, laudos e pareceres médicos, e sobretudo, se houver, prova testemunhal de colegas de trabalho.
Cumpre destacar que se o assediador utilizar-se da força ou esforço físico face à pretensão resistida da vítima para usufruir dos favores sexuais ou mesmo libidinosos, estar-se-ão diante de outros crimes, como o de estupro e de atentado violento ao pudor.
5. ASSÉDIO MORAL X ASSÉDIO SEXUAL
Feita a análise conceitual e caracterizante do que vem a ser assédio sexual e moral, cumpre salientar que não há conteúdo sexual no assédio moral. Há sim a característica comum da humilhação, da discriminação e da ofensa à dignidade, mas o assédio moral não se reveste do caráter sexual nem traz em si a retaliação decorrente do convite não aceito. O assédio moral, repissa-se, caracteriza-se pela humilhação e pelo clima de terror. Também não há a configuração penal do crime de assédio moral, sendo no máximo, conforme o caso concreto configurado o crime de constrangimento ilegal, previsto no art. 146 do Código Penal.[23]
Maria Aparecida Alkimin resume os assédios – moral e sexual – como em ambos sendo traduzidos em comportamentos, atos, palavras, gestos ou escritos que tornam o meio ambiente do trabalho hostil, degradante e insuportável, e, como forma de violência psicológica, geram na vítima “grande tensão psicológica, angústia, medo de ficar sozinha no posto de trabalho, com sentimento de culpa e autovigilância acentuada, inclusive, desarmonizando as emoções e provocando danos à saúde, física e mental, constituindo-se em fator de risco à saúde nas organizações de trabalho, e ambas as formas atingem a dignidade e os direitos de personalidade do trabalhador”.[24]
O assédio sexual por ter em seu contexto uma agressão à vítima mais clara e evidente do que o moral, torna-se mais fácil de ser configurado, tanto para a esfera trabalhista-civil quanto penal.
Para Roldão Alves de Moura, “no que concerne ao assédio sexual ocorrido no meio ambiente de trabalho, evidencia-se flagrante violação dos direitos do trabalhador, com o conseqüente dano de difícil reparação que sofre o assediado, quando tem a sua dignidade ferida”, pois “o meio ambiente de trabalho pra o assediado passa a ser hostil, humilhante e instável. Esta situação conduz o funcionário a uma situação de constrangimento, refletindo sobre o psiquismo e tirando sua liberdade m todos os sentidos.”[25]
6. AGRESSÃO FÍSICA
Além dos assédios, moral e sexual, há ainda a possibilidade de na relação de emprego ou trabalho ocorrer agressão física entre as partes, principalmente no ambiente de trabalho em que há relacionamento direto entre seres humanos em diversos momentos do dia, em dias variados, com sentimentos pessoais variados, somados à tensão do mundo trabalhista globalizado.
Novamente, o Código Penal fornece a tipificação de um delito para tal(is) condutas, o de Lesão Corporal, previsto no art. 129,[26] que poderá ser, gravíssima, grave e leve, conforme o caso concreto.
Cumpre mencionar e destacar que a agressão está presente na configuração do assédio sexual diferentemente do moral.
7. OS DANOS
Para tratar dos danos oriundos dos assédios ou agressões passíveis de ocorrerem na relação laboral, utiliza-se a conceituação de Paulo Eduardo Vieira de Oliveira,[27] para quem o “dano é a lesão (efeito) de um ato humano ilícito, comissivo ou omissivo, decorrente de dolo ou culpa, que fere interesse alheio juridicamente protegido”
Assim, no caso concreto de assédio deve-se verificar a ocorrência e preenchimento dos requisitos estampados no conceito supra para ter-se o dano. São requisitos: a) lesão; b) ato ilícito comissivo; c) culpa ”lato sensu”; d) interesse jurídico alheio, e neste tem-se a honra, a moral, a reputação ilibada da vítima, e sobretudo a sua condição de hipossuficiente psicológica face o agressor.
Ainda sobre danos, não se pode olvidar de analisar o nexo causal e a relação com a obrigação jurídica existente em decorrência do contrato de trabalho celebrado, pois dentre todas, àquele decorrente do meio ambiente de trabalho saudável e equilibrado, para atingir a boa-fé na contraprestação das obrigações oriundas da relação de trabalho e da lealdade das partes, mesmo que o assédio se dê fora do ambiente físico de trabalho, mas em função deste (trabalho) por haver relação direta entre o ambiente saudável e a condutas dos agentes poderá sim haver a ocorrência de danos ao ambiente e por sua vez às pessoas que nele convivam.
Todo o dano à personalidade e à vida, quer seja ele, pessoal ou material, desde que praticado de forma ilícita deve ser reparado por aquele que deu causa, como prevêem os arts. 186, 187 e 927 da Lei nº 10.406/02, o Código Civil, que são plenamente aplicáveis às normas laborais. No entanto é que a Emenda Constitucional de n/ 45 de 2004 que alterou o art. 114 fez inserir em seu contexto a competência da Justiça do Trabalho para julgar e processar as ações oriundas dos danos havidos em razão do trabalho.
Em existindo danos à vítima, há de se analisar se estes foram de ordem patrimonial ou de ordem pessoal. Aqui, mais uma vez utilizando-se da obra de Paulo Eduardo Vieira Oliveira,[28] obtém-se quanto ao Dano Pessoal, a seguinte classificação e entendimento:
“A personalidade é um continente, de que direitos e obrigações são o conteúdo. (…) Destacando os seguintes direitos, do “todo” que é a pessoa: Direito à integridade física: direito à vida e aos alimentos; direito sobre o próprio corpo vivo e morto; direito sobre o corpo alheio vivo e morto; direito sobre partes separadas do corpo vivo e morto; Direito à integridade intelectual: (…) Direito à integridade moral: direito à liberdade civil, à honra (…); Direito à integridade social: ser essencialmente político e social, a pessoa humana tem direito ao convívio familiar e em grupos(…)”
O trabalhador, antes de assumir essa qualidade a ele inerente, é pessoa humana, e por assim ser, possui um rol de direitos e garantias asseguradas à pessoa que é, e à personalidade que possui, conforme garantias e direitos estampados nas legislações, como Código Civil e os direitos à personalidade, e como a Constituição no bojo do art. 5°, quer mesmo que de forma principiológica, iluminando e informando todo o ordenamento jurídico, por força do dispositivo historio da “dignidade da pessoa humana”, positivado no art. 1°, inciso III da Constituição de 1988.
8. REPARAÇÃO DOS DANOS
Como exposto, o dano, que pode ser material ou não-material, enseja a sua reparação, pois, como na conceituação supra utilizada, o dano é gerado por um ato humano por culpa “lato sensu” do agente, atingindo um bem jurídico doutrem. Maria Aparecida Alkimin menciona que
“enquanto o dano material ou patrimonial afeta o patrimônio material, ou seja o conjunto de bens e direitos apreciáveis economicamente, diminuindo o valor e restringindo a utilidade, ou até mesmo anulando a utilidade do mencionado bem, o dano moral ou extrapatrimonial não é valorável economicamente, haja vista invadir e afetar a esfera subjetiva e psíquica da personalidade humana, atingindo a honra, a intimidade, a integridade psíquica, auto-estima, enfim, é derivado de práticas que atentam contra o constitucional e universal princípio da dignidade da pessoa humana.”[29]
A reparação do dano ocasionado pela lesão praticada há de ser exercida pelo poder de ação do empregado, por meio do Estado-jurisdicional, que chama para si esta prestação jurisdicional a ofertando pela tutela. O ressarcimento do dano, quando inviável o retorno ao “status quo ante” da lesão, deve se dar por intermédio de uma indenização que, nas palavras de Enoque Ribeiro dos Santos, deve ter dupla função, a saber[30]: “a objetiva, não apenas compensar a dor, a angústia, a humilhação e aflição do lesado, como também tem por finalidade a imposição de sua outra função, ou seja, uma pena para o ofensor, com o caráter de prevenção, a fim de evitar novas investidas ou reincidências.”[31]
Maria Aparecida Alkimin,[32] propõe levar-se em conta para a fixação da quantificação da indenização alguns critérios como: a) intensidade da dor sofrida pela vítima; b) gravidade e natureza da lesão; c) a intensidade do dolo e o grau da culpa, bem como a condição econômica do agente causador do dano; d) a possibilidade de retratação; e) o tempo de serviço prestado na empresa e a idade do ofendido; f) o cargo e a posição hierárquica ocupada na empresa; g) permanência temporal dos efeitos do dano e h) antecedentes do agente causador do dano.
Os danos na esfera moral e patrimonial são passíveis de serem cumulados, como dispõe a Súmula 37 do STJ[33], portanto possível que do assédio moral ou sexual, além dos danos morais que em via de regra existirão ter-se-à os danos materiais, como por exemplo, o fato da pessoa passar a ter compulsão por aquisição de produtos que para si seriam supérfluos, ou fora do seu perfil de consumo, ou ainda, distúrbios que atinjam a esfera psíquica e que influenciem a vida patrimonial da vítima, como gastos excessivos ou perda do equilíbrio financeiro, para todas, basta que tais condutas tenham o nexo de causalidade atrelados ao assédio.
Os danos ainda podem ser ocasionados a um só indivíduo ou a toda uma coletividade. Pois se o assédio ocorreu a todo um departamento, ou a todo um grupo de trabalhadores, sair-se-á da esfera individual e entrará na esfera coletiva. Outra situação, ainda coletiva, é o fato de haver dano moral coletivo, como por exemplo, o fato de o agressor tentar ou conseguir prejudicar, diversas vítimas e/ou o sistema de proteção e às normas que tutelam o ser humano, principalmente o trabalhador.
A reparação do dano, no caso do dano moral coletivo, pode atentar-se as mesmas regras do dano individual, e ainda buscar desestimular a conduta do sujeito agressor.
Tal desestimulação pode ser requerida pelas vítimas, ou com a condenação do agressor a pagar-lhes determinadas quantias, ou com a conversão de valores a Fundos Públicos de preservação e informação ao trabalhador; ou ainda, ser aplicada pelo magistrado “ex oficio” a fim de “educar e coibir” atos futuros similares ao que deu causa àquele feito.
Ponto finalizando, na existência de danos, quaisquer que sejam, inclusive, quando exigidos trabalhos intelectuais além das forças do trabalhador, ou ainda nos casos de o empregador praticar atos faltosos, e ensejar a ruptura da relação contratual, este deve ser acionado para reparar o dano que ocasionou ao empregado, evitando abuso de direito ou prática ilícita.
9. ASSÉDIOS, DANOS E MEIO AMBIENTE DO TRABALHO PROPOSTAS E ASPECTOS E POLÍTICAS PREVENTIVAS E SOLUCIONANTES
Uma vez conceituados os institutos, analisadas suas abrangências e identificados seus caracterizantes, passa-se a considerar que os assédios são formas inequívocas de deteriorização ao meio ambiente do trabalho, ocasionado danos e prejuízos à ordem individual, coletiva e empresarial, quer à vítima quer à empresa.
As formas de alinhar preventivamente as condutas dos agentes envolvidos estão desde a realização pormenorizada de exames periódicos da capacidade e desenvolvimento físico e psíquico do trabalhador, e neste caso incluir o coletivo além do individual. Cumprir e fazer cumprir as normas de segurança e medicina do trabalho. Instruir os empregados quanto as precauções a tomar para evitar acidentes de trabalho ou doenças ocupacionais, adotar as medias que lhes sejam determinadas pelo órgão regional competente. Exercitar a fiscalização pelos órgãos públicos e cumprir as determinações.[34]
Alinham-se a tais condutas os estudos prévios de impactos ambientais que a empresa pode realizar nos locais de trabalho, além das auditorias ambientais que são estudos posteriores ao do Impacto ambiental e que possuem a finalidade de avaliar se as orientações contidas no estudo Prévio estão sendo observadas esse o controle ambiental está sendo eficiente.
E, por fim, a mais relevante de todas as formas, o amplo acesso à informação educativa, quer com campanhas publicitárias internas na empresa, quer com cursos regulares destinados aos empregados da empresa com profissionais gabaritados e de diversas áreas, com propaganda informativa, com campanhas educativas, sempre tendo como público alvo a vítima e concomitantemente o agressor.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A análise final deste trabalho esbarra no problema central que ainda não foi abordado de frente, qual seja, o papel do ser humano nas relações laborais, mas não no sentido unicamente sociológico, que não se descarta, mas também no antropológico e no psicológico.
Desta forma é que Richard Sennett em sua obra A Corrosão do Caráter, conseqüências pessoas do trabalho no novo capitalismo, propõe no capítulo da Ética do Trabalho as seguintes proposições[35]: “as superficialidades da sociedade modera são mais degradantes que as superfícies e máscaras da arte. (…) Um dos motivos para essa superficialidade degradante é a desorganização do tempo. (…) As pessoas sentem falta das relações humanas constantes e objetivos duráveis. (…) a ética do trabalho é a arena em que mais se contesta hoje a profundidade da experiência. (…) é o homem motivado, decidido a provar seu valor moral pelo trabalho. (…) O trabalho em equipe, porém, nos leva ao domínio da superficialidade degradante que assedia o moderno local de trabalho. Na verdade, o trabalho em equipe deixa o reino da tragédia para encenar as relações humanas como uma farsa.”
Ora postas estas colocações, chegam-se as seguintes conclusões.
Que o trabalho e seu valor social são necessários para que o ser humano continue a viver, a viver em sociedade, e a se relacionar e desenvolver as relações sociais. Pois com base no trabalho é que a sociedade se transforma e se modifica com o passar dos anos. Os costumes sociais são influenciados pelas alterações que o ser humano insere na sociedade quer econômica quer industrial e tais somente são possíveis por meio do trabalho.
Não há que se duvidar da mudança paradigmática das relações laborais em menos de um século de história, basta o recorte, exemplificativo, do período pós-guerra, para poder observar que a interferência humana no meio ambiente e nas relações sociais se modificaram como nunca dante visto. O desenvolvimento da robótica e da informatização, possibilitaram as mudanças nas formas de trabalhar, reduzindo a excedente mão-de-obra operária para a intelectual qualificada e precisa, além, da supressão dos postos de trabalho.
Se o trabalho intelectual, alinhado a mecanização e a robótica, passa a dominar as frentes de trabalho no mundo, o trabalho individual também deixa de ser buscado,ou seja, os artesões de antes estão em escassez, já que o trabalho em equipe com polipercepções capacidades múltiplas tem sido buscadas para reduzir custos e atingir mais rápido os resultados.
Porém, com o aumento do profissionalismo técnico e precisão das atividades envolvidas nas novas formas de trabalho, o ser humano, passa a ocupar papel secundário ou até terciário, pois basta uma mente criadora, muitos robôs e o trabalhador que aperta o botão da máquina para iniciar e finalizar o trabalho, e pronto.
Essa tendência ocasiona o deslocamento da mão-de-obra para o trabalho intelectual, como colocamos, e para tanto os escritórios e não mais as indústrias e fábricas passam a ocupar o papel central no mundo obreiro. Assim o é que muitas fábricas antigas além de fecharem, dão lugar físico a enormes arranha-céus que abrigarão muito mais trabalhadores capacitados para funções múltiplas, com o acumulo de riquezas maiores para suas corporações.
Porém, o que parecia ser bom começa a demonstrar seus sinais de fraqueza. Se no inicio do século passado o “chão da fábrica” foi palco para o surgimento do embate e desenvolvimento dos sindicatos, hoje a concentração de pessoas em pequenos escritórios e salas, proporcionam o estreitamento das relações pessoais, influenciando na saúde e no bem estar das pessoas que ali convivem.
O meio ambiente de trabalho como conceituado no inicio, passa a sofrer perturbações pois a vida numa cidade se reduz ao ritmo frenético e rotineiro de: trabalho-casa e casa-trabalho, com menor leque de contatos pessoais transformando a psique das pessoas e suas condutas, reduzindo as atividades de lazer e cultura do ser humano.
O surgimento de doenças modernas relacionadas ao trabalho, estão intimamente ligadas aos problemas do meio ambiente de trabalho. E, os assédios não fogem à regra.
O assediante, grande culpado do assédio, é produto do meio, do meio tecnológico-globalizante em que o indivíduo passa a ter “neuras” e tais extrapolam a sua pessoa atingindo os seus poucos colegas de trabalho, acentuando os problemas e concentrando as ocorrências de assédios.
Se o assediante é o culpado do assédio e ao mesmo tempo se é produto do meio, pode-se concluir, sem medo, que o culpado é o meio ambiente de trabalho.
Sem dúvida, que um meio ambiente de trabalho equilibrado e adequado à modernidade e as necessidades dos seres que o freqüentam possibilita melhor produtividade, melhor qualidade de vida pessoal e profissional. Basta, e de forma simples, buscar melhorias para o meio ambiente de trabalho e a saúde do obreiro que a saúde do próprio meio ambiente será elevada.
As ocorrências como os assédios demonstram que o ambiente de trabalho está doente, ou por “uma erva daninha” (um trabalhador descompassado) ou por “toda a plantação contaminada” (toda a empresa, desde a direção que esta alheia à realidade). Não se podem tolerar empresas que não se preocupem com o ser humano e por sua vez com seus trabalhadores. O mundo já passou por grandes evoluções culturais, mas a mais importante de todas foi a de alteração do rumo das políticas sociais e públicas para focar o ser humano como detentor de direito e não só de deveres e obrigações.
Ora se direitos existem, como o de ser considerado cidadão, basta efetivá-los, e para a efetivação inicia-se nas pequenas atitudes do dia-a-dia, ou podando a “erva daninha” ou “replantando a plantação” toda, o que não se pode é ficar de braços cruzados esperando que por si só o ser humano evolua, pois tal fato não ocorrerá e as relações humanas continuaram a se deteriorar até a eclosão total do Ser, pois o ser humano é um Ser social por natureza e não individual assim suas condutas são balizadas pela coletividade.
Os conceitos, as análises e as propostas abordadas ao longo deste trabalho são idéias e proposições concatenadas em fatos reais e hordieiros, que são os casos de assédios. Por ter-se sempre como meta a pacificação definitiva dos conflitos o Poder Judiciário inicia o desenvolvimento de teorias, como a do valor do desestimulo, para através das sentenças começar ou aumentar o processo de reeducação da sociedade, o que possibilita voltar à atenção para as causas remotas e a refletir qual o papel do estado (não intervencionista) nas relações humanas.
A solução para evitar os assédios e por sua vez a reparação dos danos está em não praticá-los e coibi-los quando ocorrerem, assim a educação e a informação são as armas das empresas e da sociedade, sendo que o agir é que modificará o Ser, já que “de boas intenções o inferno está cheio”.[36]
E, de Norberto Bobbio[37] vem a lição: “com relação à grandes aspirações dos homens de boa vontade, já estamos demasiadamente atrasados. Busquemos não aumentar esse atraso com nossa incredulidade, com nossa indolência, com nosso ceticismo. Não temos muito tempo a perder.”
Advogado e professor de Direito, especialista, mestre e cursando doutorado em Direito
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